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Artigo original – Original article

Escala de sobrecarga dos familiares de pacientes psiquiátricos:


adaptação transcultural para o Brasil (FBIS-BR)
Family burden scale for caregivers of psychiatric patients: transcultural
adaptation to Brazil (FBIS-BR)

Marina Bandeira, Maria Gláucia Pires Calzavara e André Augusto Borges Varella

Resumo Abstract
Introdução: O processo de desinstitucionalização psiquiátrica resultou em Introduction: As a result of psychiatric deinstitutionalization patients’
maior envolvimento dos familiares nos cuidados cotidianos dos pacientes families have been more involved in the daily care of their members who
que sofrem de doenças mentais. Pesquisas internacionais constataram suffer from psychiatric disorders. International researches demonstrated that
que os cuidados prestados e as responsabilidades envolvidas em cuidar the tasks and responsibilities taken by the families in this process resulted
dos pacientes implicam em sobrecarga para os familiares. No Brasil in family burden. In Brazil, there are a small number of researches in this
existem poucas pesquisas sobre sobrecarga familiar e um dos motivos area, probably because of the lack of validated scales for the evaluation of
pode ser a carência de instrumentos de medida para avaliar a sobrecarga. family burden. Objective: This study performed the transcultural adaptation
Objetivo: Este estudo visou fazer a adaptação transcultural para o Brasil for Brazil of the scale Family Burden Interview Schedule (FBIS) created by
da escala Family Burden Interview Schedule (FBIS), elaborada por Tessler Tessler and Gamache. Methods: In order to fulfill this need, the adaptation
e Gamache. Métodos: A adaptação transcultural foi realizada segundo os of this scale was performed following international recommendations in this
procedimentos recomendados pela literatura internacional: tradução por area, such as: translation, back translation, comparison of both versions
um tradutor bilíngüe de língua inglesa; retradução, do português para o for correction, evaluation of the scale by an expert committee and a pilot
inglês, por um tradutor bilíngüe de língua portuguesa; correção dos erros de study with family members of psychiatric patients. Results: The results
tradução, comparando-se as duas versões em inglês; avaliação da escala included important modifications in the formulation and content of the
por uma comissão de especialistas; e um estudo-piloto para testar a versão questions to guarantee the semantic and cultural equivalence of the scale
preliminar do instrumento no qual foram entrevistados 20 familiares de adapted for the Brazilian context. Conclusions: The changes introduced
pacientes psiquiátricos. Resultados: Os resultados incluíram modificações in the instrument turned it more clear and understandable by respondents
importantes na formulação e no conteúdo das questões para garantir a independently of their socio-economic level and years of schooling and
equivalência semântica e cultural da escala adaptada para o contexto also included additional situations reflecting their cultural background.
brasileiro. Conclusões: As modificações introduzidas permitiram a redação The Brazilian version of FBIS (FBIS-BR) was considered a scale of easy
da escala em uma linguagem clara, acessível a qualquer respondente, application and understanding for the target population.
independente de seu nível socioeconômico e de escolaridade, além de Key words: family burden, FBIS scale, transcultural validation,
incluir situações que refletiam as variáveis culturais. A versão brasileira da deinstitutionalization.
FBIS (FBIS-BR) se mostrou uma escala de fácil aplicação e compreensão
pela população-alvo.
Palavras-chave: sobrecarga familiar, escala FBIS, validação transcultural,
desinstitucionalização.

Universidade Federal de São João Del-Rei (UFSJ) (Bandeira M, Calzavara MGP, Varella AAB)
Este artigo faz parte de um projeto de pesquisa financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa
Recebido
21-06-05 do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Aprovado Tecnológico (CNPq).
10-09-05
Correspondência para: Marina Bandeira
Departamento de Psicologia – Laboratório de Pesquisa em Saúde Mental (LAPSAM/UFSJ)
Praça Dom Helvécio, 74 – 36301-160 – São João Del-Rei-MG
e-mail: bandeira@ufsj.edu.br – site: www.lapsam.ufsj.edu.br
Escala FBIS-BR de sobrecarga familiar

Introdução paciente e os seus familiares, como a diminuição da reciprocidade


entre eles, que prejudica a relação e torna difícil a manutenção de
Um maior envolvimento dos familiares de pacientes sentimentos positivos no dia-a-dia, podendo resultar em conflitos
psiquiátricos como principais provedores de cuidados cotidianos interpessoais, deterioração da relação e divórcio, que constituem
aos pacientes tem ocorrido em conseqüência do processo de estímulos estressores para os familiares (Tessler e Gamache,
desinstitucionalização psiquiátrica, devido à ênfase dada à rein- 2000).
serção social dos pacientes e ao seu atendimento em serviços A sobrecarga tem sido definida em dois aspectos: objetivo
comunitários de saúde mental. Esse maior envolvimento dos e subjetivo. A sobrecarga objetiva se refere às conseqüências
familiares decorre ainda da situação dos serviços comunitários negativas concretas e observáveis resultantes da existência da
de saúde mental, que têm sido freqüentemente considerados, em doença mental na família, como perturbações na rotina, na vida
vários países, insuficientes, fragmentados e com dificuldades em social e profissional dos familiares, perdas financeiras, tarefas
fornecer atendimento eficiente para as múltiplas necessidades dos cotidianas de cuidados com o paciente (higiene, transporte, medi-
pacientes. Em conseqüência, os familiares muitas vezes acabam cação, alimentação, atividades ocupacionais, etc.), supervisão dos
desempenhando o papel de case managers, atuando na busca de comportamentos problemáticos dos pacientes (comportamentos
serviços e atendimento das necessidades básicas dos pacientes embaraçosos, agressões físicas e verbais, condutas sexuais inade-
(Solomon et al., 1988; Hanson e Rapp, 1992; Lauber et al., 2003). quadas, etc.) e o suporte dado ao paciente (Maurin e Boyd, 1990;
Nos países como o Brasil, onde ainda não se desenvolveram Tessler e Gamache, 2000; Martens e Addington, 2001; Hoenig e
programas de acompanhamento intensivo dos pacientes na comu- Hamilton, 1966; Lauber et al., 2003).
nidade – que incluem assistência contínua com visitas freqüentes O aspecto subjetivo da sobrecarga se refere à percepção
a domicílio, feitas por equipes volantes – o papel dos familiares ou à avaliação pessoal do familiar sobre a situação, sua reação
é ainda mais importante. Um exemplo é o Program for Assertive emocional e o sentimento de estar sofrendo uma sobrecarga,
Community Treatment (PACT) (Bandeira et al., 1998). atribuída por ele à presença da doença mental na família. Re-
Pesquisas internacionais têm investigado sistematicamente fere-se ao grau em que os familiares percebem a presença, os
a experiência desses familiares, desde meados dos anos 1950 comportamentos e a dependência dos pacientes como uma fonte
e início dos anos 1960 e, de forma mais intensiva, a partir das de pensamentos e sentimentos negativos, preocupações e/ou
décadas de 1970 e 1980. O conjunto desses estudos tem demons- tensão psicológica (Maurin e Boyd, 1990; St. Onge e Lavoie,
trado, consistentemente, que os cuidados intensivos prestados aos 1997). Envolve ainda sentimentos de desamparo, tristeza, culpa,
pacientes no dia-a-dia e as dificuldades encontradas no desempe- assim como um sentimento de perda, semelhante ao luto. Além
nho do papel de cuidador resultam em considerável sobrecarga disso, a natureza e o estigma da doença mental podem provocar
para os familiares (Loukissa, 1995; Rose, 1996; Magliano et al., sentimentos de vergonha diante das pessoas (Tessler e Gamache,
1998; Maurin e Boyd, 1990; Tessler e Gamache, 2000; Martens 2000).
e Addington, 2001; Lauber et al., 2003; Jungbauer et al., 2003). Avaliações sistemáticas da sobrecarga familiar, através de
Essa sobrecarga pode, inclusive, provocar desconforto emocional instrumentos de medida validados, têm sido numerosas em nível
(distress) e transtornos psicológicos como a depressão (Song et internacional. No Brasil há poucas publicações em periódicos cien-
al., 1997; Maurin e Boyd, 1990; Loukissa, 1995; Rose, 1996). tíficos sobre a avaliação sistemática da sobrecarga dos familiares
Constatou-se ainda que os familiares sentem necessidade de re- de pacientes psiquiátricos, embora haja um interesse crescente a
ceber mais informações sobre a doença do paciente, o tratamento respeito da experiência desses familiares (Villares e Mari, 1998),
medicamentoso prescrito, o plano de intervenções desenvolvido suas concepções e representações sobre a doença mental (Villares
e o plano de alta previsto e necessitam de uma orientação mais et al., 1999), sua vivência avaliada através de entrevistas abertas
eficaz a respeito de como lidar com o paciente no dia-a-dia e em (Koga e Furegato, 2002) e sobre os programas de atendimento aos
momentos de crise (Bernheim e Switalski, 1988; Maurin e Boyd, familiares (Villares, 2000). No entanto, a avaliação sistemática da
1990; St. Onge et al., 1995; Tessler e Gamache, 1994). Uma revisão sobrecarga familiar por meio de instrumentos de medida validados
detalhada das pesquisas nesse campo se encontra em Bandeira está apenas se iniciando no Brasil. Destaca-se o trabalho de Scazu-
e Barroso (2005). fca et al. (2002), que avaliaram 82 familiares brasileiros, cuidadores
O conceito de sobrecarga, definido na literatura da área, de pacientes idosos com depressão. Garrido e Menezes (2004)
se refere a conseqüências negativas resultantes da existência da também avaliaram a sobrecarga subjetiva de 49 familiares cuida-
doença mental na família. O impacto dessa situação atinge um dores de pacientes idosos, porém com diagnóstico de demência.
amplo espectro de dimensões da vida familiar e foi considerado O grau de sobrecarga dos familiares nesses estudos foi elevado,
sobrecarga porque requer que os familiares do paciente passem semelhante aos de pesquisas internacionais, tendo sido maior
a colocar as suas próprias necessidades e desejos em segundo quando a saúde física dos familiares estava mais comprometida e
plano (Maurin e Boyd, 1990) e adotem um papel suplementar aos já quando o paciente apresentava maior severidade da doença, mais
desempenhados por eles (Martens e Addington, 2001). Além disso, distúrbios de comportamento e maior dependência.
a situação de cuidar do paciente ocorre em um momento que não Um dos motivos da escassez de pesquisas sistemáticas
está em sincronia com o ciclo da vida familiar, pois normalmente nessa área pode ser a carência de instrumentos de medida valida-
se espera que na idade adulta o indivíduo seja independente e não dos e adaptados para o contexto brasileiro. Estudos que procuram
necessite mais de cuidados intensivos. Há, portanto, uma quebra avaliar a experiência dos familiares sem utilizar instrumentos de
nas expectativas e nos planos anteriormente estabelecidos pelos medida validados encontram dificuldades metodológicas de confia-
familiares. Ocorrem ainda mudanças no relacionamento entre o bilidade dos resultados e de comparabilidade com outros estudos.

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Bandeira M et al.

Alguns autores têm questionado a generalidade e a validade dos e cultural com a versão original. Esta constitui a primeira parte de
resultados de avaliações em saúde mental que são realizadas sem uma pesquisa mais ampla, em andamento, envolvendo o estudo
instrumentos de medida validados (Perreault et al., 1993; Perreault das propriedades psicométricas desse instrumento de medida e
et al., 1999; Ruggeri, 1994). visando garantir a sua validade para o contexto brasileiro.
Foram encontrados dois instrumentos de medida da sobre-
carga familiar validados para o Brasil. Um deles é a Escala Pai e Métodos
Kapur (EPK), desenvolvida por Pai e Kapur (1981) e validada para o
Brasil por Montagna et al. (1985) e Abreu et al. (1991). Essa escala Participantes
é composta por 24 itens envolvendo seis dimensões da sobrecarga Fizeram parte desta pesquisa uma comissão de especialis-
dos familiares, segundo a descrição de Pai e Kapur (1981) e de tas e 20 familiares de pacientes psiquiátricos, que freqüentavam um
Montagna et al. (1985). Na descrição posterior de Abreu (1991), centro de atenção psicossocial (CAPS) de uma cidade do interior
entretanto, a escala se apresenta modificada, contendo apenas 19 de Minas Gerais. A comissão de especialistas era composta de
itens distribuídos em sete dimensões, o que resulta em um número cinco profissionais, sendo dois psiquiatras e um psicólogo que
muito reduzido de itens (1 e 2) em duas dimensões. Não foram atuavam em serviços de saúde mental, assim como dois outros
encontrados outros estudos de avaliação da sobrecarga familiar psicólogos acadêmicos.
utilizando essa escala como instrumento de medida. Durante o estudo-piloto, 20 familiares cuidadores de 20
O segundo instrumento é a escala Zarit Burden Interview pacientes psiquiátricos participaram da pesquisa, submetendo-se à
(ZBI), desenvolvida originalmente por Zarit (1987) para familiares aplicação da escala. Os familiares foram contatados no serviço de
de pacientes idosos com demência. Essa escala contém 22 itens saúde mental, onde foram convidados a participar do estudo, após
envolvendo cinco dimensões da sobrecarga, medidas através de explicação dos seus objetivos e garantia do sigilo de suas respostas,
escores da freqüência com que o familiar apresenta os sentimentos tendo dado seu consentimento para participação na pesquisa.
expressos nos itens. Scazufca (2002) avaliou a consistência interna
e a validade de construto dessa escala para familiares de pacientes Descrição do instrumento de medida original
idosos com depressão. Taub et al. (2004) avaliaram sua consis- A escala original de língua inglesa – FBIS/SF – elaborada
tência interna com uma amostra de familiares de pacientes idosos por Tessler e Gamache (1994) é uma escala multifatorial que avalia
com diagnóstico de demência. Embora a escala seja útil e prática a sobrecarga familiar, a partir de cinco subescalas, correspondentes
para avaliar a sobrecarga subjetiva dos familiares, uma vez que a cinco dimensões da vida do familiar: 1) assistência ao paciente na
focaliza os seus sentimentos, ela não fornece escores de avaliação vida cotidiana; 2) supervisão aos comportamentos problemáticos; 3)
da sobrecarga objetiva. A escala possibilita o cálculo de um escore gastos financeiros; 4) impacto na rotina diária; e 5) preocupações
global de sobrecarga, mas não de escores independentes para os com o paciente.
seus dois aspectos, objetivo e subjetivo. Não foram encontrados A primeira subescala possui 16 questões que avaliam as
estudos de sua validação para familiares de pacientes com outros sobrecargas objetiva e subjetiva do familiar, referentes à assistên-
tipos de diagnóstico nem com outras faixas etárias. cia que ele fornece ao paciente nas tarefas cotidianas. A segunda
Há necessidade, portanto, de estudos de validação de subescala inclui 14 questões que avaliam as sobrecargas objetiva e
novas escalas de avaliação da sobrecarga familiar adaptadas para subjetiva do familiar, referentes à supervisão dos comportamentos
o Brasil. A escala escolhida para este estudo foi a Family Burden problemáticos apresentados pelo paciente. A terceira subescala
Interview Schedule – Short Form (FBIS/SF), elaborada por Tessler possui três itens que avaliam os gastos financeiros do familiar com
e Gamache (1994) e também adaptada e validada para a Espanha o paciente, sendo que um deles avalia as despesas referentes
por Martinez et al. (2002). Essa escala avalia simultaneamente a 11 tópicos específicos. A quarta subescala possui cinco itens
tanto a sobrecarga subjetiva quanto a objetiva, fornecendo escores que avaliam o impacto da doença do paciente na vida do familiar,
de medida distintos para esses dois aspectos da sobrecarga. A sendo que quatro itens se referem às perturbações ocorridas
FBIS é uma escala multifatorial, portanto dividida em fatores ou nos últimos trinta dias e um item avalia a presença de mudanças
subescalas, relativas às diversas dimensões da vida do familiar, permanentes ocorridas em cinco aspectos da vida do familiar. A
que possibilitam o cálculo de escores de medida independentes, quinta subescala possui sete itens que avaliam com que freqüên-
para cada dimensão da sobrecarga. Essa característica permite, cia o familiar se preocupa com os diversos aspectos da vida e do
portanto, avaliar quais dimensões apresentam maior ou menor futuro do paciente.
grau de sobrecarga para os familiares e quais variáveis afetam As alternativas de resposta para as questões que avaliam
diferencialmente uma ou outra dimensão. Além disso, a escala a sobrecarga objetiva, em termos da freqüência de ocorrência, são
foi desenvolvida originalmente para pacientes psiquiátricos com distribuídas em uma escala tipo Likert de 5 pontos, sendo 1 = ne-
diagnósticos variados. Como foi elaborada sob forma de entrevista, nhuma vez; 2 = menos que uma vez por semana; 3 = uma ou duas
com questões lidas pelo entrevistador, a escala FBIS se aplica a vezes por semana; 4 = de três a seis vezes por semana; 5 = todos
uma ampla população-alvo de familiares de pacientes psiquiátricos, os dias. As alternativas de resposta para as questões de sobrecarga
independentemente do seu nível de escolaridade ou da presença subjetiva, que avaliam o grau de incômodo sentido pelo familiar, são
de limitações sensoriais. Portanto a escala FBIS consiste em um dispostas em uma escala tipo Likert de 4 pontos, sendo 1 = nem um
instrumento pertinente, cuja validação para o Brasil pode contribuir pouco; 2 = muito pouco; 3 = um pouco; e 4 = muito. Não há escalas
para o estudo da sobrecarga familiar. de resposta para a subescala de gastos financeiros, uma vez que os
O objetivo desta pesquisa foi fazer a adaptação transcul- seus itens consistem de questões abertas. As questões da escala
tural da escala FBIS, visando garantir sua equivalência semântica FBIS se referem aos trinta dias anteriores à data da entrevista.

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Escala FBIS-BR de sobrecarga familiar

A escala original possui qualidades psicométricas ade- Retradução


quadas de validade de construto, estabelecida através da análise A versão em português, produzida pelo procedimento
fatorial, assim como consistência interna, indicada pelos seguintes inicial de tradução, foi então retraduzida para o inglês por um
valores do coeficiente alfa de Cronbach: na dimensão assistência outro tradutor bilíngüe, cuja língua materna era o inglês. A versão
ao paciente na vida cotidiana, os valores de alfa foram de 0,77 em inglês, produzida pelo processo de retradução, foi comparada
para a escala objetiva e 0,72 para a escala subjetiva; na dimensão à escala original pelos dois tradutores, a fim de se identificarem
supervisão aos comportamentos problemáticos, os valores de inconsistências a serem corrigidas, visando obter uma tradução
alfa foram de 0,65 para a escala objetiva e de 0,63 para a escala mais precisa da escala.
subjetiva; na dimensão impacto na rotina diária da família, o valor
de alfa foi de 0,56; e na dimensão preocupações com o paciente, o Análise da escala por uma comissão de
valor foi de 0,89. No caso da dimensão gastos financeiros, a análise especialistas
da consistência interna não se aplica, pois essa dimensão consiste A escala traduzida e a original foram, então, comparadas
de questões abertas (Tessler e Gamache, 1995). por uma comissão de especialistas. A partir dessa comparação,
vários termos da tradução foram revistos visando uma melhor
Procedimento adequação ao contexto brasileiro. Além disso, a comissão de
O procedimento adotado para realizar a adaptação trans- especialistas discutiu cada item da escala, as instruções gerais e
cultural da escala FBIS seguiu as recomendações da literatura as alternativas de resposta. Nessa discussão, a comissão apontou
internacional (Vallerand, 1989; Guillemin et al., 1993; Bunchaft e as reformulações a serem feitas na redação das questões e das
Cavas, 2002; Jorge, 2000), representadas na Figura. A adaptação instruções, visando manter uma linguagem simples para melhorar
transcultural de um instrumento de medida, seguindo a metodologia a compreensão dos itens e aumentar a sua clareza. Esse procedi-
recomendada internacionalmente, possibilita a inclusão de variáveis mento foi importante para adaptar a escala ao contexto brasileiro,
específicas da cultura do país para qual o instrumento está sendo à luz do conhecimento e da experiência profissional dos integrantes
adaptado e permite ajustar a formulação das questões em uma da comissão, uma vez que eles possuíam um contato cotidiano com
linguagem simples, clara e de fácil acesso à população. a realidade dos familiares de pacientes psiquiátricos. Os membros
Antes de iniciar o procedimento de adaptação transcul- da comissão procuraram adaptar o conteúdo e a forma dos itens ao
tural foi feito contato com um dos autores da escala (R. Tessler), contexto brasileiro. Após essa fase, obteve-se então uma versão
obtendo-se a sua autorização para que a escala fosse traduzida preliminar da escala brasileira.
e adaptada para o Brasil. Essa pesquisa respeitou os princípios
éticos da investigação com seres humanos, envolvendo o consenti- Estudo-piloto
mento informado, tendo sido previamente aprovada pela comissão O estudo-piloto teve por objetivo testar a versão preliminar
avaliativa da instituição, que avalia o respeito à ética da pesquisa, do instrumento de medida junto à população-alvo, possibilitando
sua relevância e pertinência. identificar as dificuldades de compreensão derivadas da forma de
aplicação do instrumento, das instruções, da forma e do conteúdo
Tradução das questões e das alternativas de resposta.
A primeira etapa do procedimento de adaptação trans- Foram entrevistados 20 familiares de pacientes psiquiá-
cultural consistiu na tradução da escala FBIS. Ela foi traduzida tricos, sendo que as entrevistas foram realizadas pelos próprios
do inglês para o português por um tradutor bilíngüe, cuja língua pesquisadores, que são psicólogos treinados em técnicas de
materna era o português. entrevista. Para a aplicação da escala, o entrevistador utilizava

Figura 1. Passos metodológicos para a adaptação transcultural da escala FBIS-BR

FBIS Tradução Retradução Discussão das versões


Escala original  Tradutor  Tradutor  Tradutores e
QLS (língua materna português) (língua materna inglês) comissão de especialistas

Versão preliminar
FBIS

Estabelecimento das propriedades Versão brasileira


psicométricas da escala FBIS-BR
  Discussão e adaptação  Estudo-piloto
FBIS-BR 20 familiares

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Bandeira M et al.

um cartão contendo as alternativas de resposta, redigidas em administrar o dinheiro foi substituída por cuidar do dinheiro. A
grandes números e palavras, para facilitar a compreensão. expressão tais como foi substituída por por exemplo. A expressão
Após a apresentação das instruções iniciais sobre a escala, o afazeres domésticos foi substituída por tarefas de casa. Outras
entrevistador lia cada pergunta em voz alta; em seguida lia as substituições do mesmo tipo foram realizadas, sempre visando
alternativas de resposta e pedia ao entrevistando para dar sua aumentar a compreensão das questões, usando palavras sim-
resposta, baseando-se nas alternativas indicadas no cartão. ples, de fácil entendimento para qualquer pessoa.
As aplicações da escala foram realizadas no serviço de saúde
mental após serem autorizadas pelos diretores responsáveis pela Inclusão de termos ou situações
instituição e após consentimento escrito dos familiares. Cada As entrevistas realizadas com os familiares no estudo-
entrevista teve duração aproximada de 90 minutos, tendo em piloto forneceram informações necessárias para se fazer a in-
vista o objetivo do estudo-piloto de verificar e esclarecer, junto ao clusão de termos, frases ou situações culturalmente pertinentes,
entrevistando, os termos que não estavam claros. Os familiares que não estavam presentes na escala original. Por exemplo, no
que não puderam comparecer ao CAPS foram entrevistados em item a respeito da freqüência com que o familiar lembrava ou
sua própria residência. encorajava o paciente a tomar o medicamento, foi incluída a
No decorrer do estudo-piloto, para cada entrevista com situação de dar o remédio pessoalmente ou às escondidas. No
um participante da população-alvo eram identificadas quais item sobre a freqüência com que o familiar conduzia o paciente a
perguntas ou palavras causavam dificuldade de compreensão algum lugar, por algum meio de transporte, foi incluída a situação
e procuravam-se palavras ou termos mais adequados, claros de acompanhá-lo a pé. Na questão sobre suicídio, foi incluída a
e simples para substituí-las. Buscava-se ainda identificar, nos situação do paciente falar em morrer, citada pelos familiares.
exemplos apresentados pelos entrevistandos, as situações Na subescala que se refere às alterações ocorridas na
culturalmente pertinentes para serem incluídas nas questões da vida do familiar desde que o paciente adoeceu, além da situa-
escala, visando sua adaptação ao contexto brasileiro. O resul- ção freqüente de ter que trabalhar menos ou abandonar o seu
tado de cada entrevista era discutido pela equipe de pesquisa, emprego para cuidar do paciente foi incluída a situação de ter
as modificações necessárias eram feitas e o instrumento era que trabalhar mais para cobrir os gastos com o paciente. Na su-
novamente aplicado a um outro respondente e, assim, sucessiva- bescala que avalia como o familiar lida com os comportamentos
mente, até que não se detectassem mais problemas de compre- problemáticos do paciente, incluiu-se a situação de ter que lidar
ensão durante as entrevistas. Com as modificações realizadas também com as conseqüências desses comportamentos. Por
no estudo-piloto foi elaborada a versão final da escala. exemplo, foram citadas situações em que o familiar precisava
lidar com os vizinhos, em conseqüência de dificuldades ante-
Resultados riores criadas por comportamentos problemáticos do paciente.
Na questão que avalia as mudanças que ocorrem na rotina
O estudo feito pela comissão de especialistas sobre do familiar em função da doença do paciente, foi incluída a
os itens da escala, assim como as entrevistas realizadas com situação de ter que cancelar algum compromisso para cuidar
os familiares no estudo-piloto, permitiram levantar questões do paciente.
importantes que resultaram em algumas modificações na
formulação das questões, das alternativas de resposta e das Utilização de exemplos
instruções, visando uma linguagem clara e simples que pudesse Uma modificação importante que facilitou muito a com-
ser utilizada com a população-alvo, independentemente do nível preensão das questões pelos familiares durante as entrevistas
socioeconômico ou de escolaridade. foi a introdução de exemplos na escala, envolvendo situações
As modificações efetuadas na escala podem ser resumi- culturalmente pertinentes. Esses exemplos foram colocados
das em quatro categorias: substituição de termos; inclusão de entre parênteses, no final de algumas questões, visando dar
palavras ou situações na formulação das questões; utilização clareza ao significado de alguns termos, como tarefas de casa,
de exemplos como parte das questões e inclusão de itens na vida social, atividades de lazer, preocupações com a segurança
escala. Serão descritas, a seguir, algumas dessas modificações, física do paciente, etc.
uma vez que a apresentação exaustiva de todas excede os Essa modificação tinha sido realizada também na tradu-
limites deste artigo. ção e adaptação da escala FBIS para a Espanha (Martinez et
al., 2000). A idéia de utilizar exemplos foi inspirada na versão
Substituição de termos espanhola, mas os exemplos incluídos foram retirados da ex-
Para tornar a linguagem mais simples, próxima da sua periência dos familiares entrevistados durante o estudo-piloto. A
utilização pelos familiares no dia-a-dia, alguns termos foram inclusão dos exemplos serviu para que os familiares pudessem
modificados, de forma a eliminar ambigüidades e aumentar a ter uma melhor compreensão das situações concretas a que se
clareza. Por exemplo, nas perguntas a respeito da freqüência referiam as perguntas. Os exemplos se mostraram, portanto,
de ocorrência de tarefas realizadas pelos familiares para cuidar um recurso eficaz para aumentar a compreensão das questões
do paciente, a expressão com que freqüência foi substituída e incluir variáveis culturais.
por quantas vezes, em todas as questões. No item a respeito
das preocupações do familiar com as perspectivas futuras do Inclusão de itens
paciente, substituiu-se essa expressão por futuro do paciente. Na subescala referente à assistência na vida cotidiana
Na subescala referente a despesas financeiras, a expressão foi feita uma modificação que havia sido realizada também na

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Escala FBIS-BR de sobrecarga familiar

versão espanhola, separando-se em dois itens distintos o con- Tabela 1. Subescalas e questões da escala FBIS-BR
teúdo de um único item da escala original. Esse item se referia
à assistência que o familiar fornecia ao paciente para que ele Subescala 1: Assistência ao paciente na vida cotidiana
ocupasse seu tempo realizando atividades e também para que Higiene e cuidados pessoais
ele freqüentasse as consultas médicas ou atividades do serviço
Administração dos medicamentos
de saúde mental. Como essas duas situações algumas vezes
apresentavam respostas diferentes por parte dos familiares, foi Cuidado e limpeza do quarto e roupas
necessário separar esse conteúdo em dois itens distintos. Compras diversas
Em uma das questões da subescala de gastos financei- Preparo da alimentação
ros foram incluídos novos itens na lista das despesas mensais
feitas com o paciente, como gastos com planos de saúde e Transporte
despesas com profissionais para cuidar do paciente. Além disso, Administração do dinheiro
a organização dessa subescala foi modificada de forma a permitir Atividades e ocupação do tempo
o cálculo das despesas reais feitas com o paciente, subtraindo-
se dos gastos mensais do paciente a contribuição que ele fazia. Freqüência às consultas médicas e atividades de tratamento
Para isso foi incluído um item referente à quantia com a qual o Subescala 2: Supervisão dos comportamentos problemáticos
paciente contribuía nas despesas mensais. Comportamentos problemáticos
Na subescala referente às mudanças provocadas pela
doença do paciente na rotina do familiar, foi feita uma modifica- Demanda excessiva de atenção
ção na medida da sobrecarga subjetiva de um dos itens. Esse Perturbações durante a noite
item avalia o grau em que o familiar sente que a doença do Agressividades verbal e física
paciente provocou mudanças permanentes em sua vida. Para
esse item foram incluídas alternativas de resposta dispostas Tentativa ou ameaça de suicídio
em uma escala tipo Likert de 4 pontos, sendo 1 = nem um Bebidas alcoólicas
pouco; e 4 = muito. Essa modificação teve o efeito de tornar o Excesso de alimentos, cigarros e líquidos
item semelhante às medidas presentes no restante da escala.
Abuso de drogas
Além disso, na questão que descreve as facetas em que essas
modificações ocorreram foi acrescentado um item referente à Subescala 3: Gastos financeiros
situação em que o familiar teve que deixar de receber visitas Despesas mensais do paciente com transporte, roupas e cal-
em casa por causa do paciente. çados, trocados para pequenos gastos, alimentação, moradia,
medicamentos, tratamento da saúde mental, tratamento da
saúde física, cigarros, objetos pessoais, telefone, pagamento
Descrição da versão brasileira da Escala de de profissionais, plano de saúde, outras despesas
Sobrecarga Familiar (FBIS-BR) Contribuição do paciente
Após o procedimento de adaptação transcultural, obteve-
se uma versão brasileira da escala FBIS (FBIS-BR), que manteve Gastos da família com o paciente: dois itens
as mesmas cinco subescalas da versão original: 1. assistência Avaliação do peso financeiro para a família
na vida cotidiana; 2. supervisão aos comportamentos proble-
Subescala 4: Impacto na rotina
máticos; 3. gastos financeiros; 4. impacto nas rotinas diárias;
5. preocupação com o paciente (Tabela 1). Faltas, atrasos ou cancelamento de compromissos
Tendo em vista a inclusão de itens, a composição das Alteração nas atividades sociais e de lazer
subescalas se modificou ligeiramente. A primeira subescala Perturbação nos serviços ou rotina da casa
possui agora 18 questões que avaliam as sobrecargas objetiva
e subjetiva do familiar na assistência que ele fornece ao paciente Alteração nos cuidados e atenção aos outros membros da
nas tarefas cotidianas. Inclui a avaliação da freqüência com que família
o familiar ajuda o paciente nessas tarefas e o grau de incômodo Mudanças permanentes na rotina, no trabalho e na vida social
sentido por ele nessas atividades. A segunda subescala possui Facetas modificadas na vida do familiar: seis aspectos
16 questões que avaliam as sobrecargas objetiva e subjetiva
do familiar ao supervisionar os comportamentos problemáticos Subescala 5: Preocupações com o paciente
do paciente, incluindo para isso a freqüência com que o familiar Segurança física do paciente
supervisiona esses comportamentos e o seu grau de incômodo Adequação do tratamento médico fornecido ao paciente
ao fazê-lo. A terceira subescala avalia os gastos financeiros
e inclui cinco itens: um deles se refere ao valor estimado dos Vida social do paciente
gastos mensais do paciente em relação a 14 tópicos específicos; Saúde física do paciente
um item avalia a contribuição do paciente; dois itens se referem Condições de moradia para o paciente
aos gastos do familiar; e um item avalia o grau em que o familiar
Sobrevivência financeira do paciente na ausência do cuidador
considera que as despesas com o paciente foram pesadas no
orçamento familiar. A quarta subescala possui seis itens que Futuro do paciente

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Bandeira M et al.

avaliam o impacto da doença do paciente na vida do familiar A utilização de escalas de medida da sobrecarga fami-
em termos das limitações e interrupções em sua rotina: quatro liar pode ser útil também em pesquisas avaliativas da eficácia
desses itens avaliam a freqüência das limitações que ocorreram de intervenções ou programas terapêuticos. A avaliação da
na vida cotidiana do familiar nos últimos 30 dias; um item avalia sobrecarga familiar pode servir como indicador dessa eficácia,
o grau em que mudanças permanentes ocorreram na vida do levando em consideração que a melhora do paciente pode
familiar; e um último item avalia quais mudanças permanentes se refletir em uma diminuição da sobrecarga dos familiares
ocorreram em seis aspectos da vida do familiar. A quinta subescala (Scheene et al., 1994).
possui sete itens que avaliam com que freqüência o familiar se O desenvolvimento de pesquisas sobre a sobrecarga
sente preocupado com os diversos aspectos da vida e do futuro do será útil ainda para uma reavaliação do serviços de saúde
paciente. As alternativas de resposta são distribuídas em escalas mental, visando o desenvolvimento de programas de apoio e
tipo Likert semelhantes às da versão original. As entrevistas de apli- atendimento nesses serviços, que forneçam aos familiares infor-
cação da escala têm uma duração aproximada de 60 minutos. mações sobre a doença dos pacientes e seu tratamento e uma
melhor preparação dos familiares para os cuidados cotidianos
Discussão aos pacientes. A sobrecarga dos familiares pode prejudicar o
seu bem-estar psicológico, provocando desconforto emocional
A escala FBIS foi submetida aos procedimentos de (distress). A associação entre sobrecarga e distress nos fami-
adaptação transcultural recomendados pela literatura da área liares já foi constatada em pesquisas internacionais (Maurin e
(Vallerand, 1989; Guillemin et al., 1993; Bunchaft e Cavas, Boyd, 1990; Loukissa, 1995; Rose, 1996 e 2004) e nacionais
2002; Jorge, 2000). Com a escala adaptada para o contexto (Scazufca et al., 2002), podendo resultar indiretamente em
cultural brasileiro será possível então realizar o estudo de sua efeitos negativos no próprio tratamento dos pacientes. Serviços
validação, visando estabelecer as suas propriedades psicomé- de apoio e informação aos familiares de pacientes psiquiátricos
tricas de validade e fidedignidade, estudo que já se encontra poderiam atenuar esses efeitos, contribuindo para o tratamento
em andamento pelos autores deste artigo. dos pacientes. O desenvolvimento de serviços dirigidos aos
A validação dessa escala possibilitará a realização de familiares faz parte do projeto de desinstitucionalização (So-
pesquisas brasileiras que avaliem, de forma sistemática, os lomon et al., 1988; Hanson e Rapp, 1992; Morgado e Lima,
fatores associados à sobrecarga familiar, objetiva e subjetiva, e
1994) e deve ser implementado tanto quanto os serviços de
sua comparação com resultados internacionais e nacionais. Per-
atendimento aos pacientes, visando o bom andamento dessa
mitirá ainda avaliar a sobrecarga dos familiares separadamente,
política de saúde mental.
em cada uma das suas dimensões, possibilitando localizar quais
são as dimensões mais afetadas da vida do familiar e quais
fatores estão mais associados diferencialmente a uma ou outra Conclusão
dimensão da sobrecarga, tendo em vista que a escala fornece
O presente estudo permitiu realizar a adaptação
escores separados para cada dimensão. Dados referentes às
sobrecargas objetiva e subjetiva e suas diferentes dimensões transcultural para o Brasil da escala FBIS. Foram feitas várias
podem diferir, e o conhecimento dos fatores relacionados a modificações nas instruções da escala e na formulação de seus
essa diferenciação pode ser importante para a elaboração de itens. Essas modificações possibilitaram adequá-la ao contexto
programas de intervenção e apoio aos familiares (Tessler e cultural brasileiro, incluindo nos seus itens as características
Gamache, 1994). específicas desse contexto, garantindo assim à versão brasileira
Além disso, a utilização dessa escala será útil para da escala a equivalência semântica, experiencial e cultural com
continuar as investigações sistemáticas, no contexto brasileiro, a versão original.
sobre a sobrecarga dos familiares dos pacientes psiquiátricos As modificações feitas permitiram a redação da escala
que possuem outros diagnósticos, além de demência e de- em uma linguagem clara, acessível a qualquer respondente,
pressão em pacientes idosos, aumentando assim o corpo de independente de seu nível socioeconômico e de escolaridade,
conhecimento sobre essa temática. A influência do diagnóstico além de incluir situações que refletem as variáveis cultu-
do paciente no grau de sobrecarga dos familiares poderá ser rais. A FBIS-BR se mostrou uma escala de fácil aplicação e
investigada, assim como a identificação das dimensões ou compreensão pela população-alvo.
aspectos que seriam mais afetados em função dessa variável.
Pesquisas internacionais apontam resultados contraditórios Agradecimentos
em relação ao efeito do diagnóstico e os autores enfatizam a
necessidade de se pesquisar a sobrecarga de familiares de Agradecemos a participação dos membros da comissão
pacientes com diagnósticos variados (Maurin e Boyd, 1990; de especialistas, os psiquiatras Henrique Alvarenga da Silva e
Loukissa, 1995; Rose, 1996). Reinaldo Moreno e o psicólogo Ramon A. Resende.

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Escala FBIS-BR de sobrecarga familiar

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