You are on page 1of 104

O LIVRO DA NOVA EDUCAÇÃO DO CARÁCTER

Ramiro Marques
2008
Blog: ProfAvaliação
http://www.professoresramiromarques.blogspot.com

1
Índice

Cap 1 As virtudes: o que são e como se adquirem


Cap 2 As pré-condições das virtudes do carácter
Cap 3 Como construir uma comunidade virtuosa
Cap 4 O papel dos hábitos na educação do carácter
Cap 5 O carácter e os hábitos: a perspectiva de Aristóteles
Cap 6 A habituação como prática crítica
Cap 7 Cultura comunitária e virtudes
Cap 8 O papel das narrativas e da tradição
Cap 9 Artes de sobrevivência e educação do carácter
Cap 10 Artes de sobrevivência e florescimento das virtudes do
carácter
Cap 11 Artes de sobrevivência e florescimento das virtudes: Um
exemplo
Cap 12 Artes de sobrevivência e currículo
Cap 13 Como floresce a amizade
Cap 14 A relação entre a amizade e as outras virtudes
Cap 15 Educação do carácter
Cap 16 Educação do carácter: 6 Es
Cap 17 Manifesto da educação do carácter
Cap 18 Indisciplina e carácter
Cap 19 Pode um povo ser rico num país pobre?
Cap 20 Quando as virtudes do carácter estão ausentes
Cap 21O papel do Estado na educação do carácter
Cap 22 Teoria ética da virtude
Cap 23 O prazer e a dor na educação do carácter
Cap 24 A felicidade e a amizade andam associadas
Cap 25 O telelixo é uma droga pesada
Cap 26 O que as crianças e os jovens realmente precisam
Cap 27 Princípios básicos na nova educação do carácter
Cap 28 Recomendações para a criação de programas de educação do
carácter
Cap 29 Os dez mandamentos dos pais
Bibliografia

Introdução

2
As escolas públicas portuguesas estão a falhar em muitas áreas
e a prova disso são os resultados medíocres que os alunos
portugueses obtêm nos testes internacionais, situando-se no último
terço da tabela, tanto na Matemática como nas Ciências da Natureza.
A persistência de elevadas taxas de abandono escolar, quer no ensino
básico, quer no final do secundário, constitui outro indicador desse
falhanço. Contudo, a área onde os resultados ficam mais longe do
desejado é a educação do carácter das crianças e dos jovens.
Em Portugal, persiste, desde há mais de três décadas, a ideia
de que a única proposta pedagógica válida para se fazer educação
ética é a abordagem congnitivo-desenvolvimentista, fortemente
influenciada pelos trabalhos de Lawrence Kohlberg. Essa proposta
tem-se revelado um falhanço completo e a razão desse falhanço
explica-se pelo facto de acentuar apenas a aquisição de competências
cognitivas, evidenciando um claro desprezo para com a acção moral,
os hábitos e as virtudes do carácter.
Infelizmente, essa tem sido a única abordagem ensinada e
estudada nos cursos de formação de professores, apresentando-se,
desde há muito tempo, como a única proposta pedagógica válida.
Quer as revistas de Educação, quer os congressos e conferências,
têm vindo a ignorar, de forma persistente, qualquer tentativa séria
para dar a conhecer outras propostas pedagógicas. A Nova Educação
do Carácter é uma dessas propostas. Nascida nos EUA, na década de
90 do século passado, como resposta à ineficácia da abordagem
cognitivo-construtivista, a Nova Educação do Carácter é quase
desconhecida em Portugal. Tenho feito um esforço para a dar
conhecer e a publicação deste livro constitui, a meu ver, um marco
importante.
O Livro da Educação do Carácter destina-se, sobretudo, a
alunos dos cursos de formação de professores, alunos de cursos de
pós-graduação em Educação e a professores e a técnicos de educação
não formal. Ao longo de 27 capítulos, apresenta-se e discute-se a

3
teoria e dão-se a conhecer os métodos, estratégias técnicas próprios
da Nova Educação do Carácter.

CAP 1 As virtudes: o que são e como se adquirem?

À medida que as crianças crescem, precisam de adquirir e


desenvolver algumas qualidades de carácter, a que alguns autores

4
chamam disposições e hábitos, tais como o sentido da
responsabilidade, coragem, temperança, sentido da justiça,
autodomínio e prudência. Estas virtudes não são mais do que hábitos
da mente, bons sentimentos e força de vontade para os traduzir em
actos.
Há três maneiras de as crianças adquirirem estas virtudes: pelo
exemplo, através da prática directa e através das narrativas (1).
As crianças aprendem pelo exemplo quando vêem e observam
as vidas dos pais, amigos e vizinhos. As transformações na estrutura
da família tradicional, nomeadamente a percentagem cada vez maior
de filhos únicos e de famílias monoparentais, aumentou a influência
dos mass media na vida das crianças. Essa influência é tanto maior e
mais perigosa quanto mais frágil for a estrutura da família. Como as
crianças aprendem as virtudes por imitação, a exposição a que estão
sujeitas, durante longas horas por dia, ao telelixo, ao lixo que circula
na web e a jogos de computador que exaltam a violência e a
crueldade, pode ter efeitos extremamente nefastos no processo de
formação do carácter, impedindo-as de adquirir as virtudes
necessárias e aguçando nelas o apreço e apetite pelos vícios e valores
negativos. A agravar este estado de coisas, está o facto de, nas
sociedades ocidentais materialmente mais desenvolvidas, a juventude
se estender por demasiado tempo sem que os adolescentes e jovens
tenham um contacto directo com actividades produtivas, de tipo
profissional ou de voluntariado.
As crianças aprendem através da prática directa, ou seja, pela
repetição de actos que são levadas a realizar quer sob influência dos
pais quer dos professores e dos pares. Trata-se, neste caso, de uma
aprendizagem através da experiência. Essa aprendizagem é muito
importante porque vem associada ao desenvolvimento de
competências de vida e de trabalho, as quais mantêm uma íntima
relação com determinadas virtudes, como a honestidade, a verdade,
a generosidade, a equidade, a perseverança e a resiliência.

5
As crianças aprendem pela palavra e, em particular, através das
narrativas, as quais têm um poderoso efeito na formação da
personalidade e na construção do carácter das crianças. As narrativas
familiares ajudam a criança a compreender que pertence a uma
cultura e a uma comunidade marcadas por laços de solidariedade e
de afeição e enquadradas por rituais, normas, tradições, proibições e
limites. Sem o contacto permanente com esse quadro de normas,
rituais, tradições, proibições e limites, a criança sente-se perdida e
desorientada, ficando mais exposta à influência nefasta da cultura
dos gangs, nomeadamente quando não dispõe do apoio e
acompanhamento de uma comunidade virtuosa, na família, no bairro
e na escola (2).
De seguida, vamos passar em revista as quatro virtudes
cardinais: prudência, justiça, coragem e temperança.
A prudência é a virtude da boa deliberação. Sem ela, perdemo-
nos com facilidade no complexo processo de tomada de decisões.
Como sabemos, o processo de tomada de decisões compreende
várias fases: contacto com o problema, compreensão do problema,
cálculo racional sobre as opções, estratégias e consequências,
deliberação e, por fim, passagem à acção. Em muitos casos, o sujeito
não chega ao fim do processo, ou seja, não passa à acção. Há várias
razões para isso: vontade fraca, ausência da virtude da coragem ou
simplesmente adiamento da passagem à acção por efeito do cálculo
racional. Outras vezes, o sujeito passa à acção mas age mal. Há
várias explicações para isso: vontade deficiente, falta de informação
e, portanto, incapacidade para compreender o problema, mau uso do
cálculo racional ou, simplesmente, a posse de um mau carácter. O
sujeito com um mau carácter age mal porque tem uma inclinação
para apreciar as acções incorrectas. O hábito de praticar acções
incorrectas reforça o mau carácter. Por outro lado, um sujeito que
cresce e vive numa comunidade onde as virtudes não estão presentes
ou não são apreciadas, tem mais probabilidades de desenvolver um

6
mau carácter. Por vezes, acontece outra situação: o sujeito opta por
não passar à acção. Pode acontecer que o sujeito, após a fase de
cálculo racional, conclua que as consequências negativas previsíveis
de uma determinada acção aconselhem a que a acção não seja
tomada ou que a mesma seja adiada para melhor oportunidade. A
prudência compreende várias qualidades e exige a presença de várias
condições: respeito pela aprendizagem e pela realização intelectual;
compreensão da natureza humana; respeito pela experiência de vida;
análise das prioridades de vida; hábito de considerar as causas
passadas e as implicações futuras dos acontecimentos presentes e
das circunstâncias; habilidade para conhecer a verdade, a beleza e o
bem; capacidade para distinguir entre a verdade e a mentira, o
verdadeiro e o falso e o bem e o mal. A capacidade de distinguir
constitui uma propriedade essencial na virtude da prudência. Mas
distinguir o quê? Eis uma pequena lista de coisas importantes:
distinguir os heróis das celebridades, a regra da lei das regras
pessoais, a consciência dos sentimentos, as opiniões racionais dos
sentimentos, o respeito por si mesmo do orgulho, o risco calculado da
impulsividade, a competição honrada da ambição desmedida, a
colaboração em equipa do individualismo egoísta…
A justiça é a virtude da responsabilidade e da equidade. No
fundo, é ser capaz de dar a cada um aquilo que lhe pertence e aquilo
que lhe é devido. A justiça compreende várias qualidades e exige a
presença de várias condições: compreender e respeitar os direitos
dos outros; hábito de cumprir as nossas obrigações; obrigação de
procurar fazer o melhor que nos for possível; respeito pela autoridade
legítima; saber viver com as consequências das nossas acções e
erros; hábito de honrar as nossas promessas e compromissos; hábito
de evitar a intromissão em assuntos alheios; dar aos outros o
benefício da dúvida e respeitar o direito à presunção de inocência.
A coragem é a virtude da fortaleza. Ser corajoso exige que se
aguente e pressupõe que se seja persistente. É ser capaz de reagir às

7
adversidades e não desistir mesmo quando tudo parece perdido. Não
é o mesmo que temeridade. A coragem pressupõe determinadas
qualidades e exige a presença de algumas condições: habilidade para
ultrapassar as dificuldades; hábito de ultrapassar o medo e a
ansiedade através da acção correcta; confiança na capacidade para
resolver problemas; determinação para ultrapassar as derrotas.
A temperança é a virtude do autodomínio. Exige ser capaz de
escolher e de fazer nas proporções certas, evitando os excessos e os
defeitos. Implica ser capaz de optar pelo justo meio. Pressupõe
determinadas qualidades e exige a presença de algumas condições:
capacidade para dizer não quando é preciso dizer não; hábito de
esperar pelas recompensas e de ser capaz de as merecer; capacidade
para usufruir dos prazeres (comida, bebida e sexo) com moderação;
ser capaz de pedir desculpa quando se comete um erro ou uma
ofensa; hábito de usar as boas maneiras; capacidade para se
preocupar com a dignidade e as necessidades dos que nos rodeiam.
As quatro virtudes cardinais são autênticas lições de vida. A sua
posse e o seu uso são condição essencial para se levar uma vida boa
e digna. Sem a presença e o uso das quatro virtudes cardinais não se
pode aspirar a uma vida feliz.

Notas
1) Marques, R. (2000). O Livro das Virtudes de Sempre. Porto:
Edições Asa (Edição brasileira, na Editora Landy e edição em
castelhano na Editora Desclée)
2) Marques, R. (2002). Breve História da Ética Ocidental. Lisboa:
Plátano Edições

CAP 2 As pré-condições das virtudes do carácter

8
O grande mestre, Aristóteles, dá-nos uma definição exacta e
rigorosa das pré-condições das virtudes (1), levantando e discutindo
questões fundamentais do tipo: quais são as condições de uma acção
voluntária? Quando é que podemos afirmar que uma acção é
involuntária? Quando é que uma acção é digna de apreço ou de
censura?
A virtude está sempre relacionada com os sentimentos e as
acções. Quando as acções são voluntárias, são dignas de apreço ou
de censura. Quando são involuntárias, recebem o perdão ou a
piedade, nunca a censura. Quando uma acção é realizada pela
coacção externa, pela força, ou quando se baseia na ignorância,
podemos afirmar que essa acção é involuntária. Por vezes, as acções
são realizadas em condições complexas e difíceis de definir. Vejamos
o exemplo do tirano que exige a alguém que faça alguma coisa digna
de censura moral sob pena de o filho dessa pessoa ser preso ou
torturado. Será que a acção realizada por essa pessoa é voluntária?
Embora uma acção desse tipo tenha componentes voluntárias e
involuntárias, parece ser mais do segundo tipo porque é realizada sob
coação psicológica ou física.
Que tipo de acções é que nós podemos dizer que foram
forçadas? São as acções causadas por factores e agentes externos ao
agente que age. Por exemplo, o caso do agente que rouba alguém
sob a ameaça de tortura a um filho raptado.
Vejamos o caso da ignorância. Será que a ignorância faz com
que o acto seja involuntário? Nem sempre. Uma acção causada pela
ignorância é de natureza diferente de uma acção feita na ignorância.
Por exemplo, uma acção realizada sob o efeito da embriaguês, foi
causada não pela ignorância mas pela embriaguês, embora realizada
na ignorância. Neste caso, a acção não é inteiramente involuntária e
não só é digna de censura moral como o agente é responsável pelo
acto em termos morais e legais. A ser de forma diferente estaria

9
aberto o caminho para mascarar uma acção vil com o véu da
ignorância causada não por ela mas por outras causas,
nomeadamente o abuso do álcool ou das drogas. Esta ignorância não
torna a acção involuntária.
Podemos concluir que uma acção involuntária é uma acção
forçada ou causada pela ignorância e uma acção voluntária é uma
acção que tem a sua origem no próprio agente e sempre que o
agente conhece os aspectos particulares dessa acção. E quais são
esses aspectos particulares? São os seguintes: quem pratica a acção?
O que é que o agente está a fazer? Para que é que o agente está a
fazer aquilo? De que maneira o agente está a fazer?

Notas
1) Aristóteles (1985). Nichomachean Ethics. (Introdução, tradução e
notas de Terence Irwin). Indianapolis: Hackett, 1110ª5 a 1111b15

CAP 3 Como construir uma comunidade virtuosa?

Antes de respondermos a esta questão é conveniente


definirmos comunidade virtuosa. Aquilo que sustenta uma
comunidade virtuosa é a partilha do bem comum e o compromisso de
o conservar e fortalecer. O bem comum é um conceito difícil de
definir. Sabemos que é um conceito importante porque quando ele
não existe ou não é partilhado, a comunidade desfaz-se, os seus
membros digladiam-se na defesa de questões particulares, cresce a
dissenção, a malícia e a animosidade. Sabemos que uma comunidade
não pode manter-se sem que os seus membros partilhem uma noção
de bem comum. Etimologicamente, a palavra comunidade vem de
communio, ou seja, comunhão, pôr em comum, partilhar. Não se
pode estar em comunhão se não se reconhecer a existência de um

10
todo que importa assegurar e proteger. A comunhão é uma forma de
testemunhar essa partilha. No fundo, o bem comum é o conjunto das
práticas culturais e sociais que afirmam a nossa humanidade comum
e a nossa pertença a uma comunidade. O objectivo do
reconhecimento do bem comum é a procura da melhoria de todos e
de cada um. Como sabemos, tal empreendimento só pode ser feito
com o esforço de muitos. Não é tarefa para ser realizada
individualmente. Então, uma comunidade virtuosa não é mais do que
um conjunto de pessoas unidas pelo reconhecimento e partilha do
bem comum e que, unidas, em comunhão, visam a melhoria de todos
e de cada um. É claro que uma comunidade virtuosa é uma
comunidade onde se cultivam e usam as virtudes. Todas as
comunidades virtuosas asseguram um processo de transmissão e de
aquisição das virtudes pelas novas gerações. A família, as Igrejas
locais e a escola são agências fundamentais desse processo. Mas não
são as únicas. Os pares e os vizinhos exercem, também, um papel
não negligenciável. Quais são as formas que asseguram o processo
de aquisição das virtudes? São fundamentalmente três: exemplo,
experiência directa e narrativas. Quando uma comunidade não
encontra maneira de usar estas três formas, torna-se muito difícil
assegurar que as novas gerações partilhem as virtudes e a noção de
bem comum das gerações anteriores. Entra-se num processo de
ruptura. Há comunidades onde não existe tempo nem espaço para
assegurar essas três formas de aquisição das virtudes. As
comunidades urbanas e suburbanas de muitas das nossas cidades,
aquilo a que eu chamo de sociedades materialmente desenvolvidas,
têm vindo a organizar-se de um modo que torna bastante difícil o uso
dessas três formas de aquisição das virtudes: exemplo, experiência
directa e narrativas. O exemplo escasseia porque as crianças e os
jovens partilham cada vez menos espaços e tempos em comum com
os mais velhos. Não se encontram às refeições ou tomam as refeições
à pressa e cada um para seu lado. Sem referenciais seguros dos pais,

11
dos vizinhos e dos professores, as crianças e os jovens vão buscar os
exemplos a outro lado: ao telelixo, ao lixo que circula na web e aos
jogos para consolas. Em qualquer destes sítios, a probabilidade de
encontrar exemplos de virtude é muito pequena.
A experiência directa também escasseia por várias razões: a
infância e a adolescência prolongam-se por cada vez mais anos, a
entrada dos jovens no processo produtivo e criativo faz-se cada vez
mais tarde e as crianças deixaram de aprender as artes da
sobrevivência e não têm oportunidades para desenvolverem
competências de construção e de criação, ou seja, deixaram de o
fazer porque compram ou dão-lhes tudo já feito.
As narrativas existem, mas nem sempre são as mais
adequadas. Faltam as narrativas familiares e abundam as narrativas
veiculadas pelo telelixo. Sem a partilha das narrativas familiares e
das narrativas comunitárias, as crianças ficam sem referenciais
seguros, tendem a perder-se na incerteza e na dúvida e não
conseguem encontrar uma ordem na confusão. Há, no entanto,
comunidades onde o exemplo, a experiência directa e as narrativas
continuam a ter um lugar central no processo de socialização e de
aquisição das virtudes. A República de S. Tomé e Príncipe é uma
delas. Pude presenciar que as crianças continuam a ser ensinadas
pelos pais, irmãos mais velhos e vizinhos nas artes da sobrevivência
e a desenvolverem competências do domínio do saber-fazer porque
são envolvidas, desde cedo, nos processos produtivos familiares e
escolares. Veja-se, no primeiro caso, o envolvimento das crianças e
jovens no trabalho nas machambas ou na pesca e, no segundo, nas
hortas escolares. Quero dizer com isto que, em S. Tomé e Príncipe e
em muitos outros países de forte pendor comunitário, não há uma
separação tão nítida entre o mundo da infância e o mundo dos
adultos e que aquelas são envolvidas por estes em processos
produtivos que lhes permitem o exercício contínuo da experiência
directa e a aprendizagem das artes da sobrevivência.

12
Há algumas estratégias que facilitam a construção de
comunidades virtuosas: traçar objectivos realistas mas ambiciosos;
criar oportunidades para partilhar narrativas; envolver as crianças e
jovens em processos produtivos; construir relações de proximidade;
criar oportunidades para a supervisão e a correcção das actividades
proporcionadas pela experiência directa.
Sem objectivos não há projecto. Sem objectivos realistas mas
ambiciosos nunca passaremos da mediocridade. Os pais e as escolas
devem traçar expectativas elevadas mas realistas. Não chega ter
expectativas elevadas face ao aproveitamento escolar. Tão importante
como isso é ter expectativas elevadas face ao carácter.
As virtudes são adquiridas de forma semelhante às artes. Para
aprender música ou pintura é necessária a supervisão regular de um
mestre, muita prática supervisionada e muita experiência directa.
Sem a prática das virtudes, não há processo de melhoria do carácter.
Aristóteles responde à pergunta “como é que as virtudes são
adquiridas?” da seguinte forma: “Há dois tipos de virtudes, virtudes
de pensamento e virtudes de carácter. As primeiras nascem e
crescem a partir do ensino e, por isso, necessitam de experiência e
de tempo. As virtudes de carácter, ou seja do ethos, resultam do
hábito (ethos), daí que se apelidem de éticas” (1). Se ancorarmos o
nosso pensamento na teoria aristotélica da virtude, não podemos
deixar de concluir que é extremamente difícil que as virtudes de
carácter floresçam em comunidades viciosas. Pelo contrário, as
crianças e jovens que cresçam em comunidades virtuosas têm mais
probabilidades de adquirir as virtudes de carácter, atendendo a que
estas dependem sobretudo da prática, dos hábitos, isto é, do ethos.
O envolvimento em serviços de voluntariado e em actividades
produtivas é uma maneira prática e eficaz de envolver as crianças e
jovens em experiências directas do tipo aprender fazendo. Em S.
Tomé e Príncipe, tive oportunidade de testemunhar que o
envolvimento das crianças no processo produtivo familiar não é uma

13
manifestação de exploração de mão de obra infantil, como um olhar
Ocidental apressado levaria a concluir, mas é sobretudo uma prática
de socialização que aproxima os dois mundos, o mundo da infância e
o mundo dos adultos, com evidentes benefícios para todos. Se nos
lembrarmos que o cultivo das artes da sobrevivência está
intimamente associado ao desenvolvimento das virtudes de carácter,
é fácil de ver o potencial educativo dessas práticas.
As relações de proximidade são parte integrante do processo de
sustentação de uma comunidade virtuosa. Para tal, têm de estar
asseguradas algumas condições: tempo disponível para manter e
aprofundar as relações de proximidade, tradição e autoridade
reconhecidas e respeitadas por todos, reconhecimento da existência
de um bem comum, envolvimento em práticas de produção de forma
a assegurar a experiência directa. Em S. Tomé e Príncipe, essas
condições continuam presentes na vida das comunidades e é essa a
razão que explica o elevado nível de aquisição e uso das virtudes de
carácter por parte das crianças. O uso das virtudes de carácter é
natural porque se tornou um hábito dizer a verdade, honrar os
compromissos, mostrar coragem, ser paciente, respeitar os mais
velhos e obedecer à autoridade legítima. Por contraste, em muitas
comunidades de Portugal é difícil assegurar a presença dessas
condições e, por isso, tão difícil o uso dessas virtudes. Quando visito
uma escola básica de S. Tomé e Príncipe, é natural, porque é um
hábito, que as crianças se levantem e digam em coro: “seja bem-
vindo senhor visitante!” e que só se voltem a sentar quando o
professor faz sinal. Também é natural que as crianças obedeçam aos
professores e aos pais e respeitem as relações de cortesia porque é
um hábito fazê-lo.
Uma comunidade sem as condições enumeradas atrás não
potencia o desenvolvimento do carácter. Regra geral, é fácil identificar
as características de uma comunidade onde existe um ethos
negativo: não há uma partilha da noção de bem comum, não há

14
oportunidade para o envolvimento das crianças e jovens em
actividades produtivas, não há respeito pelas tradições e não há
tempo para aprofundar as relações de proximidade. Uma boa parte
das famílias e escolas portuguesas estão neste caso. É por isso que
eu digo que há muitas crianças portuguesas que vivem e crescem em
comunidades viciosas onde é extremamente difícil adquirir as virtudes
de carácter. Mas o pior de tudo é que muitas dessas comunidades
viciosas são escolas.

1) Aristóteles (1985). Nichomachean Ethics. (Introdução, tradução e


notas de Terence Irwin). Indianapolis: Hackett, 1103ª20, 15

CAP 4 O papel dos hábitos na educação do carácter

O processo mais fácil e rigoroso para analisar esta questão é ler


e analisar o pensamento de Aristóteles, tal como ele é expresso na
Ética a Nicómaco (1).
As virtudes de carácter não são adquiridas pelo ensino, mas sim
pelo hábito. Nenhuma das virtudes de carácter surge naturalmente.
As crianças não nascem com elas. Embora as crianças nasçam com
os sentidos naturalmente activos, por exemplo a visão ou a audição,
o mesmo não acontece com as virtudes de carácter que carecem de
tempo, experiência, prática e actos repetidos, de forma a se tornarem
hábitos. Se as virtudes de carácter surgissem naturalmente, como os
sentidos, é claro que não podiam ser mudadas pelo hábito. Não é o

15
hábito de ver ou de ouvir que aguça e melhora o sentido da visão ou
da audição, mas é o hábito de ser justo, corajoso, temperado e
prudente que aguça e melhora cada uma dessas virtudes de carácter.
As virtudes de carácter são adquiridas da mesma forma que nós
adquirimos a mestria nas artes e nos ofícios: pelo exemplo, pela
prática supervisionada e pelo hábito de fazer. Esta questão não é de
pouca importância. Repare-se: se as virtudes de carácter se
adquirem pelo hábito, uma comunidade onde rareiam oportunidades
para a criação de bons hábitos é totalmente hostil à aquisição das
virtudes de carácter. Podemos generalizar e afirmar que o mesmo
acontece na sociedade e na vida política em geral. Um país com um
poder político hostil à prática das virtudes não oferece as condições
de base para o desenvolvimento do carácter dos cidadãos. Um poder
político hostil à prática das virtudes é, por exemplo, um poder político
favorável à corrupção, clemente para com o crime organizado ou
fomentador de rivalidades étnicas.
À semelhança das virtudes, também os vícios se adquirem pelo
hábito. Da mesma forma que um mau professor de música produz
um mau músico, também os pais e professores, pouco preocupados
com as virtudes de carácter, tendem a favorecer o desenvolvimento
do mau carácter nas crianças e nos jovens. Uma escola que se tenha
tornado numa comunidade hostil às virtudes de carácter potencia um
ambiente favorável à aquisição dos vícios. É fácil identificar os vícios
que um tal ambiente hostil favorece: injustiça, imprudência,
intemperança, cobardia, desonestidade, irresponsabilidade, entre
outros. Na medida em que o bom carácter floresce pela repetição de
actividades propícias, a comunidade deve proporcionar o exercício
dessas actividades.
A habituação deve evitar quer o excesso quer a deficiência.
Aristóteles (2) avisa-nos que tanto o excesso como a deficiência
numa actividade podem arruinar quer a formação dos hábitos quer
das virtudes a eles associadas. Vejamos o exemplo da coragem. Se

16
uma pessoa evita e tem medo de tudo, está aberto o caminho para a
aquisição do hábito da cobardia e, concomitantemente, do vício que
lhe anda associado. Da mesma forma, se o indivíduo não for capaz de
refrear o usufruto de prazeres em excesso, está aberto o caminho
para a aquisição do hábito da intemperança e do vício que lhe anda
associado. Contudo, se o indivíduo se abstém de todos os prazeres,
torna-se insensível. Como vimos, quer a coragem, quer a temperança
podem ser destruídas quer pelo excesso quer pela deficiência.
Aristóteles chama-nos a atenção para o papel que o prazer e a
dor têm no processo de habituação. Por exemplo, se o indivíduo
consegue ser firme face às situações difíceis e tira prazer disso, então
essa pessoa torna-se corajosa; mas se isso lhe provoca dor, então
tende a tornar-se cobarde. Se o indivíduo sente prazer na capacidade
de resistir ao excesso de prazeres, usufruindo-os com moderação,
então podemos dizer que é temperado. Se, pelo contrário, sofre em
refrear-se, temos de afirmar que é intemperado (3). Resulta daqui
que a educação correcta é aquela que nos faz sentir prazer e dor nas
coisas certas. Para os casos em que o indivíduo retira prazer nas
coisas erradas, importa que o processo educativo proceda à
necessária correcção, da mesma forma que o médico faz perante os
sintomas de uma determinada doença. A virtude é, então, uma
espécie de estado que leva à realização das melhores acções
correctas que dizem respeito aos prazeres e às dores e o vício é o seu
contrário. E Aristóteles avisa que a aquisição das virtudes exige
prática continuada e não apenas teoria: “há muitos, contudo, que não
agem, antes se refugiam em argumentos, pensando que fazem
filosofia e que essa é a forma de educar para a excelência. No fundo,
são como as pessoas doentes que ouvem atentamente o médico mas
que não põem em prática as suas instruções” (4).

Notas

17
1) Aristóteles (1985). Nichomachean Ethics. (Introdução, tradução
e notas de Terence Irwin). Indianapolis: Hackett, 1103ª20,
1103ª25, 1104ª, 1104b15, 1104ª25 e 1105ª30
2) Idem, 1104ª15
3) Ibid, 1104b5
4) Ibid 1105b15

CAP 5 O Carácter e os hábitos: a perspectiva de Aristóteles

Não há dúvida de que Aristóteles afirma que os estados de


carácter são adquiridos pela prática de acções correspondentes (1). É
possível fazer uma leitura correcta da teoria aristotélica da virtude,
afirmando que grande parte do ímpeto da habituação é
essencialmente não cognitivo e anda associado à parte não racional
da alma. Embora Aristóteles tenha aceite de Platão a ideia de uma
parte racional da alma separada da parte não racional, o filósofo
considera que a parte desiderativa (que comanda os desejos) da alma
não racional (os apetites e as emoções) pode ouvir a razão e,
portanto, ser orientada e corrigida pela parte racional da alma. Para
Aristóteles a racionalização dos desejos e apetites constitui uma
forma de ouvir e obedecer à autoridade da parte superior da alma,
precisamente a parte racional. Para ilustrar este processo, Aristóteles
dá o exemplo do filho que obedece ao pai (2). A definição que
Aristóteles dá de carácter, na obra Ética a Eudemo, encaixa nesse
argumento: “o carácter é uma qualidade da parte da alma que é não
racional mas que é capaz de seguir a razão, de acordo com um
princípio de prescrição” (3). É possível inferir que, na teoria
aristotélica, a prática é vista, fundamentalmente, como o treino não
racional dos desejos em direcção a objectos apropriados. Dito assim,
parece que os hábitos são vistos como essencialmente separados do
desenvolvimento das capacidades reflexivas e racionais. Parece,
também, que o desenvolvimento dos hábitos surge antes do

18
desenvolvimento das capacidades reflexivas. Contudo, é preciso não
esquecer que Aristóteles não partilhava uma perspectiva meramente
mecânica da relação entre o processo de habituação e o
desenvolvimento do carácter. Aliás, uma perspectiva puramente
mecânica não consegue explicar como é que se faz a transição entre
a infância e a maturidade moral. A perspectiva mecânica não explica
como é que uma criança que possui virtudes geradas apenas pelo
hábito se transforma num adulto capaz de fazer uso da razão prática.
Aristóteles parece resolver esta questão quando afirma, no Livro VI,
que não se pode ser bom sem razão prática nem sábio sem virtude
(4). É possível concluir que Aristóteles defende uma posição algo
desenvolvimentista, considerando que se regista uma evolução do
uso das capacidades racionais e da razão prática até se atingir a
maturidade moral e que tanto os hábitos como a cognição têm um
papel importante a desempenhar nesse processo. Ou seja, o hábito
não é visto de forma estática e passiva mas sim de forma crítica e
reflexiva. Há, portanto, forma de treinar a razão prática e esse treino
pode iniciar-se na infância através dos métodos da tentativa e erro e
do inquérito racional. As deficiências na razão prática não são fixas,
mas sim temporárias, e, portanto, é de crer que a criança passe por
várias etapas nesse processo de desenvolvimento. Por outro lado, a
falta de competências deliberativas na criança não implica a ausência
de outras capacidades cognitivas que permitem respostas éticas
adequadas. A criança precisa da orientação de uma razão externa
visto não possuir ainda as capacidades deliberativas completamente
desenvolvidas, nem o domínio da razão prática, para poder deliberar
e agir de forma autónoma. Este argumento é de extrema
importância. Se a criança não dispõe, ainda, de uma razão prática
adequadamente desenvolvida, então precisa da direcção, orientação,
supervisão e correcção dos adultos, ficando, assim, legitimada a
educação com autoridade. Podemos, pois, afirmar que um professor e
uma escola sem autoridade não podem, por definição, desempenhar

19
bem o papel educativo. Esta constatação leva-me a afirmar que um
dos principais problemas que explicam um certo fracasso da escola
actual é, precisamente, a erosão da autoridade dos professores. O
mesmo se poderá dizer em relação à educação em contexto familiar.
É hoje muito mais difícil educar os filhos porque os pais perderam
muito da sua autoridade.

Notas
1) Aristóteles (1985). Nichomachean Ethics. (Introdução, tradução
e notas de Terence Irwin). Indianapolis: Hackett, 1144b30
2) Idem, 11202b31
3) Idem 1220b6
4) Idem, 1144b30

CAP 6 A habituação como prática crítica

Sendo o carácter a aquisição de estados através da habituação,


é fácil concluir que a habituação tem um papel central nas virtudes do
carácter. A habituação envolve, essencialmente, prática e repetição.
Os actos realizados repetidamente tornam-se hábitos e permitem a
aquisição de capacidades que parecem quase naturais e que se
constituem numa quase segunda natureza do sujeito. Contudo, a
explicação que Aristóteles nos dá sobre o papel da habituação é mais
complexa do que parece. À primeira vista, julgamos estar perante
uma teoria que tende a considerar os hábitos e a prática de forma
passiva e mecânica, mas uma leitura mais fina leva-nos a concluir
que Aristóteles defende uma visão crítica da prática. A acção
pressupõe a discriminação de uma situação em ordem a dar uma

20
resposta adequada e anda sempre associada aos objectivos e ao
modo, não sendo possível separar o momento exterior da acção (o
comportamento) dos momentos cognitivos e afectivos interiores (o
processo deliberativo).
Aristóteles considera que a repetição permite a melhoria da
acção, ou seja, tornamo-nos mais excelentes na realização de uma
determinada arte, através da repetição e da prática. Quanto mais
praticamos melhores nos tornamos. Contudo, repetir uma acção não
significa fazê-la sempre da mesma maneira. Não é assim que as
coisas acontecem na realidade. Quando repetimos uma acção,
costumamos introduzir algumas alterações, impostas pela
aprendizagem que a prática continuada nos facilita. Ou seja, a
repetição costuma andar associada ao progresso e à melhoria. Uma
acção repetida varia sempre alguma coisa, tanto em termos de
comportamento como das emoções associadas.
Podemos concluir que aprender através da repetição exige
tentar uma aproximação gradual a uma acção ideal que foi
estabelecida como o objectivo do agente. A prática crítica é, então,
um refinamento de repetição de acções através de sucessivas
tentativas, cada uma mais refinada do que a anterior. Não é,
portanto, uma repetição mecânica da mesma acção. A prática
permite o progresso sempre que a repetição for crítica. Uma
repetição é crítica sempre que o agente tem presente o objectivo da
acção, o reconhecimento dos erros anteriores, a compreensão das
instruções e a avaliação das acções passadas. Uma acção excelente
combinará sempre um juízo sobre as circunstâncias, as emoções
reactivas e um certo nível de decisão sobre como agir (1). Uma vez
que a prática não é mecânica e a repetição, para originar
aprendizagem e progresso, tem de ser crítica, o processo de
aprendizagem das capacidades exige a presença de um mestre.
Infere-se, então, que o papel dos pais e dos professores é
absolutamente crítico na aprendizagem das virtudes do carácter. Mas

21
os pais e os professores só podem desempenhar o seu papel de
educadores se possuírem as virtudes do carácter, porque um mau
mestre faz do aprendiz um mau praticante.

Notas
1) Sherman, N. (1984 ) The habituation of character. In nancy
Sherman (Ed.). Aristotle`s Ethics: Critical Essays. Nova Iorque:
Rowman and Littlefield Publishers

CAP 7 Cultura comunitária e florescimento das virtudes

Regresso ao tema de S. Tomé e Príncipe. Por que razão as


crianças parecem tão felizes? Por que razão são tão alegres, gentis e
bem-educadas? E, por contraste, por que razão as crianças
portuguesas parecem, regra geral, tristes, entediadas e
desmotivadas? Parece-me que é possível indicar várias razões. As
crianças de S. Tomé e Príncipe estão fortemente ancoradas e
apoiadas em famílias numerosas, possuem, regra geral, mais do que
dois irmãos e têm contactos diários com a mãe, tias e primos. Existe
um espírito forte de comunidade em toda a sociedade de S. Tomé e
Príncipe. A comunidade existe, faz sentir a sua presença através dos
laços afectivos, da consaguinidade, das relações de vizinhança e da
solidariedade. As crianças daquele país vivem em comunidades onde
se cultivam as virtudes, em particular, as virtudes da coragem, da
amizade, da justiça, da verdade e da temperança. As crianças
aprendem, desde cedo, as artes da sobrevivência através do exemplo
dos mais velhos, da prática directa e das narrativas. O contacto com
uma tradição cultural forte ajuda as crianças a adquirirem as virtudes
necessárias à vida boa e à felicidade. A presença constante das
Igrejas locais, sejam elas de orientação católica ou protestante,
reforça o peso da tradição na vida das crianças e constitui um

22
poderoso instrumento de transmissão de valores básicos,
nomeadamente o respeito pelos mais velhos, a obediência, a
responsabilidade, a honestidade e a generosidade. As crianças de S.
Tomé e Príncipe crescem intimamente ligadas ao processo produtivo,
participando nas tarefas diárias, ajudando os pais a cuidar das
machambas e contribuindo para a economia da família com o seu
esforço e competências.

CAP 8 O papel das narrativas e de tradição

Não há educação digna desse nome sem narrativas e sem


tradição. As narrativas, sejam elas orais ou passadas através da
leitura e das manifestações artísticas (teatro, por exemplo)
constituem um fortíssimo instrumento de socialização das crianças e
de formação da sua personalidade e carácter. Nas sociedades com
uma forte tradição comunitária, o poder das narrativas está em todo
o lado e as crianças beneficiam do seu poder e influência, sobretudo à
hora das refeições, na presença de todos os membros da família, sem
pressas, conversando sobre o dia-a-dia, sobre o que está para
acontecer, sobre o que aconteceu e partilhando as histórias de vida
dos mais velhos, quantas vezes sob a forma de verdadeiras epopeias
e tragédias. Nessas sociedades, há uma tradição. Melhor dizendo: há
tradições e as crianças crescem imersas nessa tradição. Não há
criação sem tradição. Não se pode construir o novo sem conhecer o
velho. Foi esse respeito e essa partilha da tradição e das narrativas
que eu vi em S. Tomé e Príncipe e em quase todos os países africanos
onde trabalhei. Quando chega a hora das refeições, a família reúne,
todos estão presentes, a refeição é saboreada sem pressas e usa-se o
momento para partilhar histórias de vida. Cada refeição é uma
oportunidade para partilhar uma lição de vida. Aqui, em Portugal,
nesta Europa envelhecida, quantas crianças ainda beneficiam do

23
poder das narrativas, passadas e partilhadas, em contexto familiar, à
volta de uma refeição?

CAP 9 Artes da sobrevivência e educação do carácter: o exemplo de S.


Tomé e Príncipe

Um olhar apressado e etnocêntrico do Ocidental facilmente


encontrará uma série de alvos a abater na sociedade comunitária de
S. Tomé e Príncipe. O primeiro é, estou certo, a desigualdade de
género. É dela que me ocuparei neste texto. Com efeito, quem circula
pelas estradas do país observa, amiúde, as mulheres com alguidares
cheios de roupa, à cabeça, para lavar na ribeira. Observa, também,
que, regra geral, são as meninas que acompanham as mães nas
tarefas de recolha de água potável ou de lavagem da roupa e da
louça. Os meninos ocupam, preferencialmente, o seu tempo livre a
ajudar os pais nas artes da pesca, a apanharem frutos ou a fazerem
reparações em casa. Não há dúvida que, em S. Tomé e Príncipe,
continua a existir uma clara divisão das tarefas entre homens e
mulheres, rapazes e raparigas, e que essa divisão pode escandalizar
o Ocidental mais etnocêntrico. É claro que tem de ser feito um
esforço no sentido de reduzir estas diferenças e que tudo aquilo que
conduza a uma maior igualdade entre homens e mulheres é bem-
vindo. Contudo, convém perceber que, ao contrário do que acontece
nas sociedades materialmente desenvolvidas do Ocidente, as crianças
e os jovens de S. Tomé e Príncipe não estão afastados do processo
produtivo e criativo e não se encontram separados do mundo dos
adultos. É por isso que respeitam os mais velhos, que aprendem,
desde cedo, a ser responsáveis e que não dão mostras de serem
caprichosas, arrogantes, desmotivadas, impacientes e irascíveis. Esse
facto e sobretudo a aquisição das artes da sobrevivência por parte
dos rapazes e das raparigas, bem como o envolvimento na
experiência directa a que estão sujeitos desde cedo, constituem

24
factores absolutamente essenciais no processo de educação do
carácter e de aquisição das virtudes das crianças de S. Tomé e
Príncipe. Convém que, como resposta às críticas do Ocidental
etnocêntrico, o povo de S. Tomé e Príncipe não dê cabo das práticas
comunitárias que constituem a sua superioridade no processo de
educação do carácter das novas gerações. A esse respeito, S. Tomé e
Príncipe, não só não tem nada a aprender com as sociedades
materialmente desenvolvidas do Ocidente, como, ao invés, tem muito
que ensinar. Assim, saibamos, nós, Ocidentais, libertar-nos da nossa
arrogância cultural e ter a humildade de aprender.

CAP 10 Artes da sobrevivência e florescimento das virtudes do carácter

Foi em S. Tomé e Príncipe que eu me apercebi da importância


que a aprendizagem das artes da sobrevivência tem no processo de
educação do carácter das crianças e jovens. Num país materialmente
pobre, habitado por um povo espiritualmente rico, com forte espírito
comunitário, uma das principais componentes do processo de
educação das crianças é a aprendizagem das artes da sobrevivência.
Sem a aquisição dessas artes, a pessoa tem poucas possibilidades de
ganhar autonomia e de ser credora do respeito e consideração dos
restantes membros da comunidade. Essas artes são necessárias ao
indivíduo e à comunidade e a sua posse granjeia respeito e
consideração. Há, portanto, um incentivo à aquisição dessas artes e o
processo de aprendizagem começa cedo e prolonga-se pela infância e
adolescência, ganhando uma importância social tão grande como as
aprendizagens académicas (leitura, escrita e cálculo) ocorridas na

25
escola. As artes da sobrevivência incluem todas as destrezas e
competências físicas e técnicas necessárias à participação no
processo produtivo familiar: artes da pesca, artes do cultivo da terra,
artes da carpintaria, artes relacionadas com pequenos arranjos e
reparações, culinária, costura e mecânica rudimentar, entre outras.
As crianças aprendem essas artes em contacto directo com os pais,
irmãos mais velhos, tios e vizinhos. A aprendizagem é feita pelo
exemplo, experiência directa e prática supervisionada, à semelhança
do que acontece com a aprendizagem de qualquer arte e, também,
das virtudes de carácter. Os adultos passam muito tempo com as
crianças numa interacção constante em torno de processos
produtivos que exigem o contributo das artes da sobrevivência. Essa
interacção permite não só o desenvolvimento das competências e
destrezas necessárias à aprendizagem das artes da sobrevivência,
mas também a aquisição de valores e virtudes carácter. Uma coisa
surge a par da outra. A criança não se vê a si própria como vivendo
num mundo separado do mundo do adulto, antes, olha para si própria
como membro activo e produtivo de uma comunidade imersa numa
tradição que urge respeitar e que se agrega em torno de práticas
culturais e sociais que convém adquirir. O respeito pelos mais velhos,
a amizade e a responsabilidade são virtudes que se enraízam, dessa
maneira, no carácter das crianças e jovens. Em S. Tomé e Príncipe
não há, portanto, lugar para a chamada “guerra de gerações”, nem os
jovens têm oportunidade ou pretexto para aderirem a processos de
contestação da cultura comunitária, como acontece, frequentemente,
nas sociedades materialmente desenvolvidas do Ocidente, onde a
separação das crianças e dos jovens dos processos produtivos e o
fosso existente entre o mundo das crianças e o mundo dos adultos
são particularmente propícios à contestação e à revolta juvenil contra
a cultura dos pais e da comunidade. Como é sabido, a contestação e
a revolta juvenil, bem como a adesão dos jovens a movimentos de
contra-cultura, são fenómenos pouco vulgares em sociedades

26
fortemente comunitárias e desconhecidas de todo nas comunidades
que adoptam ainda um modo de produção pré-capitalista ou que não
sofreram ainda a invasão cultural e a imposição do modo de vida do
Ocidente.
Esta constatação gera implicações tremendas para a
compreensão dos razões que tornam tão difícil o processo de
educação do carácter nas crianças e jovens das sociedades
materialmente desenvolvidas do Ocidente. Limito-me a enunciar
algumas implicações. Uma delas diz respeito ao prolongamento
exagerado da juventude. Com efeito, a maior parte dos jovens
europeus entra no processo produtivo muito tarde, sendo comum que
tal aconteça depois dos 25 anos de idade. Convém lembrar que, com
essa idade, Alexandre Magno já tinha construído um Império que ia
da Macedónia até ao Afeganistão e ajudara a edificar, pelo caminho,
várias cidades. O fenómeno da entrada tardia no mercado de trabalho
agrava-se pelo facto de as crianças e os jovens europeus não serem
envolvidas em processos de produção familiar nem em serviços de
voluntariado, mantendo-se afastadas do mundo dos adultos e sendo
consideradas por estes como um fardo, uma despesa e não um
investimento. Tenho para mim que o decréscimo da taxa de
fecundidade se deve a essa percepção.
Estou certo, também, que existe uma relação entre a ausência
de aquisição das artes da sobrevivência e a dificuldade que os pais e
professores têm em serem bem sucedidos no processo de
desenvolvimento do carácter das novas gerações. Essa incapacidade
de os pais ensinarem aos filhos as artes da sobrevivência resulta de
muitos factores. Um deles é, sem dúvida, a falta de tempo dos pais e
a rarefacção dos momentos que passam juntos com os filhos. Em
muitos casos, os próprios pais não aprenderam as artes da
sobrevivência e, por isso, estão impedidos de as ensinar. Por outro
lado, nas sociedades materialmente desenvolvidas criou-se o hábito
de comprar tudo feito e de pagar aos profissionais para fazerem as

27
reparações caseiras. A ideia de que não é preciso fazer nada, porque
se pode comprar tudo feito, é interiorizada, muito cedo, pelas
crianças que, por isso, não se sentem motivadas para adquirir as
destrezas e as competências inerentes às artes da sobrevivência. E,
como tentei provar atrás, sem aprendizagem das artes da
sobrevivência torna-se mais difícil o processo de aquisição das
virtudes do carácter.
É possível inverter esta situação? Penso que sim. Aponto
algumas sugestões: introduzir, no currículo escolar do ensino básico,
espaços curriculares para a aquisição das artes da sobrevivência,
forçar os adolescentes a trabalharem em part-time, ou seja, a
dedicarem algumas horas por dia a actividades de voluntariado social
ou ao exercício de uma actividade profissional que lhes ocupe o
tempo depois de saírem da escola, pôr em prática políticas públicas
amigas da natalidade, da família e da maternidade, para que a
definição de família pós-moderna, que eu a seguir vou dar, não tenha
mais razão de ser: “a família pós-moderna é um agregado de
indivíduos, facilmente descartáveis, unidos por objectivos e interesses
particulares e incapazes de reconhecerem o bem comum”.

CAP 11 Artes da sobrevivência e florescimento das virtudes: Um


exemplo

Nada melhor para ilustrar a teoria de que existe uma relação


entre aprendizagem das artes da sobrevivência e o florescimento das
virtudes do carácter do que apontar um exemplo. Encontrei o senhor
Joaquim, 35 anos de idade, casado e com quatro filhos, em Jalé, na
periferia de Porto Alegre, uma pequena localidade no Sul da Ilha de
S. Tomé. Nos dois dias que eu e os meus colegas passámos na
ecolodge de Jalé, um nome pomposo para referir cinco cabanas de
madeira sem electricidade, edificadas à beira-mar, no meio da
floresta tropical e num quase total isolamento, o senhor Joaquim foi o

28
nosso pescador de serviço, o nosso cozinheiro, o nosso guia e o nosso
anfitrião. Aparentemente, não havia nada que ele não soubesse fazer.
Ficara-se pela 7ª classe incompleta, mas sabia ler, escrever e fazer
contas, para além de dominar com mestria todas as artes da
sobrevivência, fazendo uso delas para ganhar a vida. Pescador exímio
com arpão e com rede, cozinheiro afamado na região, proprietário de
um petisqueira junto da aldeia que serve de porta de entrada à
ecolodge, construtor de casas de madeira quando é preciso,
mecânico, electricista e agricultor. Aparecia sempre com um sorriso a
bailar-lhe nos olhos, bem disposto, alegre, solícito, gentil e a falar um
português de primeira categoria. “Onde é que aprendeu todas essas
artes?”, perguntei. Resposta rápida: “com o meu pai, os irmãos mais
velhos e os vizinhos”. Aparentemente, todos lhe terão ensinado
alguma coisa e por todos nutria respeito e admiração. Perguntei-lhe
se gostaria de emigrar ao que ele respondeu que já trabalhara como
cozinheiro em Cabo Verde mas que decidira regressar a casa. A vida
ali não era fácil, mas era ele quem comandava, era o senhor do seu
destino, podia manter a família unida, partilhava a amizade e o
convívio de muitos amigos e era respeitado na comunidade. Que
melhor vida podia almejar do que aquela que tinha? Todos os dias,
usava o arpão para pescar três ou quatro peixes (não precisava de
mais, pois não havia nem frigorífico nem electricidade!), cozinhava
para a família e atendia um ou outro cliente que resolvia petiscar no
seu estabelecimento. Dedicava uma ou duas horas por dia ao cultivo
na Machamba, com o apoio da mulher e filhos, e, por vezes, ainda
servia de guia a um ou outro turista mais aventureiro. Era uma vida
boa, aquela que o Joaquim levava. Materialmente pobre, mas boa. O
senhor Joaquim era uma homem feliz porque se encontrava bem
inserido na sua comunidade, onde era amado e respeitado, não por
aquilo que ele tinha, mas por aquilo que ela era e pelas virtudes do
carácter que ele manifestava nas relações próximas que mantinha
com familiares amigos e vizinhos. Nele, as virtudes da justiça,

29
amizade, coragem, prudência, temperança e coragem manifestavam-
se com naturalidade, como se fossem nele uma segunda natureza. O
senhor Joaquim aprendera a ser corajoso, praticando actos de
coragem, justo, praticando actos de justiça, temperado, praticando
actos temperados e por aí fora, no que diz respeito a todas as
virtudes que faziam parte do seu excelente carácter. E essa
naturalidade com que o senhor Joaquim adquiriu as virtudes do
carácter muito deve às muitas horas que passou com os pais, irmãos,
tios e vizinhos na aprendizagem das artes da sobrevivência, essas
artes que, agora, aos 35 anos de idade, lhe permitiam ganhar a vida
e ser estimado na comunidade.

CAP 12 Artes de sobrevivência e currículo

Há muito que me interrogo sobre o papel da aprendizagem das


artes da sobrevivência na educação do carácter e no desenvolvimento
de competências necessárias a uma vida boa. Há múltiplas artes de
sobrevivência e, embora haja algumas que são comuns a todos povos
e comunidades (culinária e rudimentos de costura, mecânica e
electricidade, por exemplo), há outras artes que são específicas de
determinadas comunidades e têm que ver com a geografia, a
economia local e a cultura (artes da pesca e da construção e
reparação de casas, por exemplo). Há mais de três décadas que
essas artes foram retiradas do currículo das escolas portuguesas.
Constituiu um grave erro a erradicação do ensino técnico e a recente
criação do ensino profissional ou dos programas de educação e
formação não possibilitou a correcção desse erro porque são poucos
os jovens que frequentam esses cursos (bastante menos de 30%) e
porque essas artes são introduzidas demasiado tarde no currículo (no

30
10º ano e, em casos raros, no 9º ano). Para que a aprendizagem
dessas artes constituísse um poderoso instrumento de educação do
carácter e de desenvolvimento de competências necessárias à vida
boa, seria necessário que a) fossem de frequência obrigatória para
todos os alunos e b) entrassem no currículo desde o 5º ano de
escolaridade (como propedêutica integrada nas áreas curriculares
existentes) e a partir do 7º ano de escolaridade com o estatuto de
áreas curriculares com o mesmo peso e estatuto das outras. Esta
medida, sendo do mais elementar bom senso, muito dificilmente será
introduzida nas escolas portuguesas e há razões para que os políticos
e decisores resistam a ela: i) o bom senso rareia nas elites
portuguesas, classe politica incluída, ii) mantém-se o preconceito
ideológico contra o ensino técnico e iii) já não há quem saiba ensinar
essas artes. Mas valia a pena tentar.

CAP 13 Como floresce a amizade

Cada vez que visito S. Tomé e Príncipe dou por mim a reflectir
por que razão as crianças são tão alegres, bem-educadas e gentis e
parecem tão felizes. Em artigo anterior, fiz referência à forte presença
da comunidade na vida das crianças. Com efeito, é raro ver-se uma
criança sozinha. Andam em grupos, quer caminhem pela beira da
estrada, quer brinquem à porta de casa ou nadem na praia. O mesmo
acontece com os idosos. A prevalência das famílias alargadas e das
relações de vizinhança, bem como a forte presença da comunidade
na vida das crianças, facilitam a emergência da virtude da amizade,
essa virtude a que Aristóteles dedica um capítulo na sua Ética a
Nicómaco e que elege como a mais importante e necessária das
virtudes. Sem amigos não se pode ser feliz. A amizade, em qualquer
dos seus tipos, seja ela a amizade por utilidade, a amizade agradável
ou a amizade perfeita, é um elemento essencial da vida boa. Sem ela
ficamos perdidos. Não somos mais do que uma ilha afastada do

31
Continente! Em S. Tomé e Príncipe, fazer amigos é tão natural como
saber que o Sol nasce todas as manhãs por volta das 5 horas e 30
minutos e se põe, todas as tardes, pelas 17 horas e 30 minutos.
Afinal, estamos a falar do País que é atravessado pelo Equador, não
é? Talvez seja por isso que é tão agradável ir para a escola, apesar
de, na maior parte das vezes, a escola não passar de um edifício
encardido pela humidade e pelo tempo e com salas repletas de
carteiras velhas. Talvez seja porque a amizade é uma virtude
cultivada até à exaustão que as crianças andam sempre com um
sorriso nos lábios. É provável que aqui, em Portugal, nesta Europa
materialmente tão rica, onde há escolas repletas de equipamentos e
materiais, falte aquilo que mais falta faz às crianças: a amizade!
Talvez seja porque falta a amizade que haja tanta amargura, raiva
contida e violência reprimida.

CAP 14 A relação entre a amizade e as outras virtudes

A relação existente entre a virtude da amizade e o


florescimento das outras virtudes precisa de ser demonstrada. E o
exemplo de S. Tomé e Príncipe pode ser convenientemente
ilustrativo. Se a amizade é uma virtude essencial à vida boa e à
felicidade e sendo a felicidade a finalidade culminante face à qual
todos os outros objectivos de vida são meramente instrumentais,
resulta daqui que ter amigos, conservá-los e tê-los bons é uma
condição sine qua non da felicidade. Todas as outras condições,
riquezas materiais, glória e poder, sendo importantes, ocupam uma
posição secundária face à amizade, porque se tivermos de optar
entre a riqueza ou a glória e a amizade não há dúvida de que a nossa
opção vai para uma vida repleta de amigos e impregnada de
amizade. Senão vejamos: alguém trocaria o amor de um filho ou o
amor de uma esposa por um bem material? Qualquer pessoa de bom
carácter e com boa formação humana responderá negativamente.

32
Para adquirir amigos e para os conservar é necessário ser-se uma
pessoa de bom carácter, ou seja, uma pessoa que cultiva e faz uso
das virtudes (justiça, coragem, prudência e temperança, entre
outras). Há duas maneiras de perder a amizade: não lhe dedicar o
tempo devido e perder a confiança do(a) amigo(a). Ora, perde-se a
confiança quando se dá provas de que se age repetidamente ao
arrepio das virtudes. É por isso que o desejo de adquirir e de
conservar os amigos nos leva a procurar ser pessoas virtuosas, ou
seja, com um bom carácter, porque sabemos que a amizade perfeita
se baseia no amor que se tem por quem o outro é, pela sua
personalidade e pela maneira como ele faz uso das virtudes. Repare-
se: é fácil ser amigo de uma pessoa verdadeira e é difícil ser amigo
de uma pessoa falsa; é bom ser amigo de uma pessoa justa, mas
torna-se quase impossível manter a amizade por uma pessoa
persistentemente injusta. E por aí fora…
Vejamos, por último, como é que o exemplo de S. Tomé e
Príncipe nos ajuda a ilustrar a associação entre a amizade e o
florescimento das outras virtudes. Pude observar, nas várias visitas
de trabalho que fiz ao país, estar na presença de um povo paciente,
temperado, justo, prudente e corajoso. A ausência de guerras civis ou
de golpes de estado sangrentos é ilustrativa! Apesar da frustração
das expectativas, da corrupção e da falta de resultados, o povo
continua a acreditar na democracia e a fazer uso de meios legítimos e
pacíficos para resolver os problemas. Provavelmente, essas virtudes,
tão disseminadas entre a população, floresceram porque a escassez
material (a pobreza material…) e o isolamento geográfico tornaram
mais necessária a cooperação, a partilha e a entreajuda e qualquer
uma dessas atitudes cresce melhor quando há amizade abundante.
Sem amigos, é extremamente difícil sobreviver em S. Tomé e
Príncipe. Desde logo, são os amigos que ensinam, uns aos outros, as
artes da sobrevivência (pesca, trabalhos agrícolas na machamba,
reparações, construção de casas e de canoas, etc…). Por outro lado,

33
são os amigos que partilham, entre si e até com os vizinhos e os
estranhos, os meios de transporte, igualmente escassos e sem os
quais o isolamento se torna intransponível. Por fim, o tempo abunda
e todos sabemos que o tempo é essencial à conservação da amizade.
A falta de tempo é a principal causa da morte da amizade. Anoitece
todos os dias do ano por volta das 17 horas e 30 minutos e, na maior
parte das localidades, não existe energia eléctrica. Sem luz, não se
pode trabalhar. Não havendo televisão, há que procurar outras
ocupações. As narrativas e o convívio familiar à porta de casa ou na
“petisqueira” (1) ocupam uma parte significativa do anoitecer e é aí
que ocorre um fenómeno curioso: a amizade entre pais e filhos, entre
irmãos, entre primos e entre vizinhos floresce na proporção do tempo
que resta. E o tempo é muito.

Nota
1) Petisqueira é um pequeno bar ou taberna, geralmente de
madeira, localizado na berma da estrada, onde se pode beber
cerveja e sumos e tomar uma pequena refeição.

CAP 15 Educação do carácter: um conceito, múltiplas questões

O Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia


das Ciências de Lisboa define carácter da seguinte maneira: sinal
traçado, gravado, pintado numa superfície e a que se atribui um
significado especial. E, ainda, traço característico, distintivo de um
ser. O mesmo Dicionário refere, também, que a palavra quer dizer
coerência e firmeza nos actos e nos ditos, honestidade e sentido ético
dos deveres e direitos a respeitar.
Podemos afirmar que o carácter de um indivíduo é a sua
constituição moral e o seu padrão de comportamento. Podemos ter
um bom carácter ou um mau carácter. Embora o carácter de uma

34
pessoa seja, em parte, produto da herança genética, a educação e o
ambiente exercem um papel fundamental na sua construção. Quando
se vive e se é educado em comunidades virtuosas, o processo de
construção de um bom carácter é facilitado. Quando se vive e se é
educado em comunidades hostis e destituídas de virtudes, torna-se
extremamente difícil a construção de um bom carácter. A sabedoria
prática constitui uma virtude essencial à formação do bom carácter.
Com ela, o indivíduo aprende a analisar uma situação ou problema, a
deliberar com racionalidade e prudência, a escolher a coisa certa a
fazer e a agir adequadamente. É esse processo que,
continuadamente repetido, se torna um verdadeiro hábito, colando-se
ao indivíduo como uma segunda natureza. Mas, para deliberar bem e
agir adequadamente, não basta o conhecimento do bem. Importa,
também, a posse de bons sentimentos e emoções, bem como um
genuíno gosto por fazer o bem e a capacidade de sentir empatia
pelos outros.
O indivíduo de bom carácter está melhor preparado para fazer o
bem do que o que possui um carácter fraco ou deficiente, porque,
para além de conhecer e de amar o bem, possui uma vontade forte
para fazer o bem. Quer isto dizer que não basta o conhecimento ou
os sentimentos. A força de vontade é uma qualidade necessária para
que o indivíduo passe à acção e faça o que tem de ser feito.
A definição do bom carácter levanta, contudo, alguns
problemas. Um deles é o da definição de “bem”. O que é o bem e o
que é mal? Diferentes culturas dão definições diversas de bem,
embora seja possível encontrar alguns pontos comuns em todas elas.
Por exemplo, todas as culturas censuram a mentira e valoram
positivamente a verdade. Todas elas valoram positivamente a
coragem. Todas as grandes civilizações conhecidas, desde a
civilização grega até aos nossos dias, acentuam a importância de um
conjunto de virtudes a que podemos chamar de cardinais: sabedoria,
justiça. autodomínio e coragem. Outras virtudes como a prudência, a

35
temperança e a generosidade surgem, também, em grande plano em
todas as grandes civilizações.
Parece haver algum consenso em torno deste conjunto de
virtudes, visto que os antropólogos, sociólogos e historiadores as têm
encontrado nas práticas culturais e nas criações artísticas de todas as
grandes culturas. Contudo, passar daí para a defesa da existência de
valores básicos comuns, vai um passo demasiado arriscado. Há
culturas que valoram, positivamente, a crueldade. Veja-se o caso da
cultura asteca e de outras culturas pré-colombianas.
Ryan e Bohlin (1) afirmam que o bom carácter não é mais do
que conhecer o bem, amar o bem e fazer o bem. Essa afirmação
estaria isenta de contestação se fosse possível uma definição
transcultural do bem e do mal. Ora, os ensinamentos da História e da
Antropologia parecem querer dizer-nos o contrário. É extremamente
difícil, senão impossível, estabelecer um consenso transcultural em
torno de valores éticos. Veja-se o caso de Esparta, no século V a.C.,
onde o infanticídio de crianças deficientes era uma prática legítima.
Ou a aceitação pública da pederastia, na Atenas do século V a.C.
Em conclusão, podemos afirmar que o carácter é a soma dos
nossos hábitos intelectuais e morais e uma disposição natural para
agir de uma determinada maneira. Podemos, ainda, afirmar que há
algumas regras de ouro que são comuns a todas as culturas, como,
por exemplo, “não faças aos outros o que não queres que te façam a
ti”, mas a existência de valores éticos comuns não vai muito além
disso.

1) Ryan, K. e Bohlin, K. (1999). Building Character in Schools. S.


Francisco: Jossey-Bass

CAP 16 A Nova Educação do carácter: A metodologia dos 6 Es

36
Kevin Ryan e Karen Bohlin (1) desenvolveram a metodologia
dos 6 Es, exemplo, explicação, ethos, experiência, exortação e
expectativas de excelência, e assumem a defesa do modelo da
educação do carácter, claramente influenciado pela teoria ética
aristotélica. Segundo os dois professores da Universidade de Boston,
é através da combinação destes seis métodos que melhor se pode
fazer educação do carácter.

Exemplo
Quer queiram quer não, os professores são sempre exemplos
para os seus alunos. Quanto mais jovens são os alunos mais
importância dão ao exemplo dos professores. Ao fim de pouco tempo,
os alunos são capazes de reconhecer a personalidade do professor,
simpatizar com determinadas qualidades e antipatizar com certos
defeitos. Raramente, os alunos se enganam quando apelidam um
professor de injusto, pouco empenhado, trocista ou rude. O mesmo
se poderá dizer quando apelidam um professor de justo, simpático e
empenhado. São muitos os professores que deixam uma impressão
duradoura nos seus alunos. Em muitos casos, a identificação que os
alunos estabelecem com certos professores tem repercussões para
toda a vida. O que os professores fazem, a forma como o fazem e
aquilo que dizem tem efeitos na formação da personalidade e do
carácter dos alunos. É por isso que os professores devem fazer a si
próprios as seguintes perguntas: a) “os meus hábitos enquanto
professor são adequados à minha função de educador?”; b) esses
hábitos poderão ser adoptados pelos meus alunos?”; c) “ as minhas
atitudes são compatíveis com a filosofia e o projecto educativo da
escola?”.

Explicação

37
Uma das principais funções do professor é explicar. O professor
exerce a função de explicador em grande parte do tempo que passa
com os alunos. Para os alunos, é suposto que o professor seja capaz
de explicar aquilo que não sabem. Quanto mais complexos os
assuntos e problemas, mais os alunos dependem da capacidade que
o professor tem de explicar. É assim na Matemática e é assim em
qualquer outra área curricular, incluindo a educação ética dos alunos.
Explicar, pressupõe envolver os alunos numa conversação de onde se
retira sentido e significado. Para isso é preciso que haja tempos e
espaços para que ocorram essas conversações entre professor e
alunos.
Os alunos adquirem hábitos através do conhecimento, da
imitação e da prática. A função explicativa do professor deve
acompanhar quer o processo de instrução, quer o processo da
realização das tarefas. O professor tem de ajudar a aluna a
compreender os conceitos, mas também tem de a apoiar no processo
de realização das tarefas. Para que o aluno não fique bloqueado
nesse processo é, muitas vezes, necessário que o professor se abeire
dele, lhe pergunte quais são as suas dificuldades e lhe dê uma
explicação. Munido dessa nova informação, a aluna é capaz de seguir
em frente e de completar a tarefa. A conversação entre o professor e
os alunos pode centrar-se, por exemplo, em questões do tipo: “por
que razão a mentira é sempre um mal, mas em certas circunstâncias
pode ser um mal menor?”; “o que é isso de um mal menor?”; “temos
mais responsabilidades para com as pessoas que nos são mais
próximas do que para com os desconhecidos?”

Ethos
Ethos é uma palavra que, etimologicamente, significa costumes.
As escolas são comunidades éticas, ou seja, onde as pessoas se
mantêm juntas e colaboram entre si, através do respeito de um
conjunto de costumes e virtudes que dão coesão à comunidade e

38
ajudam os seus membros a crescer como pessoas. Há comunidades
que são dilaceradas por vícios e práticas que impedem o crescimento
dos seus membros como pessoas. As comunidades que enfatizam
virtudes e práticas adequadas ao crescimento dos seus membros
como pessoas são comunidades que se mantêm unidas por um ethos
adequado. Nessas comunidades, os professores respeitam os alunos,
os alunos têm elevadas expectativas, os adultos tratam os jovens
com justiça e consideração e as pessoas estabelecem entre si
relações marcadas pela empatia e pela interajuda. Há um conjunto de
regras de convivência que raramente são quebradas. Há confiança
mútua. Uma escola com um ethos adequado é uma comunidade que
explicita e faz cumprir um conjunto de hábitos, valores e atitudes.
Uma comunidade com tradições e que é capaz de celebrar aquilo que
une os seus membros tende a ser uma comunidade coesa. As
crianças e os jovens precisam de coesão para poderem crescer como
pessoas.

Experiência

É com a experiência que aprendemos a corrigir os nossos erros,


mas é também com ela que fortalecemos os nossos hábitos. Fala-se,
hoje, muito em desenvolvimento de competências. Ora, as
competências exigem tempo e repetição das tarefas até se atingir um
determinado nível de desempenho considerado satisfatório. Sem
experiência não se atinge a maturidade. O desenvolvimento do
carácter não se atinge só pelo conhecimento de palavras bonitas ou
pela compreensão das virtudes, nem tão pouco apenas pela
interiorização de determinados valores. O carácter envolve a vida
toda: o conhecimento, a imaginação, os sentimentos, os hábitos e a
experiência. Podemos afirmar, sem risco de errarmos, que são os
hábitos e a experiência os principais factores do desenvolvimento do

39
carácter. Para além da herança genética, claro está, a qual predispõe
o indivíduo para desenvolver um determinado tipo de personalidade.
Nós somos a soma das nossas experiências de vida. O nosso
presente e o nosso futuro são condicionados pelo nosso passado. Se
essas experiências de vida nos afastaram dos outros, nos separaram
das nossas comunidades, nos centraram em nós próprios, então é
quase certo que nós desenvolvemos um carácter fraco e deficiente.
Se, ao invés, as experiências de vida nos aproximaram dos outros,
nos relacionaram com as nossas comunidades, nos projectaram para
compreendermos e servirmos os outros, então, muito provavelmente,
nós desenvolvemos um carácter forte e adequado. Mas o que é um
carácter forte e adequado? É um carácter que nos predispõe para
conhecermos o bem, amarmos o bem e fazermos o bem. É certo que
cada teoria ética tem a sua definição de bem. Por exemplo, para os
utilitaristas, o bem é o que traz o máximo possível de benefícios para
o próprio e para o maior número de pessoas. Para a ética
deontológica, o bem é uma espécie de boa vontade que nos leva ao
cumprimento incondicional do dever. Ou seja, não está directamente
relacionado com os benefícios, nem com as consequências das
acções. Para a teoria ética da virtude, o bem é o conjunto de
qualidades humanas e hábitos que nos conduzem para a excelência
dos actos.
Se levarmos em linha de conta a teoria ética da virtude,
veremos que a experiência exerce um papel fundamental na vida
ética. Com efeito, as virtudes, sejam elas a justiça, a
responsabilidade, a prudência, a temperança ou a perseverança,
cultivam-se através das nossas acções. É praticando actos de justiça
que uma pessoa se torna justa. É agindo responsavelmente que uma
pessoa se torna responsável e por aí adiante. É claro que uma
comunidade sem virtudes torna muito mais difícil a prática de actos
que conduzam ao cultivo das virtudes.

40
Exortação
O carácter é produto de muitas influências e factores: a
genética, a experiência e os hábitos, o exemplo, mas também a
exortação. É sabido que “um professor medíocre prelecciona, um bom
professor explica, um professor superior demonstra, mas um grande
professor inspira”. Não queremos dizer com isto que as prelecções
sejam sempre negativas. O que é negativo é enfatizar as prelecções
em prejuízo dos outros métodos: a demonstração, a explicação, o
treino e a supervisão. Inspirar é ser capaz de provocar nos alunos o
desejo de se tornarem melhores. Quando um aluno está prestes a
desistir, a exortação de um professor pode motivá-lo para continuar.
Quando um aluno persiste na exibição de maus hábitos, a exortação
de um professor pode levá-lo à mudança. Um professor competente e
dedicado aos seus alunos é capaz de censurar e de elogiar. Censurar
os maus hábitos, com palavras firmes, mas com o desejo de se
colocar ao serviço do aluno, mostrando por que razão a persistência
desses hábitos é negativa, constitui uma forma de exortação eficaz.

Expectativas de excelência
O poder das expectativas é extraordinário. Quando os
professores manifestam baixas expectativas face a determinados
alunos, estão com isso a reforçar um conceito negativo acerca deles.
Os professores devem ser capazes de descortinar as qualidades dos
alunos. Um aluno nunca pode ser encarado como um caso perdido.
Cabe ao professor mostrar que acredita na recuperação do aluno,
mostrando-se disponível para o ajudar, indicando-lhe o caminho e
dizendo que acredita nele.
Durante a juventude cometem-se muitos erros e muitas
imprudências. Contudo, esse é um período de crescimento. Cresce-se
com a experiência e aprende-se com os erros. Os professores devem
mostrar que têm expectativas elevadas face a todos os alunos,
mesmo aos que, em determinadas alturas, parecem casos perdidos.

41
Notas

1)Ryan, K. e Bohlin, K. (1999). Building Character in Schools. S.


Francisco: Jossey-Bass

CAP 17 Manifesto da nova educação do carácter

Considero que a educação do carácter deve obedecer aos


seguintes princípios orientadores:
1. Não há educação sem valores. A educação é sempre um
processo de criação e de transmissão de valores. Os
professores e educadores, quer queiram quer não, são sempre
exemplos morais para os seus alunos.
2. A educação deve ser um processo contínuo de melhoria do
carácter de cada um. Essa melhoria faz-se através de vários
processos: exemplo, imitação, prática supervisionada, contacto
com grandes narrativas, discussão de dilemas morais e
exortação, entre outros.
3. Os pais são os primeiros educadores morais dos filhos e têm
um papel insubstituível nessa tarefa. As escolas devem criar
parcerias com os pais de forma a potenciar e articular o papel

42
dos professores e das famílias no processo de educação do
carácter.
4. As escolas têm a obrigação de transmitir aos alunos algumas
virtudes essenciais: coragem, justiça, temperança e prudência.
5. Essas virtudes transmitem-se através do exemplo e da prática.
Os hábitos constituem um dos principais instrumentos de
transmissão das virtudes, na medida em que se é justo
praticando actos de justiça e se é corajoso praticando actos de
coragem e assim por diante.
6. A educação do carácter visa transmitir virtudes essenciais, ou
seja, hábitos saudáveis e correctos, que contribuam para a
excelência e para o bem-estar e a felicidade da pessoa.
7. A educação do carácter não visa transmitir os pontos de vista
“politicamente correctos”. Isso é matéria para outras agências
de socialização, não para a escola.
8. Todos os adultos que trabalha na escola devem ter formação
sobre educação do carácter, porque todos eles exercem
influência no processo de transmissão de valores e virtudes.
9. Não deve haver no currículo uma disciplina para se fazer a
educação do carácter. Em vez disso, esse processo deve fazer-
se transversalmente e através do ethos da escola.
10.A escola, na sua totalidade, deve constituir-se numa
comunidade onde se cultivam as virtudes essenciais: justiça,
coragem, prudência, temperança, responsabilidade, respeito pelos
seres humanos e pelos restantes seres vivos que partilham a Terra
connosco.

CAP 18 Indisciplina e carácter

As crianças não são encaradas, em S. Tomé e Príncipe, como


uma despesa ou um fardo. Antes, são vistas como uma receita, uma
dádiva e um investimento. São, na verdade, a alegria das famílias e

43
das comunidades. Numa sociedade frugal, onde a economia de
subsistência tem lugar preponderante no processo de produção, não
custa muito educar e cuidar de uma criança. A bem dizer, não custa
mais cuidar de uma do que de três ou quatro. Os pais têm a
percepção de que, por vezes, é mais fácil educar e cuidar de três ou
quatro crianças do que de apenas uma e têm razão em pensarem
dessa maneira. Com efeito, é vulgar verificarmos que os irmãos mais
velhos cuidam, natural e alegremente, dos irmãos mais novos,
libertando os pais de uma parte significativa das tarefas relacionados
com o cuidar das crianças. É raro vermos uma criança sozinha.
Andam em bandos, brincam à porta das casas, constroem os seus
próprios brinquedos, ajudam os pais nas tarefas caseiras e, quando
calha, participam em processos produtivos, como, por exemplo, a
pesca ou a recolha de frutos. A escola é vista como uma coisa séria e
o professor como um adulto significativo, com autoridade e prestígio
na comunidade. Obedecer ao professor é um acto encarado com
naturalidade porque o professor é uma figura com autoridade
legítima. Violência nas escolas é algo que não existe. Indisciplina, só
muito raramente. Quando pergunto aos professores quais são os
problemas mais graves, as respostas são sempre as mesmas: há falta
de material, há miúdos que moram demasiado longe da escola e o
salário não chega para cobrir as despesas. Nunca ouvi um professor
queixar-se da indisciplina. Faça-se a mesma pergunta aos professores
portugueses e atente-se nas respostas: a indisciplina figura entre as
três maiores preocupações. Nas inúmeras visitas que tenho feito às
escolas primárias, sempre dei conta da forma afectuosa mas firme,
amiga mas com autoridade, com que os professores lidam com as
crianças. Talvez isso seja um dos principais factores que explicam a
maneira fácil como florescem as virtudes do carácter nas crianças e
jovens daquele país. Talvez isso nos leve a reflectir sobre as razões
por que é tão difícil ser professor em Portugal e é tão penoso educar
e cuidar dos filhos. Quando ouvimos responsáveis políticos do

44
Ministério da Educação de Portugal desvalorizarem o problema da
indisciplina, e por vezes a lançarem a responsabilidade para os
professores, como se eles tivessem todos os instrumentos para
lidarem com o problema, a única coisa que podemos fazer é alertar e
denunciar, na esperança de que possamos ser ouvidos e contribuir
para a correcção das políticas e orientações educativas erradas.

CAP 19 Pode um povo ser rico num país pobre?

Pode um povo ser rico num país pobre? Esta pergunta ocorre-
me sempre que visito S. Tomé e Príncipe. A riqueza de um povo
mede-se através das suas práticas, sejam elas religiosas, artísticas,
culturais ou sociais. Não se mede através do tamanho e do luxo das
casas e dos automóveis! Um povo com uma vida comunitária cheia e
variada é um povo rico, independentemente do nível da riqueza
material do País. É por isso que eu digo que há países materialmente
ricos, habitados por povos pobres. A riqueza material de um País é, a
partir de um determinado nível, um obstáculo à riqueza do povo.
Quanto maior é a riqueza material de um País, mais facilmente o
povo tende a construir gaiolas douradas e a perder ou a anular a sua
vida comunitária. Na ânsia de adquirir cada vez maior riqueza
material, os povos tendem a empobrecer espiritualmente e esse
empobrecimento espiritual é acompanhado, regra geral, de

45
decréscimos acentuados da natalidade, aumento de famílias
monoparentais, tendência para o filho único, envelhecimento da
população, isolamento, solidão, tristeza e depressão. Não é por acaso
que o aumento do consumo de antidepressivos tem vindo a
acompanhar o enriquecimento material de muitos países,
constituindo a depressão a resposta ao crescente isolamento social,
solidão e perda da vida comunitária. Ora, isso foi precisamente o que
eu não vi em S. Tomé e Príncipe. O que vi nesse país da África
Ocidental foi exactamente o contrário: famílias numerosas, taxa de
natalidade elevada, vida comunitária fortíssima, laços familiares e
comunitários muito fortes, o cultivo da virtude da amizade e do
companheirismo e um contacto íntimo com a natureza. Vi também
uma elevada capacidade de auto-sustentação por parte das pessoas,
visível na aquisição, desde crianças, das artes da sobrevivência. E vi
muita alegria nos olhos das crianças. Quando pergunto às crianças de
8 anos de idade o que fazem depois da escola, quase todas me
dizem: “brinco, nado, pesco, vou apanhar frutos e ajudo os pais na
machamba!” Em Portugal, vêem televisão, ocupam o tempo a jogar
nas consolas e a surfar na net. Muitas vezes sozinhas em casa ou
entregues a profissionais.

CAP 20 Quando as virtudes do carácter estão ausentes

O que falhou na educação do Francisco? Faço esta pergunta


muitas vezes e a única resposta que me parece possível é que os pais
e os professores não ensinaram ao Francisco as artes da
sobrevivência e, portanto, não criaram oportunidades para que ele
adquirisse as virtudes do carácter, nomeadamente, a coragem, a
prudência e a temperança. Na ânsia de o protegerem, os pais
pouparam-no sempre à assunção de responsabilidades, substituindo-
se ao filho em tudo o que era penoso e implicava esforço e
obrigações. Para os pais do Francisco, os desejos do filho eram

46
ordens. Tudo fizeram para que nunca lhe faltasse nada. Sempre
procuraram que o filho não tivesse de enfrentar a dura realidade da
vida. Sempre o pouparam às tarefas penosas e desagradáveis do dia-
a-dia. O Francisco foi sempre um bom estudante, ou seja, um aluno
com notas elevadas. Licenciou-se em Economia com 16 valores numa
das melhores universidades do país. Não quis procurar trabalho e
optou por fazer o mestrado. Com 27 anos, ainda não tivera
oportunidade de participar em qualquer tipo de processo produtivo.
Os pais, na ânsia, de lhe concederem todo o tempo do mundo para o
estudo, pouparam-no a todas as outras actividades. Quando
completou o mestrado, o Francisco viu-se perante uma crise de
vocação: não sabia o que queria fazer. Além de não saber fazer nada,
tinha muitas dúvidas sobre o que gostaria de fazer na vida. Descrente
e confuso, abandonou o país e foi viver para Berlim. Os pais
pagavam-lhe as contas, procurando estar seguros de que nada lhe
faltava. Passados seis meses, receberam um telefonema que iria
mudar as vidas deles: o filho estava internado num hospital
psiquiátrico de Berlim. Diagnóstico: esquizofrenia.
A par do complexo e moroso processo de transferência para um
hospital português, os pais do Francisco queriam encontrar resposta
para o sucedido. Porquê? Em que é que falharam como pais? Embora
seja muito difícil apurar as verdadeiras razões do sucedido, até
porque há factores de natureza genética que podem ter
desencadeado a doença, podemos identificar algumas coisas que não
correram bem no processo educativo do Francisco. Em primeiro lugar,
a ênfase que a escola, os professores e os pais colocaram na
dimensão cognitiva (o que importava eram as notas elevadas!),
esquecendo-se de trabalhar a dimensão afectiva e o desenvolvimento
das virtudes do carácter. Em segundo lugar, o não envolvimento do
Francisco, apesar dos seus 27 anos de idade, em qualquer tipo de
actividade produtiva e, portanto, o seu desconhecimento completo
das artes da sobrevivência. Em quarto lugar, e talvez a razão mais

47
importante, nem a escola nem os pais lhe possibilitaram a aquisição
das virtudes da coragem e da temperança. Da coragem, para poder
dizer não ao que não é conveniente nem saudável, para poder resistir
à pressão dos grupos e para não desistir à primeira dificuldade. Da
temperança, para poder fazer um uso moderado dos prazeres. Nunca
ninguém saberá ao certo, mas podemos supor, com uma elevada
probabilidade de estarmos certos, de que a vida do Francisco teria
sido diferente, caso tivesse aprendido a usar bem as virtudes da
coragem, da prudência e da temperança.

CAP 21 O papel do Estado na educação do carácter

Para Aristóteles (1) o objectivo dos estudos sobre a acção (e a


ética é a disciplina que nos ensina a agir bem, em ordem a termos
uma vida boa) não é o saber teórico, mas sim o saber prático guiado
pelo conhecimento e pela razão. É por isso que não chega conhecer
as virtudes; é preciso possuir e exercer as virtudes, que é como
quem diz, tornar-se bom.
Os argumentos são importantes, mas não são suficientes para
fazer com o que o agente leve uma vida boa. É claro que, para uma
pessoa que já possui as virtudes do carácter, os argumentos podem
ser suficientes, mas para as crianças e os jovens é preciso mais do
que argumentos, até porque a maior parte dos agentes obedece mais
ao medo do que à vergonha. Por outro lado, não se altera com
argumentos o que se adquiriu pelo hábito.
As virtudes do carácter não se adquirem apenas pelos
argumentos nem surgem naturalmente. São, sobretudo, os hábitos os
responsáveis pela sua aquisição. Se as virtudes do carácter se
adquirem pela natureza, pelos argumentos e pelos hábitos, importa
saber a quem é que a comunidade deve entregar a magna tarefa da

48
educação ética. Às famílias? Às escolas? A ambas? E qual é o papel
do Estado e das leis?
As respostas a estas perguntas são fundamentais e estão no
cerne da discussão milenar em torno de duas perspectivas que se
vêm digladiando ao longo dos séculos: a perspectiva comunitária e a
perspectiva individualista. A leitura de A Política e de a Ética a
Nicómaco leva-nos a crer que Aristóteles foi o mais importante
precursor da perspectiva comunitarista, afastando-se, claramente, da
perspectiva liberal individualista. Embora o filósofo seja um defensor
da propriedade privada, e nisso difere do que Platão escreveu em A
República), Aristóteles coloca limites à propriedade privada,
submetendo-a ao interesse comum. Aliás, toda a ética aristotélica
constitui a defesa da primazia do bem comum face aos interesses
particulares. Uma vez que a educação ética constitui uma tarefa
absolutamente necessária ao processo de aquisição das virtudes do
carácter pelas novas gerações, tal empreendimento não pode ser
deixado entregue apenas às famílias. Aristóteles defende que a
educação deve ser uma tarefa do Estado e que as Leis devem ser um
instrumento de promoção das virtudes do carácter, punindo, quando
necessário, os comportamentos considerados vis e exortando as
pessoas a obedecerem à rectidão, impondo os necessários correctivos
a quem se desviar dela.
O Estado é mais capaz de promover a educação do que os
particulares. É mais fácil o filho desobedecer ao pai do que ao Estado.
Os pais são os primeiros educadores dos filhos, mas não têm os
poderes de persuasão e de correcção que o Estado possui; logo, a
tarefa educativa tem de ser partilhada entre os pais e o Estado. Por
outro lado, Aristóteles reconhece que os Estados que negligenciaram
a tarefa educativa acabaram por criar as condições para que o povo
se afastasse das virtudes do carácter (2). Tal como as palavras e os
actos dos pais têm uma enorme influência nos filhos, também as leis,
normas e costumes de um Estado têm. Resulta daí que um Estado

49
com más leis presta um mau serviço à educação ética das novas
gerações. E o inverso também é verdadeiro. Embora Aristóteles
defenda a existência de uma educação pública, a cargo do Estado,
chama a atenção para os malefícios de uma educação massificada,
acentuando os benefícios de uma educação personalizada, ou seja,
que vá ao encontro das necessidades de cada pessoa.
Aristóteles afasta-se da perspectiva liberal, na medida em que
não partilha da ideia da sacralização da propriedade privada nem tão
pouco de um mercado completamente livre. Veja-se a propósito a
crítica que Aristóteles faz ao sistema dos juros (empréstimo de
dinheiro com o único objectivo de acrescentar dinheiro),
considerando-a uma actividade vil e imprópria. Ao invés, Aristóteles
toma partido por uma perspectiva comunitária, baseada na primazia
do bem comum e na subordinação dos interesses particulares aos
interesses comuns.

Nota
1) Aristóteles (1985). Nichomachean Ethics. (Introdução, tradução
e notas de Terence Irwin). Indianapolis: Hackett, 1179b
2) Idem, 118025

CAP 22 Ética da virtude e desenvolvimento moral

A Génese da Teoria Ética da Virtude


A preocupação com a educação do carácter, central na teoria
ética da virtude, desenvolveu-se, no Ocidente, desde o tempo de
Platão. A este respeito, justifica-se uma leitura aprofundada dos
diálogos Apologia, Crito e Gorgias, onde o filósofo de Atenas procede
a uma definição, nem sempre coincidente, dos conceitos de bem, de
felicidade e de prazer. Essas discrepâncias são uma constante na obra
de Platão e não contribuem para o seu enfraquecimento, porque

50
importa olhar para elas como produto de um processo de inquérito
racional em demanda de uma cada vez maior aproximação à
verdade. Nos diálogos Protágoras e Gorgias, nota-se, igualmente,
uma discrepância na definição do conceito de prazer (1) o qual, como
sabemos, é um conceito central para compreendermos a teoria ética
da virtude e, no fundo, todas as éticas teleológicas. Embora o termo
virtude pareça antiquado, as questões sobre o carácter da pessoa e a
excelência das práticas ocupam um lugar central na Ética. Essas
questões dizem respeito ao que uma pessoa boa deve ser e deve
fazer em situações reais de vida. Têm que ver com o carácter e com
a acção, não apenas nem sobretudo com o raciocínio, como alguns
modelos desenvolvimentistas e construtivistas pretendem. De entre
essas questões, há duas que têm a primazia: a questão da acção, ou
seja, “como devo agir?”; a questão do carácter, isto é, “que espécie
de pessoa devo ser?” Podemos fazer, aliás, uma analogia com o
sistema de justiça. Como pessoas a viverem num determinado país
depositamos a nossa vontade de justiça de duas maneiras: nas leis,
que proporcionam as regras necessárias para a vida em sociedade;
nas pessoas dos agentes da justiça, que aplicam a justiça. Do mesmo
modo, a ética da virtude baseia-se em teorias, que fundamentam e
justificam determinadas regras de conduta e na noção de virtude,
que proporciona a sabedoria necessárias para aplicar as regras a
casos particulares. Na concepção de Platão, as virtudes permitem-nos
lidar correctamente com as vantagens materiais da nossa vida, isto é,
fazer um bom uso delas. Quer isto dizer que bens do tipo “riqueza” e
“saúde” só são realmente valiosos se o indivíduo possuir, na medida
certa, as virtudes da justiça, da coragem e da temperança.
Aristóteles, na Ética a Nicómaco, definiu, com precisão o
conceito de virtude. Assim, a virtude (em grego, aretê) é uma
disposição voluntária que visa a excelência, a perfeição. O filósofo
distingue as virtudes intelectuais das virtudes morais. Enquanto as
segundas têm que ver com a sabedoria e o conhecimento, as

51
primeiras dependem do hábito. A pessoa virtuosa é aquele que sabe
o que faz, que escolhe deliberadamente seguir a conduta recta e é
capaz de repetidamente executar a rectidão com vontade inabalável.
O hábito da rectidão impele o virtuoso a uma disposição natural para
ser recto. O hábito é uma segunda natureza. Envolve sentimento e
acção. Os bons hábitos, aqueles que asseguram a acção virtuosa,
afastam-se do excesso e da deficiência. Procuram o justo meio. A
virtude anda, assim, associada ao justo meio. A força de carácter
exige que a pessoa encontre o equilíbrio certo entre dois extremos: o
excesso (ter algo em demasia) e a deficiência (ter demasiado pouco
de algo).
O justo meio significa harmonia e equilíbrio. A virtude é alguma
coisa que é praticada e aprendida. É um hábito (hexis). E é por isso
que Aristóteles, ao contrário de Sócrates, considerava que era
possível ensinar as pessoas a serem virtuosas. Sócrates e Platão
associavam inteligência ao exercício do Bem na medida em que o mal
era encarado como produto da ignorância. Se assim fosse, o
conhecimento e a inteligência seriam as qualidades que suportariam
a acção recta. Aristóteles afasta-se dessa concepção. Distingue
inteligência de sabedoria. A pessoa inteligente é a que conhece os
melhores meios para qualquer finalidade possível. A pessoa sabedora
é a que conhece quais são os fins que são estimáveis e dignos de
apreço. Então, a inteligência não permite, por si só, assegurar a
acção recta. A sabedoria, porque permite conhecer os fins estimáveis,
é uma qualidade essencial ao exercício da acção recta (2).
Central, também, na teoria ética aristotélica, é o papel dos
desejos no processo de tomada de decisões e de passagem à acção.
O filósofo faz uma distinção entre desejos bem ordenados e desejos
mal ordenados. As pessoas que conseguem controlar os desejos
desordenados são pessoas continentes. Daí a importância da
continência como uma virtude moral. As pessoas, cujos desejos são
bem ordenados, isto é, são ordenados em função do que é bom para

52
elas, são pessoas temperadas. Por último, há pessoas de vontade
fraca (akrasia), ou sejam indivíduos incapazes de controlarem os seus
desejos.
Se tivermos presentes as virtudes da continência e da
temperança, é fácil verificar a associação da virtude ao conceito de
justo meio. Vejamos: a força de carácter exige que a pessoa encontre
o equilíbrio certo entre dois extremos: o excesso (ter demasiado de
algo) e deficiência (ter demasiado pouco de algo). Uma pessoa
incapaz de ordenar desejos em excesso dificilmente consegue ser
virtuosa. Diremos o mesmo de alguém que é deficiente em desejos.
No primeiro caso, a pessoa tende a ser caprichosa e inconstante; no
segundo, insensível.
Outro aspecto importante na teoria ética de Aristóteles é a
unidade das virtudes. Para uma pessoa ter uma virtude de carácter,
em grande escala, também deve ter outras qualidades, em alguma
medida. Veja-se o caso da coragem. A coragem sem capacidade de
julgamento é cegueira. A coragem sem perseverança é apostar
apenas no curto prazo. A coragem sem um claro conhecimento das
nossas capacidades é uma forma de loucura.
Façamos, de seguida, uma breve visita a outras virtudes
constantes da paleta de Aristóteles e vejamos como elas se explicam
à luz da teoria do justo meio. A compaixão significa etimologicamente
sentir ou sofrer com o outro. O seu excesso paralisa, na medida em
que se constitui na síndrome de “o coração partido”. A sua deficiência
anda associada à “dureza de coração” e, portanto, à insensibilidade. A
virtude da compaixão ajuda-nos, também, a compreender o papel da
emoção na teoria ética aristotélica. Sendo a compaixão uma virtude
que anda associada à capacidade para sentir o sofrimento do outro,
ela vem carregada de emoção, a qual é necessária para que se
estabeleça uma ligação emocional que permita não apenas
reconhecer o sofrimento do outro, mas também partilhar com o outro
esse sofrimento, procurando dar resposta. O amor, uma virtude

53
essencial na constelação ética de Aristóteles, envolve sentir, conhecer
e agir. Quando se ama alguém, tem de se conhecer essa pessoa, tem
de se partilhar com ela sentimentos de ternura, cuidado, apreço e
respeito e tem de se agir de forma a promover o florescimento dessa
pessoa. Repare-se na existência de três componentes essenciais do
discurso ético: conhecimento, emoção e acção.
Vejamos, de seguida, outra virtude: o amor-próprio. Trata-se de
uma virtude que implica ter sentimentos de cuidado, apreço e
respeito por si próprio, valorar-se na justa medida e agir de forma a
promover o seu próprio florescimento. De novo, a presença do
conhecimento, dos sentimentos e da acção. De novo, a virtude
encarada como justo meio. O amor-próprio exige um meio-termo, um
ponto de equilíbrio entre o excesso e a deficiência. Em excesso,
confunde-se com arrogância e narcisismo. A sua deficiência implica
uma reduzida capacidade para sentir e uma tendência para a
autodepreciação.
A amizade é uma virtude central na teoria de Aristóteles. Na
Ética a Nicómaco, ocupa mais páginas do que qualquer outra virtude.
Ninguém escolhe viver sem amigos, ainda que tenha todos os outros
bens é uma afirmação que ressalta na leitura da Ética a Nicómaco. O
que é a amizade? Aristóteles dá-nos uma belíssima definição na
Retórica: “O amigo é aquele que partilha o teu prazer naquilo que é
bom e a tua dor naquilo que é desagradável, pelo teu valor intrínseco
e por mais nenhuma razão” (3). Aristóteles distingue três tipos de
amizade quanto aos fins. Amizade por utilidade, que acaba quando a
utilidade cessa: a amizade pelo prazer, que acaba quando a fonte de
prazer cessa; a amizade perfeita, que é a amizade que se baseia na
partilha de virtudes e em mais nenhuma razão (4).
Vejamos, por último, como é que a teoria da virtude se articula
com a definição que Aristóteles dá de felicidade (eudaimonia).
A teoria ética da virtude filia-se nas éticas teleológicas, ou seja,
subordina os processos deliberativos e as tomadas de decisão às

54
finalidades. Na teoria aristotélica, a finalidade última é a felicidade
(eudaimonia). Não se confunda, no entanto a eudaimonia com uma
estado de alma, com o “sentir-se bem”. Para os gregos antigos, a
eudaimonia significa ter uma vida bem sucedida. A eudaimonia não é
uma emoção, mas uma actividade que promove a excelência (5).
Dizer que a eudaimonia é uma actividade é o mesmo que dizer que
para que uma pessoa floresça, ela tem de agir de uma certa maneira
e não apenas sentir determinadas emoções. Florescer como pessoa
não é um estado de alma, mas sim um conjunto de actividades que
conduzem à excelência e ao sucesso. As virtudes intelectuais e
morais, quando bem exercidas, são um instrumento essencial nesse
processo de florescimento, ou seja, no processo que permite à pessoa
alcançar a eudaimonia.

Renascimento da teoria ética da virtude: Desenvolvimentos recentes

Elisabeth Anscombe (6) e Alasdair MacIntyre (7) são os


responsáveis pelo renascimento da teoria ética da virtude a partir do
último terço do século passado, depois de as éticas deontológicas
terem dominado o pensamento ético ocidental por mais de um
século.
Ascombe defendeu e justificou o carácter ininteligível da ética
deontológica e o seu desajustamento face à necessidade de agir bem,
ou seja, de agir com o objectivo de promover o florescimento da
pessoa e não em função de uma ideia apriorística do bem e do mal.
Para Ascombe, a virtude só faz sentido quando preenche
necessidades humanas. A ideia de agir, não para satisfazer um
desejo, uma necessidade ou um querer do indivíduo, mas porque é
eticamente correcto fazê-lo, deixou de ter sentido nos dias de hoje. E
tem tanto menos sentido quanto mais pluralistas e multiculturais são
as sociedades.

55
MacIntyre recolocou em cena a questão do pluralismo ético, ao
afirmar que não existe apenas uma tradição ética, no Ocidente, mas
várias. Somos perfeccionistas no desporto e nas artes, utilitaristas na
vida diária, lockianos quando se trata de respeitar o direito de
propriedade, cristãos quando idealizamos a compaixão, a caridade e a
igualdade e kantianos quando afirmamos o valor da autonomia da
pessoa e do respeito pelos direitos humanos. MacIntyre procura
responder à questão de “qual é o significado da vida?”, afirmando que
o significado depende da pessoa compreender que pertence a várias
tradições morais, as quais lhe permitem construir uma narrativa de
vida, que depende da existência de padrões de excelência e de
práticas apropriadas. A opção por determinados padrões de
excelência (virtude, no sentido que a palavra grega aretê possui) e de
práticas apropriadas depende não apenas das tradições éticas,
culturais e comunitárias (que influenciam o sistema de valores do
indivíduo), mas também das finalidades (telos) que o sujeito
estabelece para a sua vida. Na concepção da ética da virtude, o telos
é, acima de tudo, uma escolha pessoal, em função dos prazeres que
o indivíduo elege, no sentido de cumprir a sua noção do que é uma
vida boa, e em função das dores que ele pretende evitar. Sendo
assim, deixam de ter sentido as concepções apriorísticas do bem e do
mal, sejam elas informadas pelas éticas deontológicas, pelas noções
de cumprimento do dever, ou em obediência a quaisquer imperativos
categóricos ou mandamentos ancorados numa tradição religiosa.
Outro importante contributo de Alasdair MacIntyre foi a noção
de que existe uma relação, quase simbiótica, entre as tradições
culturais e éticas da comunidade e o indivíduo, pelo que as virtudes
só podem prosperar em comunidades de certo tipo. Há, portanto,
comunidades que favorecem a promoção das virtudes e há outras que
as dificultam, na medida em que diferentes tipos de comunidade
encorajam diferentes tipos de virtude ou, em casos extremos,
promovem o desenvolvimento de caracteres perversos.

56
Esta ênfase colocada no desenvolvimento do carácter, por
oposição aos modelos construtivistas que centram a discussão no
desenvolvimento do raciocínio moral, faz toda a diferença. Mas, para
percebermos a associação entre o desenvolvimento do carácter e a
acção moral, importa definirmos e caracterizarmos carácter. Ora, o
carácter não é o mesmo que personalidade, embora integre esse
conceito. Quando falamos em carácter de uma pessoa, estamos a
referir-nos a traços mais ou menos fixos, muitas vezes condicionados
geneticamente, e que muito dificilmente podem ser alterados. Para
um determinado tipo de carácter, nós podemos associar um
determinado tipo de personalidade e esperar um conjunto específico
de atitudes. Contudo, se o carácter fosse inteiramente fixado por
condicionantes genéticas, de nada valeria a educação ética e seria
completamente estéril estarmos a falar de metodologias promotoras
do desenvolvimento moral. Na verdade, o carácter pode sofrer
aperfeiçoamentos e MacIntyre dá-nos algumas sugestões nesse
sentido. É a esse aperfeiçoamento do carácter que a teoria ética da
virtude chama de desenvolvimento moral. A reflexão sobre as
consequências dos actos, a formação de bons hábitos, através de um
processo de “ethical guidance” e o envolvimento comunitário abrem
alguma margem de manobra para o aperfeiçoamento do carácter e,
como tal, para o desenvolvimento moral do sujeito.

Teoria ética da virtude e metodologias de promoção de valores

Vejamos, como é que a teoria ética da virtude se articula com a


promoção de valores e o desenvolvimento moral do aluno?
As metodologias de promoção de valores podem agrupar-se em
três tipos: as que se fundamentam nas teorias construtivistas, como
é o caso da metodologia de Lawrence Kohlberg, também chamada de
“comunidade justa”; as que se fundamentam nas teorias
personalistas, como é o caso da metodologia da clarificação de

57
valores; e as que se fundamentam na teoria ética da virtude, como é
o caso da metodologia dos 3 Es (8).
A fundamentação teórica do método dos 3 Es é, sem dúvida, a
teoria ética da virtude. Toda a metodologia gira em torno de três
estratégias (exortação, exemplo e envolvimento) e cinco objectivos
(usar os conteúdos para desenvolver o raciocínio moral; estimular a
cooperação; desenvolver o sentido da responsabilidade; superar os
conflitos sem violência; promover uma ética do cuidar).
O professor assume-se como mentor e modelo e um
dinamizador da reflexão ética em torno de grandes narrativas. Os
papéis do professor explicam-se pelo facto de o método dos 3 Es
considerar que o conhecimento moral exige: reflexão, formulação de
juízos e processo de escolha (cálculo racional, deliberação e acção).
Os valores éticos percorrem todo o currículo de forma transversal,
não sendo de aconselhar a existência de uma disciplina específica
para ensinar ética. O ambiente da escola é determinante para o
desenvolvimento moral do aluno e um dos principais instrumentos é o
código de conduta escolar. São as autoridades escolares e os
professores os responsáveis pela elaboração, aprovação e
implementação do código de conduta, o qual toma uma opção clara
pelo reforço da autoridade do professor, reconhece a importância da
linguagem moral e do hábito no processo de desenvolvimento moral.
Lickona considera que existem três componentes no bom carácter: o
conhecimento moral, o sentimento moral e a acção moral. O
conhecimento exige reflexão, compreensão, formulação de juízos
morais e processos de escolha. O sentimento exige auto-estima,
empatia, afecto e saber colocar-se no lugar do outro. A acção exige
vontade e hábito. São, assim, estas as dimensões fundamentais de
qualquer programa de desenvolvimento moral preocupado, não
apenas como o desenvolvimento do raciocínio, mas sobretudo com o
desenvolvimento do carácter e da acção moral.

58
Notas

1) Annas, J. (2003). Plato: A Very Short Introduction. Oxford: Oxford


University Press

2) Sherman, N. (1998). Aristotle`s Ethics. Oxford: Rowman and


Littlefield Pub
Aristóteles (1998). Retórica. Lisboa: Imprensa Nacional

3) Aristóteles (1998). Retórica. (Tradução e notas de Manuel Júnior,


Paulo Alberto e Abel Pena). Lisboa: INCM, Livro II, 4; 1380b36-1381ª
5

4) Aristoteles (1985). Nicomachean Ethics. (Introdução e notas de


Terence Irwin). Indianapolis: Hackett PC

5) Barnes, J. (2000). Aristotle: A Very Short Introduction. Oxford:


Oxford University Press

6) Ascombe, G. (1958). “Modern moral philosophy”. In Philosophy.


33, 1-19

7) MacIntyre, A. (1984). After Virtue. Indiana: University of Notre


Dame e (1990). Three Rival Versions of Moral Inquiry. Indiana:
University of Notre

8) Lickona, Th. (1991). Educationg for Character: How Our Schools


Can Teach Respect and Responsibility. Nova Iorque: Bantam Books

CAP 23 O prazer e a dor na educação do carácter

59
Aristóteles dedica uma parte do Livro X da Ética a Nicómaco à
relação entre o prazer e a dor e a educação do carácter. O prazer é de
uma grande importância ética na teoria da virtude. A dor também. A
extrema importância do prazer resulta do facto de que as pessoas
tendem a fazer aquilo que lhes dá prazer e a evitar o que lhes dá dor.
Os humanos são atraídos pelo prazer. Acontece o mesmo com os
outros animais. Essa aprece ser uma lei comum a todos os seres
vivos. Esse facto leva Aristóteles a afirmar que uma pessoa com um
bom carácter é a que é capaz de tirar prazer e dor das coisas certas.
Uma pessoa que tira prazer das coisas erradas, ou seja, que sente
prazer a fazer o que está errado, é uma pessoa intemperada. Diz-se
que é temperada uma pessoa que é capaz de tirar prazer das coisas
certas e dor das coisas erradas. A temperança é, pois, uma virtude
essencial à vida boa e à felicidade porque é a virtude que permite um
uso moderado dos prazeres. Apesar da sua importância, caiu em
desuso e são poucos os professores e pais que a incluem na sua
linguagem do dia-a-dia. A pobreza da linguagem moral de muitos
pais e professores tem efeitos negativos na educação do carácter das
novas gerações. Importa recordar que a educação do carácter se faz
pelos argumentos, pelo exemplo e pelo hábito.
Há muitas décadas que a relação entre prazer e dor e educação
do carácter deixou de fazer parte da linguagem moral dos pais e
professores. Os mass media tendem a enfatizar a relatividade dos
prazeres e das dores, havendo cada vez mais pessoas que pensam
que se trata de uma matéria de gosto pessoal. Essa relativização dos
prazeres e das dores tem efeitos extremamente negativos na
educação do carácter das novas gerações. Sem referenciais éticos e
normativos, as crianças e os jovens sentem-se perdidos e confusos
no seu processo de valoração. Os jovens crescem a pensar que todos
os actos que dão prazer são correctos e não aprendem a usar a
virtude da temperança, sem a qual ficam incapazes de fazer um uso
moderado dos prazeres. É evidente que há prazeres que são

60
prejudiciais para o agente. O consumo do tabaco, da cocaína ou da
heroína podem dar um prazer momentâneo, mas ninguém é capaz de
negar os seus malefícios a médio e longo prazo. A comida é, regra
geral, fonte de prazer; contudo, o excesso de alimentos pode causar
obesidade e ser potenciador de doenças. Se as crianças e os jovens
não aprenderem a fazer um uso moderado dos prazeres, dificilmente
serão capazes de cultivar as virtudes do carácter.
Por último, importa referir o potencial educativo das dores. É
próprio dos humanos serem atraídos pelos prazeres e sentirem
repulsa pelas dores. Assim é porque as dores causam desconforto,
tristeza e depressão. Contudo, é importante saber como resistir às
dores. Por mais protegidos e afortunados que sejamos, todos nós
somos, mais tarde ou mais cedo, atormentados pelas dores. Pode ser
a morte de um familiar que nos causa a dor, uma doença, um
fracasso no trabalho, uma perda de amor ou qualquer outra coisa. As
pessoas corajosas e resilientes estão melhor equipadas para
ultrapassar as dificuldades e os fracassos. Só é possível aprender a
resistir às dores, através do exemplo e da experiência directa. A
virtude da coragem aprende-se dessa forma. O problema é que as
crianças vivem, regra geral, imersas num mundo que enfatiza os
prazeres de uma forma imoderada e raramente lhes são dadas
oportunidades para aprenderem com as dores. Em consequência,
torna-se muito difícil a aprendizagem da coragem e sem essa virtude
é mais provável desistirmos à primeira dificuldade. Com a
aprendizagem da coragem ausente das nossas famílias e escolas,
estamos a educar as crianças num ambiente que potencia o fácil, o
efémero e o que não exige esforço. Contudo, o mundo onde os
nossos jovens estão prestes a entrar é tudo menos fácil. Ao invés,
corre o risco de ser tornar cada vez mais competitivo, cruel e
desumano.

CAP 24 A felicidade e a amizade andam associadas

61
A felicidade e a amizade andam associadas, a tal ponto que é
possível afirmar que, sem amigos, não podemos ser felizes. Se
tivermos de optar entre uma vida sem amigos, mas rodeados de
riqueza, e uma vida frugal, com muitos amigos, a nossa escolha vai,
sem dúvida, para a segunda opção. Ao longo das muitas visitas de
trabalho a países africanos, pude verificar que uma das principais
razões da alegria estampada nos rostos das pessoas era, sem dúvida,
a amizade abundante. Em S. Tomé e Príncipe, é raro ver-se alguém
sozinho. Os amigos estão presentes na vida das pessoas a toda a
hora. A amizade é uma virtude abundante e muito prezada. Quando
alguém tem um problema, sabe que pode contar com os amigos. Em
sociedades com forte tradição comunitária, estão reunidas todas as
condições para a gestação e crescimento da amizade: há tempo para
estar com os amigos, a entreajuda é um instrumento de
sobrevivência, a frugalidade dos bens materiais não desvia a atenção,
tempo e energia das pessoas para actividades não essenciais e os
processos de alienação e de criação de falsas necessidades não
condicionam a vida das pessoas.
Quando se tem amigos e se tem tempo para estar com eles e
para partilhar actividades e projectos comuns, torna-se difícil a
criação de falsas necessidades. Alguns dos males da vida
contemporânea nas sociedades materialmente desenvolvidas são
originados pela ausência de condições para a gestação, o crescimento
e a manutenção das amizades. Em sociedades onde tudo é
descartável e com um prazo de validade de curta duração, não há
condições para a manutenção das amizades e das relações afectivas.
Sem amigos e sem tempo para estar com eles, as pessoas estão mais
sujeitas a serem condicionadas pelos processos de alienação: vêem
televisão, nomeadamente reality shows, horas a fio, tomam as
refeições a olhar para a televisão e dedicam os seus tempos livres a
fazerem compras em centros comerciais. Nas sociedades

62
materialmente desenvolvidas, a televisão é o substituto da amizade.
Contudo, ao contrário dos amigos, que proporcionam experiência
directa, que geram alegria e que se entreajudam, a exposição,
durante horas a fio, à televisão constitui o mais poderoso instrumento
de alienação que a Humanidade já conheceu. É graças a ela que
muitas pessoas se endividam excessivamente, abandonam a sua
herança cultural, se tornam escravas do consumismo e se isolam
ainda mais dos outros. Para além de ser um pobre substituto da
experiência directa e dos amigos, a televisão constitui um opiáceo
com efeitos devastadores a todos os níveis: contribui para o aumento
da obesidade na infância e adolescência, é um poderoso agente de
inversão dos valores (veja-se os valores transmitidos pelos reality
shows e pela maior parte das telenovelas) e condiciona a nossa
mente e os nossos desejos a ponto de sermos levados a comprar o
que não queremos e a desejarmos o que não nos faz falta.
A ausência de televisão em muitas comunidades africanas, pelo
menos nas doses maciças a que nos habituámos a ter nas sociedades
materialmente desenvolvidas, constitui um bem extraordinário que
importaria manter, não confundindo progresso com alienação, nem
felicidade com desenvolvimento material. Sem televisão, as pessoas
estão mais predispostas para estarem juntas, para interagirem, para
conversarem, dedicando tempo umas às outras, num processo de
construção de narrativas, onde a comunidade mantém os seus elos
agregadores. Não se compreende, por isso, nem se pode aceitar, que
os Estados mantenham a funcionar, à custa dos contribuintes, cadeias
de televisão pública. É tão inaceitável um Estado financiar, à custa
dos contribuintes, canais de televisão como, por exemplo, assegurar
a distribuição e o fornecimento de drogas pesadas aos jovens. No
fundo, o negócio é o mesmo, porque os reality shows e telenovelas e
em geral as programações dos diversos canais generalistas não
passam disso mesmo: drogas duras.

63
CAP 25 O telelixo é uma droga pesada

A Holanda é, há várias décadas, o maior entreposto europeu de


fabrico e distribuição de drogas sintéticas. Milhares de jovens
portugueses e de outras nacionalidades, seduzidos pelas políticas
liberais holandesas, ali perderam a vida ou regressaram aos seus
países carregando para toda a vida o fardo da esquizofrenia. No meu
círculo de colegas de liceu, houve dois que morreram de overdose,
em Amesterdão, e quatro que regressaram a Portugal com psicoses
graves. E a tragédia continua. Agora, são os filhos adolescentes e
jovens adultos dos meus amigos e colegas a sofrerem esse pesadelo.
A Holanda é a sede do maior grupo europeu de produção de
telelixo. A Endemol, com sede na Holanda e filiais em quase todos os
países europeus, concebe e produz a maior parte dos concursos,
reality shows e novelas da vida real que enchem o horário nobre dos
canais televisivos generalistas.
O telelixo é constituído por todo o tipo de conteúdos para
televisão que a) imbeciliza as pessoas; b) as torna insensíveis à dor,
à violência e à crueldade; c) lhes cria falsas necessidades que se
tornam prejudiciais à saúde e à vida boa; d) lhes transmite versões
distorcidas e falsas da realidade e; e) lhes inculca contravalores.
Quase todo o prime-time dos canais generalistas, que vai desde as 18
horas até às 22 horas, é preenchido com conteúdos que cumprem
uma ou mais das condições descritas atrás. Os próprios noticiários
não escapam, muitas vezes, à designação de telelixo, sobretudo
porque cumprem, demasiadas vezes, as condições b) e d). Com
efeito é cada vez mais comum a abertura dos noticiários com a
notícia e a exploração exaustiva dos crimes de cariz sexual, bem
como dos crimes de assalto à mão armada e homicídio. Uma análise
do tempo dedicado pelos noticiários dos canais generalistas (RTP, SIC
e TVI) aos crimes violentos, mostra-nos que esse tipo de
acontecimentos tem vindo a ter cada vez mais destaque, agravado

64
pela técnica da repetição da notícia, que é dada aos poucos e de
forma recorrente ao longo de todo o noticiário.
As crianças portuguesas vêem, em média, 3 horas de televisão
por dia. Há muitas crianças que se expõem ao telelixo durante mais
de 5 horas, aos fins-de-semana. Para além dessa exposição, há que
acrescentar o tempo que crianças e adolescentes passam a navegar
em websites e salas de chat, que são, também, distribuidores de lixo,
ou se quisermos um nome mais apropriado, distribuidores de veneno
para a mente.
Os efeitos devastadores da exposição ao telelixo não são
menores do que as consequências do consumo de drogas pesadas e
atingem um universo muito maior. É por isso que eu digo que o
telelixo é uma droga pesada. Da mesma forma que os pais devem
fazer tudo o que lhes for possível para afastar os seus filhos da
cocaína, da heroína, do ice e do ecstasy, também devem fazer um
esforço idêntico para os impedirem de consumir telelixo. Se eu
tivesse de seleccionar uma das cinco mais importantes medidas para
proteger a educação familiar das crianças e adolescentes, eu
colocaria em grande destaque a redução do tempo de exposição à
televisão.
Infelizmente, os proprietários, editores e directores de
programas dos canais de televisão que preenchem o seu prime-time
com telelixo não são alvo de censura social; antes, são vistos e
apresentados como celebridades e empresários de sucesso e há até
prémios especiais para celebrar os que conseguem atingir maiores
níveis de audiência. Contudo, os efeitos do telelixo na mente, no
carácter e na vida das crianças e jovens podem ser devastadores.
Não menos devastadores do que o consumo de drogas pesadas. As
drogas pesadas são veneno para o corpo. O telelixo é veneno para a
mente.

65
CAP 26 O que as crianças e os jovens realmente precisam

O carácter de uma pessoa é o resultado de um complexo e


multifacetado processo de construção. Ninguém tem o poder de,
sozinho, formar o carácter de outra pessoa. Uma pessoa pode
contribuir, por omissão ou por acção, mas não mais do que isso. É por
isso que os pais não devem sentir-se culpados pelo facto de,
porventura, os seus filhos possuírem um mau carácter. Podem e
devem fazer um exame de consciência sobre o que falhou, mas
devem estar conscientes de que um mau resultado pode ter sido
originado por múltiplos factores, a maior parte dos quais exteriores à
família. Apesar disso, o papel dos pais na educação do carácter dos
filhos não pode ser negligenciado. Há muita coisa que podem fazer e
há muita coisa que devem evitar.
A primeira coisa que devem fazer é serem ouvintes atentos. Na
tarefa de educar um filho, a distracção dos pais pode ter
consequências nefastas. Ouvir atentamente significa estar desperto
para identificar e compreender os indícios daquilo que corre mal, de
forma a intervir a tempo de evitar males maiores. Significa, também,
dar a palavra aos filhos, num processo de comunicação nos dois
sentidos. Partilhar as refeições, com tempo e calma, sem o televisor
por perto, é uma forma excelente de promover a comunicação.
Os pais devem ser uma fonte de inspiração para os filhos. Na
era dos reality shows, das novelas da vida real e da MTV, as crianças
e os jovens estão constantemente a ser inspirados por maus
exemplos. O culto das celebridades substituiu o apreço pelos heróis.
Os valores veiculados por esses media são, sobretudo, o culto do
efémero e da facilidade, o individualismo e a ostentação. O efeito
devastador que a exposição continuada ao telelixo tem nas mentes
das crianças e dos adolescentes é incomensurável. Importa, por isso,
que os pais sejam capazes de encontrar fontes de inspiração
alternativas, capazes de contrariar o crescente cinismo, niilismo,

66
relativismo radical, individualismo e egoísmo reinante nas sociedades
materialmente desenvolvidas. Nas sociedades com forte sentido
comunitário, as fontes de inspiração mantêm relações de proximidade
com as crianças e os jovens, proporcionando-lhes o acesso aos
exemplos e à experiência directa. Nas sociedades materialmente
desenvolvidas, marcadas por um forte sentido de individualismo,
separação, descontinuidade e egoísmo social, torna-se mais difícil o
contacto com fontes de inspiração que assegurem o acesso aos
exemplos e à experiência directa. A tendência crescente para o filho
único não ajuda em nada a inverter essa situação.
O amor é um dos factores mais importantes de promoção do
carácter. As crianças não conseguem um desenvolvimento equilibrado
se não forem imersas, desde cedo e de forma continuada, num
ambiente onde haja amor. Quando falta o amor em casa, as crianças
e os adolescentes vão procurá-lo nos sítios errados. Uma das razões
para o envolvimento precoce dos adolescentes em actividades
sexuais é a falta de amor em casa.
As crianças precisam de ambientes estruturados para poderem
crescer saudavelmente. Há pais e professores que confundem o
produto com o processo. Embora o objectivo de longo prazo seja
ajudar a desenvolver mentes abertas, livres e autónomas, esse
resultado atinge-se melhor com a criação de ambientes educativos
estruturados, onde os pais e os professores dispõem de autoridade e
exercem a autoridade. Infelizmente, há muitos pais e professores que
pensam que a moralidade convencional e as tradições são sempre
opressivas e devem ser substituídas pelo desregramento moral. Há
muitos pais que não sabem, não têm tempo ou não querem usar a
autoridade. O mesmo se passa com alguns professores. Infelizmente,
décadas de políticas educativas erradas têm vindo a retirar a
autoridade aos professores, fazendo com que lhes seja cada vez mais
difícil e penosa a criação de ambientes educativos onde haja normas,
respeito pelas regras e penalizações para os infractores.

67
CAP 27 Princípios Básicos da Nova Educação do Carácter (adaptado Por

Eduardo Nuno Fonseca de I. Menezes, 1999; Lickona, 1996)

Apresenta-se, de seguida, os princípios básicos da Nova Educação de

carácter agrupados numa grelha com duas colunas, uma para os princípios,

outra para as estratégias, com o objectivo de proporcionar uma leitura mais

clara e mais imediata desta proposta pedagógica.

Princípios Estratégias
1. A formação do carácter promove Os valores nucleares devem ser
valores éticos nucleares (cuidado, objecto de afirmação pública,
honestidade, justiça, definição em termos
responsabilidade, respeito por si comportamentais, modelagem,
próprio e pelos outros) como a base estudo e discussão, exigência de
do bom carácter. padrões de conduta consistentes.
2. O carácter deve ser definido de Ajudar os alunos e outros membros
forma abrangente para incluir da escola a conhecer o bem,
pensamentos, sentimentos e valorizá-lo e agir em consonância.
comportamentos.
3. Uma formação do carácter eficaz O programa deve envolver: o
requer uma abordagem intencional, exemplo dos professores, a política
pró-activa e abrangente que disciplinar, o currículo académico, o
promova os valores nucleares em processo de ensino e de avaliação, a
todas as fases da vida escolar. gestão da escola.

68
4. A escola deve ser uma A vida da escola, na sala de aula e
comunidade de cuidado. fora da sala de aula, deve estar
imbuída dos valores nucleares.
5. Para desenvolver o carácter, os Criar oportunidades práticas de
estudantes necessitam de desenvolvimento do carácter, através
oportunidades de acção moral. da aprendizagem cooperativa, do
trabalho comunitário, dos debates na
aula.
6. Uma formação de carácter eficaz Uso de métodos activos:
inclui um currículo académico aprendizagem cooperativa, técnicas
significativo e desafiante que de resolução de problemas, trabalho
respeita os alunos e os ajuda a ter de projecto, temas transversais,
sucesso. respeitando a forma como o aluno
aprende.
7. A formação do carácter deve visar Promover o compromisso intrínseco
desenvolver as motivações do aluno para com os valores
intrínsecas dos alunos. nucleares, especialmente através dos
procedimentos disciplinares.
8. Os profissionais da escola devem Todos os profissionais da escola
tornar-se uma comunidade moral em devem estar envolvidos no
que todos partilham a programa, na sua discussão e na sua
responsabilidade pela formação do implementação; as regras e os
carácter e tentam aderir aos valores que orientam a vida dos
mesmos valores nucleares que alunos são também válidos para os
guiam a educação dos alunos. profissionais; a escola deve
providenciar ocasiões de reflexão
sobre temas morais.
9. A formação do carácter requer Exercício de uma liderança do
uma liderança moral tanto dos programa pelos profissionais da
profissionais como dos alunos. escola, com responsabilidades
quanto à elaboração e
implementação; possibilidades dos
alunos exercerem papéis de
liderança.
10. A escola deve recrutar os pais e Reconhecer o papel dos pais como
os membros da comunidade como protagonistas na educação moral dos
parceiros integrais no esforço de seus filhos, envolvendo-os
construção do carácter. directamente no programa; pedir o
apoio de organizações da
comunidade.
11. A avaliação da formação do Questões a abordar: o carácter da
carácter deve incluir o carácter da escola, a evolução dos profissionais
escola, o funcionamento dos como educadores do carácter; o
profissionais como educadores carácter dos alunos (incluindo os três
morais e o grau em que os alunos domínios do carácter).
manifestam bom carácter.

69
CAP 28 Recomendações para a criação de programas de Nova
Educação do Carácter

Eduardo Nuno Fonseca

A Nova Educação do Carácter é uma abordagem que implica o esforço


deliberado de cultivar a virtude através da formação de bons hábitos,
despertando na mente e no coração dos alunos novos trilhos e a
direcção correcta. É uma metodologia pedagógica compreensiva,
transversal, planeada, desenvolvendo nos alunos o conhecimento,
competências e habilidades que permitam escolhas e acções
ponderadas e responsáveis, no contexto de uma escola pública
inserida em sociedades pluralistas e multiculturais.
A Nova Educação do Carácter (NEC) visa atravessar todos os
momentos da vida escolar com uma tónica relacionada com a
Formação Pessoal e Social e pretende envolver todos aqueles que
possam dar um contributo válido na prossecução desse propósito, ou
seja, em particular todas as referências humanas aptas e sensíveis a
esse intento. Este capítulo contempla algumas recomendações do
foro curricular (uma das facetas da abordagem escolar global)
baseadas na NEC (Nova Educação do Carácter). No âmbito curricular
formal apresentaremos algumas iniciativas que as disciplinas e os
respectivos docentes poderão contemplar no seu quotidiano
pedagógico, a saber: Currículo Centrado em Valores, Uso da
Literatura, Exercício sobre Qualidades Humanas, Actividades de
Expressão Escrita e Reunião de Turma.

Currículo Centrado em Valores


Todas as disciplinas deverão estar impregnadas de valores. No âmbito
curricular, recomendamos que, nas diversas disciplinas, sejam
promovidos espaços de reflexão e de diálogo emanados dos

70
conteúdos específicos que ilustrem, aludam e que convidem à análise
e à apreciação de determinadas virtudes. Numa perspectiva
transversal, quer nas aulas de ciências sociais e humanas, quer
através das designadas disciplinas duras (ciências, físico-química,
matemática) as considerações éticas e morais de cada tema e área
(caso seja apropriado) devem ser discutidas abertamente.
Igualmente, devem ser explicados em que medida hábitos como a
responsabilidade, coragem, perseverança e zelo são requeridos para
se ser um aluno bem-sucedido no domínio em consideração. As
regras da sala de aula e os trabalhos de casa devem reflectir esses
princípios. Recomendamos o uso frequente do ensino cooperativo, de
forma que os alunos incorporem o hábito de entreajuda. A
compreensão por parte dos alunos de que a ética não está confinada
a uma área específica e que o domínio em consideração não é
desprovido de uma faceta moral, é de suma importância no
desenvolvimento pessoal dos alunos. De uma ou outra forma, os
direitos e as responsabilidades do cidadão devem ser revisitados,
explanados e debatidos regularmente pelas diversas disciplinas. O
repto de como o aluno pode fomentar e concretizar hábitos de
cidadania activa e responsável deve ser um elemento constante na
interacção pedagógica.
Relativamente à especificidade de cada disciplina, cabe ao docente
poder planificar didáctica e pedagogicamente intervenções baseadas
nos conteúdos e nas competências relacionadas com o programa
disciplinar, assim como relacioná-las, quando possível, com o
contexto cultural e social dos próprios alunos. Concretamente, eis
uma breve exemplificação de como um conteúdo na disciplina de
Matemática pode ser apresentado de forma relevante e como pode
suscitar a reflexão e a imaginação moral e ser um meio privilegiado
de questionamento em práticas e condutas.
Concretização em Matemática. No 9º ano de escolaridade, logo no
primeiro tema, com a noção de probabilidade, alguns objectivos

71
específicos são delineados, a saber: a) reconhecimento que em
determinados acontecimentos há um grau de incerteza; b)
compreensão e uso das escalas de probabilidade de 0 a 1 ou de 0% a
100% e usar conscientemente as expressões muito provável,
impossível, quase improvável, equiprovável.
Uma das estratégias que podem ser aplicadas no âmbito da Formação
Pessoal e Social consiste na utilização, no contexto da sala de aula,
de notícias mediáticas pertinentes e interessantes para o escalão
etário em questão, contemplando matérias emocionalmente
significativas e que se encontram articuladas com as experiências
quotidianas dos adolescentes e que possam contribuir para os
seguintes objectivos específicos: a) promover uma sensibilização no
quadro de referências pessoais dos alunos em relação às
consequências que os seus actos (em sentido lato) têm na
configuração da sua própria vida; b) criar oportunidades para
informação e sensibilização em relação a assuntos relevantes; c)
conferir espaços que eventualmente possam permitir aos alunos
abertura e confiança, para expressarem alguma questão que os
inquieta, ou permitir aos professores identificarem sinais de
preocupação em algum aluno.
Um exemplo recente. A trágica morte de Francisco Adam de acidente
de automóvel (16 de Abril de 2006), sem razão aparente, após uma
noite na discoteca, com ingestão de álcool e de consumo de cocaína 1,
teve um enorme impacto emocional nos adolescentes que
acompanham fielmente os Morangos com Açúcar. Levanta-se a
questão em relação ao porquê do acontecido? A maioria dos alunos
associa tal trágico acontecimento a um “exclusivo assustador azar”. O
professor, na conversa gerada não deve perder o foco de questionar
em que medida o acontecido foi puramente desprovido de
relacionamento com alguma coisa já realizada ou permitida. O seu
1
A temática do consumo de drogas, mormente a cocaína, constitui um tema premente dado que, segundo
os últimos dados (2005), do relatório do Instituto da Droga e da Toxicodependência, tem-se registado a
prevalência do consumo desse estupefaciente nas populações escolares.

72
acidente sem razão aparente não pode ser dissociado dos resultados
da autópsia: o consumo de cocaína, a qual aumenta a sensibilidade à
luz (potenciando situações de encadeamento), devido à dilatação das
pupilas, e ainda provoca um excesso desmesurado de adrenalina e de
confiança. Os alunos devem ter conhecimento de que, por muito
prazer momentâneo, euforia e desinibição geradas, com a habituação
à droga torna-se impossível sentir prazer com qualquer outro tipo de
estímulo, além de outros efeitos nocivos (potencia o consumo
compulsivo, depressão, ideias suicidas e paranóicas, ansiedade e
irritabilidade). E numa condução, ou em situação similar, pode
aumentar exponencialmente a possibilidade de ocorrência, ou
utilizando a linguagem probabilística, ser um acontecimento
substancialmente provável.
Tal notícia convoca o professor no decurso da reflexão em conjunto (e
com o auxílio de ferramentas didácticas específicas), paralelamente
com a faceta científica, a sublinhar que a probabilidade é um
continuum, na quantificação da incerteza em relação a fenómenos
aleatórios ou que ainda se realizarão no futuro. Desde o
acontecimento nulo (0%) até ao acontecimento certo (100%), as
nossas decisões, práticas, abusos ou omissões, podem contribuir para
o aumento ou diminuição da possibilidade de ocorrência. O docente
deve desmistificar a ideia errada e nociva para a constituição de uma
cidadania informada, de que toda a sorte de situações que ocorrem
na vida de alguém estão totalmente dependentes daquilo que
prosaicamente se denomina sorte e azar.
O alvo é desafiar e contribuir para a formação sadia do quadro de
referências dos alunos no que concerne à responsabilidade pelos seus
actos, particularmente no que concerne às repercussões de um
hedonismo individualista sem limites. Levar os alunos a
compreenderem que, salvaguardando-se a imprevisibilidade
associada ao próprio percurso humano, em determinas áreas da vida,
são responsáveis (através do complexo de acções, omissões e

73
atitudes), pela variável que também incorporará a equação complexa
que estabelecerá o futuro (imediato e seguinte).
Considerações finais. Nas diversas disciplinas, os professores podem
convidar ex-alunos já formados e que estejam a exercer uma
cidadania consistente e interventiva, para testemunhar sobre a sua
experiência de vida e acerca das competências que os tornaram bem-
sucedidos e também hábitos que lhes criaram problemas. Em termos
globais, quer utilizando pessoas convidadas, análise de literatura,
visionamento de filmes, a sequência didáctica a seguir, em qualquer
um dos casos, deve ser iniciada pela exposição do modelo
representado. Depois procede-se à discussão alargada entre alunos e
professores acerca dos aspectos relevantes observados; a atenção
sobre cenas mais expressivas deve ser contemplada; não descurar
finalmente, a indicação dos benefícios obtidos com a conduta
exemplar do modelo para si próprio e para a sociedade e a imitação
ou compromisso de imitação. Vejamos em concreto, de seguida, a
utilização da literatura, de biografias, de um exercício sobre
qualidades humanas e duas actividades de expressão escrita. São
apenas exemplos de como actividades concretas podem realizar-se
no âmbito da abordagem da NEC no domínio da Formação Pessoal e
Social.

Uso da Literatura
As histórias têm sido reconhecidas extensivamente pela investigação
psicológica como pilar importante no desenvolvimento moral das
pessoas, sendo explicações vívidas que operam ao nível da
imaginação, tornando-se parte permanente da vida, um meio
privilegiado para transmitir e sustentar uma cosmovisão (1). As
histórias, as narrativas multiculturais e pessoais que visaram o bem
comum, os poemas, as lendas, a literatura clássica e outros tipos de
escritos visam a aquisição de literacia moral, pelo menos ao nível de
um patamar mínimo.

74
Eis um exemplo de um trecho literário que convoca à reflexão,
nomeadamente a esfera do Cuidado, Responsabilidade e Respeito
parental: What a Baby Costs (Edgar Guest), integrado no The Book of
Virtudes, de William Bennet (2). Nunca é demasiado cedo para ir
causando a impressão aos mais novos, das responsabilidades
inerentes da maternidade e da paternidade, contribuindo para
poderem no futuro ser os melhores pais possíveis. Uma das temáticas
que certamente derivaria do decurso da análise e reflexão do poema
proposto seria algum aspecto concernente à Educação Sexual. Ora
num país como Portugal, que tem a segunda taxa mais alta de
gravidezes de adolescentes na União Europeia, e onde o assunto da
Educação Sexual tem suscitado inclusive variadas intervenções,
parece-nos de especial relevância trazer junto dos alunos espaços
efectivos de ponderação sobre assunto tão pertinente, em particular
no grupo etário do 3º ciclo de escolaridade da Educação Básica. No
ano de 2004, a temática da Educação Sexual como vertente
educativa convocou à praça pública inúmeras intervenções, existindo
uma polémica polarizada entre aqueles que eram considerados
exclusivamente a favor dos métodos contraceptivos e os que eram
acusados de apoiar a abstinência. Assim, a possibilidade da Educação
Sexual ficar confinada a um exclusivo patamar de minimização ou de
precaução, denunciando o niilismo substantivo formativo proposto,
demonstra a urgência de um currículo permeado de valores no
enquadramento da NEC. Eis o poema:

75
“For babies people have to pay “Who buys a baby has to pay
“How much do babies cost?” said he
A heavy price from day to day- A portion of the bill each day;
The other night upon my knee;
There is no way to get one cheap. He has to give his time and
And then I said: “They cost a lot;
Why, sometimes when they’re fast asleep thought
A lot of watching by a cot,
You have to get up in the night Unto the little one he’s bought.
A lot of sleepless hours and care,
And go and see that they’re all right. He has to stand a lot of pain
A lot of heartache and despair,
But what they cost in constant care Inside his heart and not complain;
A lot of fear and trying dread,
And worry, does not half compare And pay with lonely days and sad
And sometimes many tears are shed
With what they bring of joy and bliss- For all the happy hours he’s had.
In payment for our babies small,
All this a baby costs, and yet
But every one is worth it all. You’d pay much more for just a kiss.
His smile is worth it all, you bet”

Proposta de Actividade: no âmbito da disciplina de inglês traduzir o


poema para português, certificando que todo o aluno compreende o
teor do mesmo, enriquecendo a esfera didáctica e científica dos
objectivos e competências disciplinares da língua inglesa. Depois,
num primeiro momento, procede-se à leitura individual, sendo
fundamental que as questões principais sejam identificadas por todos
os alunos. Só depois se procede à reflexão individual, para que todos
os alunos pensem e elaborem a sua posição, solicitando-se que o
façam por escrito. O segundo momento é constituído pela elaboração
de pequenos grupos, onde as diversas questões propostas e os
respectivos argumentos aduzidos pelos diversos membros de cada
grupo serão compartilhados. Cada grupo terá um porta-voz que
resumirá os comentários mais substanciais e permitirá que todos os
alunos da turma possam escutar e interagir, gerando um processo
dialógico válido no aprofundamento das posições.
Questões propostas: a) quais as evidências de cuidado no poema?; b)
que situações demonstram responsabilidade no tratamento do bebé?
que consequências existiriam se não fossem providenciados?; c) “But
every one is worth it all”: tal expressão substancia que faceta
humana? porquê? d) como é possível conciliar aparentes eixos
contraditórios (alegria/bem-aventurança) com (lágrimas/dor)? e)

76
comenta a seguinte frase: “All this a baby costs, and yet, His smile is
worth it all, you bet” f) pensas que os teus amigos estão cientes de:
“they cost a lot” e “a heavy price from day to day” no relacionamento
com uma criança? g) com base no poema caracteriza a pessoa que
lida com o bebé;
O professor utilizará as contribuições dos alunos para poder paulatina
e convergentemente sublinhar e enaltecer alguns aspectos morais
que emanam do poema. Tal instrumento pedagógico concede
conhecimento acerca do que são as virtudes (principalmente Cuidado
e Responsabilidade) e os respectivos opostos, como se manifestam
na prática, como se podem reconhecer e como no plano operativo se
expressam. Essa mina rica de património moral, onde é evidenciado
os grandes desafios e preocupações axiológicos da existência
humana, deve ser utilizada como material de discussão, como base
para a análise crítica de personagens e tópicos morais e como
plataforma para o desenvolvimento de debate sobre valores que se
manifestam em espaços humanos concretos e enquadrados (3).
Propomos então que as disciplinas de línguas (Português, Inglês e
Francês) e as próprias disciplinas de ciências sociais e humanas
(História, Geografia) possam utilizar a literatura, no sentido amplo do
termo, como abordagem curricular transversal. Tal utilização suplanta
a explicação de pendor mais intelectual que ocorre em palestras,
explicações de regras, ou análise e explanação de proposições e
princípios morais.
O professor deve evitar, em termos pedagógicos, abordar a essência
e as implicações de índole moral do texto sem previamente tratar de
uma fase preliminar que não ignore a riqueza, beleza ou
complexidade do texto. As seguintes questões podem ser incluídas
nas perguntas iniciais de teor generalista: “Que pensamentos ou
emoções surgiram ao ler este texto?”, “Que características principais
possui [nome do personagem]?”, “Quais as motivações/razões que
levaram o autor a escrever o texto?”, “O que será que quis transmitir

77
essencialmente ao leitor?” O docente deve primar por um clima
aberto de diálogo e de abertura a todas as opiniões, apesar de
simultaneamente se deva frisar que o direito inalienável de possuir e
expor uma opinião em determinadas áreas da vida humana, não
resulta linearmente que tal posição esteja correcta. Os alunos devem
ficar com uma ideia clara sobre a lição moral que se pode extrair do
texto, ora sublinhando uma ou mais virtudes ou expressando os
respectivos vícios associados.
Particularmente, nas disciplinas associadas às línguas e à disciplina
de História, recomendamos que sejam lidas e discutidas biografias de
todas as áreas de estudo, com o propósito de ajudar os alunos a
reconhecerem e a motivarem-se devido aos traços de carácter em
questão e as suas características específicas. Ao estudar grandes
personalidades, o estudo do “todo” do carácter de uma pessoa é uma
lição importante de compaixão e discernimento. Nesse sentido pode
considerar-se um debate com a seguinte questão: “Pode-se ser uma
personalidade ilustre e mesmo assim ter falhas no carácter?” Ainda
no plano de actividades os docentes devem propor trabalhos
escolares sobre alguém (“O meu herói pessoal”), que foquem os
feitos e virtudes morais da pessoa. Todavia, para que tais actividades
tenham pertinência acrescida na formação dos alunos, é necessário
numa fase anterior ajudar os alunos a perceber o que constitui uma
vida particularmente nobre ou que realmente encerra e implica a
existência de determinadas qualidades humanas.
A recente iniciativa relacionada com a análise e com a eleição do
Maior Português de todos os Tempos constituiu um excelente
pretexto pedagógico para que a Escola pudesse utilizar esta
oportunidade e transversalmente reflectir a inerente faceta pessoal de
cada um dos potenciais nomeados e comunitariamente eleger e
promover iniciativas em torno da pessoa e consequentemente sobre
os seus feitos e áreas de intervenção. Na Escola onde presentemente
estamos, Escola Básica 2 3 Aristides de Sousa Mendes, dado a

78
designação do estabelecimento, foi um desafio ao estudo, análise e
reflexão sobre o contributo de Aristides de Sousa Mendes no contexto
da Segunda Grande Guerra, nomeadamente no auxílio prestado a
refugiados que queriam fugir do encalço do domínio nazi. A
compaixão de Sousa Mendes e o respeito pela dignidade do ser
humano foi evidente e exemplar, levando-o corajosamente a abdicar
dos seus interesses pessoais e do seu futuro como diplomata. O seu
nome ficou nos 10 primeiros na eleição do Grande Português de todos
os tempos. Eis os focos principais da biografia de Sousa Mendes que
poderiam ser regularmente lembrados e enfatizados.
O cônsul português em Bordéus, Aristides de Sousa Mendes,
contrariando ordens de Salazar, passou milhares de vistos, salvando
seres humanos de uma morte certa. Somente em três dias em 1940,
ele e dois dos seus filhos mais velhos, trabalharam exaustiva e
ininterruptamente. Segundo o Rabi Kruber, nesses três dias, passou
uns 30 mil vistos, dos quais 10 mil a judeus, pelo menos. Os cônsules
das cidades de Bayonne e de Hendaye, cumprindo as directivas do
regime português, recusaram-se a fazê-lo. Porém, sendo o Dr.
Mendes o superior hierárquico de ambos, deslocou-se pessoalmente a
essas cidades, e é ele mesmo quem, mais uma vez, passa milhares
de vistos. Quando as autoridades fronteiriças espanholas deixaram de
aceitar os vistos passados por Sousa Mendes, este não se resignou e
acompanhou pessoalmente um grande número de refugiados através
da fronteira para lhes assegurar a passagem. A sua própria residência
(imediatamente por trás dos escritórios do consulado em Bordéus)
estava repleta de refugiados, onde a sua mulher, Angelina,
diligenciava junto das crianças e dos idosos que careciam de cuidado.
Os refugiados que se deslocavam para Portugal, permaneciam na
casa do cônsul, na zona de Viseu, enquanto esperavam embarque
para outros continentes. As consequências do seu acto heróico
fizeram com que, depois de 32 anos de serviço e ainda com 12 filhos
ainda por educar, fosse demitido sem receber qualquer reforma ou

79
indemnização. Em Abril de 1954 morre num hospital de franciscanos
para pessoas sem posses, pobre e desonrado, com trombose cerebral
agravada por pneumonia.2

Eis algumas actividades propostas:


a) visualização do Documentário para a RTP 2, feito pela Diana
Andringa, onde entrevista vários dos sobreviventes que conseguiram
obter o visto em Bordéus e conseguiram escapar para a América. É
um documento cheio de emoções onde, além de ser traçado o perfil
de Sousa Mendes, do seu humanismo, narra igualmente a miséria e o
desprezo a que foi votado em Portugal devido aos seus actos
altruístas em prol da preservação de milhares de vidas
independentemente da sua etnia ou religião. Recentemente, a
proposta e a defesa de José Miguel Júdice de Sousa Mendes como o
Maior Português de Sempre, deu origem a um relevante programa
televisivo que também poderia ser utilizado.
b) desafiar os alunos a explicarem a exclamação do Rabi Chaim
Kruger: A grosse Mensche, um grande Homem! Realização de um
poster, poderia ser um concurso anual, sujeito a esse mote.
c) os alunos pesquisam e reflectem sobre o primado do respeito à
pessoa humana, com base na conversa com o Rabino Chaim Kruger,
judeu polaco, que teve uma audiência com Sousa Mendes, pensando
que este tinha raízes judaicas, dado o seu apelido.
d) elaboração de ensaios subordinados ao tema: a grandiosidade de
Sousa Mendes… como o seu testemunho de vida me inspira em
alguma área da minha vida…

2
Fonte: http://www.vidaslusofonas.pt/sousa_mendes.htm; http://www.uc.pt/iej/alunos/1998-
99/asm/1pagna.htm; (páginas disponíveis; acedidas em 8 de Janeiro de 2007).

80
Exercício sobre Qualidades Humanas

O professor distribui dois exemplares da lista pelos alunos e pede a


cada um deles que faça a sua classificação de si próprio. De seguida,
pede a cada um que classifique o colega da direita. Por fim, os alunos
comparam as classificações, confrontando os pontos de vista e os
argumentos aduzidos e procedem a uma discussão entre pares ou em
pequenos grupos. Os alunos podem destacar qual a maior qualidade
ou defeito do colega (4). Em termos de benefícios este exercício
proporciona: a) é mais uma oportunidade dos alunos lidarem com
conceitos fundamentais à sua literacia ética (traços
positivos/negativos de carácter); b) oportunidade de reflexão
individual sobre o seu quadro de referências aplicado essencialmente
à vida escolar; c) confronto com a perspectiva de terceiros, aspecto
essencial ao auto-conhecimento e a correspondente faceta afectiva
(humildade), imprescindível para o processo de desenvolvimento do
carácter; d) apreciação e enaltecimento de aspectos do traço de
carácter dos alunos e dos seus colegas; e) contribui para a
compreensão de hierarquia de valor (graus de concretização
diferenciados);

Manifest
Não Manifesta Manifesta
Traços de Manifest a O
manifesta muito regularme
Carácter a pouco Bastant bs.
de todo pouco nte
e
Justo
Honesto
Inconstante
Respeitador

81
• Eu trato as outras pessoas da mesma forma como desejo ser tratado;
• Eu interajo com as pessoas com civilidade, cortesia e dignidade.
• Eu aceito diferenças pessoais.
• Eu tento resolver os problemas sem recurso à violência verbal e física.

• Eu não ridicularizo, embaraço ou magoo outros intencionalmente.


Tolerante
Preguiçoso
Paciente
Responsável
• Eu efectuo aquilo que é necessário fazer.
• Eu sou seguro e digno de confiança.
• Eu presto contas das minhas acções; eu não estou sempre a apresentar
desculpas ou a acusar os outros;
• Eu cumpro as minhas obrigações morais.
• Eu uso bom julgamento e penso nas consequências dos meus actos.

• Eu exerço controlo-próprio.
Outros aspectos a incorporar: autoritário, corajoso, intriguista, preocupado com
outros, egoísta, cortês, incumpridor, bondoso, impaciente, compreensivo e
imprudente;

Actividades de Expressão Escrita


As actividades de expressão escrita constituem um meio eficaz para
os alunos poderem confrontar-se com a realidade, tomar consciência
do meio onde se desenvolvem, permitindo a ordenação da própria
realidade e desafiando a consciência de quem escreve e apelando à
sua dimensão crítica e racional. As duas actividades que serão
apresentadas são: um conjunto de questões objectivas relacionadas
com o respeito e com a responsabilidade e uma actividade designada
Um telegrama para um Amigo.
Respeito e Responsabilidade. Em relação ao Respeito: a) Assiste na
TV a um programa e depois escreve acerca das acções dos
personagens que demonstraram ora uma conduta denunciadora de
respeito ou não; b) aqueles que são perpetradores de bullying estão
sempre a tentar que os outros os “respeitem”. Isso é realmente
respeito ou imposição de medo? Qual é a diferença? Como é que o
bullying e o comportamento violento constituem actos de
desrespeito? c) escreve acerca de uma ocasião de que foste

82
desrespeitoso para alguém. Porque isso aconteceu? Quais foram as
consequências? Como a outra pessoa se sentiu? O que aprendeste
dessa experiência? d) descreve 3 coisas que podes passar a fazer
para seres alguém mais respeitador. Como é que isso afectaria as
tuas relações com os outros? Em relação à Responsabilidade: a)
consideras-te uma pessoa responsável? Porquê? Em que medida e
em que áreas?; b) pensa em alguém que conheces que é bastante
responsável. Como é que essa pessoa demonstra responsabilidade?
c) o que é que a Regra de Ouro tem a ver com a responsabilidade? d)
tem sido dito que: “não existem direitos sem responsabilidade e não
existe responsabilidade sem direitos”. O que tal expressão significa?
Concordas? Qual a relação entre direitos e responsabilidades? e) será
que existem benefícios de ser uma pessoa responsável? Em que
medida é que a tua vida é positivamente afectada pelo exercício da
responsabilidade de outros? Dá exemplos práticos.
Um telegrama para um Amigo. O professor pede aos alunos que
escolham um amigo que esteja a passar alguma situação difícil que
carece de apoio e ajuda. De seguida, solicita aos alunos que lhe
escrevam um telegrama com um máximo de 6 linhas, dando-lhe um
conselho. Exemplos de início do telegrama:
- eu sei que foi difícil apanhares uma nota negativa pela primeira vez
mas há uma maneira de ultrapassares esse insucesso…
- eu sei que ficamos tristes quanto temos dificuldade em arranjar
amigos mas há coisas que tu podes fazer para te aproximares dos
outros…
- eu sei que é horrível ser vítima de uma injustiça mas há formas de
resistirmos…
- eu compreendo a tua situação. Deixa-me compartilhar algo similar
que aconteceu comigo…

Seguidamente, a actividade terminaria com o desafio para escrever


uma única frase que pudesse mencionar o compromisso pessoal do

83
aluno, em que nos próximos dias, de alguma forma, interviria directa
ou indirectamente, no apoio ou minimização da situação problemática
do seu amigo. O professor complementaria mencionando o papel
decisivo que cada um pode ter na resolução ou na minimização dos
processos delicados em outras vidas. Enfatizaria que por vezes, não
havendo possibilidade de ajudar em termos concretos na solução do
problema, a manifestação de interesse e de presença junto da
pessoa, que está passar pelo momento conturbado, é já em si mesma
uma acção válida e nobre no domínio interpessoal.

Reunião de Turma
A implementação da Reunião de Turma é algo que deveria ser uma
realidade em todas as turmas de todos os níveis de escolaridade
numa Escola. Tal iniciativa cristaliza um princípio educacional assente
no envolvimento de estudantes em realizar decisões que visem o
aperfeiçoamento do ambiente na própria sala de aula. Providenciar
reuniões regulares de turma (semanalmente com os Directores de
Turma e quinzenalmente com a presença de outros professores da
classe), onde é providenciada uma experiência democrática sob a
direcção ou do Director de Turma ou de um aluno que possa ser
coadjuvado, onde de uma forma consciente uma comunidade
delibera, tornando os estudantes membros plenos na concretização
da melhor vida em classe de aula possível, é de facto uma meta
educacional válida e que deve ser implementada levando em
consideração a NEC.
O papel e as responsabilidades dos alunos são ampliados, bem como
nutre, particularmente no decurso do processo, o desenvolvimento
moral dos alunos. Através da comunicação face a face (realizada
idealmente em círculo), aperfeiçoa a capacidade de escutar
respeitosamente os outros e compreender as suas perspectivas.
Providencia um fórum onde os pensamentos dos alunos são
valorizados e onde podem ganhar estima-própria que deriva da

84
possibilidade de se expressarem num grupo. Nutre o
desenvolvimento das três áreas do carácter através do desafio
contínuo de colocar o respeito e a responsabilidade em prática no
quotidiano da vida na sala de aula. Nas resoluções de problemas no
seio da sala de aula, as medidas que o grupo democraticamente
delibera não serão muito diferentes daquelas que os professores têm
praticado mas com o envolvimento directo dos alunos no
estabelecimento dos preceitos funciona melhor. É uma metodologia
prática que ajuda a estabelecer alguns princípios orientadores para a
vivência dentro da sala de aula, e a promover a solidificação de
valores que em alguns casos não são valorizados nos ambientes
familiares. Ajuda ainda o docente a conhecer melhor os seus alunos e
estes entre si, e eventualmente concede as lições embrionárias do
que significa a participação democrática na prática. É um contributo
para a formação, no nosso contexto tão necessária, de uma real
cidadania democrática, através da participação interactiva de todos os
alunos que desejavelmente crie nos próprios o valor da participação.
Todavia, requer persistência e paciência por parte do professor,
reconhecendo que o crescimento moral da turma e o
desenvolvimento moral e social de cada um dos alunos é um processo
gradual. Consiste num exercício bastante desafiador pois inclusive
pode degenerar numa experiência antagónica em relação ao
propósito inicial. O receio deriva do facto da discussão poder tornar-
se contraproducente, quando os alunos não têm interiorizadas
capacidades mínimas de escuta e comunicação, se não respeitarem a
sua vez para tomar a palavra, se não centrarem as intervenções
naquilo que está a ser considerado e se monopolizarem as
participações. Assim, ao invés de ser um espaço privilegiado, e
processualmente ser uma mais-valia em termos de competências
sócio-morais, pode tornar-se num vívido exercício de mútuo
desrespeito, particularmente na fase da discussão que se pretende
minimamente ordeira. Se tal acontecer a Reunião de Turma pode

85
constituir-se como um exercício para que tais competências possam
ser trabalhadas e desenvolvidas antes mesmo de qualquer
preocupação com os objectivos finais da iniciativa.

Considerações Finais
As propostas de âmbito curricular são elementos que podem
contribuir para a construção de uma Escola Ética onde a formação
integral dos alunos seja claramente uma meta educativa. Conforme
sublinhámos na introdução deste capítulo, trata-se de uma valência
que pertence a um esforço mais amplo e transversal que Escola
deverá assumir, nomeadamente o desenvolvimento e defesa de um
Ethos que sublinhe e que seja expressão de um acervo de qualidades
humanas assumido. Todavia, acreditamos que neste domínio
curricular muito mais poderia ser feito, de forma planeada e
intencional, de forma a nutrir e a cimentar não só a literacia ética dos
alunos mas o seu próprio desenvolvimento pessoal e social, a sua
constituição moral, o seu carácter. Esperamos, desse modo, que este
capítulo possa ser um incentivo e constituir um repositório de
algumas possibilidades de concretização que podem ser
desenvolvidas e capitalizadas pelas diversas disciplinas.

Notas

1) Kilpatrick, W., Wolfe, G., & Wolfe, S. (1994). Books That Build Character
– A Guide to Teaching Your Child Moral Values Through Stories. New York:
Simon and Schuster.

2) Bennett, W. J. (1993). The Book of Virtues, a Treasury of Great Moral


Stories. New York: Simon & Schuster.

3) Saunders, J. (2003). Teaching Character Through the Classics. The


Fourth and Fifth Rs, 10(1), 4-5.

86
4) Marques, R. (2002). Valores Éticos e Cidadania na Escola. Lisboa:
Editorial Presença.

CAP. 29 Dez mandamentos para os pais

1º mandamento – Coloque a função de mãe e pai em primeiro lugar

Há pais que pensam que educar um filho é apenas tarefa da


escola. Inebriados com o sucesso profissional ou confrontados com
um trabalho que não deixa tempo livre, muitos pais não se envolvem,
diariamente, na educação dos filhos. Entregam-nos à escola e julgam
que essa tarefa é apenas dos professores. Estão enganados. Educar
uma criança exige atenção e disponibilidade. Os bons pais colocam a
educação dos filhos em primeiro lugar e não enjeitam
responsabilidades que são deles.

2º mandamento –Seja um bom exemplo

Ninguém gosta de ser considerado continuadamente um bom


exemplo. É uma tarefa árdua e difícil. Exige muitas renúncias.
Contudo, pode estar certo que os filhos imitam os pais, naquilo que
eles têm de bom e de mau. Quando um pai dá exemplo de não gostar
de trabalhar, de desonestidade ou de irresponsabilidade, é certo que
está a transmitir uma mensagem errada aos filhos: é correcto ser
preguiçoso, desonesto e irresponsável. Se quer dar bons exemplos
aos seus filhos, seja diligente, pontual, trabalhador, honesto e justo.
O seu exemplo vale mais do que mil lições de moral.

87
3º mandamento – Esteja atento

Educar um filho não é tarefa para se fazer sozinho. Os outros


familiares, os amigos, os vizinhos, os professores e até os vigilantes
são, também, agentes que educam pelo exemplo. Por isso, esteja
sempre atento aos que rodeiam o seu filhos, aos amigos, aos vizinhos
e também ao que se passa na escola.

4º mandamento – Envolva-se na escola do seu filho

O envolvimento parental no processo educativo é uma variável


que está geralmente associada ao bom desempenho escolar. Vá às
reuniões, converse com os professores, peça e dê informações e
colabore com os professores. Não faça críticas aos professores na
presença dos seus filhos.

5º mandamento – Controle e limite o acesso do seu filho à televisão e


à Internet

Muitos conteúdos televisivos são telelixo e têm efeitos


devastadores na educação do carácter das crianças. As crianças que
vêem muita televisão e passam muito tempo a navegar na Internet
têm mais probabilidades de serem obesas. Para além disso, ao
impedir que o seu filho tenha acesso a conteúdos que deformam a
mente, que distorcem a realidade e que invertem os valores, você
está a proteger o seu filho e a proporcionar-lhe um ambiente
saudável.

88
6º mandamento – Concentre-se no que é fundamental

Não tente que o seu filho seja um herói ou um santo. Centre a


sua atenção naquilo que são os valores fundamentais, comuns a
todas as civilizações e que estão no cerne da Cultura Ocidental:
prudência, justiça, temperança, coragem, honestidade,
responsabilidade e compaixão.

7º mandamento – Use linguagem moral

Não diga que o comportamento é apropriado ou inapropriado.


Diga simplesmente que é bom ou mau, correcto ou incorrecto. As
crianças têm de saber que há comportamentos que são sempre maus
ou bons e não apenas inapropriados ou apropriados.

8º mandamento – Centre a sua acção na acção

Os discursos sobre a moral têm pouco efeito na educação do


carácter. O mais importante de tudo são os hábitos. Certifique-se de
que a sua filha desenvolve bons hábitos. Quanto aos maus hábitos,
certifique-se de que o seu filho está envolvido num processo de
correcção e de substituição dos maus hábitos por bons hábitos. As
crianças devem saber que os comportamentos são mais importantes
do que as intenções e os argumentos.

9º mandamento – Coloque a educação do carácter em primeiro lugar

89
De que vale ter um filho que tem classificações excepcionais se
ele é irresponsável, imprudente, intemperado, injusto e malcriado?
Coloque a educação do carácter no centro das preocupações e
mostre que não dá menos importância às virtudes morais do que às
virtudes intelectuais. Não se esqueça de que o extermínio dos judeus
pelos nazis foi conduzido por gente inteligente e culta.

10º mandamento – Ame os seus filhos e mostre que os ama

Não se esqueça de que o amor é o sentimento mais forte e


mais importante que existe. A virtude da amizade, onde se inclui o
amor, é a virtude primeira, no sentido de que é a virtude essencial à
conquista da felicidade.
Se não mostrar que ama o seu filho, ele procurará o amor nos
sítios errados com as pessoas erradas (1).

Notas

1) Este texto foi inspirado em Ten commandments for parents. In


Ryan, K. e Bohlin, K (1999). Building Character in Schools. S.
Francisco: Jossey Bass

90
Bibliografia

Antis, J. (1997). Schoolwide Character Education. Em A. T. Lockwood (Ed.),


Character Education: Controversy and Consensus. Thousand Oaks: Corwin
Press, 60-68.

Araújo, L. (2005). Ética, uma Introdução. Estudos Gerais, Série


Universitária. Imprensa Nacional Casa da Moeda.

Aristóteles (Séc. IV A.C./2004). Ética a Nicómaco. Lisboa: Quetzal.


(Tradução do grego e apresentação de António Caeiro).

Arthur, J.
(2003a). Education with Character: The Moral Economy of Schooling.
London: Routledge.
(2003b). Character Education in British Education Policy. Journal of
Research in Character Education, 1(1).
(2003c). Citizenship and Character Education in British Education Policy
[Em linha] URL:
<http://www.citized.info/index.php?item=1&ItemID=114&detail=abstra
ct&k1=james&k2=arthur>.
(2005). The Re-Emergence of Character Education in British Education
Policy. British Journal of Educational Studies, 53(3), 239-254.

Ascombe, G. (1958). Modern moral philosophy. Philosophy, 33, 1-19.

Aspen Declaration (1992). Marina Del Rey, California: Josephson Institute of


Ethics.

Azevedo, M.
(1995). O desenvolvimento moral na perspectiva do desenvolvimento
cognitivo de Kohlberg. Texto não publicado. Lisboa: Universidade de
Lisboa, Departamento de Educação da Faculdade de Ciências.
(1996). Meanings of the moral domain. Em M. O. Valente, A. Bárrios, A.
Gaspar & V. D. Teodoro (Eds.), Teaching training and values education.
Lisboa: Departamento de Educação da Faculdade de Ciências da
Educação.

Barreto, António (2005). A ilusão magnífica. Em Suplemento Especial Visão


‘O Estado da Nação’, 6-11.

Beane, A. (2006). A Sala de Aula sem Bullying. Porto: Porto Editora.

2)Bennett, W. J. (1993). The Book of Virtues, a Treasury of Great Moral


Stories. New York: Simon & Schuster.

91
Benninga, J. S., Berkowitz, M. W., Kuehn, P., & Smith, K. (2003). The
relationship of character education implementation and academic
achievement in elementary schools. Journal of Research in Character
Education, 1(1), 19-32.

Berkowitz, M. W.
(2002). The Science of Character Education. Em W. Damon (Ed.), Bringing
in a New Era in Character Education. Stanford, CA: Hoover Institution
Press, 43-63.
(2006, Março). Why Character Education Matters. Comunicação
apresentada no Congresso OnLine subordinado ao tema “Character
Education in a World of Budget Cuts and Standardized Testing!”,
promovido pela Icohere, acedido em URL:
www.conferences.icohere.com, 8 a 10 de Março.

Berkowitz, M. W. & Bier, M. C.


(2005a). What works in Character Education? A research-driven guide for
educators. Washington, DC: Character Education Partnership.
(2005b). What works in Character Education? A report for policy makers
and opinion leaders. Washington, DC: Character Education Partnership.
(2005c). Character Education: A study of effective character education
programs shows that full parent involvement is a must. Educational
Leadership, 63(1), 64-69.

Berreth, D. (2006, Março). Three Journeys: Character in Thinking, Feeling &


Action. Comunicação apresentada no Congresso OnLine subordinado ao
tema “Character Education in a World of Budget Cuts and Standardized
Testing!”, promovido pela Icohere, acedido em URL:
www.conferences.icohere.com, 8 a 10 de Março.

Bohlin, K. (2006, Março). Teaching Virtue: the Heart of Character.


Comunicação apresentada no Congresso OnLine subordinado ao tema
“Character Education in a World of Budget Cuts and Standardized
Testing!”, promovido pela Icohere, acedido em URL:
www.conferences.icohere.com, 8 a 10 de Março.

Brogan, B. & Brogan, W. A. (1999). The formation of character: a necessary


goal for success in education. The Educational Forum, 63(4), 348-355.

Brooks, B. D. & Goble, F. G. (1997). The case for Character Education, The
Role of the School in Teaching Values and Virtue. Northridge: Studio 4
Productions.

Bruckner, P. (1996). Filhos e Vítimas: O tempo da inocência. Em E. Morin, I.


Prigogine e outros. A Sociedade em Busca de Valores. Lisboa: Instituto
Piaget, 51-62.

Burton, R. V. (1976). Honesty and Dishonesty. Em T. Lickona (Ed.), Moral


development and behaviour: Theory, research and social issues. New
York: Holt, Rinehart and Winston, 173-197.

92
Bush, G. (2001). Building a Nation of Character. The Fourth and Fifth Rs,
7(2), 6.

Carita, A. & Abreu, I. (1994). Formação Pessoal e Social - Desenho


Curricular. Cadernos de Formação Pessoal e Social, 3, Lisboa: Instituto de
Inovação Educacional.

César, M. & Oliveira, I. (2005). The curriculum as a tool for inclusive


participation: Students’voices in a case study in a Portuguese multicultural
school. European Journal of Psychology of Education, 20(1), 29-43.

Colby, A. (2002). Whose Values Anyway?. Em W. Damon (Ed.), Bringing in a


new era in character education. Stanford, CA: Hoover Institute Press, 149-
171.

Coménio, J. (Séc. XVII D.C./1957). Didáctica Magna (4.ª ed.). (Introdução,


Tradução e Notas de Joaquim Ferreira Gomes). Fundação Calouste
Gulbenkian. (Tradução do texto latino de 1957).

Comte-Sponville, A. (1996). Uma moral sem fundamento. Em E. Morin, I.


Prigogine e outros. A Sociedade em Busca de Valores. Lisboa: Instituto
Piaget, 133-153.

Constituição da República Portuguesa (1997). 4ºRevisão, Prefácio e


Anotações de Jorge Lacão, Lisboa: Texto Editora.

Cortesão, L. (1981). Escola, Sociedade. Que Relação? (3.ª ed.). Porto:


Edições Afrontamento.

Cunha, P. (1996). Ética e Educação. Lisboa: Universidade Católica Editora.

Curwin, R. L. (1993). The Healing Power of Altruism. Educational


Leadership, 51(3), 36-39.

DeRoche, E. F. & Williams, M. M. (2001). Educating Hearts and Minds, a


Comprehensive Character Education Framework (2ªed.). Thousand Oaks:
Corwin Press.

Domingues, Ivo (1995). Controlo Disciplinar na Escola – Processos e


Práticas (1.ª ed.). Lisboa: Texto Editora.

Ellenwood, S. (1996). Values and Character in Schools. Em M. O. Valente,


A. Bárrios, A. Gaspar & V. D. Teodoro (Eds.). Teaching Training and Values
Education. Lisboa: Departamento de Educação da Faculdade de Ciências
da Educação, 121-135.

Esteve, J. (1991). Mudanças Sociais e função docente. Em A. Nóvoa (Org.).


(1991). Profissão Professor. Porto: Porto Editora.

93
Etzioni, A. (2002). A Communitarian Position on Character Education. Em W.
Damon (Ed.), Bringing in a New Era in Character Education. Stanford, CA:
Hoover Institution Press, 113-127.

Ferreira, P. M. (2003). Valores morais: as acções de “certo” e de “errado” na


transição pós-moderna. Em J. Vala, M. Villaverde Cabral e A. Ramos
(Coords.). Valores Sociais: mudanças e contrastes em Portugal e na
Europa. Lisboa: Instituto de Ciências Sociais, 98-121.

Frasquilho, M. A. (Dezembro, 1998). Stress na profissão docente: do


indivíduo ao sistema. Escolas promotoras da saúde. Lisboa: Comunicação
ao Seminário “Stress na Profissão Docente”, organizado pela Associação
Nacional dos Professores do Ensino Secundário e Associação Sindical dos
Professores Pró-Ordem.

Freixo, M. (2002). A Televisão e a Instituição Escolar. Lisboa: Instituto


Piaget.

Fukuyama, F. (1999). Como Remoralizar os Estados Unidos. Em A


Desmoralização da Sociedade: Mito ou Realidade, Nova Cidadania –
Liberdade e Responsabilidade Pessoal, 2, 22-31.

Galeão, T. F. (2006). O professorado liceal no final do Estado Novo:


Representações dos Professores. Tese de mestrado não publicada.
Especialidade de Formação Pessoal e Social, Departamento de Educação
da Faculdade de Ciências, Universidade de Lisboa.

Gatchel, R. H. (1972). The evolution of the concept. Em I. A. Snook (Ed.),


Concepts of indoctrination: Philosophical essays. London and Boston:
Routledge & Kegan Paul.

Gellner, E. (1992). Pós-Modernismo, Razão e Religião. Lisboa: Instituto


Piaget.

Gholar, C. (1997). Character Education: Creating o framework for excellence


[Em Linha] URL:
<http:///www.aces.uiuc.edu/%7Euplink/programs/character.html>.

Giddens, A. (2004). Sociologia (4.º ed. revista e actualizada). Lisboa:


Fundação Calouste Gulbenkian.

Gilness, J. (2003). How to Integrate Character Education into the


Curriculum. Phi Delta Kappan, 85(3), 243-246.

Grenz, S. (1996). A Primer on Postmodernism. Grand Rapids: Eerdmans.

Grilo, M. E. (2002). Desafios da Educação – ideias para uma política


educativa no século XXI (2.ª ed.). Lisboa: Oficina do Livro.

94
Hargreaves, A. (1998). Os professores em tempos de mudança: O trabalho
e a cultura dos professores na idade pós-moderna. Lisboa: McGraw Hill.

Hartshorne, H., & May, M. (1928-1930). Studies in the Nature of Character.


Vols 1, 2 ,3. New York: Macmillan.

Haynes, C. (2006, Março). The Intersection of Character Education, Religion


and Spirituality. Comunicação apresentada no Congresso OnLine
subordinado ao tema “Character Education in a World of Budget Cuts and
Standardized Testing!”, promovido pela Icohere, acedido em URL:
www.conferences.icohere.com, 8 a 10 de Março.

Henriques, M. (2000). Perspectivas Conceptuais da Educação para a


Cidadania. Em A educação para a cidadania na Europa nos últimos dez
anos, Lisboa, Nação e Defesa, 93, 35-52, Instituto de Defesa Nacional.

Hessen, J. (1932/2001). Filosofia dos Valores. Coimbra: Livraria Almedina.


(Trabalho original publicado em alemão em 1932).

Himmelfarb, G. (1999). Uma sociedade desmoralizada. As experiências


britânica e americana. Em A Desmoralização da Sociedade: Mito ou
Realidade, Nova Cidadania – Liberdade e Responsabilidade Pessoal, 2, 6-
21.

Hymowitz, K. S. (2000). O que aconteceu às crianças. Nova Cidadania –


Liberdade e Responsabilidade Pessoal, Ano II, 5, 32-39.

Johnson, H. C. (1987). Society, Culture and Character Development. Em K.


Ryan & G. F. MacLean (Eds.), Character Development in Schools and
Beyond. New York: Praeger, 59-93.

Kidder, R. M. (1991). Ethics is Not a Luxury: It’s Essential to Our Survival.


Education Week, 10(28), 31.

1) Kilpatrick, W., Wolfe, G., & Wolfe, S. (1994). Books That Build Character
– A Guide to Teaching Your Child Moral Values Through Stories. New York:
Simon and Schuster.

Kilpatrick, W. K.
(1983). Psychological seduction: The failure of modern psychology.
Nashville: Thomas Nelson.
(1992). Why Johnny can’t tell right from wrong: Moral illiteracy and the
case for character education. New York: Simon and Schuster.

Kirschenbaum, H. (1995). 100 Ways to Enhance Values and Morality in


Schools and Youth Settings. Allyn & Bacon.

Kohlberg, L.
(1970). Moral stages as a basis for moral education. Em E. Sullivan & J.
Rest (Eds.) Moral Education. University of Toronto, Canadá.
(1975). The Cognitive Development Approach to Moral Education. Phi
Delta Kappan, 46, 642-67.

95
(1976). Moral Stages and Moralization: The Cognitive-Development
Approach. Em T. Lickona (Ed.), Moral development and behaviour:
Theory, research and social issues. New York: Holt, Rinehart and
Winston.

Kohn, A. (1997). How not to teach values: A critical look at character


education. Em Studies in Moral Development and Education Home Page
[Em linha] URL: <http//www.uic.edu/~lnucci/MoralEd/index.html>.

Kristol, I. (2002). Moral and Ethical Development in a Democratic Society.


Em W. Damon (Ed.), Bringing in a New Era in Character Education.
Stanford, CA: Hoover Institution Press, 189-198.

Lapsley, D. & Marvaez, D. (2006). Character Education. Em W. Damon, R.


Lerner, K. Renninger & I. Sigel (Eds). Handbook of Child Psychology . 6ª
edição, Vol. 4. Child Psychology in Practice.

Laud, L. (2001). The Heart of Character Education. The Fourth and Fifth Rs,
7(3), 6.

Lei nº 46/86, de 14 de Outubro (Lei de Bases do Sistema Educativo).

Leming, J. S.
(1993). In Search of Effective Character Education. Educational
Leadership, 51(3), 63-71.
(1997). The Current Condition of Character Education. Em A. T. Lockwood
(Ed.), Character Education: Controversy and Consensus. Thousand
Oaks: Corwin Press, 22-30.

Lickona, T.
(1976). Critical Issues in the Study of Moral Development and Behaviour.
Em T. Lickona (Ed.), Moral development and behaviour: Theory,
research and social issues. New York: Holt, Rinehart and Winston, 3-27.
(1983). Raising Good Children, From Birth Through the Teenage Years.
New York: Bantam.
(1991). Educating for character: How our schools can teach respect and
responsibility. New York: Bantam.
(1993). The return of Character Education. Educational Leadership, 51(3),
6-11.
(1996). Eleven principles of effective character education. Journal of Moral
Education, 25(1), 93-100.
(1999). Religion and Character Education. Phi Delta Kappan. Bloomington,
81(1), 21-26.
(2004). Character Matters. New York: Simon & Schuster.

Lickona, T., & Davidson, M. (2005). Smart and good high schools:
Integrating excellence and ethics for success in school, work and beyond.
Washington, DC: Character Education Partnership.

96
Lickona, T., Schaps, E., & Lewis, C. (1995). Eleven principles of effective
character education. Washington, DC: Character Education Partnership
[Em linha] URL: <http://www.character.org/principles/index.cgi>.

Linden, D. (1997). A Grassroots Character Education Program. Em A. T.


Lockwood (Ed.), Character Education: Controversy and Consensus.
Thousand Oaks: Corwin Press, 48-59.

Lipovetsky, G. (1996). A era do Após-Dever. Em E. Morin, I. Prigogine e


outros. A Sociedade em Busca de Valores. Lisboa: Instituto Piaget, 29-37.

Lisy-Macan, L. (1997). Educating the Head, the Heart, and the Hand. The
Fourth and Fifth Rs, 3(2), 1.

Lockwood, A.T.
(1976). Moral Reasoning and Public Policy Debate. Em T. Lickona (Ed.),
Moral development and behaviour: Theory, research and social issues.
New York: Holt, Rinehart and Winston, 317-325.
(1993). A letter to character educators. Educational Leadership, 51(3), 72-
75
(1997). Why Character Education?. Em A. T. Lockwood (Ed.), Character
Education: Controversy and Consensus. Thousand Oaks: Corwin Press,
1-11.

Lourenço, O.
(1992). Desenvolvimento Pessoal e Social: Educação para a Justiça ou
para a “Santidade”?. Revista Portuguesa de Educação, 5(2), 129-136.
(1995). A comunidade justa de Kohlberg: Um caso especial de educação
moral. Revista de Educação, 5(1), 27-39.
(2000). Educação para a Cidadania: Um olhar Kohlberguiano. Revista
Portuguesa de Pedagogia. Ano XXXIV, 1, 2 e 3, 555-583.
(2002). Psicologia de Desenvolvimento Moral: Teoria, Dados e Implicações
(3.ª ed.). Coimbra: Almedina.

Lume, F. O. (2004). A Inspecção Escolar – entre o Estado Novo e a


Democracia: Representações, Dinâmicas e Estruturas Organizacionais.
Tese de mestrado não publicada. Ciências da Educação – Área de
Formação Pessoal e Social. Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências.

Lyotard, J. F. (2003). A Condição Pós-Moderna (3.ª ed.). Lisboa: Gradiva.

MacIntyre, A. (1990). Three Rival Versions of Moral Inquiry. Indiana:


University of Notre.

Manzo, K. K. (2005). Researchers Urge Broad View on How to Build


Character. Education Week, 25(15), 1-16.

Marques, Ramiro
(1989). A Formação Pessoal em Debate. Participação em Mesa Redonda.
Revista de Inovação, 2(4), 483-513.

97
(1993, Dezembro). As transformações na estrutura da Família: A
Resposta da Escola Cultural. Santarém: Comunicação apresentada no
Colóquio da AEPEC, realizado na ESE de Santarém, em 11 de Setembro
de 1993.
(1995). Escola, Currículo e Valores. Lisboa: Livros Horizonte.
(1998). Ensinar Valores: Teorias e Modelos. Colecção Escola e Saberes.
Porto: Porto Editora.
(1999). Vinte e cinco anos de Educação Cívica: notas para um balanço. A
Revista da ESES, Dossier Temático: O 25 de Abril e a Educação, 10, 13-
26.
(2000). O Livro das Virtudes de Sempre. Porto: Edições Asa.
(2001a). O Protágoras de Platão: Será possível ensinar a virtude?. A
Revista da ESES, 11, 157-163.
(2001b). Educar com os Pais. Lisboa: Editorial Presença.
(2002). Valores Éticos e Cidadania na Escola. Lisboa: Editorial Presença.
(2006, Junho). Ética da Virtude e Desenvolvimento Moral do Aluno.
Aveiro: Comunicação apresentada no Simpósio Internacional sobre
Activação do Desenvolvimento Psicológico, Universidade de Aveiro, 12 e
13 de Junho de 2006.

Martins, Engrácia V. (1996). Educação e Doutrinamento: O pensamento de


Sebastião da Gama. Tese de mestrado não publicada. Ciências da
Educação – Área de Filosofia da Educação. Universidade do Minho.

Martins, Guilherme O.
(1996). Tolerância, Cidadania e Cultura de Paz. Em Educação para a
Tolerância – Actas da Conferência. Lisboa: Secretariado Coordenador
dos programas de Educação Multicultural, 43-49.

McDaniel, A. K. (1998). Character Education: Developing Effective Programs


[Em Linha] URL: <http://www.joe.org/joe/1998april/a3.html>. Journal of
Extension [Publicação periódica em linha], 36(2).

McKenzie, M. (2004). Seeing the Spectrum: North American Approaches to


Emotional, Social, and Moral Education [Em Linha] URL:
<http://www.findarticles.com/p/articles/mi_qa4013/is_200410/ai_n94377
89/pg_5>. Educational Forum [Publicação periódica em linha].

Medlock, A. (1995). Standing Tall: The Heroes’Path to Character. The Fourth


and Fifth Rs, 1(2), 4.

Mendes, C. P. (2001). Professor e Educador – Estudo Exploratório sobre o


papel do professor enquanto educador moral. Tese de mestrado não
publicada. Ciências da Educação. Universidade de Lisboa, Faculdade de
Psicologia e de Ciências da Educação.

Menezes, D. M. (2000). Educação, Ética e Conduta dos Professores –


Contributo para a caracterização da dimensão ética da profissão docente
(Estudo Exploratório). Tese de mestrado não publicada. Ciências da
Educação – Área de Formação de Professores. Universidade de Lisboa,
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação.

98
Menezes, I. (1999). Desenvolvimento Psicológico na Formação Pessoal e
Social. Porto: Edições Asa.

Milagre, C. & Trigo-Santos, F. S. (2001). A Escola Multicultural: O Olhar de


Professoras do 1º Ciclo. Revista de Educação, 10(1), 21-30.

Miller, T.W., Kraus, R. F. & Veltkamp, L. J. (2005). Character Education as a


Prevention Strategy in School-Related Violence. The Journal of Primary
Prevention, 26(5), 455-466.

Mogarro, M. J. (2003). Manuais Escolares no Portugal do Estado Novo. Texto


de apoio nº5, Escola Sociedade e Valores, Mestrado em Educação.

Mónica, M. F.
(1977). Deve-se ensinar o povo a ler: a questão do analfabetismo em
Portugal, 1926-39. Análise Social, 13(50), 321-353.
(1978). Educação e sociedade no Portugal de Salazar (A escola primária
salazarista 1926-1939). Lisboa: Presença.
(1999). Cenas da Vida Portuguesa. Lisboa: Quetzal.

Moreira, J. A. (1999). O Doutrinamento no “Mau Sentido”. Noesis, 52, 52-


54.

Mosher, J. (2001). Children’s Literature and Character Development. The


Fourth and Fifth Rs, 8(1), 1-3.

Nóvoa, A.
(Org.). (1991). Profissão Professor. Porto: Porto Editora.
(1992). A Educação Nacional. Em F. Rosas (Coord.). Portugal e o Estado
Novo (1930-1960). Nova História de Portugal. Vol. XII. Lisboa: Editorial
Presença.

Patacho, P. & Afonso, S. (2003). O Professor na sociedade pós-moderna.


Trabalho não publicado realizado no âmbito da disciplina Formação de
Professores, Departamento de Educação da Faculdade de Ciências da
Universidade de Lisboa, Curso de Mestrado em Educação.

Patrício, M. F.
(1989). A Formação Pessoal em Debate. Participação em Mesa Redonda.
Revista de Inovação, 2(4), 483-513.
(1993). Lições de Axiologia Educacional. Lisboa: Universidade Aberta.
(1995). Formação de professores e Educação Axiológica. Revista de
Educação, 5(1), 11-20.
(2006). Dez ideias-chave do ministro da Educação da Finlândia sobre
política educativa. Pontosnosii, 11, 58-61.
(2006, Outubro). A crise da escola: que quer a sociedade da escola?.
Lisboa: Comunicação apresentada no IX Congresso Científico-Pedagógico
da AEPEC, Universidade Lusíada de Lisboa.

Pawelski, J. (2003). Character as Ethical Democracy: Definitions and


Measures. Essay Competition – Assessing the Character Outcomes of

99
College – Center for the Study of College Student values. Association or
Institucional Research.

Pedro, A. P. (2002). Percursos de uma Educação em Valores em Portugal:


Influências e Estratégias. FCG: FCT.

Pereira, B., Neto, C. & Smith, P. (1997). “Os espaços de recreio e a


prevenção do bullying na escola”. Em C. Neto (Coord.). Jogo e
Desenvolvimento da Criança. Lisboa, Faculdade de Motricidade Humana,
238-257.

Piaget, J. (1932). The Moral Judgement of the Child. London: Routledge.

Pintassilgo, J. 1998). República e formação dos cidadãos. A educação cívica


nas escolas primárias da 1ª República portuguesa (1910-1926). Lisboa:
Edições Colibri.

Pinto, J. L. (2005). Escola Global – Quo Vadis (1.ª ed.). Colecção Campo da
Educação, 11, Porto: Campos de Letras.

Pinto, M. J. N. (2006, Outubro). A crise da escola: que quer a sociedade da


escola?. Lisboa: Comunicação apresentada no IX Congresso Científico-
Pedagógico da AEPEC, Universidade Lusíada de Lisboa.

Platão (Séc. IV A.C./1999). Protágoras. Lisboa: Relógio D’Água.

Pombo, O.
(2001). Educar/Ensinar. Materiais de Estudo (organização de uma
antologia de textos de Olivier Reboul, Jacques Ulmann, John Passmore e
Paul Hirst e sua tradução), 6º Caderno de História e Filosofia da
Educação. Lisboa: Departamento e Educação da Faculdade de Ciências
de Lisboa.
(2002). A Escola, a Recta e o Círculo. Lisboa: Relógio d'Água.

Popenoe, D. (2000). Um Mundo Sem Pai. Nova Cidadania – Liberdade e


Responsabilidade Pessoal. Ano II, 5, 10-26.

Power, F. (2002). Building Democratic Community: A Radical Approach to


Moral Education. Em W. Damon (Ed.), Bringing in a New Era in Character
Education. Stanford, CA: Hoover Institution Press, 113-127.

Rangel, M. (2006). Professores que pedem ajuda [Em Linha] URL:


<http://www.educare.pt/noticia_novo.asp?fich=NOT_20061024_4791>.

Raths, L, Harmin, M. & Simon, S.B. (1996). Values and Teaching. Charles E.
Merrill: Columbus.

Raz, J. (2001, Março). The Pratice of Value. Berkeley: Comunicação


apresentada na Universidade da Califórnia no âmbito: The Tanner Lectures
on Human Values.

100
Rebould, O. (1977). L’endoctrinement. Paris: PUF.

Reetz, L. J. & Jacobs, G. (1999). Faculty focus on moral and character


education. Education, 120(2), 208-212.

Rest, J. (1997). Character Education in the Classroom. Em A. T. Lockwood


(Ed.), Character Education: Controversy and Consensus. Thousand Oaks:
Corwin Press, 31-37.

Ribeiro, G. (2004). A Pedagogia da Avestruz – Testemunho de um


Professor. Lisboa: Gradiva.

Robelen, E. W. (2001). Politicians Stand Up For Character Education


Measures. Education Week, 20(27), 27.

Ryan, K.
(1986). The new moral education. Phi Delta Kappan, 68(4), 228-233.
(1987). The Moral Education of Teachers. Em K. Ryan & G. F. MacLean
(Eds.), Character Development in Schools and Beyond. New York:
Praeger, 358-379.
(1993). Mining the Values in the Curriculum. Educational Leadership,
51(3), 16-18.
(1997). Character Education and the Hard Business of Schooling. Em A. T.
Lockwood (Ed.), Character Education: Controversy and Consensus.
Thousand Oaks: Corwin Press, 12-21.
(1998). Ten Tips for Raising Children of Character. The Fourth and Fifth Rs,
4(1), 5.
(1999). Values, Views, or Virtues. Education Week, 18(25), 49-72.

Ryan, K. & Kilpatrick, W. (1996). Is Character Education Hopeless?. Fixing


America’s Schools [Em linha] URL:
<http://www.taemag.com/issues/articleid.16284/article_detail.asp>.

Ryan, K. & Lickona, T. (1987). Character Development: The Challenge and


the Model. Em K. Ryan & G. F. MacLean (Eds), Character Development in
Schools and Beyond. New York: Praeger, 3-35.

Ryan, K., & Bohlin, K. (1999). Building character in schools, Pratical Ways
to bring moral instruction to life. San Francisco: Jossey-Bass.

Ryan, K. & MacLean, G. F. (1987) (Eds). Character Development in Schools


and Beyond. New York: Praeger.

Ryan, K., & Wynne, E. (1997). Reclaiming our schools: Teaching character,
academics, and discipline (2.ª ed.). Upper Saddle River, NJ: Prentice-Hall.

Ryan, K., Bohlin, K. & Thayer, J. (1996). The Character Education Manifesto.
Center for the Advancement of Ethics and Character at Boston University.

Ryan, K., Bohlin, K., Farmer, D. (2001). Building character in schools –


Resource Guide. San Francisco: Jossey-Bass.
.

101
Santos, M. M. V. (2005). A Formação Cívica no Ensino Básico: Contributos
para uma Análise da Prática Lectiva. Porto: Asa Editores.

Saunders, J. (2003). Teaching Character Through the Classics. The Fourth


and Fifth Rs, 10(1), 4-5.

Schwartz, A. (2002). Transmitting Moral Wisdom in an Age of the


Autonomous Self. Em W. Damon (Ed.), Bringing in a New Era in Character
Education. Stanford, CA: Hoover Institution Press, 1-21.

Sebastião, J., Campos, J., Alves, M. & Amaral, P. (2004). Escola e Violência:
conceitos, políticas, quotidianos. Relatório de Pesquisa. Centro de
investigação e estudos de sociologia.

Sergiovanni, T. J. (1996). Leadership for the schoolhouse: How is different?


Why is it important?. San Francisco: Jossey-Bass.

Shaps, E., Esther, S. & Mcdonnell, S. (2001). What’s Right and Wrong in
Character Education Today. Education Week, 21(2), 40-44.

Silva, C. A. (1998). Os Maias e o desenvolvimento sociomoral dos alunos.


Colecção Ciências da Educação, 20. Lisboa: Instituto de Inovação
Educacional.

Simon, S., Howe, L. & Kirschenbaum, H. (1972). Values Clarification, A


Handbook of Pratical Strategies for teachers ans students. New York: Hart
Publishing Company.

Singh, G. R. (2001). How Character Education Helps Students Grow.


Educational Leadership, 59(2), 46-49.

Snook, I. A. (1972). Indoctrination and moral responsability. Em I.A. Snook


(Ed.), Concepts of indoctrination: Philosophical essays. London and
Boston: Routledge & Kegan Paul.

Snook, I. A. (Ed.). (1972). Concepts of indoctrination: Philosophical essays.


London and Boston: Routledge & Kegan Paul.

Soares, M. J. B. (1999). Não percamos a Esperança. Em A Desmoralização


da Sociedade: Mito ou Realidade, Nova Cidadania – Liberdade e
Responsabilidade Pessoal. Edição Principia, 2, 4-6.

Sommers, C. H. (1998). Are we living in a Moral Stone Age?. Imprimis,


27(3), 1-4.

Sprinthall, R. C. & Sprinthall, N. A. (1993). Psicologia Educacional – Uma


Abordagem Desenvolvimentista. McGraw-Hill.

102
Striker, G. (1987, Maio). Greek Ethics and Moral Theory. Comunicação
apresentada no âmbito The Tanner Lectures on Human Values,
Universidade de Stanford.

Sullivan, E. (1975). Moral Learning. New York: Paulist Press.

Thompson, W. G. (2002). The Effects of Character Education on Student


Behaviour. Tese de doutoramento não publicada. Universidade Estadual de
East Tenessee, Departamento de Liderança Educacional e Análise Política
Educativa.

Tigner, S. (1993). Character Education: Outline of a Seven-Point Program.


Journal of Education, 175(2), 14-22.

Torrance, T. (1969). Theological Science. Edinburgh: T&T Clark.

Valente, M. O.
(1989a). A Educação para os Valores. Em O Ensino Básico em Portugal.
Porto: ASA
(1989b). A Formação Pessoal em Debate. Participação em Mesa Redonda.
Revista de Inovação, 2(4), 483-513.
(Org.) (1992). A Escola e a Educação para os Valores - Antologia de
Textos. Lisboa: Departamento de Educação da Faculdade de Ciências da
Universidade de Lisboa.
(1995). A Educação, os Valores e a Formação dos Professores. Revista de
Educação, 5(1), 21-26.
(1996). Preface: Teacher Training and Values Education. Em M.O. Valente,
A. Bárrios, A. Gaspar & V.D. Teodoro (Eds.). Teaching Training and
Values Education. Lisboa: Departamento de Educação da Faculdade de
Ciências da Educação.
(1998). Comentário da Conferência de Mark Elchardus com o título “The
recent Rediscovery of the value of values - Lessons for the schools”. Em
R. Carneiro (Director). Valores e Educação numa Sociedade em
Mudança. Colóquio/Educação e Sociedade, 3, 147-149.

Veiga, M. L. (2006, Outubro). A crise da escola: que quer a sociedade da


escola?. Lisboa: Comunicação apresentada no IX Congresso Científico-
Pedagógico da AEPEC, Universidade Lusíada de Lisboa.

Veiga, Manuel Alte da


(1988). Filosofia da Educação e Aporias da Religião: a problemática do
ensino religioso. Lisboa: INIC.
(2005). Um perfil Ético para Educadores. Viseu: Palimage Editores.

Walker, L. J.
(1999). The Perceived Personality of Moral Exemplars. Journal of Moral
Education, 28(2), 145-162.
(2002). Moral Exemplarity. Em W. Damon (Ed.), Bringing in a New Era in
Character Education. Stanford, CA: Hoover Institution Press, 65-83.

103
Watson, M. (1999). The Child Development Project: building character by
building community. Action in Teacher Education, 20(4), 59-69.

Wheeler, D. (1997). What’s working at Wellwood Middle Scholl. The Fourth


and Fifth Rs, 3(2), 3.

Williams, M. M. (1993). Actions Speak Louder Than Words: What Students


Think. Educational Leadership, 51(3), 22-23.

Wood, R. & Roach, L. (1999). Administrators’ perceptions of character


education. Education, 120(2), 213-219.

Wynne, E. A.
(1985). On Pedagogy and the ‘Time-Honored Virtues’. Education Week,
25(4), 36-40.
(1986). The Great Tradition in Education. Educational Leadership, 43(4),
4-9.
(1987). Students and Schools. Em K. Ryan & G. F. MacLean (Eds),
Character Development in Schools and Beyond. New York: Praeger, 97-
118.

Wynne, E. A. & Hess, M. (1987). Trends in American Youth Character


Development. Em K. Ryan & G. F. MacLean (Eds), Character Development
in Schools and Beyond. New York: Praeger, 36-58.

104

You might also like