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ACIDENTES DO TRABALHO NO ESTADO DE SÃO PAULO -

IMPORTÂNCIA DA PESQUISA DOMICILIAR *


**
Paula Montagner
Leticia Borges Costa**
Maria de la Luz Prada Mato**

A importância social da segurança e prevenção de acidentes do trabalho


pode ser apreendida a partir das estatísticas da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), segundo a qual mais de um milhão de pessoas morrem no mundo,
a cada ano, no exercício do trabalho. Se esta cifra por si só já se mostra
assustadora, vale lembrar que é maior do que a média anual de mortes no trânsito
(999 mil), por violência (563 mil), em guerras (502 mil) e por Aids (312 mil) (O
Estado de São Paulo, 2001).
Em 1997, o número oficial de acidentados no exercício do trabalho no Brasil
era de 447.832 pessoas, sendo que o Ministério da Previdência e Assistência
Social gastou, nesse ano, cerca de R$ 1,4 bilhões, enquanto a Confederação
Nacional das Indústrias estimou em R$ 5,8 bilhões os gastos indiretos devido a
acidentes (Ribeiro, 2000). Estima-se que, em 1997, um em cada cinco
trabalhadores brasileiros havia sofrido um acidente de trabalho (Informativo Diesat,
1997).
Em outra pesquisa da Fundacentro executada pelo Seade (Fundação
Seade, 2001) com base em uma amostra representativa da categoria dos
motoristas de ônibus da Região Metropolitana de São Paulo, verificou-se que
23,6% dos entrevistados declararam ter sofrido algum tipo de acidente nos doze
meses anteriores à entrevista. Desses acidentes, 79,3% causaram apenas danos
materiais e 20,7%, danos pessoais ao motorista ou a terceiros. Além disso, o
grupo de motoristas que se queixava de dores nas costas, braços ou pernas
mostrou-se mais sujeito a acidentes (25,8% entre os que referiam algum tipo de
dor e 23,7% dos que referiram outro tipo de incomodo).
Embora a quase totalidade dos condutores de ônibus (96,7%) tenha
atribuído os acidentes à imprudência de terceiros (motoristas particulares,
perueiros, motoqueiros), foram destacados também o cansaço ou estresse
(67,0%), a falha humana ou imprudência ao dirigir (64,0%), a manutenção
deficiente dos ônibus (43,5%), a má condição das pistas (81,6%) e a intensidade
do trânsito (69,3%).
No entanto, apesar de o país já ter sido considerado campeão mundial de
acidentes do trabalho, este ainda é um assunto pouco debatido pela sociedade e
pela mídia. Por outro lado, sabe-se que são incompletas as estatísticas oficiais de
acidentes, levantadas pelo INSS através da Comunicação de Acidentes de
1
Trabalho – CAT , documento que serve basicamente para a concessão de
benefícios aos trabalhadores acidentados. Uma primeira razão para explicar as
omissões na contagem dos acidentes decorre da existência de elevado número de
2
vínculos de trabalho não formalizados , sem nenhum contato com a Previdência.
Acresce ainda que a emissão da CAT, apesar de obrigatória, em muitos casos
3
deixa de ser realizada, segundo alguns autores com anuência do trabalhador,
seja porque ele não quer ser estigmatizado como doente ou acidentado do

*
Este artigo utiliza as informações geradas pela pesquisa domiciliar “Acidentes do trabalho e doenças
profissionais no Estado de São Paulo”, realizada entre fevereiro e abril de 2001, pela Fundação Seade sob
demanda da Fundação Jorge Duprat de Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho –Fundacentro.
**
Analistas da Fundação Seade. Sugestões e comentário são bem vindos (pmontagn@seade.gov.br)
1
Ver, entre outros, Mendes, 1995.
2
Segundo a PNAD, em 1999 esta parcela correspondia a 64% da força de trabalho do país.
3
Ver, entre outros, Monteiro e Bertagni, 2000.
trabalho, seja porque o valor do benefício da previdência pública é o mesmo que o
salário recebido, quando o tempo de afastamento não supera quinze dias,
independentemente de se tratar de doença ou de acidente.
Por esses motivos, desenvolveu-se uma metodologia de pesquisa
domiciliar, com o objetivo de avaliar não só a ocorrência de acidentes de trabalho,
mas também a existência de medidas de proteção coletivas e individuais e da sua
efetiva utilização por parte dos empregados. Foram colhidas também informações
sobre a percepção que têm os trabalhadores dos diferentes tipos de risco
enfrentados nos locais de trabalho e se estão informados sobre esses riscos.
De modo a testar essa metodologia, que mais tarde será aplicada a outras
unidades da federação, foi realizada, entre fevereiro e abril de 2001, pesquisa com
amostra de 4.000 domicílios, representativa da Região Metropolitana de São
Paulo e municípios do interior do Estado de São Paulo com população urbana
igual ou superior a 97.000 pessoas. Segundo a PNAD 1999, nesta unidade da
federação encontrava-se pouco mais de um quinto da população brasileira e cerca
de 21% da população economicamente ativa do país. No entanto, em 1994, o
Estado era responsável por aproximadamente 60% das notificações de acidentes
e doenças do trabalho no Brasil.
A população alvo da pesquisa correspondeu aos indivíduos com pelo
menos dez anos de idade, que tiveram experiência de trabalho nos doze meses
anteriores ao período de entrevista, abrangendo cerca de 60% dos moradores dos
domicílios visitados que estavam nesta faixa etária.

Volume e caraterização dos acidentes


A existência de uma subnotificação de acidentes do trabalho já era do
conhecimento geral e já tinha sido confirmada por pesquisa anterior (Fundação
Seade, 1994). Naquela pesquisa, 4,6% das pessoas de dez anos e mais que
trabalharam nos doze meses anteriores mencionaram a ocorrência de um acidente
de trabalho, o que permitiu estimar em 325.000 pessoas o contingente de
trabalhadores acidentados no período, número substancialmente maior que o
indicado pelas fontes oficiais.
A pesquisa revelou que 6,5% da população economicamente ativa com
experiência de trabalho nos últimos doze meses havia sofrido acidente, o que
permite estimar o número de acidentes em cerca de 884.000. Desse total, cerca
de 89% foram acidentes tipo, atingindo 790.000 pessoas, e cerca de 11%,
acidentes de trajeto (93.000 pessoas) (Tabela 1). O número total é
substancialmente mais elevado que o captado através da CAT pelo Ministério da
Previdência e Assistência Social, que registrou cerca da metade deste número de
eventos para o total do país.

Tabela 1
Estimativas e Distribuição da População Economicamente Ativa – PEA
e dos Acidentados com Experiência de Trabalho nos Últimos
Doze Meses, segundo Tipo de Acidentes
Estado de São Paulo
2001
Tipo de Acidentes Estimativas Em %
(Em pessoas)

2
População Economicamente Ativa 13.545.000 100,0
Acidentados 883.000 6,5
Acidente Tipo 790.000 5,8
Acidente de Trajeto 93.000 0,7

Doenças do Trabalho 1.533.809 11,0


Fonte: Fundação Seade – Fundacentro/ MTE.
Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais – PATDOP.
(...) A amostra não comporta a desagregação para esta categoria.
Observe-se que, dos que sofreram acidente tipo, apenas 52,4% tinham
vínculo de trabalho formalizado, sendo que cerca de 38,3% possuíam relações de
trabalho mais frágeis, denotadas pelo assalariamento sem carteira de trabalho
assinada e pelo trabalho autônomo, situações em que a filiação ao sistema de
seguridade social depende exclusivamente da iniciativa individual.
Tabela 2
Distribuição dos Indivíduos de 10 Anos e Mais com Experiência de Trabalho nos
Últimos 12 Meses, que Sofreram Acidente de Trabalho nos Últimos Doze Meses,
segundo Posição na Ocupação
Estado de São Paulo
2001
Em porcentagem
Posição na Ocupação Total (1) Sofreu
Acidente
Tipo
Total 100,0 100,0
Empregado do Setor Público e Assalariado de Empresa 52,2 52,4
Privada com Carteira Assinada
Assalariado de Empresa Privada sem Carteira Assinada e 38,1 38,3
Trabalhadores por Conta-Própria ou Autônomos
Outros ... ...
Fonte: Fundação Seade – Fundacentro/ MTE.
Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais – PATDOP.
(1) Inclui aqueles que sofreram acidentes de trajeto;

Em decorrência dos baixos rendimentos do trabalho, estes segmentos


tendem a não realizar essa filiação, o que os deixa sem cobertura previdenciária
em caso de acidente. Entre os integrantes destes últimos grupos, a proporção dos
que declararam ter sofrido acidente (6,1%) era apenas ligeiramente inferior à
verificada para os formalizados (6,7%). Este resultado explica, em parte, a
subnotificação de acidentes de trabalho no país.
Outro aspecto importante a considerar, no que diz respeito à subnotificação,
diz respeito ao período de afastamento do trabalho em virtude do acidente. Na
presente pesquisa, cerca da metade do total de vítimas de acidentes tipo (45,9%)
afirmou que não houve afastamento do trabalho nem por um dia, enquanto que
outros 40,1% disseram que o período de afastamento estendeu-se de um a quinze
dias (Tabela 3). Estes resultados levam a supor que os acidentes que acarretam
afastamentos de pouca ou nenhuma duração tendem a não ser notificados.

Tabela 3
Distribuição dos Indivíduos de 10 Anos e Mais com Experiência de Trabalho
nos Últimos 12 Meses, que Sofreram Acidente nos Últimos 12 Meses no
Trabalho Atual ou no Imediatamente Anterior, por Tipo de Acidente,
segundo Tempo de Afastamento do Trabalho

3
Estado de São Paulo
2001
Em porcentagem
Tempo de Afastamento do Trabalho Total (1) Acidente
Tipo
Total 100,0 100,0
Nenhum Dia 43,3 45,9
1 a 15 Dias 41,4 40,4
Mais de 15 Dias ... ...
Fonte: Fundação Seade – Fundacentro/ MTE;
Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais – PATDOP.
(1) Inclui os acidentes de trajeto.
(...) A amostra não comporta a desagregação para esta categoria.

Entre os ocupados verificou-se maior incidência de acidentes tipo entre os


que trabalhavam na indústria de transformação (7,4%) e nos serviços para a
produção (7,0%) – segmento em que foram agregados os ocupados dos serviços
de comunicação, de eletricidade, água, gás, transportes e armazenagem, oficinas
de reparação mecânica, serviços de informática e outros serviços especializados.
Nestes ramos a proporção de acidentados é cerca de 60% maior que a
encontrada no agregado formado pelas atividades comerciais e de serviços
predominantemente destinados ao público em geral.
Quanto à ocupação, 61,5% do total de acidentes verificou-se nas
ocupações de tipo produtivo, enquanto que 38,5% ocorreram nas outras
ocupações. No entanto, ao contrário do que se poderia esperar, 92,7% dos
acidentes tiveram lugar durante a jornada diurna e habitual e 96,7% na realização
de tarefas usuais. Como 53,5% destes ocupados tinham recebido treinamento
específico para executar essas tarefas, fica-se com a idéia que o treinamento
sozinho não é suficiente para prevenir acidentes de trabalho.
Quanto à extensão da jornada diária média, constatou-se que os
acidentados trabalhavam 8 horas e 48 minutos, apenas 24 minutos mais que os
que não sofreram acidentes (8 horas e 24 minutos). No entanto, embora 39% do
total dos ocupados tivessem exercido jornadas de pelo menos nove horas diárias,
mais de 47% dos que mencionaram ter sofrido acidente de trabalho tipo tiveram
jornadas com esta extensão (Tabela 4). Assim, jornadas mais longas tendem a
ampliar a probabilidade de acidentes de trabalho, em decorrência de vários
fatores, inclusive da crescente fadiga a que é submetido o trabalhador.

Tabela 4
Distribuição dos Indivíduos de 10 Anos e Mais com Trabalho Atual,
por Condição de ter Sofrido Acidente nos Últimos 12 Meses,
segundo Horas Trabalhadas por Dia Habitualmente
Estado de São Paulo
2001
Em porcentagem

4
Horas Trabalhadas por Acidente
Dia
Total (1) Sofreu Não
Acident Sofreu
e Tipo Nenhum
Acidente
Total 100,0 100,0 100,0
Até 6 Horas 16,0 . 16,4
7 ou 8 Horas 45,0 44,3 45,1
9 Horas ou Mais 39,0 47,3 38,5
Fonte: Fundação Seade – Fundacentro/ MTE.
Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doença Profissionais
( 1 ) Inclui aqueles que sofreram acidentes de trajeto.
(...) a amostra não comporta a desagregação para esta categoria.

A maior parte dos acidentados (59,7%) tende a atribuir a falha humana a


principal causa de acidentes. No entanto, 28,5% deles apontaram como principal
fator a falta de treinamento ou de instrumentos de proteção. Isto deveria ser
levado em consideração pelas agências encarregadas da fiscalização dos locais
de trabalho.
Note-se ainda que, como esperado, há maior incidência de acidentes entre
as pessoas ocupadas que têm menor escolaridade. A explicação disto decorre em
parte da falta de habilidades específicas, que as colocam em postos de trabalho
mais precários e de menor grau de organização. Nestes postos, tanto os
trabalhadores como os empregadores tendem a desconsiderar procedimentos de
segurança do trabalho. Apesar de não constituir a fatia mais numerosa da PEA, o
grupo dos menos escolarizados é o que mais acidentes sofre, em termos
percentuais (Gráfico 1).

5
Gráfico 1
Distribuição dos Indivíduos de 10 Anos e Mais com Trabalho Atual, por
Condição de ter Sofrido
Acidente de Trabalho nos Últimos 12 Meses, segundo Nível de Instrução
Estado de São Paulo
2001

Analfabetos + Fundamental Incompleto


Fundamental Completo + Médio Incompleto
Médio Completo + Superior Incompleto ou Completo

56

48

40

32

24

16

0
T otal (1) Sofreu Acidente T ipo Não Sofreu Acidente

Fonte: Fundação Seade; Fundacentro/MTE, Pesquisa de Acidentes do Trabalho e Doenças


Profissionais. (1) Inclui os acidentes de trajeto.

Quanto à idade, registrou-se maior incidência de acidentes entre os


ocupados maiores de 44 anos, faixa esta em que há maior concentração de
pessoas com menor escolaridade e que possivelmente estariam mais
preocupadas com a possibilidade de perda da ocupação e, por isto mesmo,
aceitam riscos maiores no trabalho. Além disso, essas pessoas teriam maior
dificuldade em realizar esforços físicos prolongados. (Tiromi et alii, 1997).

Medidas de segurança
Para o detalhamento apresentado a seguir sobre as condições de
segurança nos locais de trabalho, foram considerados apenas os trabalhadores
que atuam sob alguma supervisão hierárquica. Nesta situação encontram-se os
assalariados com e sem carteira assinada do setor privado, os trabalhadores
autônomos que trabalham para uma empresa e os empregados do setor público.
Estes trabalhadores perfazem cerca de 60% dos ocupados na pesquisa. Os
demais, isto é, os trabalhadores por conta própria, os trabalhadores familiares que
não são remunerados e os empregadores têm um grau de autonomia
relativamente maior em suas decisões sobre segurança, em comparação com os
trabalhadores do primeiro grupo, uma vez que tendem a ser menos pressionados
para a execução de tarefas em ritmo e ordem pré-definidos.
Indagou-se dos entrevistados se os locais de trabalho ofereciam
equipamentos de proteção coletiva (EPC), caso fossem recomendados.
Constatou-se que 80% dos trabalhadores tinham acesso a medidas e
equipamentos de proteção coletiva, quando necessários, no caso de andaimes
com proteção lateral, identificação de produtos tóxicos, sinalização de locais
perigosos e ventilação artificial (exaustor, diluidor). Portanto, pelo menos 20% dos

6
trabalhadores exercem suas atividades sem proteção, em situações em que
medidas desse tipo são recomendadas. No entanto, a cobertura cai para 56,9% no
que se refere a isolamento acústico, embora a maioria tenha referido usar EPI
para ruído (86%) (Tabela 5).

Tabela 5
Percentual de Indivíduos de 10 Anos e Mais que Atualmente Trabalham para
Empresas, segundo Necessidade e Existência de Medidas de Proteção
Coletiva
Estado de São Paulo
2001
Em porcentagem
Medidas de Proteção É Necessário (1) Existe
Coletiva (2)

Ventilação Artificial 42,9 78,3


(Exaustor/Diluidor)
Isolamento Acústico 17,7 56,9
Sinalização de Locais 38,9 80,6
Perigosos
Identificação de Produtos 29,7 81,6
Tóxicos
Andaimes com Proteção 9,6 82,3
Lateral
Fonte: : Fundação Seade – Fundacentro/ MTE;
Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais.
(1) Percentual em relação ao total de indivíduos de 10 anos e mais que
atualmente trabalham para empresas.
(2) Percentual em relação ao total de indivíduos que responderam que a medida
de proteção é necessária para o exercício do trabalho.

Quanto a equipamentos de proteção individual (EPI), verificou-se que, onde


se encontravam disponíveis, eram largamente utilizados, em geral por mais de
90% dos trabalhadores. As telas protetoras de luminosidade e, mais
especialmente ainda, os protetores de tendinite, que mostraram percentuais mais
baixos de uso, não são mesmo requeridos pela legislação. As cadeiras e teclados
ajustáveis, mais eficientes na prevenção da tendinite, estão disponíveis em
4
respectivamente 79,1% e 63,9% dos casos, sendo amplamente utilizados (Tabela
6).

4
Vale notar que, embora estejam ausentes os equipamentos de proteção de tela e de tendinite, o
consenso é que estes representam apenas paliativos para o cansaço representado pelo esforço repetitivo
causador de Ler/Dort, aconselhando-se de preferência a rotação de tarefas, a observância de intervalos
regulares de descanso e a diminuição da freqüência de movimentos repetitivos.

7
Tabela 6
Percentual de Indivíduos de 10 Anos e Mais que Atualmente Trabalham para
Empresas, segundo Recomendação, Existência e Uso de Medidas de Proteção
Individual
Estado de São Paulo
2001
Em porcentagem
Medidas de Proteção Recomendado (1) Existe (2) Usa Sempre (3)
Individual
Uniforme/Avental 20,9 87,8 93,1
Cinto de Segurança 14,7 96,8 88,8
Botas 22,9 90,7 91,5
Capacete 9,6 90,9 81,8
Óculos de Segurança 16,5 93,7 84,7
Máscara 16,9 88,0 79,9
Luvas 27,9 92,5 84,4
Protetor de Ouvido 17,5 91,3 86,0
Cadeira Ajustável 30,4 79,1 94,8
Teclado Ajustável 22,7 74,8 91,4
Tela Protetora de 21,0 63,9 90,6
Luminosidade
Protetor de Tendinite 15,9 33,2 61,0
Fonte: Fundação Seade – Fundacentro/ MTE;.
Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doença Profissionais - PATDOP
(1) Percentual em relação ao total de indivíduos de 10 anos e mais que atualmente trabalham para empresas.
(2) Percentual em relação ao total de indivíduos que responderam que a medida de proteção é recomendada
para o exercício do trabalho.
(3) Percentual em relação ao total de indivíduos que responderam que a medida de proteção existe na empresa.

De um modo geral, pode-se concluir que há disponibilidade mais freqüente


de aventais, luvas, botas, capacetes, máscaras, etc, porém faltam medidas de
proteção coletiva mais dispendiosas, como isolamento acústico e aparelhos de
ventilação artificial. Mesmo outras medidas que não envolvem grandes despesas,
como sinalização de locais perigosos, identificação de produtos tóxicos e
andaimes com proteção lateral, estão ausentes no cotidiano de pelo menos 20%
dos trabalhadores que delas necessitam, expondo-os a acidentes.
A situação também é pouco animadora no tocante a organizações que
poderiam melhorar o nível de segurança no trabalho. A CIPA ou não existe, ou é
desconhecida por cerca de 65% dos empregados das empresas. Essas
Comissões Internas para Prevenção de Acidentes (Cipa) deveriam, em princípio,
recomendar e implementar medidas de proteção, além de disseminar informações
relativas à existência de riscos de acidente e de agravo à saúde do trabalhador,
não se restringindo ao preenchimento de CATs e outros procedimentos.
Constatou-se que a parcela de ocupados que sofreram acidentes tipo e referiram
haver CIPA no local de trabalho era de 38,1%, enquanto entre os que não
sofreram acidentes era de 34,5%.
Serviços médicos nas empresas, quando bem organizados, são importantes
na prevenção de acidentes, mas quase 67% dos trabalhadores não contam com a
existência de ambulatório médico no local de trabalho. No entanto, a Pesquisa de
Condições de Vida para o Estado de São Paulo, realizada pela Fundação Seade
em 1998, revelou que cerca de 44% da população total estava coberta por
convênio ou plano de saúde, uma vez que algum membro da família tinha acesso
a este serviço pelo fato de estar trabalhando em empresas que o custeia parcial
ou integralmente. Isto equivale a dizer que pelo menos 56% dos trabalhadores não
estão cobertos por qualquer serviço médico das empresas, quer para tratamentos
regulares, quer nas emergências.

8
Ainda no tópico de segurança, indagou-se dos entrevistados quais seriam
as melhores providências para reduzir o risco de acidentes e doenças do trabalho.
Eles indicaram treinamento (45%), maior fiscalização das condições de trabalho
(31,6%) e campanhas de esclarecimento (23,4%) (Tabela 7). Esta ordem de
prioridades se mantém, quer o trabalhador se considere bem ou mal informado
sobre os riscos que corre no trabalho. Apesar de os funcionários de empresas
entenderem o treinamento como o principal fator de segurança, menos de metade
deles (41,5%) declarou ter recebido treinamento nos procedimentos necessários.
Esse percentual é um pouco mais elevado para os homens (48,6%) do que para
as mulheres (31,2%). Isso se explica, provavelmente, pela inserção mais precária
das mulheres no mercado de trabalho.
Pouco mais da metade dos trabalhadores (55,9%) se considera
suficientemente informada sobre os riscos de acidente e doenças do trabalho.
Como era de se esperar, quanto mais escolarizado, mais bem informado o
trabalhador se considera.
Tabela 7
Distribuição dos Indivíduos de 10 Anos e Mais que Atualmente Trabalham para
Empresas, por Condição de Estar Suficientemente Informado sobre os Riscos
de
Acidentes ou Doenças do Trabalho, segundo Opinião sobre a Melhor Forma
para Evitar Acidentes ou Doenças no Exercício do Trabalho
Estado de São Paulo
2001
Em porcentagem
Melhor Forma para Está Suficientemente Informado sobre os
Evitar Acidentes ou Riscos de Acidentes ou Doenças do Trabalho
Doenças
Total Sim Não
Total 100,0 100,0 100,0
Treinamento 45,0 46,7 42,8
Maior Fiscalização das 31,6 27,6 36,5
Condições de Trabalho
Campanhas de 23,4 25,6 20,7
Esclarecimento
Fonte: Fundação Seade – Fundacentro/ MTE;. Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doenças
Profissionais.

Percepção de Risco
Pode-se afirmar que os trabalhadores têm uma percepção bastante clara
dos riscos existentes no desempenho de suas atividades profissionais. Os dados
obtidos mostram que 63,9% dos trabalhadores em empresas consideravam estar
expostos a algum tipo de risco no exercício de suas funções. Essa percepção era
um pouco mais elevada entre aqueles que trabalhavam na indústria e na
construção civil (66,9%) e nos serviços destinados à produção (64,9%), mas
também era alta entre os trabalhadores em atividades do agregado comércio,
serviços sociais e serviços destinados ao consumo (61,7%) (Gráfico 2).
Gráfico 2
Proporção de Indivíduos com Percepção de Risco, que Trabalham em
Empresa, segundo Setor de Atividade
Estado de São Paulo
2001

9
Indústria e Construção Civil

Serviços Destinados à Produção

Comércio, Serviços Sociais e Serviços Destinados ao Consumo


Em %

80,0

66,9
64,9
61,7
60,0

40,0

Fonte: Fundação Seade – Fundacentro/ MTE,


Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais

Considerando a percepção de risco segundo grupos ocupacionais, obtém-


se que ela é mais freqüente entre aqueles alocados em atividades ligadas
diretamente à produção (77,3%) do que entre os que exercem atividades
burocráticas (55,0%). Porém, em termos absolutos, esses dois contingentes são
quase do mesmo tamanho, uma vez que o percentual dos ocupados em
atividades burocráticas no total de trabalhadores é mais elevado do que o dos
ligados diretamente à produção (51,9% e 48,1%, respectivamente).
No que se refere à idade, sentem-se mais expostos os trabalhadores de 25
a 44 anos (67,6%), do que os jovens abaixo de 25 anos (57,2%).
No tocante ao grau de instrução, verifica-se que referem risco ocupacional
67,9% dos trabalhadores analfabetos ou que cursaram fundamental incompleto,
64,8% dos que possuem fundamental completo ou médio incompleto e 61,1%
daqueles que têm curso médio completo ou superior, mesmo incompleto. Quando
a variável sexo é observada, obtêm-se que 67,7% dos homens e 58,4% das
mulheres consideram existir risco em sua ocupação.

Percepção do trabalhador por tipo de risco


Foi pesquisada a percepção dos trabalhadores em empresas com
referência a oito tipos de risco. Os resultados (tabela 8) são analisados a seguir,
segundo algumas características do indivíduo e da atividade exercida.

10
Tabela 8
Distribuição dos Indivíduos de 10 Anos e Mais que Atualmente Trabalham
para Empresas, por Tipo de Risco Percebido
Estado de São Paulo
2001

Tipos de Risco Em %
Desconforto na Posição de Trabalho 28,7
Risco de Acidente de Tráfego/Trânsito enquanto 21,2
Trabalha
Risco de Choque Elétrico 19,8
Pisos Escorregadios 17,6
Risco de Contágio de Doenças 15,0
Uso de Ferramentas ou Máquinas Perigosas 14,1
Contato com Substâncias Químicas Perigosas 13,1
Risco de Ataque por Animais ou Insetos 6,6
Fonte: Fundação Seade – Fundacentro/ MTE; Denatran/ MJ.,
Pesquisa de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais

Desconforto na Posição de Trabalho


O desconforto na posição de trabalho destaca-se como o risco ocupacional
mais freqüente, sendo apontado por 28,7% dos trabalhadores. Está presente no
dia-a-dia de quem trabalha em atividades de produção (31,3%) e em atividades
burocráticas (27,0%). Esse risco atinge de forma bastante similar trabalhadores de
todos os graus de instrução e faixas etárias, homens e mulheres.
Segundo o nível de instrução, consideram-se sob este tipo de risco 30,1%
das pessoas com ensino médio ou superior, completo ou incompleto, 29,3% dos
trabalhadores analfabetos ou com ensino fundamental incompleto e 25% dos que
possuem ensino fundamental completo ou médio incompleto.
Em relação ao sexo, 30,8% das mulheres e 27,4% dos homens convivem
com desconforto na posição de trabalho, que também alcança 31,3% das pessoas
entre 25 e 44 anos, 25,8% dos que tem 45 anos ou mais e 25,6% dos jovens até
24 anos.
Se considerado o setor de atividade, esse desconforto predomina no setor
de serviços, onde 69,7% dos trabalhadores o assinalam, contra apenas 29,3% dos
trabalhadores da indústria. Os motivos que explicam essa disparidade podem ser:
nos serviços, maior presença de pessoas com nível de instrução mais elevado, o
que aumentaria sua percepção de risco e maior freqüência de atividades a serem
desempenhadas em pé, como as atividades de venda; na indústria, a existência
de outros riscos mais graves, que tenderia a diminuir a percepção do desconforto
da posição do corpo.
Risco de Acidentes de Trânsito
Os acidentes de trânsito, que foram apontados como risco ocupacional por
21,2% do total, atingem mais fortemente os trabalhadores em serviços destinados
à produção, 34%, e os que desempenham atividades na produção, 25,5%. Devido
às características dessas atividades, os homens são mais afetados, 29,5%, que as
mulheres, 8,9%.
Fatores como instrução e idade parecem acarretar pequenas diferenças.
Em todos os níveis de instrução, a freqüência oscila entre 20 e 23%. No caso da
idade, como esperado, o reconhecimento do risco é maior entre as pessoas com
25 anos e mais (22%), atingindo menos os jovens menores de 24 anos (17%).
Risco de Choque Elétrico ou Fogo
Quase 20% dos trabalhadores indicam a existência desse tipo de risco em
sua atividade profissional. As atividades nas quais o risco é mais percebido são a
indústria (30,2% dos trabalhadores), a construção civil (26,8%) e os trabalhadores

11
em serviços destinados à produção (21,9%). Entre os empregados em comércio,
serviços sociais e serviços destinados ao consumo, 14,7% consideram a
existência de risco de choque elétrico ou fogo em seu trabalho.
Segundo o nível de instrução, tanto os analfabetos e pessoas que cursaram
o ensino fundamental incompleto, quanto os que têm ensino médio incompleto
apresentam maior risco de sofrer choque elétrico em seu trabalho, 25,8% e 21,5%,
respectivamente. Esse percentual passa a 15,4% entre os que cursaram o ensino
médio completo e superior completo ou incompleto. A explicação pode residir no
tipo de função exercida em virtude do diferencial de qualificação.
Provavelmente por causa da distribuição setorial e ocupacional desse risco,
os homens se consideram mais expostos (22,9%) do que as mulheres (15,2%). A
incidência segundo faixa etária é mais homogênea, considerando-se sob perigo de
choque elétrico ou fogo 20,4% daqueles com idades entre 25 e 44 anos, 19,1%
dos que tinham até 24 anos e 18,9% dos maiores de 45 anos.
Risco de Pisos Escorregadios
Os pisos escorregadios foram sinalizados como risco no trabalho por 17,6%
do total dos trabalhadores, afetando principalmente aqueles que trabalham no
comércio, serviços sociais e serviços destinados ao consumo (21,0%). Entre os
trabalhadores em atividades da produção essa porcentagem é de 15,4%, e na
indústria e na construção civil, de 14,1%.
Provavelmente em função da distribuição setorial dos trabalhadores, as
mulheres (19,2%) são mais atingidas que os homens (16,5%), uma vez que as
atividades comerciais e os serviços destinados ao consumo empregam grande
número de mulheres. Em relação à idade, a identificação desse risco acontece em
18,2% dos trabalhadores de 25 a 44 anos, 17% dos maiores de 45 anos e 16,6%
dos jovens até 24 anos.
Os trabalhadores analfabetos ou com ensino fundamental incompleto e os
que cursaram o fundamental completo ou médio incompleto são os que se sentem
mais ameaçados pelo risco de trabalhar em locais com pisos escorregadios
(20,1% e 17,5%, respectivamente). A partir daí o nível de instrução não parece
fazer diferença, pois a percepção desse risco entre os trabalhadores que cursaram
o ensino médio ou mais declina apenas levemente (16,1%).
Risco de Contágio por Doenças
Existe percepção de risco de contágio no exercício profissional por parte de
15,0% dos trabalhadores. Como previsto, essa percepção é mais freqüente nas
atividades de comércio, serviços sociais e destinadas ao consumo (22,0%), nas
quais estão incluídos os ramos referentes à saúde. Nos serviços destinados à
produção, esse percentual se reduz para 11,2%.
Devido à elevada presença de mulheres nos serviços de saúde, elas são as
mais afetadas, 18,7%, enquanto apenas 12,5% dos homens declaram encontrar-
se nessa situação.
Considerando a escolaridade, observa-se que os trabalhadores com curso
médio completo ou superior são mais afetados (16,9%), seguidos pelos que têm
curso fundamental completo ou médio incompleto (13,9%) e pelos analfabetos ou
que possuem curso fundamental incompleto (12,8%). Esta associação entre a
percepção do risco de contágio por doenças e o nível de instrução pode ser
entendida como resultando da exigência de maior escolaridade em vários dos
serviços de saúde.
Provavelmente o grau de instrução e de experiência requerido nos serviços
de saúde também influi na freqüência diferencial da percepção do risco segundo
os grupos etários considerados. De fato, esse risco é percebido por 17,7% dos
trabalhadores com mais de 45 anos e por 16,8% dos que têm entre 25 e 44 anos,
mas reduz-se a 9,0% entre os jovens abaixo de 25 anos.
Uso de Ferramentas ou Máquinas Perigosas

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O risco no uso de instrumentos é assinalado por 14,1% dos trabalhadores.
O risco percebido nessa utilização atinge de forma mais expressiva aqueles que
trabalham na indústria ou na construção civil (27,1%), os que desempenham
atividades de produção (13,2%) e, de forma mais branda, os que atuam no
comércio, serviços sociais e serviços destinados ao consumo (6,8%).
A distribuição ocupacional e setorial condiciona, provavelmente, a incidência
por sexo. Dessa forma,18,9% dos homens se julgam em risco de se machucar
com ferramentas ou máquinas perigosas, enquanto entre as mulheres essa
percentagem é significativamente inferior (7,2%).
A incidência da percepção de risco no uso de ferramentas e máquinas
perigosas, concentra-se, principalmente, entre os trabalhadores menos
qualificados: 21,1% dos analfabetos ou com curso fundamental incompleto e
17,1% daqueles que cursaram o fundamental até o fim ou médio incompleto
afirmam estar sujeitos a esse risco. Esses percentuais se situam sete e três
pontos, respectivamente, acima do referente ao total dos trabalhadores expostos a
esse tipo de risco. Os trabalhadores que têm pelo menos o ensino médio
encontram-se seis pontos percentuais abaixo do total, com 8,6%.
Em relação à distribuição etária, como na maioria dos casos, os
trabalhadores de 25 a 44 anos referem este risco com mais freqüência, 15,4%,
seguidos pelos jovens de até 24 anos,13,3%, e pelos maiores de 45 anos, 11,6%.
Contato com Substâncias Químicas Perigosas
O risco representado pelo contato com substâncias químicas perigosas no
trabalho foi identificado por 13,1% dos trabalhadores. Esse percentual é de 20,3%
entre os que se dedicam a atividades na indústria e na construção civil e de
14,1%, nos serviços destinados à produção. Já entre os que trabalham no
comércio, serviços sociais e serviços destinados ao consumo, esse percentual é
mais reduzido (8,3%), conforme esperado.
Também nesse tipo de risco, a distribuição setorial parece influenciar a
percepção diferencial dos sexos, mostrando que os homens se julgam
significativamente mais expostos do que as mulheres, com 16,5% e 8,3%,
respectivamente. Conforme a expectativa, os trabalhadores que exercem
atividades na produção estão muito mais vulneráveis a esse risco (22,5%),
enquanto os que desempenham atividades burocráticas são menos afetados
(6,9%).
No tocante à idade, a percepção desse risco também esta mais concentrada
entre as pessoas de 25 a 44 anos (14,3%) e aquelas com 45 anos e mais (13,7%),
embora não seja desprezível entre os jovens até 24 anos, atingindo 10,1% destes.
Segundo nível educacional, os grupos que se declararam mais expostos
são os analfabetos ou que não concluíram o ensino fundamental (15,2%),
seguidos pelos que cursaram fundamental completo ou médio incompleto (14,1%).
Esse percentual, embora inferior aos anteriores, é também bastante expressivo
entre os trabalhadores que têm o curso médio completo ou mais anos de estudo
(11,4%).
Risco de Ataque por Animais ou Insetos
O risco de ataque por animais ou insetos foi apontado por 6,6% dos
trabalhadores. Sua incidência esta concentrada entre os homens (8,0%) e os
analfabetos ou que não concluíram o ensino fundamental (7,8%).
Entre os trabalhadores em serviços destinados à produção, 10,3%
apontaram a existência de risco de ataques por animais e insetos em seu trabalho,
e 6,4% daqueles que trabalhavam no comércio, serviços sociais e serviços
destinados ao consumo.

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Considerações finais

A pesquisa domiciliar realizada no Estado de São Paulo revelou que a


ocorrência de acidentes de trabalho atinge número muito maior de pessoas do que
revelam as Comunicações de Acidentes de Trabalho – CAT. Segundo essa
pesquisa, 6,5% das pessoas com experiência de trabalho nos últimos doze meses
(884.000 pessoas) se acidentaram no Estado. Além disso, 11% desta PEA referiu
doença adquirida no exercício do trabalho, o que corresponde a 1.533.000
pessoas.
Embora a pesquisa na qual se baseia este trabalho se refira mais
especificamente aos acidentes de trabalho e as doenças profissionais ainda não
tenham sido objeto de pesquisa domiciliar específica, considerou-se importante
registrar que o levantamento bibliográfico realizado para execução da pesquisa
alerta para o expressivo crescimento das doenças profissionais, entre elas uma
série de novas doenças do trabalho.
Segundo diversos autores, estas doenças teriam sua gênese na interação
de mudanças tecnológicas e gerenciais e na aplicação de políticas econômicas e
sociais de enxugamento de custos e pessoal, responsáveis também pelo
desemprego crescente. Nesse contexto, adoecer em conseqüência do trabalho
tem deixado de ser fato esporádico, passando a fazer parte do dia a dia de
centenas de trabalhadores e trabalhadoras.
Uma vez que a inserção brasileira nos processos de reestruturação
produtiva internacional e de globalização deu-se de uma forma relativamente
acelerada e num contexto econômico bastante atribulado, é possível inferir que um
conjunto de doenças do trabalho – tais como as do sistema músculo-esquelético,
diversas formas de sofrimento psíquico, elevados níveis de estresse, hipertensão
arterial e diversos tipos de câncer, venham afetando também os trabalhadores
brasileiros.
Em relação aos acidentes de trabalho, a subestimação das estatísticas do
MPAS não constitui novidade para os estudiosos do tema, embora não houvesse
uma mensuração efetiva da sua dimensão. Isto vem a corroborar a necessidade
da realização de levantamentos domiciliares regulares, de modo a acompanhar a
evolução da incidência das doenças e dos acidentes de trabalho, face às medidas
a serem tomadas para sua contenção.
Outro resultado que ressalta a importância das pesquisas domiciliares é
que, dos acidentes declarados, apenas pouco mais da metade (52,2%) atingiram
assalariados com vínculos formalizados (assalariados com carteira assinada e
servidores públicos). Os trabalhadores sem vínculos formalizados, que
representavam 38,2% das vítimas dos acidentes, tendem a não ser objeto das
estatísticas, na medida em que não têm acesso à assistência previdenciaria. Além
disso, parte expressiva das ocorrências não envolveu afastamento do local de
trabalho.
Verificou-se que a maior parte dos acidentes acontece durante a jornada de
trabalho diurna fixa, quando o trabalhador executa suas tarefas habituais, embora
cerca da metade dos acidentados tenha declarado trabalhar jornada superior a
nove horas diárias. Como é sabido, ao final de um extenso dia de trabalho, o
cansaço reduz a capacidade de manter a atenção e a agilidade na tarefa
executada e a rapidez das respostas a eventos imprevistos. Estes resultados
sugerem que as agências responsáveis pela vigilância das condições de trabalho
deveriam considerar a extensão da jornada como tema relevante quando da
realização de campanhas preventivas.
Nos locais de trabalho, os equipamentos de segurança investigados, em
geral os mais simples, tendem a estar disponíveis e são largamente utilizados
pelos trabalhadores. A presença de EPI, Cipa e ambulatório médico, embora
tenham um papel importante a desempenhar nos processos preventivos, não são

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suficientes para evitar a ocorrência de acidentes, uma vez que parcela expressiva
dos acidentados revelou sua existência no local de trabalho.
A pesquisa revelou também que cerca de dois terços dos trabalhadores
convivem diariamente com riscos de acidente e outros agravos à saúde e têm
percepção destes fatos. Não obstante a maior parte dos riscos ser encontrada no
setor industrial, os setores comercial e de serviços também apresentam riscos
crescentes, não devendo ser deixados à margem quando da definição de
programas de prevenção. Além disso, apenas 46,5% dos ocupados tinham
recebido treinamento para a realização das suas atividades e 44% declarou não
estar adequadamente informado sobre as medidas preventivas em relação a
acidentes de trabalho.
Destaque-se no entanto que, independente do grau de informação
individual, os trabalhadores acreditam que a melhor maneira de promover
segurança e saúde são, pela ordem, treinamento em práticas seguras, maior
fiscalização por parte dos órgãos governamentais e, em terceiro lugar, campanhas
de esclarecimento.
Embora a maior parte dos acidentados se incline a aceitar a falha humana
como principal causa de acidentes, o fato de quase um terço deles apontarem a
falta de treinamento ou de instrumentos de proteção como outros fatores, e mais o
fato da escolha preferencial de treinamento e maior fiscalização das condições de
trabalho, relativamente a campanhas de esclarecimento, como formas de reduzir o
risco de acidentes, indicam uma certa percepção de que essa responsabilidade
humana é no mínimo compartida com outros agentes, tais como poder público e
empresas.
Neste sentido, considerando que as decisões referentes à segurança no
trabalho são tomadas pela empresa, seria adequado ampliar o foco das
campanhas públicas de prevenção, atualmente dirigidas aos trabalhadores e aos
cuidados que estes devem ter para não se acidentarem. As campanhas deveriam
incluir em seu público alvo também os níveis superiores e gerenciais das
empresas de maior porte e os proprietários das médias e pequenas empresas, nas
quais os problemas de saúde e segurança tendem a ser menos considerados. As
estatísticas existentes relativas às perdas financeiras incorridas face a acidentes e
doenças poderiam ser utilizadas para sensibilizá-los em relação à necessidade de
ampliar seus programas de saúde e proteção do trabalhador.

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