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IGREJA DO

CARMO
RESTAURAÇÃO E CONSERVAÇÃO - 2013/2015

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“(...) de nenhum modo poderíamos resgatar uma
lembrança perdida se seu esquecimento fosse total.
(...) grande é realmente o poder da memória”.

Santo Agostinho (In: Confissões de Santo Agostinho)

Vista da igreja do Carmo, desenho de J. Leon Righini


Fonte: Centro de Memória da UFPA

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Biblioteca Aloísio Magalhães, Iphan

M24 Igreja do Carmo: restauração e conservação - 2013/2015 /


organização, Giovanni Blanco Sarquis e Maria Dorotéa de Lima.
– Belém, PA : Iphan-PA, 2015.
48 p. : il.; 21cm

ISBN : 978-85-60909-14-8

1. Arquitetura – Restauração e Conservação. 2. Bens


tombados. I. Sarquis, Giovanni Blanco.

CDD 720.288

Igreja do Carmo após a restauração

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CRÉDITOS Presidente da República
Dilma Roussef
Gerente de Relacionamento e
Comunicação
ORGANIZADORES Organizadores da publicação Conceitos e critérios
de intervenção
INSTITUCIONAIS Paulo Ivan Campos DA PUBLICAÇÃO, Giovanni Blanco Sarquis Giovanni Blanco Sarquis
Ministro da Cultura Arquiteto-urbanista. Especialista em
Juca Ferreira Gerente de Comunicação Belém AUTORES DOS Paisagismo Tropical. Mestre e Doutor A ação educativa da obra
e Marabá em Arquitetura e Urbanismo. Técnico de restauro do Carmo
Presidente do Iphan Lívia Amaral TEXTOS E DEMAIS em Arquitetura e Urbanismo do Iphan Armando Sampaio Sobral
Jurema de Sousa Machado
Analistas de Comunicação
CRÉDITOS no Pará desde 2006
Maria Dorotéa de Lima
Artista plástico
Lucicleide de Azevedo Ribeiro
Diretor do Departamento do Fernanda Pacheco Arquiteta-urbanista. Especialista em Pedagoga e pós-graduanda em
Patrimônio Material e Fiscalização Danielle Redig Avaliações Ambientais do Espaço Pedagogia Empresarial
Andrey Rosenthal Schlee Construído. Mestre em Antropologia.
Obras Sociais da Arquidiocese Técnica do Iphan e Superintendente Produção Editorial
Diretor do Departamento de de Belém do Iphan no Pará desde 2006
Articulação e Fomento CA NO MEDIA
Luiz Philippe Torelly Presidente das Obras Sociais Autores dos textos Rua Jerônimo Pimentel, 107.
D. Alberto Taveira Corrêa CEP 66055-000 • Umarizal •
Superintendência do Iphan no Pará A Igreja de Nossa Senhora Belém - Pará
Diretor-Geral das Obras Sociais do Carmo em Belém do Pará Fone/Fax: (0XX91) 4005 - 1999
Equipe Técnica Pe. Idamor da Mota Júnior Aldrin Figueiredo
Adma Noêmia Santana Lopes Historiador. Doutor em História. Editoras Responsáveis
Giovanni Blanco Sarquis Vice-Diretor Professor da UFPA e pesquisador Beth Mendonça
João Carlos Velozo Santos Pe. Ronaldo de Souza Menezes do CNPq Fernanda Pinheiro
José La Pastina (Cons. de Telhado) Elna Trindade
Maria Dorotéa de Lima Diretor Financeiro Arquiteta. Doutoranda em Projeto Gráfico
Diác. Missias Paschôa Aguiar História, professora da UFPA Thiago Eluan e Beto Conceição
Vale
Assessoria Jurídica Landi na Amazônia Edição de Arte
Diretor-Presidente Sandro Alex de Souza Simões Aldrin Figueiredo Beto Conceição
Murilo Ferreira Elna Trindade
Coordenação Geral das Obras de Produção
Diretora-Executiva de Recursos Restauração Antecedentes da obra de 2013 Fernando Diniz e Thiago Viana
Humanos, Saúde e Segurança, Lucicleide Azevedo Giovanni Blanco Sarquis
Sustentabilidade e Energia Maria Dorotéa de Lima Revisão
Vania Somavilla Equipe Técnica Bruna Ferro
Carmen Sílvia V. Trindade (Arquiteta) A intervenção conservativa
Diretor de Energia e Institucional Pará Isis Jesus Ribeiro (Téc. em edificações) e restaurativa (2013-2015) Fotografias
João Pinto Coral Neto Andréia Loureiro Cardoso (Arquiteta) Carolina Gester Adriano Magalhães
Lidiane de Oliveira Rios (Arquiteta) Arquiteta-urbanista. Mestre em Fernando Diniz
Diretora de Relacionamento com restauração Giovanni Blanco Sarquis
Comunidades e Fundação Vale Giovanni Blanco Sarquis Hamilton Oliveira
Isis Pagy Ísis Jesus Ribeiro Ludegards Pedro
Técnica em edificações Otávio Cardoso
e graduanda de arquitetura Renan Viana
Lidiane Rios Sarah Pantoja
Arquiteta-urbanista
Sara Pantoja Capa
Arquiteta-urbanista Renato Chalu
APRESENTAÇÃO Instituição federal que tem como missão promover e coordenar o processo de
preservação do patrimônio cultural brasileiro para fortalecer identidades, ga-
APRESENTAÇÃO Entidade civil sem fins lucrativos, de caráter filantrópico e assistencial, as
Obras Sociais da Arquidiocese de Belém existe desde 1º de janeiro de 1960;
rantir o direito à memória e contribuir para o desenvolvimento socioeconômico é uma extensão social da Arquidiocese de Belém. Entre seus objetivos, con-
Maria Dorotéa de Lima Dom Alberto Taveira Corrêa
do país, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan, desta- forme o art. 1º de seu estatuto, este se sobressai: “promover e incentivar
Superintendente do Iphan no Pará Presidente das Obras Sociais da
ca, pela exemplaridade, a obra de restauração e conservação da igreja do Car- a educação do povo e a cultura”. Honrar esta missão, a de contribuir para
Arquidiocese de Belém
mo, da capela da Ordem Terceira e da capela da Adoração, por conseguir reunir o desenvolvimento sociocultural, o que tem feito ao longo destes anos, e
atores com interesses diversos em prol da preservação do patrimônio com um desde 2012 dedicando-se ao resgate do patrimônio material, de relevância
excelente resultado e com a utilização das políticas e programas federais na área histórica e religiosa, fez a instituição abraçar o compromisso de estar pela
da cultura. primeira vez proponente e, administrativamente responsável por este pro-
Obras Sociais da Arquidiocese de Belém e Salesianos do Carmo uniram-se ao jeto de restauração e conservação da igreja Nossa Senhora do Carmo e ca-
governo federal, por meio do Iphan, para viabilizar um projeto e habilitá-lo junto pela da Ordem Terceira.
ao Ministério da Cultura com a finalidade de captar recursos por meio das leis Fomentar ações dessa natureza fortalece o papel não apenas filantrópico,
de incentivo fiscal, na modalidade Mecenato. mas o do pleno exercício das suas intenções fundadoras, consciente do seu
A Vale, empresa privada com grande atuação no estado do Pará, tornou-se a dever para com a sociedade em geral, de salvaguardar o patrimônio deixado
patrocinadora única de um projeto que, além da obra, incluía ações de comunica- pelos nossos antepassados.
ção e divulgação, mas foi além, contratou (diretamente) um projeto de educação O trabalho assumido neste projeto de restauração e conservação foi cuida-
para atuar paralelamente à intervenção, cuja condição primordial foi o envolvi- dosamente executado nos deixando orgulhosos em exercer o compromisso
mento de moradores do “Beco do Carmo”, área vizinha de ocupação irregular, que social inerente à instituição, estabelecendo parcerias com o poder público e a
ao lado de estudantes de cursos universitários, das áreas de arquitetura e enge- iniciativa privada para alcançarmos um único objetivo: o de promover a salva-
nharia, tornaram-se guias de visitação na igreja, especialmente, durante a obra de guarda do bem coletivo, através de implementação de políticas públicas.
restauração e conservação. Ressalta-se que a Vale também complementou com Um projeto grandioso como este mereceu atenção integral de sua equi-
recursos próprios parte do valor total da obra. pe de trabalho. O acompanhamento diário dentro do canteiro de obras era
O Iphan, com sua experiência e conhecimento técnico acumulado sobre a realizado por equipes de multiprofissionais contratados pelas Obras Sociais;
matéria, elaborou o projeto básico e orientou o desenvolvimento do proje- relatórios semanais e reuniões periódicas informavam aos gestores da insti-
to executivo, bem como apoiou tecnicamente a equipe das Obras Sociais no tuição o andamento das atividades e o cumprimento do cronograma estabe-
acompanhamento e fiscalização da obra, por meio de Termo de Cooperação. lecido; encontros de trabalho, reuniões, avaliações se davam no próprio es-
Aliou-se a estes parceiros a Universidade Federal do Pará (UFPA), por meio do paço da igreja do Carmo. Foram dias de intenso labor; a relação estabelecida
Laboratório de Conservação, Restauração e Reabilitação (Lacore), que com aná- com os profissionais envolvidos na obra foi uma experiência ímpar, rica de
lises laboratoriais de materiais e orientações técnicas trouxe excelência e apuro conhecimentos e diversidade.
técnico à intervenção, oferecendo subsídios ao Iphan para tomadas de decisão, Por se tratar de um ambiente com profissionais de diferentes áreas, po-
seja com relação a tratamentos e técnicas; seja com relação às cores das pinturas demos compreender que a fusão de conhecimentos que transitam dentro
das duas capelas anexas à igreja; e ainda o Fórum Landi que apoiou a ação edu- de uma intervenção restaurativa é de um enriquecimento singular, que
cativa cedendo seu salão na lateral da igreja para as atividades artísticas finais encheu de entusiasmo todos os envolvidos no projeto e engrandeceu ain-
que envolveram a inserção de um painel artístico na lateral da capela da Ordem da mais aqueles que se empenharam ao longo desse tempo naquilo que de
Terceira. Também a Universidade da Amazônia (Unama) durante a realização mais sagrado há em um povo, a sua memória.
das palestras preparatórias das atividades de visitação deu seu apoio ao projeto.
É com grande satisfação, portanto, que o Iphan comemora, agradece e com-
partilha com parceiros e apoiadores do projeto, mas, principalmente, com a co-
munidade de alunos, professores e funcionários do Colégio do Carmo, a Igreja
do Carmo e seu reitor, aos moradores e frequentadores do bairro da Cidade Ve-
lha e do “Beco do Carmo”, mais essa conquista; que é também um presente para
a cidade de Belém e para o Brasil. Afinal, mais um patrimônio restaurado e uma
ação concretizada é sempre um bom motivo para comemorarmos.
APRESENTAÇÃO
SUMÁRIO
A Vale é uma mineradora global, com sede do Brasil e presente, desde a 12 A IGREJA DE NOSSA SENHORA DO CARMO EM BELÉM DO PARÁ:
década de 1970, no Pará. A empresa, que é líder na produção de minério de
HISTÓRIA E MEMÓRIA (SÉCULOS XVII-XXI)
ferro, tem como missão transformar recursos naturais em prosperidade e
João Pinto Coral Neto Aldrin Figueiredo | Elna Trindade
desenvolvimento sustentável.
Diretor de Energia e Institucional
No Pará, ao longo dos últimos trinta anos, temos realizado ações que contri-
Pará da Vale
buem para o desenvolvimento das regiões onde estamos presentes e contri- 20 LANDI NA AMAZÔNIA
buem para valorizar, respeitar e preservar os costumes, a cultura e a memória Aldrin Figueiredo | Elna Trindade
do nosso povo. Atuamos em negócios de mineração, logística e energia, sempre
com o propósito de deixar um legado para a sociedade.
24 ANTECEDENTES DA OBRA DE 2013
Um exemplo dos investimentos feitos no estado é o patrocínio à restauração
da Igreja de Nossa Senhora do Carmo, em Belém. Para a Vale, é um orgulho Giovanni Blanco Sarquis | Maria Dorotéa de Lima
ter investido, em parceria com as Obras Sociais da Arquidiocese de Belém e o
Iphan, no projeto de restauração e conservação do prédio, contribuindo para 26 A INTERVENÇÃO CONSERVATIVA E RESTAURATIVA (2013/2015)
trazer de volta para os paraenses a beleza desse importante patrimônio histó- Carolina Gester | Giovanni Blanco Sarquis | Ísis Jesus Ribeiro |
rico e artístico de Belém.
Lidiane Rios | Sara Pantoja
Uma obra que foi realizada de portas abertas para a comunidade, com o pro-
jeto de “Visitação às Obras do Carmo”, realizado pela Vale. Durante quatro (4)
meses, cerca de mil pessoas, moradores de Belém e turistas, tiveram a opor- 42 CONCEITOS E CRITÉRIOS DE INTERVENÇÃO
tunidade de conhecer a história desse importante patrimônio e de vivenciar Giovanni Blanco Sarquis
o processo de restauração de uma construção histórica. Para essa visita, se-
lecionamos monitores especiais: universitários dos cursos de Arquitetura e
Engenharia Civil e jovens moradores da Cidade Velha. Eles foram capacitados 44 A AÇÃO EDUCATIVA DA OBRA DE RESTAURO DO CARMO:
em um projeto educativo, quando receberam informações sobre a história da RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA
igreja e sua arquitetura, por meio de aulas práticas e teóricas. Armando Sampaio Sobral | Lucicleide de Azevedo Ribeiro
Para os universitários, foi uma oportunidade de incrementar o currículo e
ganhar novos conhecimentos dentro de suas áreas. Para os jovens da comuni-
dade, foi uma oportunidade de se tornarem agentes de preservação da igreja 48 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
e de disseminação de cultura, além de uma alternativa viável de geração de
renda. Um investimento que, para nós da Vale, valoriza o patrimônio da nossa
cidade, o talento de nossos jovens e a comunidade local. 50 FICHA TÉCNICA DA OBRA
A IGREJA
DE NOSSA SENHORA DO
CARMO EM BELÉM DO PARÁ:
história e memória (séculos XVII-XXI)

A memória certamente é como uma doou a esses religiosos um terreno e fazendas de criação de gado, bem
espécie de espelho por onde observa- contendo uma edificação, para que como de grandes áreas de terra no
mos os ausentes, os que se foram e o se estabelecessem na área conhe- bairro do Guamá e na Vila de Pinhei-
passado de uma cidade. Refletir sobre cida como Alagadiço da Juçara, no ro, hoje distrito de Icoaraci (SARA-
essa memória foi quase uma baliza li- bairro da Cidade em Belém do Grão GOÇA, 2000, p. 52).
terária para este pequeno texto sobre Pará. A atuação missionária dos re- Na década de 1620, foram iniciadas
a igreja de Nossa Senhora do Carmo ligiosos carmelitas era composta de as obras para instalação do conven-
em Belém do Pará. Mais do que um convento, servindo de moradia para to, que seria o primeiro da capitania,
registro de sua marca arquitetônica, os religiosos e educandário, além de onde organizaram um colégio, e uma
das suas passagens na história ou das um templo para realização dos ofícios capela de taipa, destinada ao culto e
suas nem sempre belas memórias, te- litúrgicos e diversas fazendas para consagração a Nossa Senhora do Car-
mos aqui uma escolha histórica que suporte econômico e sustentação da mo. Nos últimos anos do século XVII,
certamente tem a ver com sua ima- missão. A localização estratégica do a igreja ainda estava em obras, quan-
gem como monumento a ser preser- conjunto religioso dos carmelitas às do houve um desentendimento entre
vado como ente vivo, como construto margens da baía do Guajará facilitou a Ordem dos Carmelitas e o Bispo do
do homem e como retrato do passado a administração das fazendas e enge- Maranhão D. Frei Timóteo do Sacra-
traspassa presente e futuro. nhos, que rendiam o suficiente para mento e este determinou o fechamen- Planta da Cidade do Pará, provavelmente em 1771, elaborada pelo capitão engenheiro Gaspar Gronsfeld
A Ordem da Bem-Aventurada Vir- manter as aldeias missionárias que to do templo. Os padres recorreram Fonte: IHGB, Rio de Janeiro
gem Maria do Monte do Carmo, ou foram responsáveis pela formação de à Justiça Real e o conflito foi solucio-
Ordem dos Carmelitas Calçados, che- vários núcleos populacionais que re- nado em 21 de abril de 1700, em favor
gou a Belém em 1626. Na época, o en- sultaram em municípios paraenses. dos religiosos da Ordem, que continu-
tão governador da Capitania do Pará, Os carmelitas tornaram-se proprie- aram as obras e reabriram o templo
capitão-mor Bento Maciel Parente, tários de engenhos, lavouras, olarias (MEIRA FILHO, 1967).

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Muitos esforços em nome da fé dor Francisco Coelho de Carvalho, o dem de Nossa Senhora do Carmo de
foram feitos pelos padres para con- ouvidor-geral Mateus Dias da Costa Belém havia edificado uma nova igre-
seguir recursos a fim de dar conti- e o presidente cabano Félix Clemen- ja, bem próxima da antiga. Segundo
nuidade à obra; existe registro que te Malcher (CRUZ, 1953a, p. 11). o que foi publicado pela Gazeta de
os carmelitas, empenhados na sua De acordo com Maria de Lourdes Lisboa, depois de concluírem a nova
missão, chegaram a ir a Lisboa para Sobral (1996, p. 36) “em 1720, a 2ª igreja, os religiosos carmelitas tras-
Esse momento foi especialmente im- naquela época” (In: SOBRAL, 1996). usado pelos Bibienas. Bibbiena, Bibbie-
recolher esmolas de porta em por- igreja que havia sido mandada cons- ladaram no dia 15 de julho de 1721,
portante para Ordem do Carmo no Pará, Na primeira metade do século XVIII, na-Galli ou Galli da Bibbiena, também
ta, nas igrejas e nos palácios, para truir por Frei Victoriano Pimentel, “com uma soleníssima procissão do
com a criação do bispado desmembra- sabe-se que o padre carmelitano Frei conhecidos em Portugal e no Brasil com
a compra de pedra de lioz, mate- vice-provincial da ordem, estava em Santíssimo Sacramento da Eucaris-
do da Diocese do Maranhão e ligado Antonio de Azevedo foi a Lisboa provi- a grafia Bibiena, são os nomes pelos
rial nobre usado em sua constru- fase de conclusão, mas já se podia tia”, a imagem de Nossa Senhora do
diretamente ao Patriarcado de Lisboa denciar uma fachada para a igreja de quais eram conhecidos os membros
ção. Quem também contribuiu para admirar o retábulo barroco e o altar Carmo, “celebrando com três dias
por bula apostólica de 13 de novembro N. Sra. do Carmo. No final da década de uma família de artistas italianos dos
grande reconstrução foi o casal cinzelado a prata na capela mor”. Se- de festa solene a trasladação, a que
de 1720. A matriz de Nossa Senhora da de 1750 a fachada em pedra, já pronta séculos XVII e XVIII, cujo fundador era
cametaense coronel de ordenança gundo o Frei André Prat, foi o mesmo assistiram (sic) todo o clero, religio-
Graça foi elevada à Catedral, com to- para ser montada, chega a Belém e, originário da cidade de Bibbiena, na re-
Hilário de Morais Bitencourt e sua Frei Vitoriano Pimentel quem termi- sos, nobreza e povo”. Durante toda a
dos os direitos, honras e privilégios juntamente com ela, os mestres pe- gião da Toscana, Província de Arezzo.
esposa Catarina Teresa de Vasconce- nou a construção da “suntuosa igreja festa permaneceu “exposto o Santís-
que de gozavam as sés episcopais do dreiros contratados em 1756 para esse Alguns membros da família domina-
los, que estão sepultados na capela do Pará”, no cargo de governador e vi- simo com jubileu” (Gazeta de Lisboa,
Reino de Portugal (BAENA, 1969, p. 11). fim. A fachada da igreja do Carmo, im- vam distintas artes entre a cenografia
do altar-mor. Ernesto Cruz afirma gário-geral do bispado do Pará (PRAT, 1721). Esta reconstrução foi a que deu
O primeiro bispo escolhido para o Pará portada de Lisboa, ao ser unida à nave, teatral, arquitetura, retrato, pintura de
que na igreja carmelita foi também 1941, p. 246). A inauguração da nova feições próprias de templo religioso
foi o carmelita D. Frei Bartholomeu do a estrutura da igreja ficou abalada, quadratura e outras afins. Giovanni Bi-
sepultado no átrio vários nomes im- edificação ocorreu em meados de para o prédio, o que era algo muito
Pilar, que aportou em Belém dia 29 de causando graves problemas estrutu- biena (1625-1665) foi o primeiro a adotar
portantes da governança colonial do 1721, sendo a cerimônia noticiada na importante para a cidade, que então
agosto de 1724, acompanhado do padre rais ao edifício, e para solucioná-los, Bibiena como sobrenome. Giuseppe
antigo Grão-Pará, como o capitão ge- Gazeta de Lisboa de 6 de novembro só possuía a igreja de São Francisco
Dr. Antonio Troyano, como primeiro os religiosos carmelitas contrataram Bibiena(1696-1757), filho de Ferdinan-
neral Pedro Albuquerque, o governa- do mesmo ano informando que a Or- Xavier, hoje Santo Alexandre.
arcediago e mais dezoito padres desti- o arquiteto Antonio José Landi, que do Bibiena (1657-1743) foi considerado
nados para outras dignidades, canoni- se encontrava em Belém. Em 1766, o o nome de maior destaque da família
catos e benefícios. D. Frei Bartholomeu bolonhês iniciou sua intervenção na (MAYOR, 1940, pp. 29-37).
se hospedou no convento do Carmo e igreja, que teve suas portas reabertas Feixes de colunas da ordem com-
sua entrada como bispo teve, segundo em 1777, e as obras da reforma conclu- pósita, posicionado no quadrante do
Antonio Baena, solene procissão que ídas em 1784. transepto, produzem um efeito ceno-
adornaram com flores e folhas aromá- São atribuídas a Landi as seguintes gráfico com a propriedade de condu-
ticas, alcatifas de seda pendentes das intervenções: a nave, cinco retábulos zir nosso olhar para o alto e logo em
janelas, o arruamento das companhias laterais, os retábulos do transepto e os seguida repousar abaixo nos altares do
de infantaria e arco levantado no Largo púlpitos. A capela-mor e o retábulo do transepto e dos púlpitos que possuem
do Carmo junto à boca da Rua do Norte altar-mor foram projetados pelo arqui- uma arquitetura repleta de elementos
(HURLEY, 1940, p. 47). teto, no entanto, não foram realizados, decorativos do repertório clássico lan-
Com relação à construção da segun- mantendo os do templo anterior com dianos como: pilastras compósitas, va-
da edificação da igreja do Carmo, a as marcas do barroco joanino. Landi sos fogaréus, colunas destacadas, pai-
crônica carmelitana quando comenta também deixou sua marca nas grandes néis emoldurados, aletas envolutadas,
sobre o retábulo-mor faz a seguinte colunas com capitéis de ordem com- capitel bibienesco, volutas invertidas,
observação: “esta é a parte da segun- pósita, em madeira trabalhada, ados- cartela com concheados e outros. Os
da igreja que ficou da demolição feita sadas às paredes da nave laterais que púlpitos que não foram previstos no
em 1760 e que está unida ao templo lembram segundo Mário Barata (In: desenho de Landi se assemelham aos
não acabado que a piedade dos fiéis PORTUGAL, 1999, p. 253) elementos que foram desenhados pelo italiano,
e a santidade dos religiosos erigiram das igrejas de Bolonha, elemento muito para a Sé de Belém.

Igreja do Carmo
Fonte: <http://joaosilvio.blogspot.com>.
Acesso em: 01.mar.2015

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Antonio José Landi, Antonio José Landi,
planta-baixa da igreja de Nossa corte longitudinal da Igreja de Nossa
Senhora do Monte Carmo. Desenho Senhora do Monte Carmo. Desenho à
à pena, aquarelado pena, aquarelado
Fonte: MENDONÇA, 2003, p. 388 Fonte: MENDONÇA, 2003, p. 389

Na frontaria da igreja do Carmo se duzida em Lisboa e depois montada detalhes arquitetônicos e decorati- com volutas do jônico e as folhagens do cristianismo, o artista-índio atribui a vos simbólicos marianos com alusões
destaca o trabalho de moldura em em Belém. Entretanto, o revestimento vos da nave remetem ao retábulo- do coríntio, também segundo Diniz, essa forma os caracteres próprios do seu e louvores à Virgem Maria. “Toda a su-
pedra de lioz de cinco vãos de jane- em pedra de lioz pode ser hoje obser- mor. Ou seja, nada foi aleatório, o foram utilizadas nas colunas salomô- habitat” (In: SOBRAL, 1996, p. 38). perfície das placas em prata que com-
las. São molduras em dois modelos vado em todo o pavimento térreo, no que leva a crer que, por respeito à nicas do retábulo-mor Barroco. Segundo Leandro Tocantins, o retá- põem o frontal é profusamente repuxa-
pombalinos distintos que se encon- conjunto das pilastras, nos frisos e nas obra barroca pré-existente, o arqui- O retábulo do altar-mor do Carmo bulo do altar-mor da capela-mor data da, gravada e cinzelada” (MENDONÇA,
tram simetricamente distribuídos no molduras dos vãos. Existem cópias de teto decidiu modificar suas ideias é classificado, segundo Robert Smith, de 1720, sendo do mesmo período o 2011, pp. 08-09). Estão, neste frontal,
segundo pavimento, intercalados por três desenhos aquarelados, que foram iniciais, passando a utilizar os ele- como um retábulo de transição do na- “altar frontal cinzelado em prata e gravados motivos decorativos caracte-
pilastras ou conjunto de pilastras. Se- assinados por Landi, em Lisboa que mentos de composição do retábulo- cional português para o joanino, a talha vermeil, com incrustações de pedras rísticos da arte joanina revelando uma
gundo Mário Barata foi importado de representam a planta baixa da igreja mor como referência (DINIZ, 2008, dourada é trabalhada segundo motivos semipreciosas, de cor roxa” (TOCAN- influência da linguagem de Jean Bérain,
Lisboa o material e mão de obra para em cruz latina, um corte longitudinal p. 56). regionais pelos artesãos índios, com TINS, 1987, p. 224). Ernesto Cruz tam- decorador da corte francesa de Luís
a fachada desta da igreja, que teve a e um corte transversal, da nave, onde elementos fitomorfos, nos quais predo- bém faz referências a este altar de XIV que reproduziu seus desenhos em
sua abertura oficial em 7 de julho de podemos observar a capela-mor com Observando o equilíbrio entre o mina a folha de acanto, e motivos zoo- prata: “O altar mor, o mesmo da igreja numerosas gravuras, permitindo a sua
1766, “mantendo-se a fachada vinda solução de cobertura em cúpula arre- construído e a construção Virgínia Di- morfos, com aves alegóricas. Maria de desmoronada e reconstruída em 1766, rápida divulgação por toda a Europa (In:
de Lisboa e a capela-mor da constru- matada por zimbório e o retábulo do niz faz a seguinte observação sobre as Lourdes Sobral comenta sobre o barro- trabalhado em prata, e uma das obras MENDONÇA, 2011). Segundo Mendon-
ção anterior” (In: PORTUGAL, 1999, altar mor, elementos que não foram colunas: “Landi introduziu colunas à co no Pará que não somente os jesuítas mais notáveis do tempo, mandado la- ça, este frontal é atribuível ao ourives
p. 253). Em pesquisa recentemente da construídos, mantendo no templo, o moda italiana, adotando uma solução se utilizaram do trabalho do índio na vrar em Portugal, de onde vieram as lisboeta Manuel da Silva, em função da
lavra de Isabel de Mendonça (In: POR- conjunto barroco anterior. criativa que equacionou a diferença iniciação de “técnicas escultóricas”, mas pedras de lioz empregadas na cons- marca “MS” do ourives encontrada no
TUGAL, 1999, p. 289), foi referido o do pé direito entre transepto e capela- também, outros religiosos os familiari- trução” (CRUZ, 1953b). frontal, no entanto a ausência do con-
contrato no qual a Ordem dos Carme- Não se sabe qual o motivo da não mor, valorizando o ambiente e crian- zaram com outro universo formal que Em frente ao retábulo, observa-se um trato entre o ourives Manuel da Silva e
litas encomendava um mestre lisboe- execução do projeto de Landi para do um efeito extraordinário nos qua- lhes era completamente desconheci- altar em madeira revestida com um a ordem do Carmo não permite datar
ta para o assentamento da fachada da a capela-mor, mas se percebe que tro ângulos do transepto” (In: DINIZ, do. E acrescenta: “Disso resulta que, ao frontal de acabamento em prata portu- com precisão o frontal de prata de Be-
igreja do Carmo em Belém, toda pro- as modificações que ocorreram nos 2008, p. 58). Os captéis das colunas plasmar na talha um símbolo universal guesa, repleto de elementos decorati- lém (In: MENDONÇA, 2011).

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Faz parte do conjunto religioso - tos romântico e revivalista. Ladrilhos de Garret, Rivet et Cie demonstrava Também a pintura decorativa foi morte do Vigário Provincial do Ma- tante é se refletir nesse contexto que
convento e igreja - uma capela da hidráulicos substituíram o antigo piso um piso como uma “cerâmica” que largamente utilizada nos templos pa- ranhão, Frei Caetano de Santa Rita a história dessa obra arquitetônica,
Ordem Terceira situada na lateral di- de tijoleira colonial na primeira déca- não necessitava de cozimento pois era raenses, incluso a igreja e o convento Serejo, último carmelita que ainda artística e religiosa resultou de vários
reita da nave principal do templo, no da do século XX. Esse trabalho teve in- feita por meio de prensas e seca pelo do Carmo. No teto da nave central foi vivia no Norte do Brasil. Ao mesmo, encontros e confrontos culturais. As
local onde seria a sexta capela late- fluência tanto dos padres italianos que tempo, chamou a atenção dos mes- colocada uma pintura com azul celes- por decisão do Papa Leão XIII, em marcas dos antigos desenhos nacio-
ral da igreja encontra-se localizada a atuavam em Belém como do trabalho tres de obras da época. O português te e encrustamento de estrelas doura- setembro de 1891, os conventos e nais portugueses, do barroco joanino
porta de comunicação com a capela; do decorador francês Joseph Cas- Salvador Mesquita juntamente com das inspiradas em padrões baseados mosteiros das ordens religiosas do e do gosto neoclássico de contorno
nessa capela, Landi também teve sua sé que fez inúmeras obras na época, os engenheiros Francisco Bolonha e no gótico francês e espanhol como Brasil ficaram sujeitos à plena ju- italiano ali estão presentes. O nome
participação atribuída, o que clara- como para o Theatro da Paz, Palácio José Sidrim também incentivaram o da Santa Igreja Catedral Primada de risdição dos bispos. No Pará, a im- de Landi não se faz visto aqui por um
mente pode ser percebido na concep- dos Governadores, Intendência Mu- uso dos pisos de cimento. Várias fá- Toledo, Espanha, ou na Sainte Cha- prensa divulgou farta notícia sobre capricho, pois o arquiteto só esteve à
ção italiana dos retábulos dos altares nicipal e igreja de Santana, além de bricas de pisos e objetos decorativos pelle, em Paris, famosa pelas flores de as disputas pelos bens deixados pela frente das reformas do templo depois
laterais, elemento pouco profundo, muitas residências particulares. foram implementadas em Belém e em lis sobre um azul real. Nas paredes e Ordem do Carmo entre confrarias, de integrar a missão demarcatória
próprio para receber quadros emoldu- Todo esse gosto revivalista se acen- cidades do interior para dar conta do retábulos foram realizadas pinturas Igreja e Estado; assim como sobre dos limites amazônicos ao tempo de
rados como na igreja da Sé. Atribuição tuou em Belém a partir da década de interesse da população mais rica pela de fingidos e escaiolas seguindo uma o fim da Ordem Carmelita no Brasil D. José I como desenhador, função
da obra a Landi foi feita inicialmente 1890, com a circulação das gramáticas beleza e durabilidade do produto. Há tradição já realizada por Landi no sé- do século XIX, incluindo os debates para a qual atuaria a partir de 1753.
por Robert Smith apontando entre decorativas que ilustravam as novas também registros, conservados em culo XVIII. Porém as reformas, com- sobre a Amazônia (MOLINA, 2006). Em Belém fez sua vida como arqui-
outras características a semelhança tendências de recriação dos antigos acervos particulares, como nas cole- posições e retoques realizados duran- Já no século XX, em janeiro de 1930, teto a serviço do governo e do clero,
entre o esquema compositivo do retá- estilos artísticos e os diferentes usos ções de Theodoro Braga e José Sidrim, te o século XIX parecem ter sido mais o padre Angelo Cerri com o apoio do deixando o registro de seu traço nas
bulo do altar-mor da capela com o re- no presente. Os jornais paraenses sobre maquetes, modelos, formas, de manutenção da igreja, muitas das Bispo do Pará D. Irineu Jofilly trouxe mais significativas edificações reli-
tábulo da igreja de Santana de autoria anunciavam nas últimas décadas do bitolas, marcas e protótipos usados quais realizadas por obra das confra- a Ordem dos Salesianos para ocupar giosas, civis e oficiais, localizadas nos
do italiano (SMITH, 1957, pp. 20-29). século XIX a utilização do piso hi- largamente em palacetes, edifícios, rias leigas que tinham seus altares na- o antigo convento dos carmelitas, as- bairros da Cidade Velha e Campina,
Na segunda metade do século XIX e dráulico como alternativa elegante ao mercados, lojas e igrejas paraenses quele orago. Isso porque a situação da sim como para administrar os ofícios consideradas, hoje, como um acervo
primeira metade do século XX, algu- chão de barro, ao mármore e ao lioz seguindo padrões europeus usados Ordem dos Carmelitas na Amazônia, litúrgicos na igreja de Nossa Senho- vivo da arquitetura do século XVIII
mas intervenções foram realizadas mais difíceis de obter. Os modelos dos em cidades como Paris, Londres, Bar- como em parte no resto do Brasil, era ra do Carmo (RAMOS, 1985). (TRINDADE, 2003). Landi permane-
na igreja do Carmo, consoantes com catálogos das exposições universais, celona e Lisboa ao tempo da chamada das mais difíceis. Com efeito, em meio a todo esse im- ceu na Amazônia até seu falecimento
os padrões decorativos em voga na especialmente da Exposição Universal Belle Époque, no apogeu do Art Nou- A Ordem do Carmo no Pará foi de- bróglio sobre os destinos da Ordem em 1791, sem nunca ter retornado a
época, influenciados pelos movimen- de Paris de 1867, quando a empresa veau e da decoração revivalista. finitivamente extinta em 1891 com a e igreja do Carmo no Pará, o impor- Bolonha, sua cidade natal.

18 19
LANDI
NA AMAZÔNIA

Em 1753, quando aportou em Belém origem de Belém se destaca como im- mental de Landi, na segunda me-
com seus companheiros de missão a portante elemento da geografia urba- tade do século XVIII, resultou em
paisagem urbana era composta, em na” (PENTEADO, 1971, p. 11). Esse era o significativa mudança na feição ur-
sua maioria, por edificações simples, quadro da formação da cidade no pri- bana da capital do antigo Estado do
próprias do desenho e da cartografia meiro contexto de ocupação e coloni- Grão-Pará e Maranhão. Acrescentou
citadina da época. Apenas o grande zação da região (CHAMBOULEYRON ao traço da cidade um jogo de con-
edifício barroco construído pelos je- & CARDOZO, 2009, pp. 37-51). traste e surpresas quando da com-
suítas se destacava, a igreja de São As primeiras edificações em Belém binação de ruas estreitas com largos
Francisco Xavier, hoje mais conheci- de que se tem registro, foram cons- e monumentos, funcionando até
da como igreja de Santo Alexandre. truídas no século anterior à chegada hoje no centro histórico de Belém
A igreja da Sé estava em construção de Landi no bairro da Cidade, hoje como marco visual de referência,
para sediar o bispado criado em 1719 denominado Cidade Velha, núcleo dominando o entorno caracterizado
(LEAL, 1979). Conforme relatam os inaugural de Belém, tendo como pon- por edificações de escala reduzida
memorialistas Augusto Meira Filho e to de origem o Forte denominado pelo em relação as suas obras (MOTTA,
Leandro Tocantins, grande parte das fundador da cidade, Francisco Caldei- 1996). Permanecendo no Brasil por
construções era térrea, executada ra Castelo Branco, de Presépio, atual 38 anos, Landi foi autor de vários
com materiais precários, implantada Forte do Castelo, local escolhido pelos projetos em diferentes áreas, para a
na orla fluvial; com os beirais voltados portugueses, em janeiro de 1616, para capital e interior do Estado do Pará
para a rua e fachadas pintadas de cal, ser o ponto de partida da colonização e Amazonas, incluindo arquitetura
lembravam as construções modestas da região amazônica. Hoje, o centro civil e religiosa, retábulos, púlpitos
de Portugal (MEIRA, 1976, v. 2, p. 98). histórico delimita o núcleo primitivo e órgãos, composições em estuques Vista da “Cidade do Pará” em 1868, desenho de J. Leon Righini
Nessa época a cidade era dividida em da cidade, onde se concentram edifi- decorativos, esquemas compositivos Fonte: Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro
dois bairros denominados Cidade e cações de grande valor arquitetônico, para pinturas em quadratura, cons-
Campina, separados pelo igarapé do paisagístico e histórico. truções efêmeras e decoração de li-
Piri, “baixada alagadiça onde desde a A presença da arquitetura monu- vros (MELLO JÚNIOR, 1973).

20 21
Entre os projetos de maior destaque de intervenção de Landi, pois, quando projetos de igrejas aroquiais (CALLUF,
no que se refere às edificações religio- o arquiteto italiano chegou a Belém, es- 2013). No que se refere à arquitetura
sas estão os das igrejas de Santana e de tas duas edificações estavam com suas civil, Landi foi também autor de várias
São João Batista. Para essas edificações construções iniciadas, mas com obras obras que ainda hoje estão presentes
ficou como documento um conjunto de paralisadas. Mesmo assim, os desenhos na cidade de Belém, da mesma forma
desenhos constituídos de plantas, cortes encontrados sem sua assinatura levan- como nas religiosas, mas em menor Toda essa obra deixada por Landi im- em prestar homenagem à arquitetura ra da natureza está o de releitura dos
e elevações elaboradas pelo arquiteto. tam dúvidas e discussões dos estudiosos escala; algumas são apenas atribuições. plica pensar nas relações entre os mo- da cidade de Bolonha, que, embora não modelos e correntes da arquitetura e
Outras igrejas apontam a intervenção quanto à participação do arquiteto italia- Dessas obras destaca-se o Palácio e Re- delos arquitetônicos e artísticos ítalo construída com materiais nobres, tinha da arte de sua época. Para muitos au-
de Landi ou influências posteriores no em elementos dessas obras. sidência dos Governadores na capitania -portugueses na Amazônia pombalina e expressão arquitetônica, com assinatura tores, na ampla obra deixada no Norte
suas: Catedral da Sé, igreja e convento Quanto às outras edificações religio- hoje conhecido como Museu do Estado as influências das matrizes intelectuais de arquitetos de destaque na Itália. Essa do Brasil, Landi faz uso das duas cor-
do Carmo, igreja de São Francisco Xa- sas citadas, ainda não foi encontrada do Pará. Faz parte deste projeto assina- de Landi no contexto da arquitetura de- versatilidade de Landi no uso de mate- rentes do Barroco tardio setecentista,
vier e Colégio de Santo Alexandre, igreja documentação que comprove a parti- do por Landi a coletânea de dezessete senvolvida do Império Português. Como riais mais simples será fundamental em quais sejam o classicizante bolonhês
das Mercês, igreja de Nossa Senhora do cipação do arquiteto, ao qual a autoria (17) desenhos, entre fachadas, planta vários arquitetos e artistas que atuavam sua experiência em Belém do Pará. de sua formação e o borromínico, sen-
Rosário dos Homens Pretos, capela de é atribuída apenas pelas características baixa, corte, elevações e detalhes, volu- em Lisboa nos meados do setecentos, Também é fundamental observar o do esta última incorporada ao estilo
Nosso Senhor dos Passos (Capela Pom- da concepção arquitetônica e decora- me de desenhos considerável para um teve sua formação na Academia Cle- conteúdo iluminista da obra de Landi, pombalino. Na decoração, ele emprega
bo), capela da Ordem Terceira de São ção, bem como pela aproximação de prédio do século XVIII, mesmo saben- mentina de Bolonha, considerada nesta com seu largo enquadramento na pes- o Barochetto, conhecido como o Roco-
Francisco, capela de Santa Rita e capela Landi com os proprietários dos edifí- do-se que entre estes documentos não cidade a mais importante instituição de quisa e observação da natureza equa- có italiano além das famosas pinturas
do Engenho de Murutucu. Dessa rela- cios e alguns documentos históricos foram encontradas as plantas de regis- ensino de Belas-Artes, na qual foi aluno torial. Além de desenhador de prédios, ilusionistas de caráter cenográfico,
ção, apenas as duas primeiras têm do- contextuais. Para o interior do esta- tro do segundo e terceiro pavimento, e dileto de Ferdinando Bibiena, reconhe- o arquiteto também foi um naturalista conhecidas como quadraturas, inspi-
cumentação comprovada quanto à área do foram encomendados a Landi três fachadas laterais do prédio. cido mestre no ensino de decoração dedicado na apreciação da flora e fauna radas nos traços bibienescos, herdadas
de interiores e de cenografia. Em 1734 amazônicas. Neste campo, um docu- de sua formação com o professor cenó-
e 1737, Landi recebeu o prêmio Mazili, mento que se encontra hoje na Biblio- grafo italiano Fernando Galli de Bibie-
o que certamente influiu para que fos- teca Pública Municipal do Porto, em na, na Academia de Bolonha. Do encon-
se designado, em 1737, para trabalhar Portugal, produzido por volta de 1772, tro de duas tradições artísticas, aquela
na academia em uma função ligada ao no governo de João Perreira Caldas, é o dos Setecentos bolonhês introduzida
ensino próximo a Fernando Bibiena manuscrito intitulado: Descrição de va- por Landi e a da Amazônia Lusitana flo-
(MENDONÇA, 2003, p. 91). Na Itália, em rias, plantas, frutas, animais, aves peixes, resceu um estilo original e marcante
1742, Antônio José Landi lecionou ar- cobras, e outras coisas semelhantes que se na história da arquitetura brasileira.
quitetura na Academia Clementina, até acham nesta Capitania do Grão Pará, as Seja como for, com a marca primiti-
sua partida definitiva para Lisboa com quais todas Antonio Landi dedica a Sua Ex- va dos carmelitas, o gosto artístico do
destino ao Brasil, em julho de 1750. Em celência o Sr. Luis Pinto de Souza Cavaleiro barroco português, a suntuosidade do
Bolonha, o nome de Landi ficou asso- de Malta, e Governador do Mato Grosso, o desenho de Landi, as intervenções ao
ciado ao seu trabalho como riscador e qual com muita fadiga e deligencia inves- gosto da sociedade paraense da Belle
gravador. Desenhando, estudou os tra- tigou muitissimas coisas pertencentes à Époque, a igreja do Carmo juntamen-
balhos de arquitetos de vários lugares do historia natural, e das quais se poderia te com sua geminada capela da Or-
continente e reproduziu em gravuras os formar um grosso volume com vantagens dem Terceira do Carmo representam
mais importantes edifícios construídos para a Republica Literária. O manuscri- um momento singular da história da
na sua cidade durante os séculos XVI e to de Landi tem 187 páginas de texto e arquitetura, da arte e da religião na
XVII. Esses estudos deram origem a um era inicialmente acompanhado por 75 Amazônia. Por isso mesmo, desde 3
álbum conhecido como Racolta, cujo desenhos de algumas das plantas e ani- de janeiro de 1941, o Instituto do Pa-
exemplar desse álbum hoje pertence ao mais analisados (MEIRA FILHO, 1976; trimônio Histórico Artístico Nacional
acervo da Casa Rosada, no centro histó- SARGES In: BEZERRA NETO; FONTES, tombou esse conjunto como exemplar
rico de Belém. Importante destacar que 2007, pp. 329-330). único do patrimônio do povo brasilei-
esse álbum assinala o interesse de Landi Concomitante a seu esforço de leitu- ro no Norte do país.

Antonio José Landi, fachada da igreja de Antonio José Landi, fachada da igreja de São
Santana. Desenho à pena, aquarelado João Batista. Desenho à pena, aquarelado
Fonte: MENDONÇA, 2003, p. 270 Fonte: MENDONÇA, 2003, p. 479

22 23
ANTECEDENTES
DA OBRA DE 2013

Recuperação da cobertura da igreja Capela da Ordem Terceira antes da restauração

A intervenção atual deve ser com- ocasião superintendente do Iphan no de serviços de pintura interna e de
preendida como a mais extensa obra Pará; bem como as restaurações na recuperação do piso em madeira. Foi
de restauração e conservação ocorri- capela-mor da igreja do Carmo e da realizada em três (3) etapas: março/
da na igreja Nossa Senhora do Monte capela da Ordem Terceira ocorridas junho de 1995; março/abril de 1996;
Carmo e da capela da Ordem Terceira entre 1995 e 2001, sob a supervisão e e, por fim, de novembro de 1997 a ou-
nos últimos trinta anos, quando a atu- orientação técnica do restaurador do tubro de 1998.
ação do Iphan foi mais frequente. Tra- Iphan João Carlos Velozo, das arquite- A restauração da capela-mor da igre-
ta-se de uma realização que ressalta tas Maria Dorotéa de Lima e Ângela ja do Carmo abrangeu piso, paredes e
os valores estéticos, técnicos e simbó- Nakashima e da engenheira Elizabe- forros. O piso teve o seu nível e reves-
licos de um patrimônio que durante th Soares, então superintendente do timentos em tijoleira restaurados; o
décadas foi submetido, por questões Iphan no Pará e Amapá. Nessas duas forro de madeira foi recomposto e os
orçamentárias, a intervenções físicas (2) intervenções foram realizados os bens móveis (imaginárias) e integra-
pontuais, mas que no momento pre- seguintes serviços: dos da capela-mor foram restaurados,
sente é restituída em toda sua dimen- A restauração da capela da Ordem incluindo desde a consolidação estru-
são histórica e arquitetônica. Terceira contemplou seus bens mó- tural, remoção de repinturas, obtura-
Dentre as intervenções de recupera- veis (imaginárias) e integrados, que ção de lacunas, reintegração de dou-
ção realizadas pelo Iphan, destacamos receberam consolidação estrutural ramento e da policromia do painel de
a recuperação da cobertura da igreja - especialmente o retábulo da cape- embasamento. Os serviços foram exe-
e da capela em 1988; sob a supervisão la-mor -, remoção de repinturas, ob- cutados em duas (2) etapas: janeiro de
da arquiteta Stela Regina Soares de turação de lacunas, reintegração de 1997 a março de 1998; e, depois, de de-
Brito e do arquiteto Jorge Derenji, na douramento e de policromia, além zembro de 2000 a novembro de 2001.
Capela-mor da igreja do Carmo depois da restauração Capela da Ordem Terceira depois da restauração

24 25
A INTERVENÇÃO
CONSERVATIVA E RESTAURATIVA (2013-2015)

Decorridos pouco mais de dez (10) Na cobertura constataram-se vários coleta de águas pluviais desconecta-
anos desde a última intervenção de focos de infiltração devido inúmeras dos, ambos responsáveis por grande
preservação no conjunto histórico telhas quebradas, ausência de sub- parte da umidade existente no interior
dos carmelitas, o conjunto religio- cobertura e sistema de canalização da construção e, consequentemente,
so constituído pela igreja, capela e pluvial (rufos e calhas) deficiente. Os nas lajes (abóbadas) e paredes sob este
anexo lateral apresentava inúmeros rufos, em sua predominância, eram telhado, danificando bastante o rebo-
e graves problemas de conservação constituídos de telhas e argamassa co e, consequentemente, as camadas
decorrentes da falta de ações, ma- de barro que, devido ao longo tempo de pintura aplicadas na abóbada prin-
nutenção sistemáticas e de recursos sem qualquer manutenção e à varia- cipal e nas paredes.
para reverter, em tempo hábil, os da- ção de temperatura, apresentavam Outros problemas também foram
nos ocasionados que podem levar a muitas áreas com trincas e descola- diagnosticados no conjunto edifica-
perdas irreversíveis. A situação física mentos criando pontos de percolação do, como reboco danificado nas tor-
deste patrimônio histórico era reco- de águas pluviais. As calhas do coro res sineiras e nas fachadas devido
nhecível a partir de problemas estru- apoiavam-se sobre estrutura de ma- ao enraizamento de vegetação, bem
turais, da perda de mármore de lioz deira, tipo ripa, com revestimento em como pelo descolamento provocado
em frisos da fachada principal que já chapas de zinco, estas últimas encon- pelo excesso de umidade; instalações
apresentava grande concentração de travam-se bastante oxidadas e com elétricas em condições precárias
sujidade, com aspecto enegrecido da pontos de erosões ao longo de sua com cabos ressecados, fiações ex-
superfície; focos de cupins nos retá- extensão, permitindo a infiltração de postas e quadros de distribuição fora
bulos, esculturas, forros, pisos (ladri- águas pluviais para o interior do telha- dos padrões normativos; ausência de
lho, tijoleira e assoalho de madeira) e do. Havia, também, presença de vege- Sistemas de Combate a Incêndio e de
estruturas de madeira; e, principal- tação (de pequeno e médio porte) nas Proteção contra Descargas Atmos-
mente, diversos problemas na cober- torres sineiras, telhados, cúpulas e ci- féricas (SPDA); e também, fissuras
tura, como telhamento danificado, malhas, cujo enraizamento penetrava decorrentes de patologia mecânica e
vegetação enraizadas e infiltrações pelo interior das superfícies de pedra, térmica, mas que não comprometiam Fachada da igreja do Carmo antes da restauração
disseminadas por todo o edifício. tijoleira e telha; bem como dutos de a estabilidade da estrutura. Fonte: Arquivo Vale

26 27
Vegetação na cobertura entre as torres Cobertura em péssimo estado de Reboco danificado na cúpula de uma Inúmeras infiltrações na igreja Pintura danificada na abóboda Pintura danificada sobre o coro
sineiras e sobre o coro da igreja conservação das torres sineiras

Fachada lateral em péssimo estado de conservação Interior da igreja do Carmo, com capela-mor ao fundo

28 29
Diante desse cenário, o Iphan no ras infiltrações, limpeza da fachada 893.865,28 (oitocentos e noventa e
Pará e as Obras Sociais da Arquidio- de lioz, restauração das pinturas pa- três mil, oitocentos e sessenta e cin-
cese de Belém estabeleceram uma rietais, revisão do sistema elétrico, e co reais, e vinte e oito centavos), sen-
parceria no sentido de restaurar e instalação de projetos complementa- do R$ 500.000,00 (quinhentos mil
conservar a igreja, capela e anexo, de res imprescindíveis para a segurança reais) por intermédio da Lei Rounaet,
maneira que o primeiro encarregou- do bem, como os Sistemas de Com- e R$ 393.865,28 (trezentos e noven-
se da elaboração do projeto básico e bate a Incêndio e de Proteção con- ta e três mil, oitocentos e sessenta e
a segunda, como proponente do pro- tra Descargas Atmosféricas (SPDA), cinco reais, e vinte e oito centavos)
jeto junto ao Ministério da Cultura, além de Circuito Fechado de TV com recursos próprios da Vale, cor-
para uso das leis de incentivo fiscal, (CFTV). O projeto, incluindo todas as respondente aos seguintes serviços:
Projeto arquitetônico: fachada principal Projeto arquitetônico: corte transversal
sendo o projeto inscrito em 2012. Os ações e atividades planejadas, foi da na igreja foi concluída a restauração
Desenho: Ísis Ribeiro, 2013 Desenho: Ísis Ribeiro, 2013
recursos foram captados junto à em- ordem de R$ 5.082.968,31 (cinco mi- do teto e dos retábulos do transep-
0 1 2 4 6m 0 1 2 4 6m

presa Vale em 2013 e previam o de- lhões, oitenta e dois mil, novecentos to, bem como o douramento de bens
senvolvimento do projeto básico e do e sessenta e oito reais, e trinta e um integrados (púlpitos e capitéis); na
orçamento, a realização das prospec- centavos), captados junto à Vale, por capela da Ordem Terceira houve a
ções para subsidiar o projeto, as obras meio do Programa Nacional de Apoio recuperação do piso de madeira e a
de restauro e ações de divulgação. à Cultura (PRONAC), na modalidade restauração de elementos integra-
Assim, as Obras Sociais contrataram, mecenato, com início da obra em dos, do retábulo-mor e dos retábulos
inicialmente, o projeto executivo, de- março de 2013 e conclusão em março laterais; além da restauração de duas
senvolvido em 2013, sob a supervisão de 2015. Deste total R$ 3.881.383,47 (2) imagens em madeira de Santa Te-
do próprio Iphan. (três milhões, oitocentos e oitenta e reza D´Ávila e o as built dos projetos
O projeto contemplou a restaura- um mil, trezentos e oitenta e três re- complementares.
ção e conservação da igreja do Car- ais, e quarenta e sete centavos) foram A obra foi iniciada pela cobertura,
mo, da capela da Ordem Terceira destinados à obra. E o restante para haja vista ser a principal causa dos
do Carmo e do anexo lateral, com o ações de comunicação e produção de danos identificados no templo, mais
objetivo de conservar as caracterís- material de divulgação (livreto, mul- precisamente sobre o coro da igre-
ticas arquitetônicas e artísticas mais timída, exposição, convite) Ao lon- ja, devido ao elevado grau de dete-
relevantes do conjunto edificado, go da obra, devido ocorrências não rioração das pinturas internas loca-
destacando-se a recuperação total previstas inicialmente, foi celebrado lizadas no teto e nas paredes devido
da cobertura, supressão das inúme- um aditivo de valor, da ordem de R$ inúmeras infiltrações.

Projeto arquitetônico:
planta- baixa
Desenho: Ísis Ribeiro, 2013 IGREJA DO CARMO CAPELA DE ADORAÇÃO CAPELA DA ORDEM TERCEIRA ANEXO COLÉGIO 0 1 2 4 6m

30 31
A intervenção na cobertura prin- bra do beiral que se estende sobre as similares; a telha, por exemplo, foi tuídas por outras da mesma espécie às novas calhas; e uma subcobertu- gienização da superfície por meio
cipal da edificação envolveu madei- paredes laterais, telhas capa e canal. substituída por modelos similares, ou similar, todas imunizadas. ra de alumínio galvanizado foi insta- da remoção da poeira, fixação da
ramento estrutural e recobrimento. Embora as telhas francesas sejam de do tipo Marselha no telhado princi- O sistema de calhas e condutores lada em todo o telhado, resultando camada pictórica em descolamen-
As peças estruturais passaram por data posterior à construção do tem- pal da igreja, e colonial capa-canal foi recuperado e, em alguns casos, numa barreira às infiltrações de- to, limpeza com produtos químicos,
revisão completa, sendo substituídas plo, certamente foram colocadas há nos telhados inferiores; em ambos foram adotadas situações contem- correntes de eventuais trincas nas consolidação estrutural, emassa-
por peças similares quando fosse ne- um longo período, posto que toda a os casos em conformidade com as porâneas como calhas e rufos de telhas, sem impedir a ventilação no mento, nivelamento, reintegração
cessário. Quanto ao recobrimento, a estrutura secular de madeira apre- inclinações existentes. Com igual concreto devido sua maior resistên- interior do mesmo. cromática e aplicação de película de
situação encontrada era de tipos di- senta inclinação compatível com este procedimento, todo o ripamento em cia nos casos de ausência de ações Solucionados os problemas na co- proteção. Procedimento similar foi
ferentes de telha: no plano central, tipo de material. O ripamento em ma- madeira foi substituído; enquanto no de manutenção e conservação. Os bertura, foi iniciada a restauração aplicado na reintegração de outras
telha cerâmica francesa, e nas late- deira e o telhamento cerâmico foram madeiramento da estrutura, as peças dutos de descida de águas pluviais das pinturas figurativas das abó- pinturas em paredes de alvenaria,
rais, na área correspondente a que- totalmente substituídos por peças danificadas foram revisadas e substi- foram desobstruídos e conectados bodas. Essa operação abrangeu: hi- frisos, pilastras e colunas.

Reboco novo nas cúpulas das Cobertura da igreja sendo executada


torres sineiras

Cobertura da igreja concluída Cobertura entre as torres sineiras e Pinturas figurativas restauradas na abóboda do transepto da igreja
sobre o coro da igreja

32 33
A reintegração da representação aci- fim, aplicada película de proteção. apresentava-se em bom estado de
ma do coro da igreja foi um dos pontos Em uma das paredes laterais do conservação. A reintegração desse
mais delicados, devido ao avançado transepto direito da igreja, onde uma painel foi considerada relevante para
processo de deterioração. O trabalho pintura mais recente denominada “O recompor a simetria do conjunto de
de restauro foi iniciado pela a estag- sonho de Dom Bosco” encontrava-se esquadrias existente nos transeptos.
nação das perda, fixando-se a camada bastante danificada e sem condições Procedimentos técnicos restau-
pictórica e procedendo-se a consolida- de restauração, optou-se por restau- rativos foram igualmente aplicados
ção do reboco degradado. Em outras rar a camada anterior, visível pelo em bens artísticos integrados em
áreas de pintura figurativa, com gran- desgaste do painel sobreposto. Trata- madeira, tanto da igreja como da
de perda, o processo de restauração se de uma representação ilusionista capela da Ordem Terceira (capitéis
se iniciou com a cópia do desenho da - retratando porta de madeira com das colunas, púlpitos, imaginárias e
parede com auxílio de papel vegetal, balaustrada - de forma simétrica à retábulos); sendo que nos retábulos
posteriormente a figura foi completa- parede com esquadrias existentes na principais da igreja e da capela os
da seguindo os traços existentes, e, em parede oposta no mesmo transepto. procedimentos nos bens artísticos e
seguida, transferida para a parede já Configuração esta que se repete, tam- integrados foram mais de conserva-
reconstituída, onde foi pintada seguin- bém de forma simétrica no transepto ção, envolvendo imunização e lim-
do os elementos remanescentes e, por esquerdo, onde o painel restaurado peza de sujidades.

Pintura figurativa descoberta abaixo Pinturas figurativas restauradas no Abóboda da nave da igreja sendo
de “O sonho de Dom Bosco” teto do átrio da igreja restaurada Pinturas figurativas restauradas na abóboda da nave da igreja

34 35
Restauração dos bens artísticos integrados da igreja Retábulo lateral da igreja restaurado

Capitel sendo restaurado Capitel restaurado Púlpito sendo restaurado Púlpito restaurado Capela de Adoração restaurada

Ressalta-se que no decorrer da obra reintegração, tiveram o revestimento laboratoriais por meio de microscopia da Ordem Terceira. As imagens mi- brepostas em um mesmo ornamento, da abóbada, onde cerca de cinco (5) ca-
foram localizadas duas imagens de com folhas de ouro recomposto a par- ótica. Os dados resultantes das análi- croscópicas coloridas mostraram a como por exemplo no capitel. A colora- madas de massa encobriam algumas
Santa Tereza D´Ávila, datadas do sé- tir de vestígios de douramento identi- ses, subsidiaram o estudo de cores e superposição das camadas de pintura ção encontrada varia, principalmente soluções ilusionistas reproduzindo,
culo XVIII, que se encontravam em ficados nas prospecções as recomendações técnicas que defi- que os elementos arquitetônicos rece- entre os tons verde e ocre; com a base em massa e com pintura, as lunetas re-
precário estado de conservação, sen- Na capela de Adoração, o tratamen- niam as intervenções restaurativas. beram ao longo do tempo, sendo pos- e a moldura do retábulo apresentando, ais com gradil existentes no lado opos-
do a restauração destas integrada aos to restaurativo da policromia dos bens O trabalho de investigação das cama- sível ainda verificar a permanência de inclusive, resquícios de douramento. to da nave. A reintegração foi realizada
trabalhos de restauração dos bens artísticos integrados foi indicado pela das pictóricas dessas duas capelas acon- camadas pictóricas originais. Quanto à capela da Ordem Terceira, apenas nas lunetas onde esse trabalho
móveis e integrados. Os capitéis en- consultoria contratada com o Labora- teceu por meio de análise de microsco- A partir das análises feitas em amos- a microscopia das amostras coletadas foi identificado sob o reboco.
talhados em madeira das colunas do tório de Conservação, Restauração e pia ótica; tendo sido coletadas amostras tras coletadas da capela de Adoração nas paredes e ornamentos de massa, Uma surpresa na execução da obra
templo, que se encontravam repinta- Reabilitação (Lacore) da Universidade das camadas pictóricas dos elementos foi verificada a presença de até doze identificou, em média, dez (10) cama- foi o piso do coro da igreja, que ini-
dos e bastante danificados por inse- Federal do Pará (UFPA) com base nas construtivos e de todos os ornamentos (12) camadas (incluindo camada pic- das pictóricas. Outra descoberta im- cialmente tinha previsão de ter recu-
tos xilófagos, além da consolidação e prospecções pictóricas e nas análises - com exceção dos retábulos da capela tóricas e camada de preparação), so- portante, deu-se nas lunetas simuladas perado seu revestimento em tijoleira.

36 37
Contudo, durante a limpeza inicial Outro importante desafio foi a lim- ção e da Restauração (NTPR) da Uni-
identificou-se o delicado estado de peza e o tratamento do lioz da facha- versidade Federal da Bahia (UFBA),
conservação deste material, bem da da igreja e da arcada de seu átrio, já tendo sido utilizado para este fim
como a dificuldade de proceder a rein- que se encontravam com elevada em materiais pétreos desde a década
tegração das perdas, optando-se pela sujidade agravada pelo verniz oxida- de 1990. O emplastro foi aplicado em
medida de conservação, com aplicação do. Sob a orientação da consultoria toda a superfície de lioz, e coberto
de película de proteção (resina e cera) e dos técnicos do Iphan adotou-se o com papel alumínio para que pudes-
sobre o piso e execução de uma passa- emplastro de bentonita, cujos testes, se permanecer úmido, garantido sua
rela de madeira no sentido transversal, aplicação e acompanhamento foram ação de limpeza. Após, pelo menos,
controlando o desgaste mecânico oca- realizados pela equipe do Lacore. uma semana da aplicação do em-
sionado pela eventual circulação de Este produto foi desenvolvido pelo plastro, este foi removido e as pedras
pessoas nessa área. Núcleo de Tecnologia da Preserva- foram lavadas com água.

Igreja do Carmo restaurada, destaque para o retábulo da capela-mor

Prospecções nas paredes da Prospecções no teto da capela da Luneta ilusionista descoberta no teto
capela da Ordem Terceira Ordem Terceira da capela da Ordem Terceira

Fachada com emplastro de betonita Imagen de Santa Tereza D’Ávila antes Imagen de Santa Tereza D’Ávila Capela da Ordem Terceira restaurada, destaque para o retábulo da capela-mor
da restauração sendo restaurada

38 39
O resultado final foi satisfatório, não comprometiam a estabilidade abrangeu a renovação total das insta- restauração desses bens, reiteran-
pois o procedimento removeu gran- da estrutura; além de enraizamen- lações elétricas e de iluminação, vol- do a ação institucional do Instituto,
de parte da sujidade e da película to de vegetação em profundidade. A tada à valorização do espaço arquitetô- que se materializa na preservação e
de proteção envelhecida das pedras consultoria concluiu que tanto o ter- nico e de seus elementos artísticos; a promoção do bem arquitetônico, em
sem alterar o aspecto natural do ma- reno como o edifício permaneciam execução de sistema de combate a in- toda sua dimensão cultural, artística
terial. Importante destacar que antes estáveis; prescrevendo como solução cêndio e de proteção contra descargas e simbólica. Nesse sentido, ressal-
da aplicação definitiva do emplastro, para as fissuras acima de 3 mm a in- atmosféricas (SPDA) com a implanta- tamos que a restituição da igreja do
houve uma etapa de teste, na qual foi jeção de calda cimento expansiva por ção de para-raios na cobertura, além Carmo e da capela da Ordem Terceira
selecionada uma área no átrio para meio do processo de colmatagem; de circuito fechado de TV (CFTV). à sociedade belenense, às vésperas
aplicação do material, com posterior enquanto para fissuras de retração, Durante a realização da obra de res- dos 450 anos de fundação da cidade
acompanhamento e controle da ação relacionadas com a variação térmica, tauração e conservação, a igreja teve de Belém, não deve restringir-se ao
do emplastro. optou-se pela recomposição com tra- suas atividades paralisadas por cer- seu uso religioso, mas estender-se a
Também externamente, após de- ço de argamassa igual ao existente. ca de dois (2) longos anos, contando outras atividades culturais que pro-
tectar várias partes de reboco da- Os demais serviços dessa obra con- com a colaboração e sensibilidade piciem uma maior apropriação desse
nificado seja pelo enraizamento de templaram a conservação do restante dos Salesianos e dos paroquianos do espaço pela comunidade, tais como
vegetação, como pelo descolamen- dos ambientes e superfícies arquite- bairro da Cidade Velha e de seu en- apresentações musicais, palestras e
to devido ao excesso de umidade e, tônicas da igreja, capela e anexo la- torno, no sentido de acreditar que visitações, permitindo assim, novas Capela da Ordem Terceira restaurada
também, decorrentes de intervenção teral: remoção e recomposição do esta interrupção temporária era ne- funções sociais ao espaço edificado.
extemporânea com argamassa de ci- reboco em deslocamento de cúpulas, cessária para que fosse possível im- Desta maneira, seguramente o
mento e areia; adotou-se a remoção abóbodas, paredes e fachadas; com plantar condições físicas adequadas objetivo da restauração poderá ser
de reboco antigo e a confecção de emassamento, lixamento e pintura para o melhor funcionamento e con- alcançado em sua plenitude, se coa-
um novo, com baixo teor de cimento de tais superfícies; recomposição de servação do bem, favorecendo a rea- dunando com outras ações de preser-
(5%), e constituído basicamente de cimalhas e molduras, e a correspon- lização das atividades religiosas e co- vação do bairro e do centro histórico
barro, cal e areia peneirada. Após a dente pintura (silico mineral e pva) munitárias em conformidade com as da cidade, valorizando o patrimônio
recomposição do reboco, pintura à destes elementos; revisão e pintura condições de segurança exigidas por cultural brasileiro e do Estado do
base de tinta silico mineral foi apli- das esquadrias de madeira de portas normas legais. Além do que, recupe- Pará. Estabelecendo o equilíbrio ne-
cada em todas as paredes da cons- e janelas; recuperação de pisos de rando-se a integridade física do edi- cessário entre as atribuições e res-
trução, cujas cores seguiram tons já madeira, tijoleira, mármore e ladri- fício, valorizando e reforçando esse ponsabilidades da União, do gover-
aplicados nestas superfícies. lho, com substituição e/ou consolida- importante marco urbano da cidade no do Estado, da municipalidade, de
O outro serviço de consultoria espe- ção de peças danificadas, e posterior de Belém, de grande valor simbólico organizações da sociedade civil e da
cializada contratado foi na área estru- aplicação de cera; além da revisão e do ponto de vista religioso, mas tam- iniciativa privada, investindo na am-
tural. No campo estrutural, fissuras pintura dos bancos da igreja e capela. bém como referencial de memória e pliação de parcerias visando a preser-
foram diagnosticadas como patolo- Quanto aos projetos complementa- identidade local e nacional. vação e a promoção do patrimônio e,
gias resultantes de movimentação res, importante intervenção realizada Considerando o propósito das dessa maneira, tornar possível (e am-
mecânica decorrente do solo e térmi- com o intuito de assegurar a integri- Obras Sociais, enfatizamos a parce- pliar) o papel social do bem cultural
ca devido variação climática, mas que dade física e segurança do edifício, ria estabelecida com o Iphan para a na vida cotidiana das pessoas. Teste de iluminação na igreja

40 41
CONCEITOS
E CRITÉRIOS DE INTERVENÇÃO

A intervenção realizada na obra de Na igreja, a intervenção resultou foram preenchidos com material si-
restauração e conservação da igreja do de estudos históricos sobre a evolu- milar. Trata-se de intervenções que
Carmo e capela da Ordem Terceira se- ção do edifício e suas transforma- enfatizaram a unidade potencial do
gue, em grande medida, preceitos des- ções ao longo do tempo, bem como edifício, evitando suposições sobre o
critos na Teoria do Restauro, elaborada prospecções e análises laboratoriais; estágio original, o que poderia indu-
pelo téorico italiano Cesare Brandi, na atividades que levaram em conta os zir ao “falso histórico”; assim como
primeira metade do século XX. Essa te- valores estético e estrutural, sem controlando a própria ação do tempo
oria expõe, em linhas gerais, que o res- perder de vista a importância so- e intervenções extemporâneas que,
tauro é ato crítico, voltado ao reconhe- cial do monumento tombado. Nesta por ventura, tenham agregado valor
cimento da obra de arte; e que nenhum oportunidade, alterações e/ou inser- (estético, simbólico, estrutural e/ou
procedimento empírico deve embasar ções de elementos e características histórico) ao bem.
etapas de um procedimento restau- ao bem foram avaliadas, e aquelas Considerando tratar-se de um
rativo, enquanto que apenas métodos consideradas relevantes para a com- expressivo exemplar da arquitetu-
técnicos deveriam orientá-las, consi- preensão do bem em seu processo ra protobarroca, a igreja do Carmo
derando à especificidade própria do ato histórico e que não interferissem e seus elementos integrados reve-
restaurativo, reconhecido como ação na apreensão e percepção do monu- lam-se importantes, de maneira
estritamente científica. Deste modo, mento enquanto obra de arte foram que a intervenção realizada consi-
preservadas e restauradas, como as derou suas características formais
O restauro é considerado como pinturas dos tetos da igreja. e técnicas próprias, garantido que
intervenção sobre a matéria, mas Novas descobertas foram realiza- sua materialidade e história pudes-
também como salvaguarda das das, como o douramento dos capitéis se ser preservada. Dessa forma, a
condições ambientais que assegu- das colunas da igreja; várias cama- restauração e conservação assegu-
rem a melhor apreciação do objeto das de pintura aplicadas ao longo do raram condições físicas adequadas
e, quando necessário, como resolu- tempo nas paredes e tetos da capela, para a apropriação humana deste
ção da articulação do espaço físico, além da própria revelação de lunetas espaço de fé, devoção e admiração.
no qual tanto o observador quanto ilusionistas em abóbada. Enquanto E desta forma, esse bem se revela
a obra de arte se colocam, e a espa- elementos marcantes passaram por não só para o estudo da arquitetura,
cialidade própria da obra (CARBO- complementações criteriosas, como mas como documento da história da
NARA, 2006, tradução de Beatriz a fachada em lioz, onde frisos e ci- sociedade belenense e das missões
Kuhl). malhas que apresentavam lacunas religiosas pela Amazônia.
Igreja durante a restauração

42 43
A AÇÃO
EDUCATIVA DA OBRA DE RESTAURO DO
CARMO:
relato de uma experiência
Capacitação de mediadores Oficina de maquetes Visita monitorada com crianças

O restauro da igreja do Carmo pode de que os laços humanos se fortalecem. distintas, mostrou que é possível im-
ser comparado a um grande livro que Sem educação a consciência não des- plementar um projeto de educação
se abre, um texto a ser desvelado ao perta para o mundo e seus bens. patrimonial amplo e inclusivo, pauta-
cidadão que vê o futuro ancorado no A revitalização deste magnífico do no diálogo e em colaboração com
compromisso com a preservação da exemplar da arquitetura barroca reli- a comunidade. Foi a partir do cenário
memória. Devemos reconhecer no ges- giosa brasileira propiciou, através da existente em torno da igreja do Carmo
to exemplar da Vale, em parceria com as ação educativa, um ambiente singu- - área de ocupação irregular que atu-
Obras Sociais e com o Iphan, em empre- lar de vivência, perspectiva nortea- almente integra-se ao centro histórico
ender o que talvez seja o mais extenso e dora do projeto implantado pela Vale, da cidade - e pela necessidade em es-
completo programa de recuperação fí- concomitantemente à realização das timular o interesse entre universitá-
sica desse patrimônio, o esforço e a mis- obras, que transformou o restauro da rios sobre preservação e restauração
são humanista, urgente, em restituir a igreja em espaço de conhecimento de prédios históricos, que o projeto
Belém o respeito pelo seu passado. para quem pôde apreciar o esforço em preparou as bases de seu programa
Qualquer trabalho de preservação devolver ao cidadão parte significativa educativo: a capacitação de seis (6) jo-
patrimonial, seja material ou imaterial, da sua própria história. vens em situação de vulnerabilidade
consuma-se no permanente cuidado em Organizada e coordenada pelo ar- social residentes na comunidade do
educar e manter vivas nossas tradições e tista plástico e educador Armando “Beco do Carmo”, ao lado de dez (10)
costumes para as novas gerações. Quem Sobral, a experiência proporcionada a estudantes dos cursos de engenharia
preserva sabe que é através da transmis- dezesseis (16) estudantes, provenien- e arquitetura para tornarem-se me-
são dos saberes cultivados pela socieda- tes de realidades socioeconômicas diadores nas visitas às obras da igreja. Visitação ao canteiro de obra

44 45
O trabalho demandou parcerias guardamos na mente e no coração, violência e cidadania, processo de de- e desenvolvimento urbano de Belém estatuária, história das ordens religio- visitarem os espaços da igreja do Car-
com a Universidade Federal do Pará pois é ela que forma a nossa história gradação urbana, transformação da no período colonial, conteúdos que sas e da edificação do templo. mo, eram convidados a desenvolve-
(UFPA) e a Universidade da Amazônia e a nossa cultura (Organizado por paisagem histórica, e a luta pela pre- serviriam de subsídio ao processo As condições limitadas de circula- rem atividades livres, de desenhos e
(Unama) no planejamento das ações Paulo Souza a partir de depoimen- servação da memória. seletivo. O programa foi discutido e ção durante as obras levaram à cria- pinturas. A segunda vez e encerrando
de qualificação e seleção dos estu- tos de jovens moradores do “Beco elaborado pelo corpo docente da Fa- ção de um espaço de acolhimento, o as atividades educativas aconteceram
dantes, ao lado da equipe de relações do Carmo”, 20 de maio de 2013). É uma coisa que também é antiga e culdade de Arquitetura e Urbanismo Atelier do Carmo, ambiente planejado no mês de outubro, envolvendo ape-
comunitárias da Vale no planejamen- que faz parte da cidade, daquele lo- da UFPA, com seminários realizados para organizar os grupos e desenvol- nas visitas monitoradas.
to do programa de capacitação dos jo- O primeiro passo foi conhecer a rea- cal, pertence à história de uma co- na Unama, enquanto as atividades ver atividades educativas de caráter Diante desse cenário de partilha de
vens provenientes da comunidade do lidade do “Beco do Carmo” e elaborar munidade. São coisas que por mui- pedagógicas da ação educativa ocor- lúdico e informativo, como suporte conhecimentos, e levando em conta o
“Beco do Carmo”, como de arte-edu- um plano de qualificação abrangente, tos anos são conservadas, e muitas reram nas dependências do Colégio complementar às visitas. No ateliê, o número expressivo de pessoas parti-
cadores e agentes comunitários; estes a partir de demandas suscitadas ao histórias são contadas por pessoas Salesiano do Carmo. público acessava mais informações cipantes nas ações educativas desen-
últimos atuaram como facilitadores longo dos encontros com seus mora- que estudam os patrimônios histó- Após quatro (4) meses de planeja- através de painéis com textos didáti- volvidas nas obras de restauração da
na relação com os moradores do bair- dores; temas sobre cidadania, vulne- ricos, sendo símbolo de uma época, mento e preparação, desde a concep- cos, fotografias, vídeos e maquetes da igreja do Carmo; consideramos todos,
ro, mediação que trouxe informações rabilidade social, cultura e empodera- seja um objeto, um monumento ção e implementação do programa de igreja; os visitantes ainda eram convi- agentes multiplicadores, protagonistas
valiosas sobre a importância de tal mento, foram acrescidos a conteúdos ou uma escultura. São coisas anti- capacitação à definição da equipe de dados, ao final do percurso, a montar atuantes em zelar pelo bem comum.
empreendimento na comunidade: o específicos sobre a igreja do Carmo: gas ou não, e que são importantes dezesseis (16) mediadores, a primeira um pequeno protótipo da igreja em
impacto em suas vidas e a forma de história, restauro, construção e a sal- para o bairro e para cidade. Nossos etapa do projeto foi concluída. O inte- companhia dos monitores. “O ato de conhecer envolve um mo-
participação no projeto. vaguardado patrimônio histórico ar- patrimônios são muitos. Em Belém resse passou a ser a execução da ação Vale destacar que essa iniciativa vimento dialético que vai da ação
quitetônico. Os trabalhos iniciaram temos o Forte do Presépio, a Praça educativa propriamente dita, isto é, a estimulou a instituição proponente, à reflexão sobre ela e desta a uma
Memória é uma coisa que a gente em abril de 2013, sob a orientação do do Carmo e a Praça da Sé, a nossa implantação do atendimento às visi- Obras Sociais da Arquidiocese de Be- nova ação. Para o educando conhe-
guarda como eu guardo as lem- educador Paulo Souza, da agente co- Rua Siqueira Mendes, o Ver-O-Peso tas guiadas nas obras de restauro da lém, a abrir a igreja por duas (2) vezes cer o que antes não conhecia, deve
branças de quando fui coroinha da munitária Adriana Passos e da analis- e o nosso Mercado de Carne, que igreja do Carmo. no ano de 2014 para visitação pública: engajar-se num autêntico processo
igreja do Carmo, e lá aprendi várias ta de relacionamento comunitário da recentemente foi restaurado (Orga- Com o grupo constituído, iniciou- a primeira se deu na data comemo- de abstração por meio do qual refle-
coisas da igreja e do bairro da Cida- Vale, Mayara Barros. O convite para os nizado por Paulo Souza a partir de se a segunda etapa de preparação rativa ao Dia Nacional do Patrimônio te sobre a totalidade “ação-objeto”
de Velha. É poder relembrar a nossa encontros foi dirigido a todos os jovens depoimentos de jovens moradores dos monitores no espaço da própria (17 de agosto), contou com a parceria ou, em outras palavras, sobre for-
história, do nosso bairro, como ele moradores do “Beco do Carmo”, e as do “Beco do Carmo”, 20 de maio de igreja, fase que demandou um mês do Departamento de Educação Patri- mas de “orientação no mundo [...]
surgiu, como ele foi fundado, sobre ações demandaram quarenta (40) ho- 2013). de visitas regulares ao prédio. Nesse monial do Iphan e coordenação da (FREIRE, p. 60)
as nossas igrejas, as praças e ruas. ras de atividades com palestras, traba- período, foram realizadas palestras pedagoga Luci Azevedo, além de três
Diz respeito aquilo que fica guar- lhos de sensibilização artística e exer- A preparação dos estudantes uni- sobre segurança no trabalho, além acadêmicos do curso de Pedagogia. A Por fim, a valorização do patrimônio,
dado numa comunidade, e como cícios com ferramentas de difusão nas versitários ocorreu na segunda quin- de incontáveis caminhadas visando o ação desenvolveu atividades de visitas mesmo aqueles que estejam passando
essas pessoas contam a história de- redes sociais, no período de um mês. zena de maio de 2013, com o ciclo de reconhecimento do prédio e o levan- guiadas por todo o prédio histórico e, por intervenções restaurativas, de for-
las. São lembranças de pessoas que O roteiro de trabalho incluiu visitas a palestras “A Arquitetura Barroca no tamento de informações relevantes utilizou a capela da Ordem Terceira ma alguma devem ser executados de
contam as histórias de seu próprio igreja e seu entorno, trajeto ampliado Pará: história, restauro e conserva- que deveriam ser repassados durante para atividades pedagógicas - con- maneira isolada do ato de educar - é
passado. Lembrança de uma época, que apontou temas relevantes sobre ção”, seminários direcionados à co- as monitorias: processos de restauro, templando o público infantil com um essa prática que despertará no indiví-
de um evento, histórias contidas patrimônio histórico e os problemas munidade acadêmica sobre a arquite- análise do estilo e características da ambiente lúdico especialmente pre- duo relações de afeto com seus bens
em fotos. Memória é coisa que nós cotidianos enfrentados pela cidade: tura histórica, restauro, conservação arquitetura barroca, ornamentação, parado para os pequenos, que após culturais e históricos.

46 47
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48 49
FICHA TÉCNICA Empresa Contratada
GM Engenharia Ltda.
Rubenilson P. de Oliveira
Valdemir Pinheiro da Conceição
DA OBRA Wanderli Lopes
Equipe Técnica Edinei Pires
Acácio Gonçalves (Engenheiro Jucivaldo Piedade Palheta
Civil Responsável) Lucivaldo da Cruz Cousa
Neila Sara Nemos Patoja Leite Rui Jorge Oliveira Barros
(Arquiteta Responsável) Vones Calisto do Carmo
Adimilson Bruno das Chagas Alves Luiz Gonzaga
Afonso Cleb da Paixão Alexandre F. dos Santos
Alan Santos Palheta Arivaldo F. dos Santos
Alex Andre Barbosa Oliveira Geizael Rocha
Almir Reis Filho Edson Sidney dos Santos
Arnaldo da Silva Santos Riscardo Coelho dos Santos
Carlos Augusto Barros de Almeida Catarina de Nazaré Pereira Pinheiro
Benison dos Santos Oliveira
Edvaldo Costa Moraeis Equipe de Restauração - Halom
Josiel Ferreira da Silva Jodair Veloso Santos (Restaurador
Carlos Augusto Vale das Chagas Responsável)
Francisco Menezes Almeida Antônio Fábio Lobo de Oliveira
Gerrilson N. Carlos Maria Conceição dias Pinheiro
Gilberto da Trindade Edivaldo Alves Costa
Isaac Assunção Marciel Antônio Guilherme Dantas da Silva
Jailton Morais de Oliveira Josué Lopes Nascimento
João Garcia Sepe José Davi Nascimento
Jobson Renan Ferreira Barreto Daniele Mendes Rodrigues
Joel da Silva Texeira Leandro Sena
Joelson Junior N. Texeira Raimundo Roberto Gonçalves
Edualdo Compos Silva Ítalo Gurjão
Leomax Correa Pinho Fabiano Ferraz
Luis Carlos Aviz José Jorge Veloso Santos
Luis Carlos B. Nascimento Rivanildo Palheta
Luis Pereira da Silva Jorge Henrique Melo da Silva
Marcelino Barros de Almeida
Messias dos Santos Dantas Equipe de Restauração das
Noel Ferreira Gurjão Imagens de Santa Tereza D’Ávila
Pedreiro Texeira de Matos Tania Veloso
Ricardo Carvalho Monteiro Alcione Ribeiro
Ricardo Coelho dos Santos Gleice Farias
Robson Ricardo Nascimento Adriano Teixeira
Fachada da igreja após a restauração
Rodolfo Morais da Silva Márcio Luthier
Rodrigo Carvalho
Rogerio Pontes das Neves Consultoria de Restauro
Rosivaldo Almeida Carolina Gester

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