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AMARTYA SEN Desenvolvimento como liberdade Tato ‘Laura Teixcira Motta Revs ec Ricardo Doninelli Mendes renpreay pow J aos Genesis Teas opi son Amar en ‘mrestopabtnce taste sardocom Atle nacnio Se Fandom ue ne Indoor Devdapan need cope Ralteeie ‘shrapnel de ila mot dato de PeeLron ‘adatom La mtd gripe des ere primer (Bsn levy, Pa 6 Man) abies nicer ed Abe Mate eae Ghanian aa ‘edo a rect a te msewndon ea andera as ec spores ~ Sp Pale ar “Tae (0) yor 80 Tec) ser Introdugao Desenvolvimento como liberdade exerts texuoleicac.> ssh Hyg xis sesh Real ea» peste 7 {_ Procuramosdemenstrar nese iv que p desenvolvimento pace servo 0 um processo de expansao das libercades reais que as pessoas desfi | 6 enfoque nas liberdades humanas contrasta com visbes mais restritas de desenvolvimento, como as que identificam desenvelvimento com erescimento iz do Produto Nacional Bruto (Pn), aumento de rendas pessoais, indust ‘io, avango tecnoldgico ou modernizagao social, O crescimento do rn ou das expan as eas desftads ps membros soca, Masa bee eecootmln (por explo regs deduce ctade) oe dar chi {por xemploalberdade pript de discanieeavenguagies ples) (De forma ansloga, aindustrializago, o progresso tecnol6gico ou a moderniza- 728 | ¢do social podem contribuir substancialmente para expandiraliberdade huma- na, mas ela depende também de outras influéncias. Se a liberdade € 0 queo desavlineato pomert endo exis un agunent fundamental feat | dconentragdonesecbjevoabrangene-enfoemalgummeoespetic ou (aig | em algun lisa de inetramentos especialmente escola, ero desenvolv- mento come expansio deliberdadessbstantivas dirige a atencio para os fins 7 ‘que o tornem importante, em ver deréstringi-la alguns dos meios que inter cla, desempenhama um papel relevante no procesto, ‘O desenvolvimento requer que seremovams prnipais fonts de privagao deliberdede:pabrezactirani,caréncinde portunidadesecondmicase desta 0 social sstemstico,negligéncia do servigas pablicos nfoleréncia ou incer- ferénciaxcesiva de Estos repressns. A despeito de sumentossempreceden- tesnaopuléncia global;o mundostual ngaliberdedesclementeresa um grande riémero de pessoas —talvez até mestno & maior, As vezes austncia de ber- des substantivas elaciona-se diretamente com} « pobreza econdmica, que rouba das estos a iberdade desaiar fore, de abter ma nutri stisit6- ria oa reméaios para doenes tratéves a oportunidade de vetir-se ou morar de todo apropriado,de ter aceso agua tratada ou sancamento bisico. Em outros «casos, privasio de liberdade vincule-e esteitamente i carécia de servigos ppablicos assisténcia social, como por exemplo austria de programas epide- imiolégicos, de um sistema bem plancjado de asistencia médica e educaglo ou de insttuigdes ficazes paraa manutengdo da paz eda ordem locais, Em outros ‘casos,a violagio de liberdade resulta diretamente de uma negagao de liberdades politicas ¢ civis por regimes autoritdrios ¢ de restrig6es impostas & liberdade de pavticipar da vida social, politica eccondmicada conunidade BPICACIA E INTERLIGAGOES A liberdade ¢ central para o processo de desenvolvimento por duas razdes: 1). Arata avaliadria:a valiagao do progresso tem de ser feta verificando-se pri- _mordialmente se houve aumento dasliberdades das pessoas 2) A vazno da eficcic 3 realizaca0 do desenvolvimento depende inteiramente da livre condicao de agente das pessous. 14 destaqueia primeira motivasao: a razao avliatria para concentrat-se naliberdade.Paraentendermosa segunda, da eficacia,precisamos cbservaras relagbesempiricaselevantes,em particularas relacbes mutuamentereforsado- rasentreliberdadesdetiposdiferentes.Edevido aesses inter-relagbes—quesao «xamminadas cor um certo dealhamento nest iro — que condigio de egen- telivree sustentével emerge como um motor fundamental do deservlvimen, to.Alivrecondicéo de agente ndos6 é,emsi,umva parie“consttutiva’do desen. volvimento, mas tambe ibui para fortalecer outros tipos de condigoes ce As lage empfricasques4o amplamentecxarinadas neste do associam os dois aspectos a idéia de “desenvolvimento comoliberdade” Aligagio entreliberdadeindividuale realizagto de descnvolvimentosocial ‘Yai muito além da relagdo consttativa — por mais importante que ela see. aque es pessoes comseguem positivamente realizar éinfluenciado por oportuni- dades cconé micas, lberdades polticas, podere socnise por eondisdes habili- tadoras come boa sade, educagao bisa e incentive eaperfeigoamente dein. iativas. As disposiges institucionais que proporcionam essas oportunidades so ainda influenciadas pelo execicio da iberdades das pessoas, mediante a liberdade para participa da escolhasocial eda toinada de decisdespiblicas que impelem o progresso dessas oporvanidades. Estas inter-rlagBes também sto _ investigadas neste live. ALGUNS EXEMPLOS: LIBERDADE POLITICA £ QUALIDADE DE VIDA ‘A importaneia de considerar a liberdade o principal fins do desenvolvi- ‘mento pode ser ilustrada com alguns exemplos simples. Emborao aleance total «dessa perspectiva somente possa emergir de uma anslise muito mais armpla (empreendida nos capitulosseguintes) a natureza radical da idéiace*desenvel- vimento como liberdade” pode ser lacilmente ilustrada com alguns exemplos clementares. Primeiro, no contexto das visdes mais restritas de desenvolvimento — ‘como crescimento do Px8 ou industrializacio —, freqiientemente se pergunta sedeterminadas liberdades politicas ou sociais,como,por exemplo, aliherdade de participagzo ou dissensto politica ou asoportunidades de receber educacao basica, sto ou nao so “conducentes ao desenvolvimento” A luz da visso mais fundamental de desenvolvimento como liberdade, esse modo de apresentar a ‘questao tende a passar ao largo da importante concepgao de que essasliberda- des substantivas (ou sea, liberdade de participacao politica ou ¢ oportunidade de receber educacao bisica on assisténcia médica) estao entre 08 componcntes consttutivos do desenvolvimento, Sua televancia para o desenvolvimento néo tem de ser estahelecida a posteriori, com base em sua contribuigéo indireta para ‘o crescimenta do rou para apromogao da industrializagao,0 fato€ queessas snomico; essa relacio sera amplamente exarninada neste livro. Mas, embora {Crelagao causal sea de fto significaziva, a justificagao dasliberdades e direitos estabelecida por ess igacto causal éadicional ao papel diretamente constitutt yo dessasliberdades no desenvolvimento. {Um segundo exemplo relaciona-se a dssonincia entre a rend per capita {mesmo depois da corresan para variagdo de pregos) ea iberdade dos indivi- duos para ter uma vida longa e viver bem. Por exemple, os cidadéos do Gabo, [rica do Sul, Namibia ou Brasil poder ser muito mais ricos em termos de PN per capita do ques de Sri Lanka, China ou do Estado de Kerala, na India, mas neste segundo grupo de patsesas pessoas rm expectativas de vida substancial- ‘mente mais elevadas do que no primeico. ‘Com um tipo diferente de exemplo, é comurn o argunento de quey 208 Estados Unidos, os afro-americanos si relativamente pobres em comparagio com os americanos brancos, potém sio muito mais ricos do que os habitantes, do Terceiro Mundo, Noentanto, éimportante reconhecer que 0s afro-america~ yrAidale madure do que as nos tém uma chance absolutamente menor de che pessoas que vivern em muitas sociedades do Tesceico Mundo, como China, Sri Lanka ou partes da india (com diferentes sistemascle side educagae exelagdes, a andlise do desenvolvimento (or relevante inclusive para os paises mais rcos (neste livo procura-se demonstrar que ela efetivainente €)a presenga desses contrastes intergrupais no Ambito de pafses mais ricos pode ser considerada um aepecto importante ds concepgao de desenvolvimento ¢ sub- desenvolvimento, TRANSAGOES, MERCADOS & PRIVAGAO DE LIBERDADE ECONOMICA (Um terceiro exemplo relaciona-se a0 papel dos mercados como parte do pprocesso de desenvolvimento. capacidade do mecanismode mercado decon~ ‘ribuir para o elevado crescimento econémico eo progresso econdmico global tem sido ampla e acertadamente reconhecida na literatura contemporinea sobre desenvolvimento, No entanto, seria um erro ver o mecanismo de merca~ a liberdade de sransacho Gla propria uma parte essencial das iberdades basicas queas [pessoas tém razao para valorizar. do apenas como um derivative. Como abservou(adam $1 Ser genericamente contra os mercados seria quate tio estapafrcio quanto ser genericamente contra conversa entreas pessoas (ainda que certas conver «98 sejam claramente infames e causem problemas a terceitos — ou at mesmo 408 prépriosinterlocutores). A liberdade de trocar palavras, bens ou presenites nao necessita de justificagao defensiva com relagao a seus efeitos favoréveis mas distantes; essas rocas fazem parte do modo como os seres humanos vivem interagem na sociedade (a menos quessejam immpedides por regulamentagio ou decreto).A contribs ‘micoé obviamente importante, mas ver depoisco reconhecimentoda impor- tancia direta da liberdade de troca— de palavras, bens, presentes. Acontece quea rejeigao da liberdade de participar do mercado de traba. Iho é uma das maneirasde manter a sujeigao eo cativeiro da mao-de-obra,ea 19 do mecanismo de mercadlo para ocrescimento.econd- batalha contra 2 privagzo de liberdade existente no trabalho adscriticio* & imporcante em muitos paises do Terceiro Mundo hoje em dia por algumaes das 'mesmas razbes pelas quats a Guerra Civil americana foi significativa, A liber dade de entrarem mereados pode ser, els propria,umaconiribuigaoimportan- te para o desenvolvimento, independentemente do que. mecanismo de mer- cado possa fazer ou nao para promover o crescimente econdmico ous industrializagz0. De fato,o elogio ao capitalismo feito por Karl Marx (que nao foi nenhum grande admirador do capitalismo em geral) e sua caracterizagao (em 0 capital) da Guerra Civil americana como “o grande evento da historia contemporénea” relacionam-se diretamente 4 importincia da libercade do contrato de trabalho em oposiga0 4 escravidao e a exclusao forgada do merea- do de traballo, Como veremos, entre os dessfios cruciais do desenvolvimento ‘em muitos paisesatualmente inclui-se anecessidade delibertar os trabalhaco- * Bono aber. radio aq. como “tisha 2dscricin indica a estenci de algu tipo de coesfopara que umn psc viva ctrabelhe em determinads propridadeimpedindo a deofere cerseutiabahe no mercad, 08.7) Lbcnere wirelao” resde um cativeiroexplicito ouinpplicito que nega o acesso a0 mercado de tra balho aberto. De modo semelhante,a negacio do acesso aosmercados de pro- duos freaiientemente esté entre as privagdes enfrentadas por muitos peque~ ‘nos agricultores e sofridos produtores sujeitos & ergenizacdo ¢ restrigdes tradicionais. A liberdade de participar do intercémbio econémico tem um papel basico na via social, ‘Afinaidade dessa consideragdo muitas vezesnegligenciada nao é negara importancia de ulgar 0 mecanisme de mercado de um modo abrangente, com xentoeconémicoeyem todos osseuspapeisc efeitos, inclusive os de gerarcre: muitas circunsténeias, até mesmo a eqldade econdmica. Também temos de «saminar,poroutrolado,aperssténcie de privagdes entre segmentosda comu- nidade que pern cexclufdos dos beneficios da sociedace orientada para © mercado, ¢ 0 juizes, inclusive es exticas, que as pessoas podem fazer sobre diferentes catilos de vid c valores associados d cultura dos iavisio do desenvolvimento como liberdade, os ergumentosde diferentes lads tém de ser apropriadamente considerados eavaliados. Edifel pensar que qualquer processo de desenvolvimento substancial possa prescindir do uso muito amplo ‘de mereados, mas isso nao exclui o pepel do custeo social da regulamentacao piiblica ou da boa condugio dos negécios do Estado quando cles poden vida humana. abordagem aqui adota- quecer —ao invésdeempebrecer de prope um mode maiszmplo e mais inclusiv de ver os mereados do que @ freqlientemente invocado, seja para defender, seja para critcaro mecanismode rercado, Termino esta série de exemples com outro extrado diretamente de uma recordagiode infncia Eu tnha uns der anos.Certa tarde, estavabrincando no jardim de minha casa na cidadede Dhaka, hoje capital de Bangladesh, quando ‘um homem entrou pelo portaogritando desesperadamente esangrando muito Fora esfaqueado nas casts. Era a paca em que hindus e mugulmanos mata vvam-se nos confltos grupais que precederam a independencia ea divisio de Inia Paquistd. Kader Mia, homem esfaqueado, era um tabalhador dias tamugulmanoque viera fezer um servico em umnacasa vzinha — por um paga- mento fnfimo—e foraesfaqueado na ruapor alguns desordeirosdla comunida de hindu majoritaria naqueie regido. Enquanto eu Ihe dava Agua e ao mesmo tempo gritava pedindo ajuda aos adultos da casa — e momentos depois, ‘enquanto meu pai levava as pressas para o hospital —, Kader Mia no pareva de nos contr que sua esposa Ihe dissera para ndo entrar em uma érea hostl naquelaépoca tao conturbada, Mas Kader Mia precisava sair em buscade traba- tho. um pouco de dinheiro porque sua familia no tinhe o que comer. A pena lidade por essa privagso de liberdade econSmics acabou sendo a morte. que ocorreu mais tarde no hospital Essa experiéncia foi devastadora para mim. Ela me fez refletis, tempos depois, sobre terrivelfardo das identidades estreitamente definidas,incluindo as firmemente baseadas em comunidades e grupos (terei oportunidade de dis- correr sobre isso nest livro), Porém, de um modo mais imediato, ela também ressaltou o notdvelfato de que privagio deliberdade econdmica,na forma de pobreza extrema, pode tornara pessoa uma esa indefesanaviolagdo de outros ‘ipos de liberdale Kader Mia nao precisaia ter entredo.em uma d1ea host em busca de uns miseras trocados naquela época terrivel se sua familia tivesse con- digbes de sobreviver de outra forma. A privagio de liberdade evonémica pode _gerar a privagao de liberdade social, assim come a privacio de liberdade social olitica pode, da mesma forma, gerar a privagio deliberdade econdmica $ lib. cexnie pie ke vans ti ORGANIZAGORS F VALORES. Muitos outros e implos po adotar a visio do desenvolvimento como um processo integrado de expansio de sm ser dados para ilustrar como faz diferenga, lierdaces ubstantvasinterligadas, esa visio que apresetamos,exmiucames ¢.tilizamos nestelivo para investiga o proceso de desenvolvincent inteptan do consideragdeseconémicas,socias ¢ politica. Una abordagem ampla desse tipo permite a apreciego simulténes dos paps vitas, no proceso de desenvol- mento, de muitasinstitugdes diferentes, incluind mercadoseorganizacoes telacionadas 20 mercado, governos ¢ autoridades locais, partidos politicos ¢ ‘tras instituigBescivcas, sistema educacional eoportunidades de didlogo e debate abertos (incluindo o pape! da midia ¢ outros meios de comunicacdo). ssa abordagerm nos permit ainda reconhecer.o papel ds valores soca £ costumes prevalecentes, que podem influenciar as liberdades que as pessoas desfrutam e que elas esto certas ao prez. Normas comuns podem influenciar 3 caracrerttcasscniscome aiguldade ent ssexos atures doscuidedot Sra Sho ote catartinvospadron defending, ot arent nlc ambenee tas outa Oslo peaecen OF ovbunbam rapoden os renova desea nea stangrnt elagte conics plc, Ocrersiinds eases pene nerage soa qu cla pois noes sehr brdaes depart Cada ua de elagies meee i xr © fot de ques iberdade de rans econfmices tend sr pee sponte um grande moor do crscimentaccondmien tm do mites es serabecderrbor continue a eistiertco werent E importante wre dare evi valor sos mereados mas trbm aprecar papel de setae tbedatesecnomicn sociiepltns que melhoram een uce oetdquesrpenonepertevarKspinuencs at mesmo questoesconio- rita come wcharnado problema populaconal. papel da iberdade ns veers dts de fecondidde encssvamenteelevadas €um ei roves ual a mute trpa exist pines contre. No século x sorconta rane rconaista faneésCondovet eperava que as ax de scehnatae imine com" progreie de razio" d modo que mas vgurangn maivedscaae snip berdade ce deioes etd viser daar rcimenta opulaionl seu contemporanes Thomas Robert situs sata opine radcalment diferente, De fat, Males airmou: Nutvtercmperginquakqreainalén dadeuededeobiercomadeqs aabanvénetnesnecntadeada ria von indpor ee maiornimese de ae aracastsecelocuainexpactlaede carom aes far vu sito comparetios ess daaspoiges apres — asx das, respectivamente,naliberdade assessorada pela razz0 ena coers ica — serdo investigados mais adiante neste estudo (as evidencias fazem a balanca pender mais para Condorcet, como procurarei demonstrat). Mas € particularmente importante reconhecer que essa controvérsia especifica € apenas um exemplo do debate entre as abordagens do desenvolvimento faxo- raveisecontratias liberdade, que ver sendo travado ha muitosséculos, Ese debate ainda se mostra muito ative de wétas formas. INSTITUIGOES E LIBERDADES INSTRUMENTAIS Gi distintos de Hbendade vistos de uma perspectiva“instrumen- _ab’ so investigados perticularmente nes estudos empiticos a seguir. S20 eles ( (1] liberdades politicas (2) facilidacles econdrnicas, (3) oportunidades sociais, (4) ~ garantias de ransparéacia e (5) seguranga protetora. Cada um dessestipos dis- ¢ tintos de direitos eoportuniades juda a promoveracapackdade gral de uma pessoe. Eles podem ainda atuarcomplementando-se mutuamente, Aspoliticas pblies visando ao aumento das capacidades humanes e das iberdades subs- tantivas em geral podem funcionar por meio éa promogio dessa ibecdades distintas masinter-relecionadas, Nos cepitulosaseguirexaminaremoscad um dessestipos deliberdade —easinstituicdes envolvides— ¢ discutiremos as rcla- ces entre cls, Havers oportunidade também de investiga sus respectivos paptisna promosio de iberdadesglobais para cue as pessoas ever modo de ‘ida que elas com rezdo valorizam. Na isfo do “desenvolvimento como liber China ‘as es ee ade (anes) Fontes: Estados Unidos, 1991-isgs U.S. Departement of Heath and Haman Services Ment United Sutes 1995, Byasile, m0, National Canter for Health Statistics, 1996: Kea 99 Government of tadia, Sample retain sptene nity an moron ncators 19, Nowa neta, Ws Chin, igs: Wool Health Organization, Workt Delhi, Office of the Registrar © heath sess anneal 994, Genet, World Filth Organization, 694 disposigbes sociais comunitirias como cobertura médica, servigos de saiide pablicos, educagao escola, lei eoxdem, prevalenciada violencia etc." \Valeapena observar quena popula;Soafro-americana dos Estados Unidos existe uma enorme diversidade interna, Examinando as populagoes negras do sexo masculine em determinadas cidades americanas (como Nova York, San Francisco, St. Louis ou Washington, D.C.) constata-se que elas s20 superadas ‘no aspecto da sobrevivéncia pelos hebitantes da China ov de Kerala em faixas etérias muito mais baixas.” Também sio superadas por muitas outras popu 8 lagies do Terceiro Mundo; por exemplo, os homens de Bangladesh tém mais chancede viver até depois dos quarentaanosdo que os homensafro-americanos do distrito do Harlem na préepera cidade de Nova York. Tudo isso ocorre ape- sar do fato de 0s afto-americanos dos Estados Unidos serem muitas vezes mais ricos do que as pessoas do Terceiro Mundo com as quais estZo sendo compa- rade LIBERDADE, CAPACIDADE F A QUALIDADE DE VIDA Na diseuscao precedente, concentrei-me em uma iberdace muita elemen. tar:a capacidade de sobreviver em ver de sucumbir & morte prematura, Essa, ‘obviamente,¢ uma liberdade significativa; existern, contudo, muitas outras que também sio importantes. De fato,oconjunto das liberdades relevantes pode ser muito amplo. Essa grande abrangéncia das liberdades is vezes € vista como um problema para uma abordagem “operacional” lizada na liberdade. A meu ver esse pessimismo € infundado, mas deixarei para tratar dessa questao no capitulo 3, quando as abordagens basicas para a va loragdo serio consideradas conjuntamente. do desenvolvimento centra Cabe notaraqui, porém, que perspectiva baseada naliberdade apresenta uma semelhanga genérica com a preocupacao camum com 2 “qualidade de vida", a qual tambem se concentra no mode como 2s pessoas vivern (talvez até mesmo nasescolhas quetém),enaoapenss nosrecurtos owns renda de que elas ‘enas liberdades substantivas, endo dispdem." O enfogue na qualidade de vi apenas na renda e na riqueza, pode parecer um afastamento das tradigBes esa belecidas na economia, cem certo sentido & mesmo (especialmente se Forem feitas comparagdes com algumas das anélises meis rigorosas centralizadas na renda que podemos encontrar na economia contemporanea).Mas,na verdade, «essas abordagens mais amplas estdo em sintonia com as inhas de andlise que tem sido parte da economia profissional desde o principio. As conexdes aris- totdlcas sto suficientemente sbvias (0 enfoque de Arist6teles sobre “floresci- ‘mento” e“capacidade” relaciona-se claramente d qualidade de vida es liber- dades substantivas, como foi discutido por Martha Nussbaum)."* Hé fortes 39 conexoestarnbém com ¢ andlise de Adar Smith sobre as “necessidades” eas condigges de vida." Com efeto, a origem da economia foi significativamente morivada pela nccessidade de estudar a avaiagdo das oportunidades que as pessoas tém para levar una ida boa ¢asinflaéncias causais sobre essas oportunidades. Além do cmprego clssico dessa igi por Arst6teles, nogbes semelhantes forara muito usadas nos primitos texto sobre contas nacionais prosperidade econdrmica, ajo pioneito foi William Petty no século Xv1, seguido por Gregory King, Franyois Quesney,Antoine-Laurent Lavoisier, Joseph-Louis Lagrange e outros. Conquanto a contabilidade nacional coneebida por esses proceres de andlise cconémica tena estebelecidocos fundamentos do conceito modenne de vende, ‘suatensio nunca serestringi esse unico conceit, Fles também pereeberem que a importincia de renda é instrumental e dependente dus circunstincies." ‘Embora William Petty, por exemplo, tenha introduzido o “método da senda” ¢ o“método do dispéndio” para calcular a renda nacional (os métodos modernos de célculo originaram-se diretamente dessas primeirastentativas) cle se preocupou explicitamente com a “seguranga comum” ea “flicidade par- ticular de eada homem’. O objetivo declarado de Petty para emprcender esse estudo relacionou-se diretamente avaliagaodascondigoesde vida daspessoas Ele conseguiv combinar investigasao cienifica com uma dose significativa ée slits dori io estBo-em tio mis politica siscentista (“para mostrar” que“o ccondigdes como querem fazer cteralguns descontentes"). Outros autores tam. bém examinaram o impacto do consumo de mercadorias sobre os vias fun cionamentos {functionings] das pessoas, Por exemplo, loseph-Louis Lagrange, fo grande matemitico, foi particularmente inavador ao converter mereadorias ges: quantidades de trigo ¢ outros «em caracteristicas relacionadas as suas fu _gr40s em equivalentes nutricionais,quantidades de todos 0s tipos de carne em tunidades equivalentes de carne bewina (segundo suas qualidades nutricionais) e quantidades de todos 0s tipos de bebidas aleodlicas em unidades de vinho (lembre-se: Lagrange eta francés). Ao concentrar ¢ atengéo em funcionamen: tos resultantesem vez de apenasem mercadorias, recuperamos parte ds heranga a economia profissional MBRCADOS E LIBERDADES ‘Opapeldo mecanismode mercado €ourro tema que requer arecuperagao de uma parte da antige heranga. A relagao do mecanismno de mercado com a liberdade e, portanto, com o desenvolvimento econdmico suscita questoes de pelo menos dois tipos muito diferentes, que precisamn ser daramente distingui- dos, Primeiro, a negasao de oportunidades de tanse¢ao, por meio de controles arbitrérios, pode ses,em si,uma fontede privasdode liberdade. Asppessoas.nesse «aso, sio impedidas de fazer o que se pode considerar —na auséncia de imperiosas em contrérie — ser do seu discito fazer. Esse argument nao depend da eficitncia do mecanismo de mercado oude qualquer andlise ampla das conseqtiéncias de ter ou ndo um mecanismo de mercado; ee se baseia sim- plesmentena importincia da iberdade detroca etransagdo sem impedimentos. Esse argumento em favordo mercado precisa er distinguido de um outro, atualmente muito popular: o de que os mercado expandem « renda,a riqueza 5 oportunidades econdmicas das pessoas. Restrigées arbitrérias ao meca- nismo de mereado podem levara uma redugdo de liberdades devide aos efeitos conseqiienciais da auséncia de mereados. Negar &s pessoas as oportunidades econdmicas ¢ as conseatiéncias favorives que os mereados oferecem ¢susten- tam pode rsultarem privagbes E necessrio dsting esses dois argumentos em favor do mecanismo de mercado, ambos relevantes para a perspectiva das liberdades substantivas. Na literatura contempordinea, é 0 segundo argumento — baseado no funciona. mento eficaz e nos resultados favoriveis do mecanismo de mercado — que reeebe praticamente toda a atengée." De um mode geral, esse argumento sem vida € influente, ¢existem muitas evidéneias empiricas de que o sistema de -mercado pode impulsionar 0 crescimento econémico répido ea expansio dos padzbes devida. Politicas que restringem oportunidades de mercado podern ter ‘feito de restringir a expansio de liberdades substantivas que teriam sido ge +radas pelo sistema de mercado, principalmente por meio da prosperidade econdmica geral. Nao se esta negendo aqui que os mercados as vezes podem ser contraproducentes (como salientou o proprio Adam Smith defender aneces. sidadede controledo mercado financeiro),” ea fortes argumentosem favor da regulamentacao em alguns casos. Em geral, porém, os efeitos pasitivos do sis- tema de mercado sto hoje muito maisamplamente reconhecidos do que foram ané mesmo poucas décadas atrés. No catanto,esse argumento étotalmente diferente doargumento de queas pessous tem o direito de fazer transaydes ¢ trocas. Mesmo se esses direitos ndo ‘ossem accitos como inviokéveis —e inteiramente dependentes de suas conse- qhencias—,pode-se ainda argumentarque hi uma perda social quandosenega as pessoas o direito de interagir economicamente umas com as outras. Caso acontega de os efeitos dessas transagdes serem to danasos para terceiros que essa presunsio prima facie de permit &s pessoas transacionar como bem entenderem possa sensatamente ser restringida, ainda assim existe alguma perdadireta quando se impo essa restrigdo (anesmosecla for mais do que com- ppensada pela perda altcrnativa dos efeitos indiretos dessas transagBes sobre fer cir) A disciplina da economia tendew 0 afestar-se do enfoque sobre 0 valor das liberdades em favor do valor das utiidades, rendas eriqueza. Eos estreitamento acarreta asubestimac3o do pape integral do mecanismo de mercado, ainda que sejnimpossivelacusara classe dos economistas de nio louvar suficientemente os ‘mercados.A questio, porém,nao 6a quantidade de clogios, masas razBes deles. argumento econémico de que um meca~ ‘Vejamos, por exemplo, o cde nismo competitive de mercado pode levar a um tipo de eficisncia que um sis tema centralizado jamais poderia atingir devido tanto & economia ¢a infor: ‘magi (cada pessoa atuante no mercado no precisa saber muita coisa) comoa compatibilidade de incentivos (as ages engenhosas de cada pessoa podem incorporar-s perfeitamenteas das outras).Considere2gora,contrariamenteao, queer geral se pressupde, um exemplo no qual 6 mesma resultado econdmico Egerado por um sistema inteiramente centralizado, com todas 2s decisdes rela- tivasa produszo ealocagio sendo tomacas por umn ditador. Essa teria sido uma reali2agao tao boa quanto a do exemplo anterior? [Nao € dificil demonstrar que estaria faltando alguma coisa em um cenirio como esse: aliberdade das pessoas de agir como desejassem 20 decidir onde trabalhar, © que produzir, © que consumir etc, Mesmo se nos dois, cenrios (caracterizados, respectivamente, pela livreescolhae pela obediéncia uma ordem ditatorial) uma pessoa produaisse as mesmas mercadorias da rmesmamaneiraeacabasse recebendos mesmazenda eadquirindo os mesmos 2 bens, essa pessoa ainda poderia ter 6timas razdes para preferit 0 cenério da livre escolha ao da subinissdo a ordem. Ha uma distingao entre“resultados de calminancia” (ou sea, apenas resultados fina sem considerar 0 processo de obtencao desses resultados, incluindo qexercicio da liberdade) e “resultados abrangentes” (considerando os processos pelos quais os resultados de cul- rmindncia ocorreram) — uma distinga0 de importancia fundamental, que procureianalisarmais plenamenteem outros trabalhos."O mérito dosistema de mercado nao reside apenas em sua capacidade de gerar resultados de cul rminéncia mais eficientes. ‘A madanga do centro da atengio da economia pré- mercado, passando da Jiberdade pera a utiidade, teve seu prego: a desconsideragao do valor central da propria liberdade. John Hicks, um dos prineipais economistas deste século,ele proprio com idéias muito mais orientadas para utilidade do que pata a libes- dade, apresentou ¢ questéo com admirévelclareza em uma passagem sobre 0 assunte: OsprincipiosWberas,ou de nao interferéncia,deseconomistasclssicos (smithiae ‘nos ou ricardianos) nao eram, em primeira lugar, principios econdmicos: eram ums aplicagao economis de prinipiesconsideradesapliciveisa um eampatem mais amplo, A afirmacao de que a lberdade econdmica condut & efisiéneis scondmics niopassiva de um exteio secundaric[..]O que realmente questiona & temo jusiicativa para exquecer So completamente como a maioria de nbs sxqueces,o outro Jodo do argumento. [Essa concepgio pode parecer um tanto exotérica no contento do desen: volvimento econémico, tendo em vista a prioridade que senvolvimento tende a dar & geracio de rendas clevadas, de uma maior cesta de bensdeconsumoe deoutrosresultadosde culminancia. Masela esté longe deser cesotérica, Uma das maiores mudangas no processo de desenvolvimento de uitas economias envolve a substituigao do trabalho adscritcio edo trabalho forcado, que caracterizam partesde muitasagriculturas tradicionais, parum sis- tema de contratacio de mao-de-obra livre e movimentasio fsica irrestrita dos trabalhadores. Uma perspectiva da desenvolvimento bascada naliberdade capta satura sobre de 4a imediatamente essa questio, de um modo que um sistema avaliatério concen. trado apenas em resultados de culminancia no consegue captar. Esse argumento pode serilustradocom os debatesem tomo danaturezado trabalho escravo no Sul dos Estados Unidos antes da aboligio.O estudo clissico sobre esse tema, empreendido por Robert Fogel e Stanley Engerman (Time or the cross: the economics of American Negro slavery), inclui uma notivel descoberta sobre as “rendas pecunidrias” relativamente elevadas dos escravos (as controvérsias quanto a algumas questses abordadas no livro no solapam ‘essa descoberta). As cestas de mercadorias consumidas pelos escravos eram ‘comparativamente superiores —enio inferiores,comtoda certeza —isrendas de trabalhadores agricolas livres. Ea expectativa de vida dos escravos, relativa- ‘mentefalando,em verdade nioerabaixa—“quaseidentics aexpectativade vide «em paises tio avangados quanto Frangs ¢ Holanda’, “muito maior [do que] as expectativas de vida [dos] trabalhadores industriais urbanos livres dos Estados ‘Unidos e Europa’ Ainds assim, escravos fugiam, ehavia excelentesra26es para resumir-se que o interesse dos escravos nao era bem atendido no sistema escravista. Na verdade, até mesmo as tentativas, aps a aboligao da escravidao, 0s de volta, de fazé-los trabalhar como ne tempo em que ‘haviam sido escravos (particularmente na forma de gang work [turmas de tra de trazer of bathadores contratados para executar tarefas nas grandes plantations |), mas [por salirios mais altos, nao tiveram éxito, Dopois da libertago dos escraves, muitos donos de plantations tentaram recone tituesuasturmas de trabalhadores com base no pagamento de slitios. Mas esas tentativas em geral fracatscram, apesar de os salirios oferecidos 20s libertos ‘excederer at rendat que eles recebiam como escravos em mais decem por cento, 1 _mantero sistema de turmas uma vez que haviam sido privados do dreito de wear a forga? ‘Mesmo com esse pagamento maisalto,osfazendiros deseobriram ser impos A importancia da liberdade de emprego e pritica de trabalho é crucial para a compreensto das valorages envolvidas."* (Os comentirios favoraveis de Karl Marx sobre o capitalisme como um modo de producio contririo a privagio de liberdade existente na organizagio ppré-capitalista do trabalho relacionam.se exatamente com essa questo, que também gerou a caracteriza¢io feita por Marx da Guerra Civil americana como “e grande evento da historia contemporines”® De fato,a questio da liberdade baseada no mercado é fundamental para a anélise do uso de mio-de-obre ‘adscriticiz — pritica comum em muitos paises em desenvolvimento —e da transigdo para um sistema de livre contrata¢io de trabalhadores, Com efeito, esse 6um dos casosem que aanslise de Mars demonstrou ter alguma afinidede com a concentragao libertiria naliberdade, eno na utilidade. Por exemplo, em seu importante estudo sobre a transiglo do uso da méo-

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