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SISTEMA DE COMPOSIÇÃO BASEADO

NA MÚSICA TRADICIONAL JAPONESA


Bruno Ricardo Salvador Nogueira INTRODUÇÃO ESCALAS ESCALAS (CONT.)
Esta investigação surgiu no âmbito da disciplina de Projeto I, na A música tradicional Japonesa tem como base maioritária as es- Mesmo que o sistema Japonês remeta para uma época anterior
licenciatura de Música Electrónica e Produção Musical, cujo objectivo calas pentatónicas. Consequentemente, neste sistema, as pentatóni- à escala temperada, a maior diferença existente, caso este seja o
Escola Superior de Artes Aplicadas de Castelo Branco
era fazer com que os alunos explorassem ao máximo as capacidades cas têm de ocupar um papel importante durante a elaboração de método de afinação utilizado, é de 11,73 cents, diferença que repre-
adquiridas ao longo do curso para realizarem um trabalho de investi- qualquer peça. No entanto, o facto destas escalas serem um pouco li- senta cerca de um décimo da distância entre dois meios-tons, pelo
gação seguido de um mais prático. O trabalho que motivou este mitadas, acrescido da existência de escalas heptatónicas na Música que, dada a insignificância dessa diferença, será mais lógico e prático
Sistema de Composição Baseado na Música Tradicional póster tratava-se da criação de um sistema de composição único, Tradicional Japonesa, as escalas terão uma utilização um pouco dife- recorrer à escala temperada no sistema aqui exposto.
Japonesa com base na música tradicional japonesa, do qual resultasse uma rente.
peça final para ensemble de metais e percussão. Contudo, ainda pensando no sistema Japonês, o facto de esca-
Em primeiro lugar, como se pode concluir através da pesquisa las com as mesmas notas (e à partida com os “mesmos intervalos”)
Música Tradicional Japonesa
Deste modo, o trabalho foi desenvolvido em três fases. A pri- apresentada anteriormente, não parece haver na música tradicional serem nomeadas de diferentes formas, remete para o pensamento
meira, já contemplada num póster de outra edição, consistia numa Japonesa uma exploração do conceito de acorde nem de harmonia, de que as diferenças de afinação sejam maiores, mas esta situação
pesquisa sobre o funcionamento da música tradicional Japonesa, ex- uma vez que a polifonia não é usual e, quando acontece, é através de será ignorada, pelo facto da informação não ser suficiente.
Música Tradicional Japonesa; plicando que escalas eram utilizadas e em que circunstâncias, as tex- uma melodia e uma contra-melodia que não são verticalmente orga-
Música Contemporânea; turas, a métrica, a instrumentação e as influências que este estilo foi nizadas até à cadência. Assim, este sistema, mesmo podendo permitir
Composição; recebendo. A segunda fase, que aqui consta, compreende a criação várias melodias diferentes em simultâneo, bem como politonalidade
Etnomusicologia.
de um sistema de composição próprio tendo em conta os factores es- ou linhas melódicas sem qualquer ligação aparente, vai ter uma estru-
tudados no ponto anterior. Por fim, a última fase é a criação de uma tura harmónica regida pelas escalas pentatónicas.
peça com base no sistema de composição criado.
Simplificando, as melodias vão ficar a cargo das escalas heptató- HARMONIA
No caso do presente póster, como já referido, constam apenas nicas, podendo-se também recorrer a cromatismos, ao passo que a
as fases da criação do sistema de composição e da composição da harmonia será regida pelas escalas pentatónicas. Isto não impede a Tal como já foi referido, a harmonia e as progressões harmóni-
peça resultante. O objectivo do mesmo é permitir a compreensão do possibilidade de fazer passagens pentatónicas no campo melódico cas vão ficar a cargo das escalas pentatónicas. Deste modo, o acorde,
sistema musical em causa e informar possíveis interessados pela cul- ou acrescentar notas aos “acordes”, além das cinco notas iniciais. contará com pelo menos 5 notas diferentes, podendo variar desde o
tura nipónica de como as suas tradições podem ser utilizadas para a estado fundamental, a escala do grave para o agudo, a qualquer in-
criação de nova música e de novas formas de criação musical. A música tradicional Japonesa, remete para uma época em que versão, quer seja em modo do grave para o agudo quer seja por tran-
Resumo a escala temperada ainda não existia. Como tal, as notas apresenta- sição no registo de notas individuais. Os acordes poderão aparecer
vam, com certeza, algumas divergências de afinação quando compa- tanto em bloco como arpejados.
O presente Póster é resultado da segunda fase de um trabalho investigati-
vo sobre a Música Tradicional Japonesa.
TEXTURAS radas com as conhecidas nos dias de hoje.
O comportamento do acorde, bem como a escolha do próximo,
Aqui é descrito um Sistema de Composição criado com base nessa Apesar da Música Tradicional Japonesa ter uma maior inclina- Uma possibilidade é que os músicos obtivessem as notas das vai depender do tipo de escala, uma vez que, diferentes escalas,
pesquisa e explicada a composição de uma de duas peças que foram ção para a monofonia, o presente sistema não segue esta vertente. cordas seguintes através do segundo harmónico das cordas anterio- devido à sua diferente estrutura, vão ter outro tipo de comportamen-
compostas segundo o mesmo. res, ou seja: to ou resolução, o que dará origem ao próximo acorde ou inversão.
Contudo, a passagem dos temas ou melodias pelos vários instrumen-
tos, utilizando ou não variações, é um recurso a explorar. Se um Koto (instrumento de cordas dedlilhadas) tivesse a sua corda Aos acordes pentatónicos poderão ainda ser somadas uma ou mais
mais grave afinada com um Dó3 (261,63 Hz), ao encurtar a corda pela notas, tendo estas a condição de notas de tensão. Estas poderão ser
Serão também exploradas as sonoridades dos acordes em metade duas vezes (um quarto), a nota resultante seria um Sol4 cerca sétimas, nonas, sextas ou décimas primeiras da fundamental, depen-
bloco a fim de testar as características sonoras das harmonias. de 1,96 cents mais alto do que no sistema temperado (784,88 Hz). dendo da escala em causa.
Com este som, podia-se facilmente afinar a corda correspondente ao
Sol3, que ficaria afinada com a mesma diferença face à escala tempe- As resoluções devem ser feitas pelo grau conjunto mais próxi-
rada. Repetindo o processo à corda agora afinada em Sol3 (aprox. mo. Ou seja, se uma peça começar com um acorde formado pela
Abstract
MÉTRICA 392,94 Hz), obtêm-se o Ré5 com uma diferença de 3,91 cents face à escala Ryu-Kyu (Lá; Dó#; Ré; Mi; Sol#; Lá), as notas instáveis (Dó# e
escala temperada, nota que daria para afinar a corda correspondente Sol#) têm de resolver no sentido mais próximo (exemplo: Dó# - Ré e
O sistema tradicional Japonês, devido à pronúncia da língua, ao Ré3 (294,33 Hz). Fazendo o mesmo a esta corda, consegue-se o Sol# - Lá). Uma vez que as notas instáveis resolveram no sentido as-
This poster is the result of the second phase of an investigative work on harmónico que nos permitirá afinar a corda do Lá3, com uma diferen- cendente, as outras devem contrapor no sentido inverso (Lá – Sol; Ré
apresenta-nos uma métrica maioritariamente binária (incluindo com-
Traditional Japanese Music.
passos 6/8), podendo-se considerar também a métrica livre. Assim, ça de 5,87 cents (441,49 Hz). Esta dá-nos a possibilidade de afinar o – Dó; Mi – Ré), o que dá origem à escala Minyo (Lá; Dó; Ré; Mi; Sol; Lá)
Here is described a Composition System created based on this research este sistema, terá uma forte incidência em compassos sem métrica e Mi3 com uma diferença de 7,82 cents da escala temperada (331,12 que constituirá o bloco que se segue. A regra de passagem entre
and explained the composition of one of two pieces that were composed binários, devendo no entanto explorar as diferentes organizações de Hz), o que já resulta numa escala pentatónica, nomeadamente o acordes pode ser alterada dependendo da condução melódica e as
according to it. Modo Gong do sistema Chinês que, por sua vez, corresponde à escala únicas notas que tem obrigatoriamente de resolver por grau conjun-
compasso (2/4; 6/8; 5/8; 2/2; C - na condição de duplo binário; etc.).
Parte-se do principio que a divisão dos compassos mistos ou com- Minyo do sistema Japonês a começar na segunda nota. Este processo to são as consideradas instáveis.
postos é sempre binária. pode ainda ser repetido mais uma vez, obtendo um harmónico capaz
de afinar a nota Si3 com uma diferença de 9,78 cents (496,68 Hz), o A cadência não obriga a que se tenha de parar ou resolver num
A métrica livre também será uma opção a ter em conta embora que nos possibilita ainda a obtenção de um harmónico que permite acorde estável, nomeadamente um que seja composto pela escala
seja um pouco mais difícil coordenar vários instrumentos sem uma afinar um Fa#3 com uma derença de 11,73 cents relativamente à Minyo ou Ritsu, cujas notas intermédias do tetracorde se encontram
métrica definida. escala temperada (372,51 Hz). a mais de meio tom das restantes.

PROGRESSÃO MELÓDICA E CONTRAPONTO ESTRUTURA E PROGRESSÃO HARMÓNICA ESTRUTURA E PROGRESSÃO HARMÓNICA (CONT.)
As progressões melódicas devem, sempre que possível, ser 1º Andamento 3º Andamento:
feitas por grau conjunto ou por intervalos equivalentes (2ªM/m; Progressão Harmónica:
9ªM/m; 7ªM/m/º), podendo-se porventura fazer saltos de 3ª e 5ª. Solo de Tam-tam (escala minyo com algumas alterações); Fá# - Sol(3) -- Fá - Sol Mi
Sol(7) - - Lá Ré Ré Lá
As melodias contrapontísticas poderão ou não ter uma concor- 1.Apresentação da harmonia: Mi Ré Sol Mi - Fá -
dância harmónica, não tendo necessariamente que estar na mesma Progressão Harmónica: Ré Si Dó Si(3) - - Dó(3) - -
escala ou modo. As variações devem ser feitas através de técnicas de Sol# - Sol - Fá# - Lá Ré Mi Fá - Mib(6) - - Lá - Sib -
contraponto como a inversão, a aumentação, a diminuição, o retró- Mi Lá Ré - Si - Sib Si - Dó - Sib - Dó Lá
grado, etc., podendo-se também criar desfasamento da mesma me- Ré Mi Lá - Fá# - Fá Lá Mi Fá - Sol Ré
lodia pelos instrumentos, criando ou não pequenos canons. Dó# - Dó - Si - Ré Mi
Mi Ré Mi Mi Lá Dó - Sib Sol -
Dó# - Dó - Si - Ré - Mi Fá - Mi(9) -- Ré
Mi Sol - Lá
2º Andamento Si Dó Si(9) --
FORMA DA PEÇA Progressão Harmónica: Lá Ré - Mi
Lá Mi Lá Mi Mi Sol(3) - - Fá Dó -
A peça será constituída por quatro andamentos a fim de testar, de Si - Do# - Dó - Si Ré Lá Dó Si(9) --
forma faseada, as propriedades do sistema. Deste modo: Fá# - Sol# - Sol - Fá# Sol - --------
O primeiro, onde são apresentadas as escalas pentatónicas Ré Lá Ré Ré - Dó - Lá - Láb Fá# - Láb Mi(3) - -
(como acorde) no seu “estado fundamental” (o mais claramente pos- Mi Ré Mi Fá# - Sol - Mi Fá Mi Mi(9) - - Fá
sível) com progressões simples e melodias lentas, oferecendo um ca- Ré Lá Ré Mi Lá Sol - Réb - Si - Dó - Ré -
rácter de suspensão, não havendo um ponto de chegada notório, Mi Ré Mi Lá - Sol - Dó - Sib Ré Sob Dó
tem como objectivo apresentar a sonoridade das harmonias penata- Fá(7) - - Mib Lá Fá - Sol
tónicas. Lá - Sol - Ré Láb - Fá# - Láb Fá
Mi Mi Dó - Sib Dó(9) - - Reb Lá -
O segundo andamento começa com um ostinato em trombone Fá# Lá
e é caracterizado pelo aparecimento de todos os motivos que serão SI Ré Fá - Solb - Sol -
apresentados posteriormente nos seguintes andamentos. Após a Fá# Lá Solb Solb - Sol -
apresentação dos vários motivos há uma pequena secção rítmica Ré - Dó - Réb Mi Lá
marcada pela consecutiva mudança da divisão de tempo dos com- Fá# Lá Dob - Réb Mi
passos, tem como objectivo testar a forma como as melodias se rela- Lá(7) - - Sib - Dó -
cionam com as diferentes possibilidades harmónicas. Experiência com vários tipos de compasso: Solb Solb - Sol -
Progressão Harmónica: Lab Láb Ré
O terceiro andamento é o verdadeiro desenvolvimento da Sol# - Fá# - Sol - Sol# - Fá# - --------
peça. É aqui que todos os motivos do início do segundo andamento Lá Ré Lá Mi Lá Sol - Fá# - Fá - Mi
são trabalhados e as harmonias e progressões harmónicas ficam mais Mi Lá Mi Ré Mi Mi Ré Mi Ré
complexas. As pentatónicas (acordes) sofrem também alterações, Ré Mi Ré Lá Ré Dó - Si - Sib - Dó -
permitindo também a inclusão de notas externas às pentatónicas ori- Mi Lá Mi Ré Mi Lá Lá Sol(7) -- Fá#(6) - - Repete
ginais, bem como algumas diferentes organizações intervalares. É Do# - Si - Dó - Dó# - Si - Fá#(6) - - Sol(7) - - Láb(9) - - Lá
neste andamento que o sistema é verdadeiramente testado na sua Lá Ré Lá Mi Lá Ré Mi Lá Si(9) - -
plenitude. Si(9) -- Dó#(3) - - Ré Sol -
Sol Fá# - Sol
O quarto e último andamento trata-se de uma reexposição, em Mi Lá Mi Sol - Fá(6) - - Sol
que o sistema de composição é, de certo modo, posto de parte, Ré Mi Ré Mi Ré Dó
sendo que todos os motivos utilizados ao longo da peça são trabalha- Lá Ré Lá Dó - Sib(9) - - Si(9)
dos em conjunto (através de técnicas básicas de contraponto), a fim Ré Mi Ré Lá Lá Sol
de poderem ser todos tocados em simultâneo e permitirem uma har- Dó - Si - Dó Fá#(6) -- Sol - Lá
monia estável e que, mesmo sem corresponder ao sistema em vigor, Mi Lá Mi Ré Mi Mi
seja coerente com mesmo. O seu objectivo é testar como funciona a Si(9) -- Dó - Ré
escrita horizontal das várias escalas em simultâneo e que outras har-
monias mais complexas podem ser alcançadas. 4º Andamento:
Reexposição - Síntese dos vários motivos.

CONCLUSÃO
Sendo este um Póster destinado à exposição de um sistema de composição criado com base no sistema da Música Tradicional Japonesa, pode dizer-se que o seu foco não incide sobre a explicação do sistema original, mas
sim no sistema gerado. Este tornou-se um sistema estável que obteve resultados interessantes.

Devido à falta de espaço neste formato de apresentação, não foi possível mostrar exemplos da peça que este sistema originou, tal como seria preferível. No entanto, existe a possibilidade da audição das peças resultantes
em formato digital, disponível online: http://ricardonogueira1.wixsite.com/ricardonogueira/composi--o.

O presente sistema originou duas peças: a que se encontra descrita neste Póster, para orquestra de metais e percussão, e uma outra para Ensemble de Madeiras (quinteto), que mais tarde, por encomenda, foi transcrita para
Quinteto de Saxofones.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Tokia, A., & Hughes, D. (2008). The Ashgate Research Companion to Japanese Music. UK: Stevens, C. (2008). The Conflict and Fusion of Japanese and Arabic National Music Prado, Y. (nd). Conjuntos Pentatónicos em cinco canções Japonesas de Rodolfo Coelho de
University of London. Cultures. London: Routlegde. Sousa. S. Paulo: Universidade de S. Paulo.

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