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REFLEXÕES SOBRE A POLÍTICA DE SEGURANÇA DA RÚSSIA

Alexander Zhebit
Os recentes sinais do retorno da Rússia à cena internacional como ator de peso e
a sua consolidação como “superpotência” energética, reforçados pelo crescimento
econômico estável e acompanhados pela ampliação da autonomia russa na política
internacional, vêm sendo associados à era Vladimir Putin, cujo próximo término marca
a definitiva recuperação pós-sovíetica da Rússia da crise sistêmica pós-desintegração.
Estas mudanças devem-se a uma série de decisões, ações e evidentemente sucessos do
governo Putin nas áreas estratégicas do desenvolvimento da Rússia que variam da
atuação na política externa, reformulação das políticas de segurança e de defesa até
reformas políticas, econômicas e energéticas no âmbito nacional. O propósito deste
artigo é a discussão do assunto de segurança no contexto da atual evolução russa.
As três principais fontes paradigmáticas em assuntos de segurança resumem-se
a: i) teorias ocidentais, respaldadas pelos paradigmas realistas, liberais e globalistas;
incluindo idéias geo-políticas; ii) teorias russas não-marxistas (eurasianismo); iii)
marxismo conservador e reformista. Proponentes das teorias atlanticistas ou
ocidentalistas que foram predominantes na fase inicial dos debates sobre a política
externa russa (primeira metade dos 90), cederam lugar aos pragmáticos realistas, ou
“derjavniki” (defensores do estadismo), que dominam discussões sobre a política
externa e de segurança da Rússia. O liberalismo vem sendo deslocado pelas idéias do
eurasianismo, cujas versões democrática e eslavófila são limítrofes dos conceitos geo-
políticos. Apesar de reveses que sofreu o eurasianismo depois de 11 de setembro, cujos
impactos reforçaram a cooperação transatlântica, a sua durabilidade não deixou de ser
afetada pelo retorno do pêndulo. O ramo nacionalista dos neo-marxistas defende o
retorno à época soviética com base na reintegração socialista do espaço pos-soviético,
enquanto a social-democracia, de procedência do “novo pensamento político”
gorbacheviano, tende a defender o balanço de interesses (em oposição ao de poder), a
estabilidade internacional e interesses de toda a humanidade, com a perspectiva da
formação de uma sociedade civil global. 1
Dentro da perspectiva comparativa é importante ressaltar modificações na
definição dos principais traços da segurança nacional e internacional depois da

1
Sergunin, A. Rossiiskiei debaty po mezhdunarodnym otnosheniam v poslekommunisticheskii period.
Pod redaktsiei A.P.Tsygankova, P.A. Tsygankova. Moscow: PER SE, 2005, p. 97-122; ARIN, O.A.
(ALIEV, R.Sh.). Mir bez Rossii. Moskva: Izd-vo Eksmo, 2002, pp.180-186.

1
desintegração da União Soviética e do surgimento do novo estado da Rússia. O estado
da Rússia nunca existiu na forma política estatal e nos contornos geográficos atuais. Por
isso, tornaram-se necessárias a sua identificação com esta nova realidade geopolítica, a
redefinição de interesses nacionais, de ameaças e de desafios nacionais, regionais e
internacionais. A Rússia foi obrigada a recriar o mecanismo de segurança nacional,
porque a estrutura herdada da União Soviética não atendia a novas realidades e de se
adequar à nova situação geopolítica, que resultou do fim da “Guerra Fria”. As forças
armadas, serviços de segurança foram reorganizados. A segurança estratégica militar
deixou de ser prioritária, a agenda de segurança tornando-se multidimensional,
desierarquizada e abrangendo assuntos da “low politics”. Surgiu a compreensão de que
ameaças à Rússia podem ter sua origem na própria Rússia, como, por exemplo, crises
econômicas, tensões sócio- e etnopolíticas, nacionalismo, extremismo, separatismo,
terrorismo, crimes ambientais e tecnogênicas, insegurança nuclear, energética,
informacional, crime organizado e narcotráfico.2 Segundo A. Sergunin, nas construções
teóricas atuais na Rússia, competem dois principais conjuntos de modelos de segurança:
um, definido pela estrutura do sistema internacional, com quatro principais modelos de
segurança competitivos: a) unipolar; b) concerto de potências; c) multipolar; d) global;
outro, definido em função do caráter da interação entre os atores-membros de sistemas
de segurança: a) coletivo; b) universal; c) cooperativo. 3
De acordo com as estimativas estratégicas atuais, não há percepção de uma
ameaça de guerra global. Diferentemente do período da Guerra Fria, quando se pensava
que a segurança nacional poderia ser garantida num contexto de um sistema de
segurança abrangente, ou seja, geral ou global, atualmente pensa-se que sistemas de
segurança subregionais, regionais autônomos também garantem segurança. Para
entender tanto as preocupações estratégicas da Rússia, quanto as suas respostas aos
desafios estratégicos, o entendimento do pensamento russo a respeito é fundamental. O
novo conceito de segurança nacional, que formulou interesses nacionais russos no
contexto da transformação dinâmica do sistema de relações internacionais, no início do
século XXI, foi aprovado pelo Presidente Vladimir Putin em 2000.

2
Sergunin, A. Izychenie problem bezopasnosti v Rossii. In: Rossiiskaya nauka mezhdunarodnykh
otnoshenii: novyie napravleniya. Pod redaktsiei A.P.Tsygankova, P.A. Tsygankova. Moscow: PER SE,
2005, p 229-254.
3
Ibidem, pp. 242-250.

2
Conceito da segurança nacional 4
A conjuntura internacional, segundo o conceito, evolui em função da
contraditoriedade das duas tendências mundiais do pós-Guerra Fria: o surgimento do
mundo multipolar, por um lado, e a evolução, devido ao colapso da estrutura bipolar das
relações internacionais e da desintegração da União Soviética e do bloco Soviética, de
um centro único de poder, cuja política depende em grande medida do uso da força
militar e da ameaça da força. Nesta nova conjuntura de distribuição mundial de poder a
Rússia vem desempenhando um papel importante nos processos globais em virtude de
seu potencial econômico, científico, tecnológico e militar e de sua localização
estratégica única no continente euro-asiático.
A Rússia tem interesses comuns com outros estados em muitos assuntos de
segurança internacional, como a oposição à proliferação de armas de destruição em
massa (ADM), a solução e a prevenção de conflitos regionais, o combate ao terrorismo
internacional e ao narcotráfico, o desenvolvimento sustentável e a proteção do meio
ambiente, incluindo a segurança rádio-nuclear. Ao mesmo tempo, a Rússia depara-se
com a ignorância de seus interesses por parte de alguns estados, o que pode provocar o
enfraquecimento da segurança e da estabilidade internacional e afetar mudanças
positivas e favoráveis à paz e à segurança internacionais.
Externamente, a Rússia enfrenta ameaças e desafios: o anseio de alguns países e
de associações internacionais de diminuir o papel de organismos internacionais de
proteção de segurança internacional, sobretudo as Nações Unidas e a OSCE; a
perspectiva de enfraquecimento de sua influência política, econômica e militar no
mundo; a expansão da OTAN para o Leste; o surgimento de bases militares estrangeiras
e a concentrações de exércitos e armamentos na proximidade imediata das suas
fronteiras; a proliferação de ADM e de veículos-lançadores; o declínio de processos de
integração na Comunidade dos Estados Independentes (C.E.I.); a deflagração e a
escalação de conflitos próximos à suas fronteiras e às fronteiras externas da C.E.I.; o
terrorismo internacional com o fim de destabilização da Rússia; a tentativa da
dominação do espaço de informação; a criação de novas gerações de armas, o que
poderia resultar numa nova corrida aos armamentos; a expansão econômica,
demográfica e cultural-religiosa pelos estados vizinhos sobre o território da Rússia.

4
Russia's National Security Concept http://www.armscontrol.org/act/2000_01-02/docjf00.asp?print
Arms Control Association, acessado em 02 de outubro de 2006

3
Para garantir a sua segurança, a Rússia precisa, internamente: desenvolver a
economia nacional, orientada para objetivos sociais; ultrapassar a dependência
tecnológica e científica das fontes externas; garantir a segurança pessoal, direitos
constitucionais e liberdades dos cidadãos; melhorar o sistema do poder estatal, das
relações federais e fortalecer a ordem jurídica; assegurar a cooperação eqüitativa com
países-líderes mundiais; aperfeiçoar o potencial militar e mantê-lo em nível de
suficiência; fortificar o regime de não-proliferação das ADM e de veículos-lançadores;
tomar medidas eficazes para identificar, prevenir e interceptar ações de espionagem e de
subversão o país; proteger interesses de produtores russos; visar a liberalização de
comércio e o crescimento da competição no mercado global de mercadorias e serviços;
reduzir a dependência da Rússia de empréstimos estrangeiros e fortificar sua inserção
em organismos financeiros e econômicos internacionais; e externamente: conduzir uma
política externa ativa; fortalecer instrumentos-chave da gestão internacional multilateral
de processos políticos e econômicos mundiais; assegurar condições favoráveis para o
desenvolvimento econômico e social do país e a estabilidade global e regional; proteger
direitos legítimos e interesses dos cidadãos russos no exterior; promover a integração no
âmbito da C.E.I. de acordo com os interesses nacionais; consolidar a participação plena
em organismos globais e regionais de caráter político e econômico; colaborar na solução
de conflitos, sob os auspícios das Nações Unidas, da OSCE e da C.E.I.; progredir no
controle de armamentos nucleares e na manutenção de estabilidade estratégica através
do cumprimento de compromissos internacionais respectivos; como as da redução e da
eliminação de ADM e de armas convencionais; desenvolver a cooperação internacional
no combate ao crime transnacional e terrorismo.
O conceito assinala a importância da segurança militar da Rússia, nas condições
atuais da inserção do país nas relações internacionais contemporâneas, apesar da
prioridade de uso de meios políticos, diplomáticos, econômicos e outros não-militares a
fim de prevenir guerras e conflitos armados. O objetivo vital da Rússia consiste em
exercer a dissuasão a fim de prevenir uma agressão contra a Rússia e seus aliados, em
qualquer nível de ameaça, inclusive em escala nuclear. Para isto, a Rússia precisa usar a
dissuasão nuclear, prevendo uma retaliação sobre qualquer estado agressor ou coalizão
de estados agressores.
O declínio da capacidade dissuasora de armas nucleares e sua baixa
fungibilidade já foram objeto de diversas discussões teóricas antes e depois da

4
desintegração soviética. 5 Armas nucleares, além de serem objeto de tentativas de
extravio por grupos ilegais, agregam pouca ou quase nenhuma vantagem no tratamento
de questões da política externa, nem protegeriam, em caso de um conflito nuclear, os
Estados Unidos e a Rússia, por exemplo, de uma retaliação recíproca, depois do
primeiro uso por alguma das potências de armas nucleares contra outra. Porém, o
domínio de armas nucleares continua sendo valorizado, sobretudo por militares e
considerado pelas potências nucleares como atributo de grande potência e de prestígio
internacional, além de continuar servindo como fator dissuasor, porque a posse destas
armas ainda é limitada e distingue-as de países não-detentores de armas nucleares.
Talvez, o lugar mais polêmico no conceito foi a alusão ao “uso de todas as
forças e capacidades disponíveis, inclusive nucleares, em caso da necessidade de repelir
uma agressão armada, se todas as outras medidas de solução da situação de crise foram
esgotadas e se verificaram ineficazes”. 6 Se a primeira versão do conceito, de 1997,
aumentou a capacidade dissuasora de armas nucleares, revogando a declaração, feita
pela União Soviética em 1982, de não ser a primeira a usar armas nucleares na
iminência de um conflito nuclear, assim abaixando o patamar do uso destas armas em
caso de um conflito iminente, o conceito atual abaixa ainda mais este patamar,
possibilitando o uso de armas nucleares em caso de uma agressão armada convencional,
sem o uso de componente nuclear, assim aumentando a credibilidade da dissuasão.
Quais as razões que favoreceram a adoção desta fórmula, que em princípio,
além de fortalecer a doutrina de dissuasão e de aumentar a sua credibilidade, ao mesmo
tempo elevou o risco de uma guerra com o uso de armas nucleares em caso de um
conflito armado convencional? Há quatro considerações, que diriam respeito, a meu ver,
a esta transformação no conceito de segurança nacional. Em primeiro lugar, a liderança
da Rússia, ao se deparar nos anos 90 com uma série de conflitos inter-étnicos e civis
(Geórgia, Moldova, Tadjiquistão), alguns interestatais (Armênia, Azerbaidjão) e um
movimento separatista no seu próprio território (Chechênia), que deflagrou duas guerras
(1994-1996, 1999-2001), tentou compensar a sua vulnerabilidade interna e sua
insegurança externa pelo incremento da credibilidade da dissuasão, adicionando a ele a
reação a um desafio não-nuclear. Em segundo, a decisão política de expandir o teor de

5
HOSLTI, Kalevi Jaakko. International Politics: A framework for analysis. Prentice Hall, Englewoods
Cliffs, N.J., 1995, pp. 238-239; BLECHMAN, Barry M. Post-Nuclear strategy. The National Interest,
Summer 2005, pp. 86, 90.
6
Russia's National Security Concept. Op.cit.

5
dissuasão nuclear para a área não-nuclear foi tomada no momento, quando o governo
afegão dos talibãs, incitando e apoiando militarmente a oposição tadjique a derrubar o
governo de Emomali Rakhmonov, organizou uma série de incursões nos território de
Tadjiquistão, Uzbequistão e Quirguízia. Em terceiro lugar, o governo russo
acompanhou o crescimento do arsenal nuclear chinês, a criação de armas nucleares na
Índia e no Paquistão, testadas em 1998, e de veículos-lançadores, com o raio de ação
passível de atingir a Rússia, bem como os programas nucleares na Coréia do Norte e no
Irã. Em quarto lugar, as inovações tecnológicas na área de armamentos convencionais,
assim como a invenção de armas convencionais com a força de destruição que se
aproxima à das armas táticas nucleares, eliminando a divisória entre as ADM e armas
convencionais da “sexta geração” (sistemas ofensivas de choque que usariam gáfnio,
urânio exaurido, armas geofísicas, infrassônicas, laser, eletromagnéticas, de vácuo etc.)
contribuíram para esta postura. 7
Doutrina militar 8
Ao se basear no novo conceito de segurança, a nova doutrina militar, aprovada
em 21 de abril de 2000, repetiu as principais teses da primeira doutrina militar da Rússia
ou seja, da doutrina transitória, de 02 de novembro de 1993. Como a primeira, esta
doutrina também não teve caráter definitivo, o que ficou confirmado mais tarde pela
complementação substancial que foi dada à doutrina por uma espécie de “Defense
White Paper” de Serguei Ivanov, em outubro de 2003, dando continuidade ao
aperfeiçoamento do pensamento militar e estratégico russo para o início do século XXI.
A doutrina militar de 2000, cujo texto introduziu elementos novos, um mix de
elementos militares, políticos, econômicos e sociais, definiu com clareza que o seu tema
principal, em contraste à doutrina de 1993, foi a avaliação da segurança nacional, sob
ângulos militares, políticos e normativos, incluindo repercussões negativas da
globalização sobre a economia e a sociedade, a intervenção das companhias
transnacionais na gestão estatal e o controle pelas mesmas de fluxos financeiros. A
doutrina foi definida com o tripé de prevenção, dissuasão e parceria.
O postulado principal da doutrina é a prevenção de guerras e de conflitos, o
que não diferencia a doutrina russa das doutrinas ocidentais. Apesar de a anterior ordem

7
ZHEBIT, Alexander. Desafios estratégicos para a Rússia. Revista da Escola Superior de Guerra. Vol.
20, n.43 (dez/2004), pp. 56-57.
8
Russia’s Military Doctrine, http://www.armscontrol.org/act/2000_05/dc3ma00.asp?print , Arms Control
Association, acessado em 02 de outubro de 2006

6
mundial ter sido bipolar e ter existido no âmbito da Guerra Fria, ele possuía uma
estabilidade, que foi controlada pelo condomínio das duas superpotências. Depois da
desintegração desta ordem, começou a fase do “inter-regno”, que se caracteriza pela
relativa desordem, no âmbito da qual diversos estados e movimentos tentam tirar
proveito desta nova conjuntura. Ao ser afastada a ameaça de uma guerra nuclear global,
manifestaram-se novos perigos e ameaças, que não se concentram, como antigamente,
na esfera militar, mas cuja periculosidade, amiúde, é mais séria para a estabilidade
regional e global, do que a que emana das ameaças bélicas. Trata-se do separatismo,
extremismo nacional e religioso, terrorismo internacional. No novo contexto
internacional, observa-se, por um lado, a transformação de ameaças militares em não-
militares, estas últimas adquirindo um significado prioritário para a manutenção da paz
e da segurança mundiais e, por outro, a modificação da estrutura de segurança, quando o
componente de defesa objetivamente diminui e o componente de segurança cresce. 9 A
Rússia, conforme o Ministro de Defesa Serguei Ivanov, reservou para si o direito para
ações preventivas e pre-emptivas em caso de ameaças que possam “limitar o acesso da
Rússia às regiões essenciais para a sua sobrevivência ou importantes do ponto de vista
econômico e financeiro” 10 .
A nova doutrina alargou a noção de dissuasão - de uma dissuasão nuclear para
a dissuasão em geral, entendida com a dissuasão contra escalação, tensão, corrida aos
armamentos global e regional. A crítica, dirigida à segunda doutrina militar, como
também ao novo conceito de segurança, deveu-se à sua formulação, referente à
eventualidade de uso de armas nucleares, dentro do escopo da dissuasão de uma
agressão armada, com o uso de forças armadas convencionais, conforme se dizia no
texto da doutrina: “a Federação da Rússia reserva para si o direito de usar armas
nucleares em resposta ao uso contra ela e/ou contra seus aliados de armas nucleares e de
outras armas de destruição em massa, bem como em resposta a uma agressão de
envergadura com o uso de armas convencionais nas situações críticas para a segurança
nacional da Federação da Rússia” 11 . Portanto, a probabilidade, descrita acima, seria uma
eventualidade, em tese, caso ocorressem circunstâncias, previstas na doutrina, como,
por exemplo, uma agressão externa com o uso de armas convencionais; o uso de outras

9
MANILOV, Valery, First Deputy Chief of Armed Forces General Staff, Russia. On the military doctrine
of Russia. International Affairs (Moscow), 2000, nº 5, p. 43.
10
NICHOLS, Thomas M. Anarchy and order in the new age of prevention. World Policy Journal, Fall
2005, p.10.
11
Citado em: Ibidem, p. 44.

7
ADM, exceto nucleares; abrigo dado por outros estados a grupos terroristas, capazes de
usar ADM; a iminência de uso de ADM por atores estatais detentores de armas
nucleares, antes que estes as usassem.
Mais um pretexto, evocado no documento de 2003 pela Rússia, foi a referência
a “tentativas de restituir aos armamentos nucleares o status de instrumento militar
admissível por conta de implementação de projetos técnico-científicos “avançados” que
tornam armamentos nucleares relativamente “limpos” de ponto de vista das
conseqüências da sua aplicação” 12 , devido aos esforços de modernização e de
minituarização de armas nucleares, abaixando o seu potencial explosivo e utilizando tais
armas para atacar bunkers ou caves (a ogiva W-76, por exemplo) e também por causa
do aperfeiçoamento e do aumento do poder destrutivo das armas convencionais,
aproximando as mesmas ao patamar de destruição nuclear.
Chamado de “Doutrina Ivanov”, o complemento ao novo conceito, feito em
2003, levou em consideração os fatos da crescente supremacia dos Estados Unidos da
América em armas nucleares e a gradual deterioração do arsenal nuclear da Rússia.
Segundo as últimas avaliações, a Rússia detém 39% menos bombardeiros estratégicos
de longo alcance, 58% menos de mísseis balísticos intercontinentais, 80% menos
submarinos nucleares em serviço, em comparação com os Estados Unidos. Pelas
estimativas norte-americanas, a capacidade da Rússia de retaliar em caso de ataque
nuclear vem se tornando cada vez mais diminuta. 13
A proposta feita pelo Presidente Vladimir Putin de começar negociando com os
Estados Unidos sobre um mecanismo de substituição de START demonstra a
preocupação russa com a evolução do status nuclear do país, em 2012, quando o
Tratado SORT (The Treaty on Strategic Offensive Reductions) expirar. Como o SORT
não prevê procedimentos de verificação ou destruição de mísseis e de lançadores, o
processo de desarmamento das duas potências nucleares, conforme o Artigo VI do
Tratado de Não-Proliferação, poderia ser comprometido. 14 O propósito da dissuasão

12
V XXI viek Rossia doljna voiti s Voorujennymy Silami, sootvietstvuiusctchimi statusu velikoi derjavy.
Vystuplenie Sergueia Ivanova na sovestchanii v Ministerstve Oborony RF. (A Rússia deve entrar no
século XXI com as Forças Armadas, adequadas ao status de grande potência. O discurso de Serguei
Ivanov na reunião do Ministério de Defesa). 02 outubro de 2003. www.rian.ru, acessado em 04 de
outubro de 2004.
13
LIEBER, Keir A. and PRESS, Daryl G. The rise of U.S. Nuclear Primacy. Foreign Affairs, Vol. 85,
No. 2, March/April 2006, p. 45-48.
14
DIAKOV, Anatoli and MIASNIKOV, Eugene. ReSTART: The Need for a New U.S.-Russian Strategic
Arms Agreement. Armas Control Today, Sept., 2006. http://www.armscontrol.org/act/2006_09/restart.asp
acessado em 02/10/2006

8
ressalta a obrigação do controle de armamentos e do desarmamento, em conformidade
com tratados internacionais, mas ao mesmo tempo assinala que a prioridade da Rússia
em matéria de segurança consiste em desenvolver e aperfeiçoar o potencial das forças
armadas de destino geral e mantê-las em prontidão.
A Rússia, segundo a doutrina militar, considera todos os países do mundo, que
agem em conformidade com a Carta das Nações Unidas e não têm intenções agressivas
contra ela, seus parceiros na manutenção e na consolidação da segurança, da paz e da
estabilidade internacionais. Esta parceria estaria baseada numa participação em pé de
igualdade da avaliação e da análise da situação político-militar, da tomada da decisão
para neutralizar, localizar e evitar situações de crise, que ameacem a segurança
internacional, da realização das medidas propostas.
Reforma militar na Rússia
Entre a adoção da doutrina militar e os dias de hoje passa um divisor de águas,
que foi o 11 de setembro de 2001. Era de esperar que tanto o conceito, quanto a doutrina
passariam por uma transformação, talvez, tão profunda, quanto foi a desintegração
soviética. Este período foi repleto de acontecimentos internacionais tão significativos
como a retomada da parceria Rússia-OTAN, a instalação do Conselho Rússia-OTAN, a
celebração do SORT entre a Rússia e os Estados Unidos, a saída unilateral dos Estados
Unidos do ABM Treaty, a formação de uma coalizão anti-terrorista internacional, a
adoção da nova doutrina de segurança dos Estados Unidos da América, o racha entre os
membros permanentes do Conselho de Segurança sobre a intervenção no Iraque.
O governo de Putin aproveitou-se da situação de crise para tirar proveito dela e
se adaptar à situação internacional inédita, que começou a favorecer a política externa e
de segurança da Rússia. Usando um trunfo estratégico, a localização entre o Oriente e o
Ocidente, a Rússia transformou-se num aliado da coalizão anti-terrorista no combate à
ameaça fundamentalista islâmica. Abrindo mão de seu controle estratégico dos países da
Ásia Central, os dirigentes russos indiretamente contribuíram para a derrota dos talibãs
e para o esvaziamento das fontes de alimentação do separatismo checheno pelas fontes
de organizações terroristas assim fortalecendo as posições do governo na política
interna e a popularidade de Putin, como um presidente forte, decidido, pragmático e
construtivo.
As mudanças estratégicas globais, que ocorreram depois de 11 de setembro de
2001, tornaram-se objeto de reflexão de estrategistas políticos e militares russos e foram
condensadas no documento sobre a política de segurança e sobre as especificidades e a

9
perspectiva da construção das forças armadas da Rússia e da reforma militar.
Apresentado pelo ministro de defesa Serguei Ivanov na reunião do presidente Vladimir
Putin com o alto comando das Forças Armadas no Ministério de Defesa da Rússia em
02 de outubro de 2003 15 , o documento, do tipo “Defense White Paper”, traça uma
estratégia clara de evolução da política de segurança da Rússia em perspectiva de curto
e médio prazo.
A criação da base jurídica da reconstrução e da modernização das Forças
Armadas, o estabelecimento do controle político sobre suas atividades, a transparência
maior do orçamento militar, bem como a reestruturação das Forças Armadas e a redução
dos seus efetivos de 2, 75 milhões em 1993 para cerca de 1 milhão de soldados e
oficiais em 2003 foram as etapas da reforma na área militar, basicamente concluída até
o final de 2003, que marcou uma adaptação da política militar russa às novas realidades
globais. Uma destas realidades é o nível qualitativamente novo das relações políticas
com os Estados Unidos e com outros países desenvolvidos, o que permitiu que reduções
drásticas de potenciais nucleares, sem prejuízos à segurança dos países, fossem
acordadas. Estas relações de parceria em nível das forças armadas com os Estados
Unidos e a OTAN permitiram criar estruturas e institutos complementares, que, apesar
das contradições, referentes à expansão da OTAN para o Leste e às atividades do bloco
em conflitos armados, contribuíram para manter a estabilidade global.
As principais condicionantes da política russa na área de segurança, segundo o
documento, são as seguintes: o uso da força militar como instrumento da política
externa continua vigorando; novos desafios à segurança internacional, como a
proliferação de armas nucleares e de veículos lançadores, terrorismo internacional,
radicalismo étnico e religioso, tráfico de entorpecentes, crime organizado, tornam-se
cada vez mais significativos para a situação estratégica internacional e global; cresce o
significado de interesses econômicos na política mundial. Estes fatores, conclui-se,
tendem objetivamente a expandir a esfera do uso da força militar, descolocando reais
operações militares fora do âmbito dos organismos político-militares tradicionais e
dentro de coalizões temporárias.
A classificação de ameaças, cuja neutralização se torna a função das Forças
Armadas da Rússia, junto com outras estruturas governamentais, responsáveis pela
manutenção da segurança nacional (Presidente, Assembléia Federal, Governo, órgãos

15
V XXI viek Rossia ... Ibid.

10
executivos federais, órgãos executivos das partes constituintes da Federação da Rússia),
é mais complexa que aquela oferecida no conceito de segurança nacional. Às ameaças
internas e externas, cujo teor teve modificações ligeiras, acrescentam-se as ameaças
transfronteiras (transfronteiriças). As ameaças externas seriam a ingerência nos assuntos
internos da Rússia da parte de estados estrangeiros ou das organizações, apoiadas por
estados estrangeiros; a falta de estabilidade em países limítrofes, inclusive no C.E.I.; a
realização por estados, coalizões de estados ou movimentos sócio-políticos de
programas de criação de ADM e o acesso a armamentos de alto nível de periculosidade.
As ameaças internas incluiriam tentativas de modificar pela força o regime
constitucional e de violar a integridade territorial da Rússia; criação e treinamento de
formações armadas ilegais; tráfico de armas, munições, explosivos; crime organizado de
larga repercussão, que afete a estabilidade política de unidades federais; atividades de
movimentos separatistas e religioso-nacionalistas. As ameaças transfronteiriças
(internas pela forma de manifestação, mas externas na sua essência) consistiriam em
atividades de organizações, ligadas à comunidade terrorista internacional, no território
da Rússia; treinamento nos territórios de outros estados de grupos armados para agir na
Rússia ou em territórios de seus aliados; crime transfronteiriço, como contrabando de
armas, drogas, pessoas, migrações ilegais.
Como o combate ao terrorismo se tornou um objetivo comum para a maioria
esmagadora de estados, não faz sentido, segundo Serguei Ivanov, diferenciar atividades
terroristas externas e internas. Aconteceu a fusão dos terrorismos interno e do
internacional, o que resultou na formação de uma Internacional Terrorista. O documento
estipula o aumento da presença das forças armadas russas nas regiões de risco no antigo
espaço soviético, ou seja, “regiões com a presença das estruturas, ligadas a comunidade
internacional de terrorismo, ao crime organizado e ao narcotráfico” 16 .
As dimensões constantes da segurança nacional da Rússia são derivadas da
posição geo-estratégica da Rússia, que possui três fachadas: a ocidental, voltada ao
mundo euroamericano, a meridional, voltada ao mundo heterogêneo do Islã, e a oriental,
voltada à Ásia e à região da Ásia e do Pacífico.
A reforma militar na Rússia pós-pós-soviética, em contraste aos períodos da
Guerra Fria, não cria um buraco negro de gastos de recursos nacionais, a Rússia se
contentando com alocações orçamentárias moderadas para o aprimoramento da defesa

16
V XXI viek Rossia ... Ibid.

11
nacional. Leva-se em consideração a ausência de ameaças e desafios que colocariam o
país em pé de guerra convencional de grande escala ou de uma instabilidade capaz de
minar os fundamentos do estado. Segundo o SIPRI, 80% do aumento de gastos militares
mundiais em 2005 devem-se essencialmente às despesas dos Estados Unidos da
América, que contribuíram com 48% do valor global. A comparação internacional das
despesas dos quinze países do mundo com maiores orçamentos militares, demonstra que
a Rússia ocupa o 9° lugar neste ranking, depois dos EUA, Reino Unido, França, Japão,
China, Alemanha, Itália e Arábia Saudita, ultrapassando apenas a Índia, Coréia do Sul,
Canadá, Austrália. Espanha e Israel. A Europa, sobretudo a Itália, o Reino Unido, bem
como com a Rússia, acusam quedas em despesas e investimentos militares 17 .
No entanto, comentários de que as lideranças militares da Rússia se preparam
para uma guerra falsa, reforçam ainda mais a percepção das modificações que estão
ocorrendo na sua política de segurança. 18 A menção crítica de M. de Hass de que a
Rússia acrescentou apenas 15 tanques modernos ao seu arsenal de 23.000 tanques entre
2000 e 2004, debilitando desse modo a sua capacidade militar, 19 é, ironicamente, o
reconhecimento indireto pelo comando militar russo de que a superioridade em
armamentos blindados não se reverte mais em uma primazia estratégica.
Doutrina de segurança informacional 20
A visão da política de segurança da Rússia seria por demais incompleta se
omitíssemos a referência à doutrina de segurança informacional que a Rússia adotou em
setembro de 2000. A proposta da segurança de informação, na interpretação russa, está
associada à construção na Rússia da sociedade de informação que, por sua vez, deveria
resultar na formação de tendências pós-industriais do desenvolvimento econômico e
social. A quase simultaneidade da aprovação da respectiva doutrina pelo Presidente
Putin e da adesão à Carta de Okinawa da Sociedade Global de Informação não apenas
comprova que a segurança de informação se tornou uma das prioridades da política de
segurança nacional, mas reflete a correlação da estratégia nacional na área de segurança
com a evolução da sociedade internacional nesta mesma direção. Os cinco objetivos da

17
YAHOO News. World military spending: Europe down, Midle East up. AFP http://news.yahoo.com
acessado em 12/06/2006.
18
Power and Interest news Report. Russia’s military strategy: preparing for the wrong war. Drafted by
Dr. Marcel de Haas. http://www.pinr.com/report.php?ac=view_report&report_id=478&language_id=1 as
of 24 April 2006, acessado em 08 de outubro de 2006
19
Ibidem.
20
Doutrina de Segurança de Informação da Federação da Rússia
http://www.rg.ru/oficial/doc/min_and_vedom/mim_bezop/doctr.shtm acessado em 08/102006

12
estratégia do desenvolvimento da sociedade de informação da Rússia apontam para: a) o
aumento de sustentabilidade, competitividade, prosperidade e qualidade de vida no país;
b) o fortalecimento de garantias estatais de direitos e liberdades constitucionais; c) a
oferta de possibilidades iguais para cidadãos de acesso à informação; d) a criação de
condições para a diversidade cultural e a identidade nacional e étnica dos povos da
Federação da Rússia; e) a contraposição às ameaças à segurança nacional, inclusive
àquelas procedentes das tecnologias de informação e comunicação e orientadas contra
os interesses nacionais da Rússia. 21 A discussão do assunto da segurança de informação
no âmbito das Nações Unidas, sob o enfoque da proteção da segurança dos países
tecnologicamente pouco desenvolvidos, e suas repercussões na UNESCO, com os
debates em torno da formação da sociedade global de conhecimento, colocam o assunto
de segurança de informação num patamar privilegiado e indispensável da estratégia
nacional da Rússia.
Segurança energética
A questão da segurança energética na política russa precisa ser vista a partir de
dois ângulos. Por um lado, a reorganização que Putin empreendeu na economia nacional
em relação ao gás e petróleo, concentrando os recursos energéticos, considerados
“estratégicos”, no âmbito das companhias estatais como Gazprom, alinha-se com o
conceito do fortalecimento do poder do estado russo, apoiado pelos “derjavniki”, com
base na maximização do papel dos recursos energéticos na política externa russa.22 Por
outro lado, o pensamento em termos de segurança energética, reforçada pelo fato de a
Rússia possuir as maiores reservas mundiais de gás natural 23 e ser segundo produtor
mundial de petróleo, no âmbito do maior território estatal, provoca reflexões ligadas à
geo-estratégia política e econômica russa no século XXI. O pensamento geo-político,
apesar de não ser um paradigma predominante, destaca alguns autores que estão
fascinados pela idéia de um novo “Império Eurasiático”, baseado na crítica dos modelos
imperiais pré-soviético e soviético. 24 Segundo Aleksandr Duguin, “A sobrevivência do
povo russo como comunidade histórica orgânica é inconcebível sem a construção
imperial continental. Russos continuarão sendo um povo apenas nos quadro de um

21
Rossiskaya Gazeta, 19.07.2006
22
OLCOTT, Martha Brill. The energy dimension in Russian global strategy. Vladimir Putin and the
geopolitics of oil. The James A. Baker III for public policy. Rice University – October 2004.
23
CONFERENCE ON NATURAL GAS TRANSIT AND STORAGE IN SOUTHEST EUROPE, 31
MAY - 1 JUNE 2002. Outlook for Gas Demand and Supply to 2020 Dr. Fatih Birol, IEA
24
DUGUIN, Aleksandr. Osnovy geopolitki. Geopoliticheskoye buduschee Rossii. Myslit’ prostranstvom.
Izd.4-e. Moskva: Arktogea-Tsentr, 2000, pp. 211-213.

13
Novo Império. Este Império, segundo a lógica geo-política, deve superar estratégica e
espacialmente a versão anterior (URSS). Consequentemente, o Novo Império deve ser
eurasiático, bi-continental e em prospectiva mundial.” 25 Evidentemente que a questão
de recursos energéticos é considerado no contexto deste paradigma como crucial.
Ao contemplando criticamente propostas fascizantes, promovidas sob a
bandeira geo-política, faz sentido avaliar realisticamente a influência do crescimento de
demanda energética mundial sobre as relações internacionais nos próximos anos. O
Relatório do Conselho Nacional de Inteligência dos Estados Unidos “Contornos do
futuro mundial: relatório sobre o “Projeto-2020” apresenta uma visão sóbria e bem
realista, ressaltando que a demanda energética, sobretudo da parte das potências
emergentes, pelo ano 2020 se repercutiria cada vez mais sobre os relacionamentos geo-
políticos, distinguindo neste aspecto o aumento da demanda da China (em 150%) e da
Índia (em quase 200%). Os fornecedores de gás e petróleo terão alavancas mais
poderosas de influência. “A Rússia, como o maior fornecedor de matérias-primas
energéticas, fora da OPEP, encontrar-se-ia numa situação extremamente favorável para
conseguir seus objetivos na política externa e interna”. 26 Esta previsão está se
realizando na conjuntura econômica atual.
Considerações finais
Algumas considerações a respeito dos comentários da recente trajetória da
política de segurança da Rússia seriam cabíveis. A nova fase nas relações russo-
americanas, que vem sendo marcada por desentendimentos sobre uma gama de assuntos
da política internacional, desde a intervenção dos Estados Unidos no Iraque em 2003,
programa nuclear iraniano, crítica à abordagem dos direitos humanos, à atitude em
relação à “revoluções coloridas” no espaço pós-soviético e ao fortalecimento do
autoritarismo burocrático e anto-democrático até às recentes vendas de equipamentos
militares à Venezuela de Hugo Chávez, provoca diversas reavaliações, que variam da
“rejeição da Rússia” pelo Ocidente à uma nova “Guerra Fria”. 27 Nicholas K. Gvozdev e
Dimitri K. Simes escrevem com bastante razão, que “Putin’s “managed pluralism” falls
far short of the norms of Western liberal democracy, but to group Russia, a country that
retains a number of pluralist, democratic features, together with tyrannical states like
Zimbabwe or North Korea – or even more states like Pakistan and China – is highly

25
Op.cit., p.213.
26
Rossia i mir v 2020 godu. Moskva: Izdatelstvo Evropa, 2005, pp. 89, 91-93.
27
SOBEL, Vladimir. Psikhologicheskiye osnovy novoi “kholodnoi voiny” (Johnson’s Russia List”), site
http://inosmi.ru/ acessado em 26/09/2006.

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questionable. Russia is clearly not quite na ally of the United States, but neither does it
act as an adversary.” 28 Podemos acrescentar a isto que a cooperação da Rússia com os
Estados Unidos, União Européia na luta anti-terrorista e nas ações de não-proliferação
de ADM faz da Rússia um aliado ocidental insubstituível.
A aliança dos Estados Unidos com a Rússia é inevitável, independentemente
das divergências recíprocas sobre o programa nuclear iraniano ou discordâncias quanto
à intervenção no Iraque. A Proliferation Security Initiative, proposta pelo Presidente
G.W. Bush, que uniu 11 países em torno da luta de não-proliferação, ampliou o quadro
legal para meios de transporte das ADM em mar aberto. O ponto central da campanha
de prevenção do terrorismo nuclear está baseado sobre o programa de três “não” (não a
armas nucleares extraviadas, não à armas nucleares emergente e não a novos países
nucleares). 29 É óbvio que os Estados Unidos não serão capazes de empreender e
sustentar a campanha contra o terrorismo nuclear sem a Rússia.
Na sua nova avaliação do relacionamento da Rússia com o Ocidente na era
Putin, Dmitri Trenin do Carnegie Moscow Center, afirma que os países ocidentais
deram um tratamento frio às tentativas da Rússia de se tornar parte da comunidade
ocidental em troca de um papel específico da Rússia no espaço pós-soviético,
expandindo para o Leste e encorajando o enfraquecimento das estruturas internacionais
construídas pela Rússia no seu “exterior próximo”. A Rússia de Putin respondeu
rapidamente, lançando pontes para a China, inclusive na área militar, o que comprovam
os inéditos exercícios militares conjuntos dos dois países em agosto de 2005, e para
países asiáticos, colocando-se, devido aos progressos feitos na área de exploração e
comercialização de recursos naturais, bem como à revisão de preços das referidas
commodities, numa posição de fornecedor seguro e estável de matérias-primas
energéticas de maior importância para a Europa Ocidental, Ásia e o espaço pós-
soviético em geral. Ele conclui que “Today’s Russia may not be pro-Western, but
neither it is anti-Western. In the light of Russia’s new foreign policy, the West needs to
calm down and take Russia for what it is: a major ousider that is neither an eternal foe
nor an automatic friend.” 30

28
GVOZDEV, Nicholas K., SIMES, Dimitri K. Rejecting Russia? The National Interest. Summer 2005,
p.5.
29
ALLISON, Graham. How to stop nuclear terror. Foreign Affairs, January/February 2004, Vol. 83, No.
1, pp. 67, 69, 73.
30
TRENIN, Dmitri. Russia leaves the West. Foreign Affairs. Jul/Aug 2006. Vol. 85, No. 4, p. 95.

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A estratégia política e econômica russa, que toma alento da recuperação da
economia ao longo dos últimos seis-sete anos, está voltada para a construção de um
modelo de sociedade democrática e de economia nacional, respaldada por um
federalismo forte, que permita aguentar o impacto de uma evolução complexa e
multidimensional do país, sem a dependência excessiva da exportação maciça das
matérias-primas, superar o atraso científico-tecnológico e a dependência da tecnologia
de informação, investir na solução de problemas sociais, demográficos, educacionais e
ambientais da Rússia. Uma evolução da Rússia pelo caminho de um apêndice
energético do mundo pós-industrial, mesmo com estimativas de um potencial
gigantesco em reservas de gás, petróleo e outros minérios, prejudicaria os interesses do
país de maneira irreversível, de maneira que a política de consolidação da Rússia
degeneraria num fiasco perigoso de cunho autoritário. O movimento em direção aos
objetivos de sociedade global de informação e de conhecimento, únicas opções viáveis
para a Rússia no século XXI, destinadas a reverter as reservas acumuladas das vendas
de matérias primas em obras de desenvolvimento nacional, se alinharia com os
objetivos da construção da economia pós-industrial, de uma sociedade democrática e
eqüitativa e com o ideal de um futuro menos violento e mais seguro.

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