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OFICINA “ELEMENTOS DA ESTÉTICA DE J. R. R.

TOLKIEN”
André Luiz Rodriguez Modesto Pereira
Aula 5: 16/09/2010

FOLHA POR NIGGLE

“Não tinha tempo para si […] e ainda assim


estava se tornando senhor de seu tempo.”

• Também foi escrita entre 1938-1939;


• Publicado originalmente em Dublin Review, em 1945.
• Edição Tree and Leaf, junto com “On Fairy-Stories”, 1964.
• Tema, segundo Tolkien: Subcriação.
• Essa temática pode ser vista de modo bem amplo, levantando questões como:
• O que é arte?
• Qual o papel da arte?
• Qual a função do artista em uma sociedade “prática”?
• Conto metalinguístico: relato do artista sobre sua visão e modo de fazer arte. Lido como
texto autobiográfico.

1. Personagens (geral)
Niggle Sr. Parish
Pastor de ovelhas Sra. Parish
(artistas) (pessoas normais, sociedade)

Inspetor de casas (“Essa é a lei”)


Funcionários do Estado Condutor
(Reguladores)
Carregador

Primeira Voz (“severa”)


Casa de Trabalho Segunda Voz (“moderada, mas não suave”)

Conselheiro Tompkins (empreiteiro ?)


Vozes da sociedade, avaliação posterior, Atkins (professor)
julgamento de valor.
Perkins (apaziguador, sem opinião)
2. Os nomes
Niggle
Dicionário eletrônico Michaelis
• niggle
• n.
• 1) pequeno aborrecimento, dúvida;
• 2) pequena crítica
• vt + vi
• aborrecer, incomodar

The American Heritage® Dictionary of the English Language


• nig·gle
intr.v. nig·gled, nig·gling, nig·gles
• 1. To be preoccupied with trifles or petty details.
• 2. To find fault constantly and trivially;

[Perhaps of Scandinavian origin.]


nig.gler n.

Collins English Dictionary – Complete and Unabridged


• niggle [ˈnɪgəl]

vb
1. (intr) to find fault continually
2. (intr) to be preoccupied with details; fuss
3. (tr) to irritate; worry
n
1. a slight or trivial objection or complaint
2. a slight feeling as of misgiving, uncertainty, etc.

[from Scandinavian; related to Norwegian nigla. Compare NIGGARD]

niggler n
niggly adj

Sr. Parish
Dicionário Eletrônico Michaelis
• parish
• n.
• 1) paróquia, distrito eclesiástico;
• 2) freguesia, comuna.
• adj.
• Paroquial.

The American Heritage® Dictionary of the English Language


• par·ish
n.
1.
a. An administrative part of a diocese that has its own church in the Anglican, Roman
Catholic, and some other churches.
b. The members of such a parish; a religious community attending one church.
2. A political subdivision of a British county, usually corresponding in boundaries to an
original ecclesiastical parish.
3. An administrative subdivision in Louisiana that corresponds to a county in other U.S. states.

[Middle English, from Old French PARROCHE, from Late Latin PAROCHIA, diocese, alteration of PAROECIA, from
Late Greek PAROIKIA, from Greek, a sojourning, from PAROIKOS, neighboring, neighbor, sojourner: PARA-, near;
see para-1 + OIKOS, house; see WEIK-1 in Indo-European roots.]

Collins English Dictionary – Complete and Unabridged


parish [ˈpærɪʃ]
n
1. (Christianity / Ecclesiastical Terms) a subdivision of a diocese, having its own church and a
clergyman Related adj parochial
2. (Christianity / Ecclesiastical Terms) the churchgoers of such a subdivision
3. (Government, Politics & Diplomacy) (in England and, formerly, Wales) the smallest unit of
local government in rural areas
4. (Government, Politics & Diplomacy) (in Louisiana) a unit of local government
corresponding to a county in other states of the US
5. (Government, Politics & Diplomacy) (Christianity / Ecclesiastical Terms) the people living in a
parish
(Historical Terms)
on the parish History receiving parochial relief

[from Old French paroisse, from Church Latin parochia, from Late Greek paroikia, from
paroikos Christian, sojourner, from Greek: neighbour, from PARA-1 (beside + oikos house]

Note-se como a caracterização de cada personagem se dá conforme o significado de seus


nomes. Eles não são completamente opostos. Há uma relação de diferença e complementariedade
que se resolve no final: Niggle's Parish. Trabalho com a linguagem: Tolkien dá vida a um nome,
incorporando seus múltiplos significados em uma personagem.

3. Estrutura do enredo

Introdução • Apresentação das Personagens e do Cenário


• Niggle; Sr. Parish
• Estado (leis rígidas: “Essa é a lei.”)
• Tema da viagem: incômoda, desagradável, infeliz.
Primavera • “safra de interrupções”: precisou ser jurado; amigo
distante doente; Parish de cama, muitos visitantes.
• O tempo se tornou algo precioso – viagem.
• Jardim malcuidado – inspeção do Estado.
Outono • Úmido e tempestuoso;
• Trabalho no galpão;
• Impossibilidade de terminar o quadro;
• Interrupções de Parish (“expressão azeda e chorosa);
casa danificada; esposa doente.
• Busca de bicicleta: médico e empreiteiro (“voltara para
casa, para frente da lareira”);
• Médico atrasa; empreiteiro não vem.
• Niggle doente.
• Inspetor de Casas: “Essa é a lei”
• Condutor
Viagem • “Niggle se foi de forma bastante pacífica”
• Estação Ferroviária: grande e sombria
• Carregador chama por “Niggle”
• Enfermaria da Casa de Trabalho: remédio amargo,
tratamento pouco amigável.
• Trabalho duro; ambiente sufocante, sem luz; descanso
no escuro “para pensar um pouco”; privação dos
sentidos;
• sensação lenta de passagem do tempo; remoer o
passado; sem prazer.
• Novas preocupações: trabalho extenuante =
mecanização da rotina, da vida.
• Não havia prazer; havia certa satisfação (“pão, não
geléia”)
• “Não tinha tempo para si […] e ainda assim estava se
tornando senhor de seu tempo.” Sem pressa, mais
tranquilo, conseguia descansar.
• Suportou a mudança de rotina; mas seu corpo não.
Ninguém lhe agradeceu o esforço.
Julgamento • Primeira e Segunda Voz
• Primeira avaliação da arte de Niggle: tem um encanto
próprio; Niggle era um pintor por natureza; descuido
com as coisas da lei;
• “Há o caso Parish, o que veio depois. Era vizinho de
Niggle, nunca moveu uma palha por ele, e raramente
demonstrou alguma gratidão. Mas não há anotação nos
registros de que Niggle esperasse gratidão de Parish, ele
nem parece ter pensado a respeito.”
• Trajeto de bicicleta favorece Niggle: vai para a próxima
etapa.
Nova fase (pós-viagem) • Volta à luz, cura, nova viagem.
• Maior claridade, nitidez, trem parece novo.
• Destino: marca de posse → sua bicicleta, etiqueta com
seu nome.
• Entrada no quadro: entrar na subcriação.
• Paisagem de algum modo familiar; encontro com a
Árvore, reconhecimento: perfeito ainda que
“inacabado”: “A Árvore estava terminada mas não
acabada – 'Exatamente o contrário de como costumava
ser'”. Objeto da arte sempre em mutação.
• Parish: traz um conhecimento prático; acostumado a
lidar com plantas e jardins. Inversão de papéis: Parish
se torna o “artista” e Niggle o trabalhador prático.
Ambos trabalham juntos para a construção do lugar.
• A Beirada: região limite da criação. Niggle avança,
Parish permanece. Pastor de ovelhas: outro artista,guia.
Epílogo • Duas partes:
• Mundo primário: Conselheiro Tompkins, Atkins e
Perkins. Representação de valores da sociedade: coisas
práticas, financeiras, mecanizadas; visão sensível,
artística, educada; alheamento. Arte de Niggle é
perdida. Kin: família, parentes.
• Dimensão paralela: Primeira e Segunda Voz: descobrem
a função da arte de Niggle: férias, repouso, ótima para
convalescença; melhor apresentação às Montanhas
(introdução de novos conhecimentos, experiências).

4. Niggle e a sociedade
• Niggle
• pintor, artista, sempre ocupado com sua obra, trabalhos inacabados: “Era do tipo de
pintor que sabe pintar folhas melhor do que árvores” – Englishness.
• Coração mole: “Gostaria de ser mais decidido!”
• Limites de sua obra: tempo, molduras. Tinha que terminar o quadro antes da viagem.
O quadro precisaria parar de crescer.
• Autocrítica:

“Um dia, Niggle parou a certa distância de seu quadro e o contemplou com atenção
e imparcialidade incomuns. Não conseguia decidir o que achava dele, e desejou ter
algum amigo que lhe dissesse o que pensar. Na verdade ele lhe parecia totalmente
insatisfatório, apesar de muito atraente, o único quadro realmente bonito no mundo.
Naquele momento o que lhe agradaria seria ver ele próprio entrar, dar-se um
tapinha nas costas e dizer (com óbvia sinceridade): “Absolutamente magnífico!
Consigo ver exatamente aonde você pretende chegar. Continue assim e não se
preocupe com mais nada! Vamos conseguir uma pensão do governo para você não
precisar se preocupar.” (p. 93)

• Arte apresentada como trabalho duro, ininterrupto, que exigia concentração.

• Sr. Parish e a sociedade:


• Sr. Parish incorpora/representa a visão normal da sociedade.
• Pouca atenção à arte, mais ligado a coisas práticas;
• poucos sabiam do quadro, se soubessem não dariam importância:

“A Árvore, seja como for, era curiosa. Bastante singular à sua maneira. Assim como Niggle;
mas ele era também um homenzinho bem comum e um tanto tolo.”

• Preocupações maiores da sociedade: Quanto tempo ele poderia adiar a viagem?


Quem ficaria com a casa? O jardim seria mais bem cuidado?
• Inspetor de Casas, Condutor e Carregador: representantes do Estado. Sem quaisquer
traços de particularidade. Leis rígidas. Sem espaço para a
individualidade/subjetividade. Madeira e lona são vistos apenas como objetos de uso
imediato (reparação das casas); impossibilidade de expressão pela arte.
• Médico e empreiteiro: não atendem conforme o necessário; ineficiência. Empreiteiro:
“voltara para casa, para frente da lareira” → noção de conforto, diferenciação social.
• Arbitrariedade do Estado.

5. A Viagem: Enfermaria e Casa de Trabalho


• Chegada de Niggle sem bagagens, como um indigente. Qual valores ele deveria trazer? Os
valores posteriormente apresentados são suas ações.
• Sensação de sufocamento, escuridão: castigo, expiação?
• Niggle se habitua a uma vida mecanizada. A sensação de satisfação está longe de uma
sensação de felicidade. Desumanização. “Pão – não geleia”.
• As Vozes recebem maior grau de individualização do que os funcionários do Estado:
• Primeira Voz: “severa”
• Segunda Voz: “moderada apesar de não suave”, “com autoridade, e soava ao mesmo
tempo esperançosa e triste”
• É a Segunda Voz que propõe o tratamento suave.
• Essas personagens não possuem presença física, mas são ligeiramente distintas; já os
funcionários do Estado, possuem aparência semelhante, são peças de um mesmo sistema,
rígido, porém pouco eficiente.

6. Alguns espaços
• Vila, casa de Niggle e Sr. Parish
• Ambiente de tensão: Niggle x Sociedade;
• Essa tensão é mais evidente no “Epílogo” pelas declarações do Conselheiro
Tompkins;
• Opção por Niggle de viver afastado, interesses diferenciados;
• Contato com Parish: problemático, mas necessário. Niggle ajudava Parish e esse lhe
conseguia boas batatas a um preço barato.

• Galpão
• lugar de criação de Niggle; estúdio;
• construído onde ficava o canteiro de batatas; dependência de Parish;
• Niggle pintava a natureza sem estar em contato direto com ela; filtro de
subjetividade; criava árvores e flores, não copiava meramente.

• Casa de Trabalho
• Sem luz ou ventilação;
• Privação dos sentidos, embrutecimento, alienação.

• Estação Ferroviária
• lugar de passagem
• representa o desconhecido, o destino pode ser bom ou ruim;
• ponto de expectativa, nunca um ponto final.
• A Estação Ferroviária e a bicicleta são uma das poucas representações de objetos
modernos na obra tolkieniana. Ambos são mostrados sempre como um meio nunca
como um fim.
• Beirada
• Limite do conhecido e do imaginado;
• Ponto limite que os artistas devem ultrapassar.

7. Subcriação
• Entrada no quadro = entrada em um Mundo Secundário;
• Dentro desse mundo é possível visualizar mais detalhes, bem como ampliar seus limites
além das molduras. A visão de fora é sempre limitada, quando se entra na Arte, nota-se que
ela tem vida própria, modifica-se e evolui independente da vontade ou consciência do autor.
• Encontrar o infinito no finito = noção de sublime dos românticos.
• Trabalho em conjunto entre Sr. Parish e Niggle: nenhum dos dois pode agir de forma
independente. A arte de Niggle cura a perna do Sr. Parish.
• Forte contraponto com a opinião do Conselheiro Tompkins:

“ – Sem serventia nem prática nem econômica – explicou Tompkins. – Ouso dizer
que ele poderia ter sido transformado em alguma espécie de engrenagem
aproveitável se vocês, mestres de primeiras letras, conhecessem seu ofício. Mas
não conhecem, e assim terminamos com gente inútil como ele. Se eu governasse
este país, empregaria a ele e sua laia em algum serviço para o qual fossem
adequados, lavando pratos numa cozinha comunitária ou coisa parecida, e trataria
de garantir que trabalhassem direito. Ou os descartaria. Eu deveria tê-lo descartado
muito tempo atrás.
[…]
– É claro que a pintura tem utilidades – respondeu Tompkins. – Mas não havia
como usar a pintura dele. Há muitas oportunidades para rapazes arrojados que não
tem medo de novas ideias e novos métodos. Não para essas tolices antiquadas.
Devaneios privados. Ele não seria capaz de desenhar um cartaz expressivo nem
para salvar a própria vida. Sempre mexendo com folhas e flores. Uma vez
perguntei-lhe por quê. Ele disse que as achava bonitas! 'O quê, orgãos digestivos e
genitais de plantas?', eu disse a ele, mas não tive resposta. Desperdiçador tolo.”
(p.115 – 116)

• No trecho final a Primeira Voz e a Segunda Voz apresentam uma solução para a tensão em
torno da obra de Niggle: férias, repouso, ótima para convalescença; melhor apresentação às
Montanhas (introdução de novos conhecimentos, experiências).
• Recuperação, Escape e Consolo.

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