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Miguel Judas
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Portugal, Hoje – Na Perspectiva dos Interesses dos Trabalhadores
Prefácio
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Portugal, Hoje – Na Perspectiva dos Interesses dos Trabalhadores
O objectivo, porém, não é de provocar polémica, nem incomodar seja quem for,
atribuir méritos ou condenações. Em última instância, a crise que temos é da nossa
responsabilidade colectiva, cabendo a cada português a sua dose de responsabilidade.
O único objectivo é suscitar a reflexão, se possível íntima e intelectualmente
honesta, e que dessa reflexão possam resultar acções mais eficientes e convergentes
com os Interesses do país.
A ideia-chave que subjaz ao presente trabalho consiste na ultrapassagem dos
modelos organizacionais hierárquicos, característicos de fases muito atrasadas do
desenvolvimento das sociedades humanas modernas e a aproximação aos modelos
em rede, libertadores das energias, capacidades e mentalidades humanas,
libertadoras de forças produtivas.
Esta visão corresponde a levar em frente um processo que foi iniciado pelas
revoluções burguesas que libertaram as sociedades pré-industriais do espartilho
monarquico-feudal do Antigo Regime, tendo, no plano da economia, instituído o
Capitalismo como sistema sócio-económico dominante e, com ele, a liberdade de livre
cooperação e interacção entre as empresas e a instituição do Mercado. Este, no
sentido amplo, constitui a rede que permitiu a aceleração de todo o processo de
desenvolvimento. A instituição da Democracia não foi mais do que o reflexo, no
domínio da direcção política da sociedade, dessa profunda reorganização social.
No entanto, a vitória da rede sobre a hierarquia não é um processo automático
nem linear. Não o é no Mercado, nas relações inter-empresariais, nem na esfera
política, na Democracia. A luta entre o velho e o novo não fica resolvida com a
conquista do poder político pela parte da sociedade mais progressiva. Ela persiste no
tempo, com avanços e recuos, absorvendo as componentes do velho que se mantêm
úteis e fazendo nascer novas particularidades ou características.
Assim, as revoluções burguesas aboliram os mecanismos hierárquicos gerais, ao
nível macro-social, mas não os aboliram ao nível do funcionamento interno das
empresas nem do funcionamento interno da democracia. A organização e o
funcionamento em rede serão, na perspectiva da nova classe dominante, tanto quanto
necessários para a defesa dos seus interesses e não mais do que isso. As novas
estruturas ordenadoras do sistema social velam por que a entropia não aumente ao
ponto de comprometer a eficácia geral e as condições do desenvolvimento futuro.
Daí que as burguesias, implantando embora o funcionamento em rede ao nível do
mercado, das relações inter-empresariais e, parcialmente, ao nível das
superestruturas políticas da democracia representativa, tenham mantido os modelos
rigorosamente hierárquicos e autoritários no interior das empresas e ao nível dos
aparelhos dos Estados.
As condições da disputa mundial entre o capitalismo e o socialismo soviético, na
qual se colocava a sobrevivência de cada um dos sistemas, ambos adoptaram atitudes
de recentralização do poder típicas das situações de crise. Tal facto repercutiu-se na
neutralização das tendências gerais de longo prazo de desenvolvimento de todos os
sistemas em rede.
Nas condições da revolução científica e técnica e da intensificação da concorrência
capitalista à escala mundial, as empresas mais dinâmicas e a funcionar com base no
Conhecimento, foram em busca de factores de aumento da produtividade tanto na
valorização do capital humano como na adopção de modelos internos de organização
e funcionamento em rede e por missão, baseados numa grande autonomia e
interacção entre todos os elementos e unidades de trabalho.
Ao nível empresarial ou de grupos de empresas, surgiram assim diversos modelos
organizacionais, matriciais ou outros, que conjugam as suficientes componentes de
direcção hierárquica (administrativa) com a organização em rede.
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0. INTRODUÇÃO
O Mundo encontra-se numa fase de profunda reorganização económica, política,
social e cultural que dá pelo nome de “Globalização”.
Esse processo de globalização teve na sua base, no plano económico e financeiro,
o surgimento, especialmente a partir dos anos 60/70 do século passado, de empresas
multinacionais e da criação de uma rede de praças off-shore e, no plano político, a
derrocada do bloco socialista e da URSS.
No decurso desse processo veio a afirmar-se, por cima e contra as soberanias e as
economias nacionais, um vasto e poderoso sector de economia mundializada, apoiado
nas tecnologias mais avançadas e em imensos recursos financeiros, a qual concebe,
implanta e gere, à escala mundial, processos integrados de produção, transporte,
distribuição, comercialização e consumo de mercadorias.
Tal processo, prosseguido sob a hegemonia científica, tecnológica, económica e
financeira norte-americana, tem a sua correspondência política na hegemonia política
e militar dos EUA e na sua orientação unilateralista.
A principal função da Administração norte-americana consiste exactamente na
criação das Condições Gerais de Operação e desenvolvimento desse novo sector de
economia mundializada, mesmo que, para isso, tenha de entrar em confronto com os
interesses económicos e políticos de outras partes.
Face a essa dinâmica, os restantes agrupamentos económicos, de base nacional ou
regional, de conjuntos de países, procuram ajustar-se de modo a inserir-se no
processo de globalização e a aproveitar as oportunidades por ele abertas.
A rede mundial do capital financeiro drena, através das praças off shore, incluindo
a Suiça e outros paraísos fiscais, os recursos financeiros dos Estados, das economias
nacionais e dos sectores de tecnologia mais atrasada para o sector global da economia
mundializada, onde encontra melhores condições de reprodução.
Quem fica de fora dessa nova economia mundializada, tanto países como
empresas e grupos empresariais, não só não tem acesso aos necessários recursos
financeiros como irá sofrer a intensa concorrência dos produtos e serviços dessa nova
economia.
Os objectivos estratégicos desse sector de economia mundializada são a criação de
um mercado comum mundial, sem quaisquer barreiras, e o correspondente
esvaziamento das atribuições e dos poderes dos Estados Nacionais.
Em consequência da globalização em curso, o mundo e mesmo cada país,
polarizam-se em zonas e sectores económicos prósperos e zonas e sectores
económicos em depressão ou de subsistência. Em termos sociais, esse fenómeno
traduz-se numa crescente polarização entre riqueza e pobreza, tanto entre zonas do
mundo como no interior de cada país.
É neste contexto que se desenrolam, no plano internacional, as contradições entre
os EUA e o Mundo, representado na ONU, entre este e o grupo das potências mais
desenvolvidas, as contradições entre os diversos agrupamentos económicos regionais,
as contradições entre países no seio destes agrupamentos e, finalmente, as
contradições entre classes e grupos sociais dentro do mesmo país.
É ainda neste contexto que se colocam tanto as reservas sociais quanto ao
esvaziamento das competências dos Estados nacionais para novas entidades políticas
supranacionais como, em cada país, as opções governamentais pela defesa das
economias e os sectores produtivos nacionais ou pela liberalização e
internacionalização.
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Portugal foi apanhado pela onda da globalização económica quando mal tinha
iniciado o processo de modernização económica no quadro da sua entrada para a
Comunidade Europeia. Tendo, por incapacidade interna, perdido cerca de 20 anos e
delapidado enormes recursos financeiros que poderiam ter permitido a criação de uma
base económica internacionalmente concorrencial, confronta-se hoje com uma
profunda crise económica e financeira que, a não ser sustida com êxito, poderá
resvalar para uma endémica crise política e, finalmente, de regime.
A actual crise portuguesa não é, contudo, um problema novo, decorrente da nova
situação mundial. Sendo embora agravada por esta, ela não é mais do que a repetição
cíclica de uma História muito antiga que, pela sua “modernidade”, é mais comparável
com a do período final do Séc. XIX.
Constitui, antes, uma manifestação do baixo grau de desenvolvimento das forças
produtivas resultante da dominação histórica de classes e grupos sociais retrógrados,
pré-capitalistas, que têm permanecido agarrados a formas de exploração e a atitudes
económicas características do Antigo Regime monárquico-feudal, nunca se inserindo
verdadeiramente nas dinâmicas das sucessivas revoluções tecnológicas e
organizacionais capitalistas. No plano institucional, esse fenómeno manifesta-se na
tendência dos republicanos da nossa Segunda República, nascidos ou não na ditadura
fascista, conservarem e reproduzirem, ainda hoje, algumas formas e tiques de gerir o
Estado e os assuntos públicos advindas da fase liberal-constitucional da monarquia.
As Revoluções Liberal de 1822 e Republicana de 1910 pouco adiantaram quanto ao
processo de industrialização do país. Assim, Portugal chegou a meados do séc. XX
basicamente com as indústrias lançadas no tempo do Marquês de Pombal, as
infraestruturas ferroviárias construídas no Séc. XIX e algumas industrias
transformadoras de produtos agrícolas continentais ou coloniais.
A ditadura fascista que vigorou de 1926 a 1974 manteve o país fora dos processos
globais de desenvolvimento do capitalismo, favorecendo, especialmente a partir da
década de 1960, uma industrialização baseada num muito reduzido grupo de
monopólios financeiro-industriais e numa intensa repressão laboral. No plano da
agricultura prevaleceram, através dos latifúndios do sul do país e do minifúndio do
norte, as relações pré-capitalistas de produção.
Portugal ficou, por isso, de fora do processo geral de desenvolvimento do
capitalismo, não tendo desenvolvido as relações de Mercado em rede nem relações
laborais modernas.
A Revolução do 25 de Abril de 1974 veio repor as condições gerais de democracia
política e de libertação das relações de mercado para o desenvolvimento do
capitalismo. Contudo, tanto pela estrutura monopolista do poder económico como pela
fragilidade das classes médias burguesas, a Revolução colocou na ordem do dia a
passagem para um modelo de desenvolvimento de orientação socialista, baseado na
nacionalização dos grupos monopolistas financeiro-industriais e dos latifúndios, na
intervenção decisiva dos trabalhadores na gestão empresarial e no papel motor do
Estado no desenvolvimento económico.
Nos dez anos subsequentes, até meados da década de 80, a preocupação central
do poder político democrático consistiu em criar as condições para a emergência de
uma nova classe empresarial privada que relançasse o desenvolvimento económico e
em promover a desestruturação das forças políticas e sociais “colectivistas”,
designadamente da Intersindical Nacional.
O primeiro desses objectivos traduziu-se na entrada de Portugal para a CEE como
uma opção estratégica com vista à consolidação da democracia política, à abertura do
país ao investimento externo para modernizar as estruturas económicas nacionais no
quadro de uma economia de mercado capitalista e à criação de condições legais, de
infraestruturação geral e de apoio directo aos sectores empresariais nacionais.
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1. ANTECEDENTES E ESTRATÉGIA
Desde há muito que os sucessivos Governos Democráticos de Portugal têm vindo a
implementar políticas que não se têm mostrado decisivas para a superação da crise
actual.
1.1 Antecedentes e Caracterização
No fundamental, a situação caracteriza-se por:
a) Desmanteladas as estruturas do Poder Fascista na sequência do 25 de Abril, o
aparelho do Estado sofreu profundas alterações quantitativas como resultado dos
seguintes principais factores:
- Descolonização (absorção do funcionalismo público oriundo da administração
colonial; redução dos efectivos militares);
- Instituição do Poder Local (dotação dos Municípios com novos serviços e
capacidade técnica e dotação das Freguesias);
- Alargamento das actividades do Estado nos domínios dos sectores sociais e de
apoio ao desenvolvimento (educação, saúde, acção social e habitação, justiça e
estruturas de apoio técnico ao desenvolvimento económico);
- Alargamento da actividade internacional e do consequente aparelho diplomático
(estabelecimento de relações diplomáticas com um grande numero de países e
estruturas de apoio às comunidades emigrantes e de promoção económica
externa; integração na CEE/UE);
b) Entrada para a Comunidade Europeia com vista à definitiva estabilização
democrática e à criação de uma oportunidade para o desenvolvimento num quadro
de “economia de mercado”;
c) Estabelecimento, a meados da década de 80, de mecanismos para a captação dos
Fundos disponibilizados pela UE;
d) “Desestatização” progressiva da economia, abertura e incentivos ao investimento
privado; desmantelamento de alguns sectores económicos considerados
tecnologicamente obsoletos ou não competitivos no quadro da Comunidade;
e) Tomada de consciência sobre a profunda irracionalidade da estrutura e do
funcionamento do aparelho do Estado, sem contudo surgir qualquer ideia ou
medida de fundo para a sua reforma;
f) Surgimento, atrás do dinheiro fácil da UE de uma elite nacional degradada, com
reflexos na atitude global e criativa do sector privado em montar mecanismos de
transferência e apropriação desses fundos com base no alastramento do
favoritismo e da corrupção ao nível do sector público;
g) Cavaco Silva foi derrotado e abandonou o seu próprio partido face à incapacidade
para inflectir as aplicações financeiras para os sectores e projectos que poderiam,
de facto, promover o desenvolvimento estratégico, a modernização e
competitividade da economia;
h) Os Governos que lhe sucederam geriram o país na expectativa que o
desenvolvimento surgisse espontaneamente da dinâmica e iniciativa do sector
privado e de uma hipotética boa conjuntura internacional;
i) Os últimos governos do PSD só tiveram a vantagem de introduzir na sociedade
portuguesa algum dramatismo face à necessidade de contenção das ilusões
facilitistas e quanto à verdadeira situação das finanças públicas. De resto, ainda
ficámos mais desmoralizados e afastados da Europa!
j) O novo Governo do PS, apoiado numa confortável maioria absoluta parlamentar,
criou enormes expectativas. Porém, a Inovação e a luta contra as corporações de
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interesses só são realizáveis com um forte apoio popular que, importa, não seja
esbanjado.
1.2 Objectivos estratégicos
As cinco questões estratégicas que se colocam hoje são:
1. Criação de um quadro de condições internacionais favoráveis para o
desenvolvimento do país, fundadas na paz, na solidariedade e na cooperação
internacionais, no respeito pela diversidade cultural e pelas soluções políticas
democráticas dos povos e num maior controlo democrático do capital financeiro e
das off-shore à escala mundial;
2. Reformar o Estado conferindo-lhe um carácter democrático e económico-
empreendedor, assegurando o equilíbrio financeiro, recriando uma capacidade de
investimento estratégico e promovendo a modernidade funcional e a qualidade de
serviços. Não Menos Estado mas sim Melhor Estado;
3. Promover um desenvolvimento económico e social acelerado e sustentado do país,
superior à média europeia, assegurando a máxima autonomia alimentar e
energética, a coesão social e a valorização do capital humano;
4. Participar na plena instituição da UE assegurando o seu carácter democrático e o
seu papel progressista no desenvolvimento equilibrado da Europa e do mundo;
5. Informar e mobilizar os portugueses para, num ambiente de grande Participação
Social, superarmos das actuais dificuldades e promovermos o desenvolvimento do
país contando, em primeiro lugar, com as próprias forças.
1.3 – Amarga síntese do estado actual dos recursos estratégicos
internos:
a) A Constituição da República
A Constituição da República Portuguesa constitui a Lei Fundamental do país. Não
sendo prosseguida, coloca, imediatamente, no plano das correlações de forças, e
não do Direito, o processo de gestão nacional. As disposições constitucionais passam
a constituir frases vazias, uma mera apelação ou uma justificação.
O respeito ou o cumprimento da Constituição é, hoje, entendido, simplesmente,
como o seu não desrespeito, a sua não violação. Pode-se fazer tudo, desde que não
se pratiquem actos claramente anti-constitucionais. As próprias violações, não
constituem crime, não envolvem penalização, nem sequer sanção política ou moral;
somente se informa o transgressor que deve deixar de violar.
Mais parece que a Constituição integra algumas disposições de programa mínimo
obrigatório e muitas outras facultativas, servindo somente como referências morais
ou utopias.
É esta, de resto, a postura pró-passiva dos Presidentes da República e do
Tribunal Constitucional.
No entanto, todo o discurso da Constituição é pró-activo, designadamente
quando comete obrigações muito específicas ao Estado, tanto nos âmbitos da sua
intervenção como nos objectivos, propósitos e formas de gestão.
Da conferência entre as disposições constitucionais e a realidade actual do país
ressalta, imediatamente, o seu não cumprimento sistemático e extensivo pelo
próprio Estado. Argumentar-se-á, relativamente a algumas das suas obrigações, que
o “Estado é fraco”, que “não tem os recursos suficientes para...”, etc. Com o
processo em curso de pauperização financeira, instrumental e de Autoridade
Democrática do Estado, será de supor que este nunca estará em condições de
cumprir as suas obrigações constitucionais.
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Esta situação poderia e deveria ser minorada e evitada se os órgãos que têm por
missão defender e fazer cumprir a Constituição tivessem uma atitude pró-activa
nessa função e os adequados instrumentos de intervenção.
Em primeiro lugar, seria exigível que os programas de Governo e os demais
instrumentos de gestão previsional do Estado fizessem evidência, relativamente a
cada Artigo da Constituição, do seu cumprimento, baseada em adequados estudos e
dados estatísticos.
Este, sim, deveria constituir o primeiro critério de avaliação da acção governativa
e legislativa, o qual constituiria fundamento para o empossamento e a eventual
dissolução de órgãos e para uma sustentada avaliação política pelos cidadãos em
actos eleitorais: a governação por “benchmarks” constitucionais.
Desde há 30 anos que o Estado tem como uma das suas “Tarefas Fundamentais”
(alínea h do Art.º 9º da Constituição) “Promover a igualdade entre homens e
mulheres”. Pelo grau de realização dessa “tarefa fundamental”, que hoje todos
reconhecemos ser irrisório, poderemos inferir o estado de realização de todas as
outras tarefas do Estado. Os episódios de boa vontade mas inconsequentes, que
periodicamente se repetem, normalmente em períodos eleitorais, da
representatividade das mulheres nas estruturas políticas do país, não reflectem uma
actividade sistemática de promoção da referida actividade. A realidade quotidiana da
discriminação das mulheres é, porém, hoje, em muitos aspectos, pior do que já foi
há 30 anos. A “modernidade” daquelas empresas que se recusam a empregar
mulheres - porque podem engravidar, o alastramento do emprego clandestino - sem
contratos nem recibos, e da legislação sobre o aborto são exemplos menores da
insidiosa, permanente e implacável violência que continuam a sofrer em todas as
áreas da vida familiar, económica e social. As mulheres continuam, em geral, a
constituir uma classe de cidadania mitigada situada, mais ou menos, entre os
cidadãos de pleno direito e os emigrantes clandestinos romenos. Este é o estado de
mais de 50% do nosso capital humano.
A Constituição da República contém, em si, todas as condições e indica os
caminhos (designadamente, pelo “aprofundamento da democracia participativa”)
para a Reforma do actual Sistema Político, reconhecidamente deficitário e a entrar
em crise de representatividade, e para as Reformas do Estado e do Sistema
Económico.
Constatar-se-á, mais adiante, que as vias para a superação da actual crise
nacional passam, de facto, pela restituição à Constituição da República o seu papel
fundamental no ordenamento e orientação estratégica do país, pela reposição da
legalidade constitucional.
A crise revela-se ser resultado, também, do elevado grau de incumprimento da
Constituição.
b) O Estado
Tal como na fase final do século XIX, o Estado encontra-se altamente fragilizado,
sem dinheiro, desorganizado e desmotivado, exercendo, essencialmente, a função
de plataforma de distribuição de “fundos externos” e recursos próprios para o
enriquecimento privado (o que até se poderia justificar como método de
“acumulação primitiva” a um sector privado nascente, o que não é o caso de
Portugal).
Grande parte do sector empresarial do Estado foi sendo privatizado ao longo dos
anos não tanto por uma motivação modernizadora mas sim para “libertar” o Estado
dos respectivos proveitos (dividendos e impostos) e como meio de obtenção de
recursos para o seu funcionamento corrente, fazendo lembrar a venda, pelos liberais
novecentistas, dos bens da igreja então nacionalizados. Os restantes bens
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A ligação dos partidos políticos à população ficou, assim, cada vez mais
mediatizada pelos meios de comunicação social, especialmente a televisão, e pelos
especialistas de marketing. A política foi ficando transformada num produto que, na
altura das eleições, se vende com o propósito essencial da obtenção do voto, não
estabelecendo, em muitos casos, um compromisso de cumprimento das promessas
eleitorais.
Na sequência desse sentimento generalizado, a classe política começou a
reconhecê-lo publicamente, tanto em declarações para o exterior como em debates
internos aos partidos. São bons sinais que carecem de ser prosseguidos com
medidas de efectiva Reforma do Sistema Político que reforcem a representatividade
dos partidos e legitimidade das instituições democráticas, clarifiquem os modelos de
financiamento partidário e confiram ao sistema uma rejuvenescida dimensão de
utilidade pública.
No entanto, muito haverá a fazer, dentro e fora dos partidos, para que se cumpra
o preceito constitucional de “aprofundamento da democracia participativa” e, por
essa via, evitar a crescente redução do nível de literacia política dos cidadãos, não
se sabendo onde poderemos chegar quando desaparecer a geração formada pelo 25
de Abril.
A melhor contribuição dos partidos políticos para a superação da actual crise
nacional não se mede pelos seus patrimónios, recursos financeiros ou capacidade de
marketing, mas, fundamentalmente, pelas suas ideias, propostas e exemplos, em
suma, pela sua capacidade pedagógica e motivadora de vontades e acções.
A crise actual é, mesmo, muito profunda, exigindo um urgente repensar das
práticas e da estrutura do sistema político.
Se a actual crise tender a arrastar-se, não será de excluir uma rearrumação do
espectro partidário tendente a uma maior polarização da política portuguesa.
d) O Regime e o Sistema Político
Se bem que a Constituição da República institua uma democracia participativa,
de facto a democracia portuguesa tem sido essencialmente, e cada vez menos,
representativa.
Da fragilidade dos partidos políticos, decorrente, quer do déficit democrático das
suas vidas internas quer da falta de permeabilidade com as populações, veio a
resultar um extraordinário ressurgimento das chamadas corporações, informais e de
carácter difuso.
Estas, estruturam e representam, informalmente, de modo não oficial, os
diversos grupos sociais e económicos com interesses privados específicos no saque
dos recursos públicos e na defesa intransigente e egoísta dos respectivos interesses.
Estas estruturas informais dotadas de grande e instantânea capacidade de
mobilização, coordenação e influência nos órgãos do poder, no Estado e na
comunicação social, têm muito mais capacidade de modelar a política do país do que
as instituições democráticas ou os partidos políticos. A comprová-lo está a endémica
incapacidade do poder político em promover, na prática, qualquer tipo de reforma de
fundo.
As corporações representam tanto interesses económico-empresariais como
interesses profissionais de profissões liberais e de grupos de trabalhadores de elite,
funcionalmente importantes para a estabilidade do sistema económico ou social e,
por isso, com capacidade reivindicativa.
Quem tem ou pode usar os mecanismos corporativos, participa, de um modo
egoísta, na gestão da sociedade, normalmente com um sentido reaccionário, em
oposição às reformas que poderão por em causa os seus interesses ou, ainda,
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considerando os objectivos políticos então fixados pelo Poder, foi um feito notável
(mais de 40 anos no poder e a capacidade técnica e financeira para “aguentar” 15
anos de guerras coloniais em várias frentes, mostram grande eficiência na
prossecução dos objectivos). Sem uma forte centralização do Poder e uma grande
disciplina financeira (recorde-se o papel central do sistema das Finanças) não teria
sido possível criar esse Estado. Fizeram-no, porém, fundados em concepções anti-
democráticas.
Assim, o Fascismo construiu um Estado Totalitário, e Administrativo-Policial.
Divorciados da Sociedade e conservando até ao fim a lógica da reprodução do
Poder, inibiram e reprimiram as iniciativas dos cidadãos em geral, apoiando-se num
pequeno número de “fiéis correligionários”. Travaram o normal “desenvolvimento das
forças produtivas”. E caíram !
Apesar da natureza democrática das novas instituições, a estrutura e o
funcionamento do aparelho do Estado herdados pela “2ª República” mantiveram-se,
contudo, globalmente idênticos até ao presente.
Na sequência e com a vivência do processo revolucionário do 25 de Abril veio a
criar-se uma sociedade muito livre e com exigências participativas. A nova
Democracia mostrou-se capaz de resolver adequadamente o conjunto de desafios
imediatos que se impuseram, designadamente quanto às consequências da
descolonização, da abertura do país ao exterior, da instituição e autonomia do Poder
Local, das nacionalizações e da promoção das condições básicas de vida da população,
designadamente nos domínios sociais. Por factores que não importa agora
desenvolver mas que assenta na adopção de uma atitude conservadora dos partidos
com vista à conjuntural luta e utilização do poder e ao acesso aos recursos da Europa,
a Segunda República “esqueceu-se” de reconfigurar o Estado às novas necessidades e
objectivos estratégicos da Sociedade. Assim, o velho Estado adaptou-se à nova e
conjuntural função de plataforma distribuidora dos recursos mantendo, no
fundamental toda a anterior lógica, agora com mecanismos de responsabilização
quase inexistentes por motivo do “rotativismo partidário” a que foi sujeito durante
anos.
“Olhando” para a estrutura do Estado “central” logo que constata a sua
organização exclusivamente sectorial à escala de todo o país. Os serviços
regionalizados de cada Ministério sectorial não têm articulação entre si, mantendo-se
estritamente dependentes do “centro”.
Esta situação corresponde a que, na prática, qualquer coordenação, inter-sectorial
ou territorial só poderá ser realizada com maior probabilidade de êxito pelo Primeiro-
Ministro (antigamente, pelo Presidente do Conselho de Ministros, o qual, como
verdadeiro “chefe”, enviava o Américo Tomás, os Governadores Civis ou os nomeados
Presidentes das Câmaras distribuir, localmente, algumas benesses).
A instituição do Poder Local Democrático constituiu, sem dúvida, ao momento, um
forte avanço no sentido da resolução dos problemas mais imediatos sentidos pelas
populações e da intervenção democrática dos cidadãos.
Porém, o modelo centralista do Poder manteve-se no essencial, não
desempenhando o actual poder local qualquer função estratégica.
Os subsídios “automáticos” ao Poder Local, o acesso a alguns “fundos europeus”
(muitas vezes distribuídos segundo critérios partidários) e pelo rodopio fortemente
entrópico dos trezentos e tal Presidentes das Câmaras junto dos membros do Governo
e organismos da Administração Central mendigando alguma atenção e recursos não
resolveram o essencial do problema. As Presidências Abertas e os Conselhos de
Ministros descentralizados foram iniciativas inconsequentes para assegurar algum
momento e lugar de sincronização territorial.
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Tal déficit de enquadramento político democrático terá de ser corrigido tanto pela
“Regionalização” democrática como pela maior participação do actual Poder Local na
gestão dos serviços já hoje “regionalizados”.
3.2.5 – Os Recursos Humanos da Administração Pública
Sob o pretexto de “despolitizar” o aparelho do Estado na sequência do processo
revolucionário de 1975, afastaram-se os quadros democráticos e progressistas que
havia e abriram-se lugares para as pessoas “de confiança”. Não esqueçamos que o
aparelho de Estado herdado pela Democracia era profundamente conservador e de
mentalidade imobilista ao nível dos seus dirigentes, não tendo alterado o seu carácter
pelo arremedo de “saneamento” que se chegou a intentar. Desse novo saneamento “à
esquerda” resultou uma hierarquia globalmente “de direita” que tende a paralisar
quaisquer tentativas de reforma democrática. Quando o PS vai para o Governo, essa
hierarquia tende a disfarçar o seu imobilismo com inconsequentes declarações de
profissionalismo e isenção, tornando-se, pelo contrário, efectivamente colaborante
com os governos de direita (recordemos, pelo menos, pela sua visibilidade pública, as
“cascas de banana” que constituíram alguns episódios da GNR que comprometeram
politicamente os Ministros do PS Fernando Gomes e Alberto Costa). Não é por acaso
que quando o PS vai para o Governo ressurge sempre o alarido dos “boys”, que,
antes, se chamavam “comunistas”... Com a algazarra da direita, que, ao longo dos
séculos, naturalmente, sempre entendeu o Estado como seu, a esquerda tende a ficar
com “complexos”, relativamente à criação de uma hierarquia democrática no aparelho
do Estado.
De facto, o assunto não é de filiação ou simpatia partidária mas sim de se ter ou
não espírito reformador, criatividade organizacional e de gestão, liderança e
mentalidade “económico-empreendedora”, sentido de serviço público, num quadro de
modernidade.
Infelizmente, não possuindo embora o perfil adequado para promover a
modernização do aparelho do Estado, alguns desses dirigentes “conservadores“, mas
sérios, ainda vão desempenhando um papel positivo no sentido de refrear alguns
ímpetos pseudo-modernos tendentes a autênticas práticas de “bagunça” negocista na
administração pública.
A linha de dirigentes e técnicos de “staff” da Administração Pública encontra-se
fortemente debilitada e pervertida. A chamada “confiança partidária” (que, depois dos
altos, invadiu os mais baixos escalões de direcção) e a disponibilidade para, por vezes
de forma mais do que arrevesada, servir de “carneiro no altar de algumas decisões
públicas”, passaram a ser uma espécie de “código deontológico”. De facto, ao nível do
Estado, extinguiu-se a Liberdade de opção política, em nada se distinguindo algumas
práticas actuais dos célebres juramentos e procedimentos do “antigo regime”.
A luta político-partidária pelo Poder o controlo do aparelho tecnico-administrativo e
de gestão Estado transformou-se um facto mais que habitual, consensual, uma
característica da Democracia, ao contrário do que pretendia mostrar um conhecido
programa inglês de televisão. Muitos quadros, aptos e dedicados noutros tempos, com
sentido do serviço público, preferem aguardar hoje, passiva e confortavelmente, em
“prateleiras douradas”, o tempo das suas reformas. Outros, para nossa sorte,
mantêm-se como verdadeiros heróis resistentes, a manter o fundamental do que
ainda funciona na Administração Pública.
A política de quadros da Administração Pública, como resultado do imobilismo
conservador, do “rotativismo político” e das “comissões de serviço”, está
profundamente pervertida.
O Estado é da Nação, devendo obediência e lealdade ao poder político eleito mas
não podendo ser “apropriado privadamente” por qualquer grupo ou partido.
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Por outro lado, grandes estratos da população ainda entendem o Estado (não sem
alguma razão) como algo exterior, contra eles, que lhes foi imposto, de que se
desconfia à partida e de onde, quando possível, se vai sacar alguma coisita: deverão
ser ganhos, através da informação transparente e da participação, para uma atitude
de confiança e de cooperação, de assunção da sua condição de “co-proprietários”
responsáveis desse Estado, ao mesmo tempo que se fecham as portas aos
comportamentos oportunistas.
Tanto uns como outros não irão mudar de atitude através de piedosos cursos de
“Cidadania” (o que não invalida o mérito destes junto da juventude).
Um Estado Democrático é um Estado que acolhe e suscita a permanente
participação organizada da população na gestão dos seus negócios; é,
tendencialmente, utopicamente, um Estado que se funde e se extingue na auto-
organização social.
O caminho para a sua construção não passa pelo “basismo fala-barato”, quase
sempre ignorante e muitas vezes oportunista, nem, tão-pouco, pela “política-
espectáculo”, quase sempre obscurantista e manipuladora, das campanhas eleitorais
quadrienais.
Essa participação democrática, permanente, racional e responsável, é a grande
Escola de Cidadania, a principal “fábrica” de Capital Humano para o Desenvolvimento.
Decorre do acima exposto, a necessidade de um complexo projecto de
reengenharia social (organizacional, psicológica…) cuja concretização poderá começar
já hoje mas que poderá levar décadas para se notarem diferenças qualitativas no
estado do “objecto”.
A construção do Estado Económico/Empreendedor exigirá, em primeiro lugar, a
própria Reforma interna do Estado para o Modelo Empresarial acima referido. Essa
será a “grande escola” que irá permitir aos dirigentes do Estado e aos seus agentes a
compreensão do funcionamento económico da sociedade e a percepção dos
instrumentos de estímulo económico (inc. fiscal) mais adequados à
“orientação/regulação” da actividade da sociedade para os objectivos estratégicos.
Um Estado Burocrático-Administrativo-Policiesco só pode imaginar/inventar
instrumentos à sua imagem e semelhança; o Estado Burocrático é uma reminescência
do Estado do “Antigo Regime”, aristocrático-feudal. Só um Estado Democrático-
Económico-Empreendedor poderá satisfazer as necessidades da Economia Moderna e
“reinventar” instrumentos democráticos e económicos de regulação da sociedade.
3.2.10 – Novos critérios de gestão e de investimento
Uma gestão pública focada nos Objectivos, nos Cidadãos e nos Resultados,
estrutura-se através de Programas, Projectos e Acções. A cada um desses níveis
operacionais deverá corresponder uma estrutura organizacional a quem competirá a
respectiva Gestão. Esta Gestão compreende o Planeamento e Programação (incluindo
o financeiro-orçamental e do recurso Tempo), a Organização e Coordenação dos
meios de execução, o Controlo e o “Reporting” (“Relatório e Contas”).
Uma “Agência” de Gestão, no caso português tipicamente uma Direcção-Geral, um
Instituto ou uma Empresa Pública, poderá manter a responsabilidade por um ou mais
Programas. No entanto, cada Programa/Projecto deverá ser gerido por uma Unidade
de Gestão própria, um “Conselho de Administração” responsável pela obtenção dos
objectivos específicos de cada Programa/Projecto. Cada Programa ou Projecto, para
além da respectiva Unidade de Gestão deverá ser acompanhado por um órgão
consultivo (Assembleia Geral Consultiva) e por um Gestor de Qualidade/Auditor
Interno, como se de uma “empresa autónoma” se tratasse.
O Relatório “Reinventar a Administração Pública” sobre o estado da Administração
Pública americana e as opções fundamentais para a sua reforma, elaborado sob a
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Os apoios e incentivos ao sector privado da economia são poderão mais ser criados
e aplicados de modo indiscriminado ou a favor de lobbies mais activos. Esse processo,
que o Estado deverá manter como linha estratégica com vista à competitividade do
país, tem de ser altamente selectivo, nos agentes e nos projectos.
Os anos que se vão seguir serão cruciais para a definição do papel que Portugal
poderá desempenhar na Europa e na Península Ibérica. A reforma do “Sistema
Nacional de Eleição e Gestão dos Projectos de Investimento” será fundamental para
esse efeito.
Dada a actual fraca capacidade de investimento público e debilidade do sector
privado nacional, o próximo Governo não poderá deixar de atribuir a maior
importância à captação do investimento estrangeiro estruturante. Isto implica uma
profunda reforma orgânica e cultural em todo o nosso sistema de relações exteriores,
direccionando-o e tornado-o apto para a identificação, selecção e captação dos
recursos externos necessários atrair para o desenvolvimento da nossa economia e
para a colocação dos produtos nacionais nos mercados externos. A maior parte das
tradicionais embaixadas, especialmente na Europa e em muitos outros países,
deveriam ser transformadas em verdadeiras agências comerciais e económicas e em
“consulados” activos de apoio aos portugueses no estrangeiro, concentrando a
actividade diplomática “política” só nos locais essenciais. Longe está o tempo das
embaixadas de representação/prestígio; hoje, cada “serviço” tem de justificar a sua
existência por aquilo que produz de útil.
3.2.10.8 – Planeamento Público
O planeamento consiste numa das funções essenciais a qualquer processo racional
de gestão. Sem planeamento os objectivos e os recursos dispersam-se, perdem-se,
no seio de inúmeras circunstâncias conjunturais. Um Estado sem planeamento limita-
se a ser um conglomerado de factos em direcção a coisa nenhuma.
A ausência de processo de planeamento conduz, inexoravelmente, à fragilidade
financeira e institucional do Estado e à desorientação dos seus sistemas operativos e
funcionários. Instala-se o estado de espírito do “... estamos p’ráqui ...”
A Constituição da República exige que o Estado tenha um sistema de planeamento
(Art.º 80º); mais, que esse planeamento seja democrático, que inclua a participação
das organizações representativas dos trabalhadores e das organizações
representativas das actividades económicas.
Define, no seu Art.º 90º, os objectivos dos planos de desenvolvimento económico
e social (promover o crescimento económico, o desenvolvimento harmonioso e
integrado de sectores e regiões, a justa repartição individual e regional do produto
nacional, a coordenação da política económica com as políticas social, educativa e
cultural, a defesa do mundo rural, a preservação do equilíbrio ecológico, a defesa do
ambiente e a qualidade de vida do povo português.)
Determina, no seu Art.º 91º, que sejam fundamentados e executados de forma
descentralizada, regional e sectorialmente.
Considera tão essencial o planeamento que, no Art.º 288º, estabelece “a existência
de planos económicos no âmbito de uma economia mista” como um dos limites
materiais das revisões constitucionais.
A perda gradual de importância institucional e, mesmo, o seu desaparecimento
mostram como a influência ideológica neo-liberal de apossou do Estado português.
Quando se fala em Planeamento logo esse facto suscita uma perplexidade do tipo:
“isso não é um tique bolchevista?”. Em nossa opinião, seria uma boa pergunta a
colocar ao Bill Gates numa das suas próximas viagens a Portugal, “se a Microsoft não
leva o Planeamento muito a sério”.
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A título de exemplo, poderemos referir uma das medidas que poderia ser
implementada: a expropriação sistemática dos terrenos urbanos e a sua gestão futura
por “direito de superfície”. Outra, seria a obrigatoriedade das empresas imobiliárias
procederem à gestão por projectos e a fixação de margens máximas de
comercialização sobre os custos directos para cada projecto, bonificadas em função
dos méritos arquitectónico/paisagísticos, construtivos, energéticos, funcionais e
outros, das construções.
É vital que a política deixe de depender do “imobiliário” para passar a encará-lo
como um sector económico da maior importância para a competitividade económica
do País e a Liberdade dos cidadãos. É necessário que os lucros exorbitantes gerados
pelo sector e arrebanhados por proprietários iniciais de terrenos, construtores e
urbanizadores, bancos, e muitos outros que não o fisco, sejam “devolvidos” aos
compradores/utilizadores finais por forma a poderem ser reinvestidos por estes na
economia ou na valorização do “capital humano” pessoal e familiar.
Para além da “terrível” operação de Reorganizar o Estado será este, talvez, o
maior desafio dos futuros Governos.
4.4 - Reconquistar o mercado nacional
No território de Portugal vivem cerca de 10 milhões de pessoas com as mais
diversas necessidades de bens e serviços.
Não vemos razão por que as empresas portuguesas não aproveitem
adequadamente a “vantagem competitiva” da sua proximidade (geográfica e cultural)
ao mercado nacional para o reconquistar.
Encontrando-se Portugal, e bem, num espaço de economia aberta, todos os
mercados se encontram em disputa. É, porém, confrangedor verificar os portugueses
a comprar laranjas da África do Sul, pêras de França, etc. O mesmo se diria para
alguns produtos do sector industrial... Quanto aos “serviços” que, em geral, não
podem ser realizados “à distância” nem necessitam de grandes investimentos em
capital físico, haverá ainda melhores condições para que as empresas portuguesas
alcançarem sucesso no mercado doméstico.
O actual estado das coisas não derivou do “destino”. Ele decorreu como
consequência das nossas tradicionais incapacidades ao nível do “brainware”, do baixo
nível de formação dos recursos humanos, do deficiente aproveitamento dos Fundos
que nos foram disponibilizados pela UE durante cerca de 20 anos, e das políticas de
favorecimento frequentemente seguidas pelo poder político relativamente a clientelas
(empresas e quadros) incapazes ou parasitárias.
O tecido empresarial português tem a responsabilidade de, em alguns sectores,
produzir e comercializar produções em vantagem competitiva com os produtos
estrangeiros.
Sem dúvida que deveremos estar orientados para a exportação, para a criação de
produtos e “marcas” vendáveis no mercado internacional. Porém, isso só é possível,
de modo significativo, com base em muito conhecimento cientifico e tecnológico, em
grande capacidade de gestão, em firmes e evoluídas práticas de comercialização. Isto
é, com rápido desenvolvimento do nosso sector educativo o qual hoje vive sem
ambição, parecendo que se contenta em manter um nível mínimo de literacia e formar
pessoas para “caixas de supermercado” ou “empregados hoteleiros”. A má qualidade
e degradação do nosso ensino público “de massas” não é compensada pela existência
de algumas escolas e universidades de qualidade (as realmente reconhecidas no
mercado), com acesso restrito aos filhos das novas elites.
O modo de funcionamento do nosso Estado e da nossa Economia, virados em
grande parte para a montagem de “esquemas”, assim como uma falta de cultura
social de algumas elites políticas, conservadoramente fechadas sobre si próprias, leva
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5. Tentativa de Síntese
a) A Constituição da República contém todas as referências necessárias para o
Desenvolvimento Sustentado de Portugal e para a avaliação das políticas. Não é
preciso mudar nada; só cumprir o prescrito;
b) É necessário repor o Regime e o Sistema políticos a funcionar sem perversões;
c) O Estado continua a desempenhar um papel imprescindível para a superação da
crise actual e como “motor” do desenvolvimento futuro;
d) O Estado tem de ser Forte, “Rico” e Empreendedor. A sua reforma nesse sentido é
uma prioridade capital;
e) O Desenvolvimento não provirá, essencialmente, da “economia mundial” mas sim
do reforço da economia nacional num quadro alargado, ibérico e europeu;
f) A modernização e a competitividade da economia portuguesa não podem prescindir
da superação das perversões terceiro-mundistas de uma burguesia ainda “rústica”
nem da participação empenhada dos trabalhadores;
g) O aprofundamento da Democracia Participativa, a Educação e Formação e as
políticas sociais são condições essenciais para o desenvolvimento qualitativo do
Capital Humano nacional e uma modernização tecnológica acelerada.
h) A construção europeia e um ambiente internacional de Paz e Cooperação são
essenciais para o desenvolvimento de Portugal.
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ÍNDICE
Prefácio
0. INTRODUÇÃO
1. ANTECEDENTES E ESTRATÉGIA
1.1 - Antecedentes e Caracterização
1.2 - Objectivos estratégicos
1.3 - Estado actual dos recursos estratégicos internos:
1.4 Quadro Geral de Referência para o Futuro - Estratégia:
2. AMBIENTE INTERNACIONAL DE PAZ, COOPERAÇÃO E SOLIDARIEDADE
3. CONSTRUÇÃO DE UM ESTADO FORTE
3.1 - Anos de “construção” de um Estado Pobre e Fraco, ou a teoria do “Menos
Estado”
3.2 - Para a construção de um Estado Forte
3.2.1 - Domínios de Intervenção
3.2.2 - Natureza e Estrutura do Estado
3.2.3 - Estado de Direito, Prestígio e Autoridade
3.2.4 - O défice de enquadramento político democrático
3.2.5 - Os Recursos Humanos da Administração Pública
3.2.6 - A Reforma do Poder Local
3.2.7 - Por uma nova gestão da “área social”
3.2.8 - Modelo “Redistributivo” ou Modelo “Empresarial”
3.2.9 - Modelo Totalitário-Administrativista ou Democrático-Económico/Empreen-
dedor
3.2.10 - Novos critérios de gestão e de investimento
3.2.10.1 - Gestão Democrática e Participação Social
3.2.10.2 - “Modernização” Tecnológica: O perigo do “carro à frente dos bois”.
3.2.10.3 - Formas de Gestão das actividades do Estado, Interesse Público,
Interesse Geral e Mercado
3.2.10.4 - Orientações para o Reequilibro Geral das Contas do Estado
3.2.10.5 - ... o papel dos Ministérios “económicos” na luta contra o défice
3.2.10.6 - “Não há almoços grátis” ou Quem está a pagar para Quem
3.2.10.7 - Investimentos - Hardware versus Software-Brainware
3.2.10.8 - Planeamento Público
3.2.11 - Reforma do Estado: Questão política Essencial
4. UMA NOVA ECONOMIA E UM NOVO CONCEITO DE EMPRESA
4.1 - A ideia do “Socialismo” não tem futuro?
4.2 - Uma estrutura empresarial de “subsistência” ...
4.3 - Sector Imobiliário – A força gravitacional do “buraco negro”
4.4 - Reconquistar o mercado nacional
4.5 - A Gestão do Sistema Investigação-Inovação (SI2)
4.6 - Factores Gerais para a Competitividade Nacional
5. TENTATIVA DE SÍNTESE
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