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Departamento de História
Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo
DISSERTAÇÃO
CONTRADIÇÕES E CONFLITOS DO
DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO:
Impactos do Software Livre no Brasil – Uma História em Progresso
Dissertação depositada como parte dos requisitos
para obtenção do título de mestre em história.
Rubens Araujo Menezes de Souza Filho
Orientador: Prof. Dr. Gildo Magalhães dos Santos Filho
Agosto de 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 1
Esta obra se encontra disponível para cópia, distribuição, exibição e
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hipótese alguma afetados pelo disposto acima.
1
Vide: Anexos, documento V
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Sumário
Resumo....................................................................................................................................5
Agradecimentos.......................................................................................................................7
Dedicatória..............................................................................................................................8
Siglas........................................................................................................................................9
1.Introdução..............................................................................................................................10
1.1. Justificativa Pessoal........................................................................................................10
1.2. A História do minuto anterior.......................................................................................12
1.3. Sistemas Operacionais?..................................................................................................16
1.4. Considerações Metodológicas.......................................................................................18
1.5. Estrutura da Dissertação................................................................................................21
2.A idéia de progresso e a disputa pelas patentes de softwares.............................................23
3.Uma História de softwares e sistemas operacionais............................................................37
3.1.Do hardware ao software................................................................................................37
3.2.Do nascimento da Microsoft à conquista do Desktop................................................43
3.3.O nascimento do Linux.................................................................................................55
3.4.O GNU/Linux e a antiga novidade do Software Livre................................................56
3.5.Visões de Mundo...........................................................................................................58
3.6.O Linux e o movimento do Software Livre pelos olhos da Microsoft, o Windows e a
Microsoft pelos olhos do movimento do Software Livre....................................................61
3.7.Considerações Sobre a Natureza da Informática e a Autodeterminação Tecnológica
................................................................................................................................................86
4.Uma História do desenvolvimento tecnológico brasileiro...................................................91
4.1.Brasil: raízes da industrialização e do desenvolvimento tecnológico..........................91
4.2.Mudanças no quadro político........................................................................................95
4.3.A Industrialização..........................................................................................................98
4.4.História do Software no Brasil....................................................................................109
4.5.O Software Livre e a política brasileira de desenvolvimento tecnológico, uma nova
tentativa de autodeterminação.............................................................................................117
5.Conclusões...........................................................................................................................127
5.1.Balanço Final................................................................................................................133
6.Glossário..............................................................................................................................135
7.Bibliografia..........................................................................................................................136
7.1.Livros............................................................................................................................136
7.2.Teses e Dissertações.....................................................................................................138
7.3.Artigos..........................................................................................................................138
7.4.Artigos da Imprensa Diária..........................................................................................138
7.5.Bibliografia Técnica de Referência.............................................................................139
7.6.Documentos na Internet...............................................................................................139
7.7.Legislação Consultada..................................................................................................139
7.8.Material de Apoio........................................................................................................139
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8.Anexos..................................................................................................................................140
8.1.Documento I.................................................................................................................140
8.2.Documento II (Resolução n° 5.213 de junho de 2005)...............................................141
8.3.Documento III (Lei n° 7.646 de 18 de dezembro de 1987)........................................143
8.4.Documento IV (Decreto de 29 de outubro de 2003)..................................................150
8.5.Documento V (Creative Commons Licença de AtribuiçãoUso Não Comercial 2.5
Brasil)..................................................................................................................................152
8.6.Documento VI (The Open Source Definition)...........................................................153
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Resumo
O software represente hoje uma das mais interessantes criações humanas, pois é o
conhecimento em estado puro. Ainda que não se possa tocar o software ele está presente em
todos os lugares onde estão as tecnologias digitais: telefones celulares, MP3 players,
máquinas fotográficas digitais, computadores e a Internet. Peças da rotina diária de milhões
de pessoas, todos regidos por softwares.
A evolução e indiscriminada disseminação das tecnologias digitais impõe desafios
às pessoas, empresas e governos, tornando imperativo a compreensão das relações
econômicas, sociais e políticas que determinam a criação e utilização dos softwares, ou em
outras palavras a criação e utilização do conhecimento humano.
Este trabalhado está centrado na questão dos sistemas operacionais, abordando as
histórias do Windows e do Linux, mas trata também da idéia do progresso, da disputa pelo
conhecimento, da disputa pelas patentes, e do movimento GNU/Linux.
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Abstract
Today software is one of the most important human creations, once it knowledge in
pure form. Even if we can not touch the software it is present at all the places where you can
find the digital technologies: cell phones, MP3 players, digital photographic cameras,
computers and the Internet. Pieces in the every day life of millions of persons around the
world, all of them ruled by softwares.
This work is focused in the problem of the operating systems, covering the history
of Windows and Linux, but it also addresses the very idea of progress, the dispute over
knowledge, the dispute over patents, and the GNU/Linux community.
It also evaluates the relations of information technology and the technological self
determination, with focus on the Brazilian technological development.
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Agradecimentos
Agradeço à minha esposa Ana, pelo apoio, incentivo, compreensão e todo amor. A
ela peço desculpas por todas as madrugadas no computador enquanto redigia este
texto.
Agradeço à minha Mãe pelo gosto que me incutiu pelas palavras longas e ao meu
Pai que tantos anos financiou esta excentricidade.
Agradeço a todos os amigos que abandonei para poder me trancar em “meu mundo”
e perseguir estas idéias, em especial Dedé, Klaus, Léo, Rigotti e Madrugada, de
quem, com grande aperto no coração, efetivamente me escondi.
Agradeço muito ao Prof. Dr. Gildo Magalhães, tanto por sua consistente orientação
como por sua paciência de monge que já atingiu a iluminação. Agradeço as leituras
cuidadosas das versões deste texto, agradeço a oportunidade, as aulas e a amizade.
Espero um dia conquistar erudição semelhante.
Como é de praxe declaro que os erros são meus e os acertos compartilhados.
Agradeço a todos que injustamente não estão sendo mencionados. Se quem disse
que “o trabalho do historiador é solitário” tivesse recebido metade da ajuda que eu
recebi, teria ficado calado.
São Paulo, 27 de Agosto de 2006
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Dedicatória
Esta dissertação é dedicada a minha filha, ou ao meu filho, cuja chegada
se avizinha. Afinal, como todos sabemos, a história se dedica ao futuro.
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Siglas
1. BBS BBS ou bulletin board system. Software, que permite conexão via telefone a um
sistema via computador, permitindo a interação com o sistema e com outros usuários.
2. CNPq Conselho Nacional de Pesquisas
3. CPD Centro de Processamento de Dados
4. FINEP Financiadora de Estudos e Projetos
5. FLOSS Free/Libre Open Source Software
6. FNDCT Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
7. FUD – Fear Uncertanty Doub
8. HTML Hiper Text Markup Language, ou Linguagem de Marcação de Hipertexto
9. HTTP Hiper Text Transfer Protocol, ou Protocolo de Transferência de Arquivos de
Hipertexto
10. LED sigla em inglês para Light Emitting Diode (Diodo que Emite Luz), um dispositivo
semicondutor emissor de luz bastante utilizado como indicador de utilização em
dispositivos eletroeletrônicos.
11. NCSA National Center for Supercomputing Applications.
12. NDA Nondisclosure Agreements ou NDAs
13. NT, Windows Windows New Technology, ou Windows NT
14. NTFS New Technology File System, algo traduzível como Sistema de Arquivos de Nova
Tecnologia.
15. OEM Original Equipment Manufacturer
16. RAM Random Access Memory, ou Memória de Acesso Randômico
17. SEI Secretaria Especial de Informática
18. SO Sistema Operacional
19. TI Tecnologia Informação, ou em inglês IT (information technology), sigla utilizada para
referir profissionais e recursos deste ramos da engenharia.
20. TCO Total Cost of Ownership, ou em português Custo Total de Propriedade.
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1. Introdução
"(...) fiel no sentido, não tanto na forma, o que se compreende e desculpa, já que a memória, que é
susceptível e não gosta de ser apanhada em falta, tende a preencher os esquecimentos com criações de
realidade próprias, obviamente espúrias, mas mais ou menos contíguas aos factos de cujo acontecer só lhe
havia ficado uma lembrança vaga, como o que resta da passagem de uma sombra."
José Saramago Todos os Nomes
1.1. Justificativa Pessoal
2
Este trabalho começou a ser imaginado em fins de 1996 e foi em grande medida
motivado e inspirado pelo editor de textos MSWord.
2
N. do A. As citações de obras ou documentos encontrados originalmente em inglês foram traduzidas
sempre que isto pareceu pertinente para a compreensão do texto, sendo as traduções de responsabilidade do
autor. No capítulo sobre o desenvolvimento tecnológico brasileiro, nos documentos da Microsoft se optou por
não fazer adaptações ao texto, mantendo redundâncias e vícios de linguagem presentes nos originais já que
estes são quase sempre transcrições de apresentações e palestras.
Nas traduções o termo Open Source deliberadamente não foi transformado em Software Livre como no
restante do texto, visando justamente ajudar a diferenciar quando a referência é feita ao Software Grátis (Free
Software) e quando é feita ao Software Aberto (Open Source), pois o inglês free não se traduz
automaticamente como livre, podendo ter (e aqui em geral terá) a acepção de grátis.
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Nesta época comecei a notar que para um número sensível de usuários, os
processadores de texto, que deveriam ser relativamente simples, por alguma razão não o
eram. O software em questão era o MSWord hegemônico já naquela época que teimava
em tomar "decisões" sem consultar os usuários, "corrigindo" palavras, alterando
formatações e em certa medida submetendo usuários menos experientes à sua "vontade".
Mesmo eu, usuário pretensamente avançado, tinha um inevitável desconforto em ser
obrigado a alterar configurações e o setup de "fábrica" para utilizar o software.
Parecia, para mim, que aquela tecnologia subvertia o pensamento, acrescentando aos
textos do usuário, de maneira subreptícia, suas próprias idéias. Algo sem dúvida
descabido, pois a máquina computador, apesar de toda sua tecnologia não seria capaz de
pensar mais do que a máquina de escrever ou o aspirador de pó. Ainda assim a máquina de
escrever e o aspirador não interferiam no que era datilografado ou aspirado.
A este pequeno fator incomodativo aliouse uma palestra do intelectual e ativista
político norteamericano, Noam Chomsky. Em visita ao Brasil, em novembro de 1996, a
convite da ABRALIN (Associação Brasileira de Lingüística), o Prof. Chomsky proferiu
uma palestra no Departamento de Letras Modernas, onde entre outras coisas destacava a
língua como uma manifestação ideológica dos grupos que a utilizavam e/ou apropriavam e
modificavam3.
Estes fatores deram início à fermentação do pensamento de que poderia haver mais
nos softwares do que simplesmente uma ferramenta estritamente técnica. Parecia, ao menos
para mim, que ali estava contido um pensamento concreto, uma lógica particular, uma visão
de mundo concretizada nas soluções apresentadas na tela ou, se preferirmos outro termo, ali
estava embutida uma ideologia. Logo, talvez aquela sensação não fosse tão descabida
afinal.
3
Knowledge of History and Theory Construction in Modern Linguistics. Palestra proferida em São Paulo,
Brasil (Novembro de 1996). Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada (D.E.L.T.A.) 13,
(1997): 103122. Em português no mesmo exemplar, p. 12952.
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homogêneo de pessoas, todas partilhando os mesmos valores culturais de um país, e que
este produto era massificado para (e consumido por) todo o planeta, surgiu em mim uma
crescente preocupação com a aceitação dos softwares como simples ferramentas
desprovidas de intenções. Produtos intangíveis que eram passíveis de críticas apenas
quando falhavam, e não, como eu principiava a enxergálos: uma produção cultural, tão
passível de análise crítica e, quiçá, regulação.
1.2. A História do minuto anterior
No diálogo de vivos e mortos, também a tecnologia é herdada e, como toda herança,
traz sua carga histórica e ideológica, sendo esta carga o objeto de análise deste trabalho.
Pretendendo abordar a história de uma tecnologia recente, iniciada há pouco tempo,
quando a posicionamos na longa cronologia do tempo histórico, somos forçados a
confrontar algumas questões de ordem prática e metodológica que emergem de maneira
inevitável.
Ao tratar da história da microinformática, em nosso caso específico do ramo de
softwares, a primeira e mais irrefletida das questões é se há afinal uma história para ser
contada em algo tão recente. Digo irrefletida pois ao iniciar este texto, com a lúgubre
ilustração da história como o diálogo entre os vivos e os mortos, pretendo deixar clara a
natureza do hoje como derivada do ontem; de forma que fique patente que, mesmo um
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fenômeno recente tem suas raízes plantadas nas gerações precedentes, por vezes em
profundidades insuspeitas.
Imbuído deste espírito, acredito que um trabalho desta natureza traz em si elementos
de grande motivação para o pesquisador e interesse para a sociedade. Por ser a micro
informática aspecto dominante da economia e das sociedades modernas, ela está submetida
a forte apropriação ideológica, já que é uma ponta de lança do capitalismo moderno. 5 E esta
é uma apropriação, sem dúvida, histórica.
4
BLOCH, Marc. Introdução à H istória. Edições EuropaAmérica.
(vide páginas 38 e 43, nas citações foi preservada a grafia do texto consultado).
5
Afirmação que pode ser verificada por um lado nos escritos de José Luiz Fiori e Giovanni Arrighi sobre a
globalização financeira do capital e por outro nos escritos de Manuel Castells sobre a nova configuração da
sociedade em rede.
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desenvolvimentos do hardware e software blindados do peso das ideologias, constituiriam,
apenas por isso, irresistível tema para historiadores e outros cientistas sociais, pois tratarse
ia de caso único na história da humanidade.
Uma das premissas desta reflexão é que esta negação faz parte de um raciocínio
economicista dominante na atualidade, raciocínio que afasta as formas sociais de
compreensão do mundo em favor de uma onipresente lógica empresarial, poderosa para
cooptar até mesmo os Estados Nacionais. O principal resultado dessa situação é que
ressaltada a racionalidade econômica, escondese a racionalidade humana; desta forma
embora esta pesquisa verse sobre a historia da tecnologia motriz da chamada “nova
economia”, o que nos interessa são as formas sociais que a engendraram e as formas sociais
por ela engendradas, mais do que qualquer outra coisa.
Assim, este texto não pretende recontar a história da informática, nem tão pouco dos
computadores, embora por vezes façamos menção a tais temas, com o objetivo de embasar
determinadas teses, perpetrar analogias ou simplesmente por ser impossível atingir nosso
objetivo sem passar por estes temas em algum momento. Sem menosprezar a relevância
destas áreas de investigação, acreditamos que neste sentido nossa contribuição seria de
pequena relevância em relação à bibliografia já disponível, bibliografia vasta o bastante
para nos dar uma pista do grande interesse que o tema desperta na sociedade
contemporânea6.
Como já foi dito, este trabalho aborda uma subdivisão da história da informática, a
história dos softwares que operam os microcomputadores de hoje. Portanto temas como
hardware e Internet estão fora do escopo inicial desta investigação, sendo o nosso objetivo
específico recontar parte da história dos softwares com um especial interesse nos sistemas
operacionais Windows e Linux porém, menos com o objetivo de fazer o simples registro
cronológico de sua trajetória, do que analisar e expor as forças sociais e econômicas que
operaram e operam esta trajetória.
6
Cf. CERUZZI, Paul E. A History of Modern Computing. Massachusetts : MIT Press, 1998. ou
MAGALHÃES, Gildo. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto desenvolvimentista na
formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992). 1994. Tese (Doutorado
História) FFLCH, USP para uma história da computação geral e para o caso específico brasileiro; ou os
trabalhos de Pierre Levy e Manuel de Castells para a elaboração de aspectos mais gerais do impacto desta
tecnologia na sociedade.
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O principal pressuposto deste trabalho é a idéia que a ideologia opera ativamente
Este é um trabalho de investigação no campo da história da ciência, que ao “contar a
história dos softwares”, busca apontar o peso da ideologia nesta história. Porém, ao tratar
“da ideologia”, estamos obrigados a definir com qual conceito de ideologia estaremos
trabalhando, pois o termo em si é suficientemente controverso para dar origem a inúmeros
trabalhos acadêmicos. Aqui utilizaremos o termo ideologia sem aplicar a ele
necessariamente um juízo de valor, sem desconsiderar que a ideologia pode, como tudo, ser
boa ou má. No nosso caso trabalharemos o termo ideologia simplesmente como “ idéias que
servem a determinados fins”8, não raro, mascarando os seus reais objetivos.
Por fim cabe apontar que se esta pesquisa não busca o “deleite macabro, em
desenfaixar os deuses mortos”, há o tom herético de quem conta uma história in the
making, que ainda não permite o distanciamento temporal tão caro a tantos colegas
historiadores. Para os críticos da proximidade só resta oferecer o conforto de que para tratar
da história do que está acontecendo foi necessário recuar no mínimo um quarto de século, e
em alguns momentos mais do que isso, já que os vivos dialogam constantemente com os
mortos. Os riscos e desvantagens desse situação eram conhecidos e foram assumidos, com
seu peso inerente de imprecisão, que não deve porém impedir a crítica dessa história desde
já.
7
Esta idéia é apenas uma extensão natural da noção já bastante sedimentada da força exercida pela(s)
ideologia(s) no desenvolvimento científico. Sobre este tema existe extensa bibliografia disponível, da qual
destacamos alguns títulos a seguir: MAGALHÃES, Gildo. Introdução à metodologia científica: caminhos
da ciência e tecnologia. São Paulo : Ática, 2005; CANGUILHEM, Georges. Ideologia e racionalidade nas
ciências da vida. Lisboa : Edições 70, 1997; JAPIASSU, Hilton. As Paixões da ciência. São Paulo : Letras &
Letras, 1991; CHALMERS, Alan. A Fabricação da Ciência. SP: UNESP, 1994; LACEY, H. Valores e
Atividade Científica. São Paulo : Discurso Editorial, 1998; LACEY, H. Is Science Value Free? Values and
Scientific Understanding. London and New York: Routledge, 1999.
8
MAGALHÃES, Gildo. Introdução à metodologia científica: caminhos da ciência e tecnologia. São Paulo :
Ática, 2005.
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1.3. Sistemas Operacionais?
Para ilustrar nossa visão, e familiarizar o leitor menos embrenhado nas searas da
técnica, com o objeto deste trabalho, utilizemos a seguinte imagem cartesiana: em sendo o
computador uma entidade “viva” o hardware seria seu corpo, e o software seu espírito.
Nesta dissertação, trataremos pois de questões “espirituais”.
A motivação desta abordagem é, em primeiro lugar, dada pela seguinte constatação:
ainda que sejam aplicados os mais inovadores designs, quer estejamos tratando de
poderosos mainframe no CPD9 de grandes empresas ou órgãos públicos, de um tradicional
clone dos PC em um escritório, de um roteador gerenciando tráfegos de rede, ou de um
compacto palmtop anotando pedidos em um restaurante, a tecnologia física de todas estas
máquinas é, sob diversos aspectos, muito parecida. Na verdade, tratase de tecnologia
recorrente e comum.
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microprocessadores10, memória de acesso randômico (RAM 11) e em geral alguma forma de
armazenamento de dados como harddrives12 ou memórias flash13, o que contudo não é
obrigatório. Estes princípios são constantes, constituindo um padrão que independe
totalmente da plataforma e do sistema operacional.
Mas não acreditamos que o mesmo possa ser dito sobre os softwares14, que mesmo
dentro dos limites impostos pelo hardware podem ser tão criativos como a imaginação
humana. Dito isto, a próxima justificativa que se faz necessária é a razão de escolhermos
sistemas operacionais (SO) e não, por exemplo, planilhas ou processadores de texto para
nossa análise.
10
Na definição da Wikipédia: “Um microprocessador (abreviado como µP ou uP) é um componente eletrônico
de computador, feito de transistores miniaturizados em um único circuito integrado (IC) de material semi
condutor (também chamado microchip ou apenas chip). A unidade central de processamento (CPU) é o mais
comum microprocessador, mas muitos outros componentes em um computador contêm microprocessadores,
como as unidades de processamento gráfico (GPU) em uma placa de vídeo. (....)”
(http://en.wikipedia.org/wiki/Microprocessor ; acesado em 12/10/05 )
11
Memória de acesso randômico, comumente conhecida pelo acrônimo em inglês RAM, tipo de armazenador
para computadores (na prática um chip de computador) do qual os conteúdos podem ser acessados em
qualquer ordem (random). Em contraste com dispositivos de armazenamento seqüencial como fitas
magnéticas e discos, no qual o movimento mecânico da mídia de armazenamento força o acesso em uma
ordem fixa. (...) Computadores utilizam a RAM para guardar o código dos programas durante a execução.
Uma característica que define a RAM é que o acesso a diferentes blocos da memória é feito quase na mesma
velocidade, em contraste com outras tecnologias(...). (http://en.wikipedia.org/wiki/RAM ; acessado em
12/10/05)
12
Um disco rígido (hard disk) utiliza pratos rígidos que se movimentam em alta rotação. Cada prato tem uma
superfície magnética plana na qual os dados são armazenados. A informação é escrita no disco pela
transmissão de um fluxo eletromagnético disparado por uma antena ou cabeça de leituragravação contra o
material magnético da superfície, alterando assim sua polaridade em blocos específicos. A informação pode
ser lida de volta por esta mesma cabeça de leituragravação devido a alteração elétrica causada pelo campo
magnético na cabeça de leituragravação quando ela passa por este disco em rotação. (explicação adaptada da
definição da Wikipédia, conforme acessado em 12/10/05 no endereço:
http://en.wikipedia.org/wiki/Hard_disk)
13
Memória Flash é uma forma de EEPROM (ElectricallyErasable Programmable ReadOnly Memory) que
permite que múltiplos setores sejam lidos e apagados em uma única operação de programação. (...) uma forma
de chip de memória regravável que, ao contrário do chip de memória de acesso randômico (RAM), mantém
seu conteúdo sem a necessidade de alimentação constante de energia. É um exemplo de memória não volátil
(NonVolatile Read Write Memory ou NVRWM).
14
Podese contraargumentar que também os softwares obedecem a um mesmo conjunto de soluções e
princípios solidamente estabelecidos pela indústria, mas mesmo assim acreditamos que eles apresentam
variabilidade mais do que suficiente para esta análise, bem como outras características únicas que ainda serão
exploradas, como sua forma de produção que serão vistas em capítulos subsequentes, para justificar nossa
posição.
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A opção pelos SO devese em primeiro lugar à sua centralidade e sua função vital
dentro das máquinas15. Todos os demais softwares são dependentes do SO para conseguirem
“rodar” como se diz no jargão, ou de forma mais objetiva, os softwares precisam do SO
para desempenhar os papéis para os quais foram projetados16, como também precisa o
próprio hardware, que sem o SO consegue fazer pouco mais do que piscar alguns LEDs. O
SO é précondição para que tanto o hardware ou outros softwares efetivamente funcionem,
mal comparando poderseia pensar no SO como um administrador, que mantém a máquina
operacional e cuida das funções básicas do computador, mantendoo ligado e funcionando
para que os softwares possam executar as funções específicas para as quais foram
projetados.
Assim, nosso estudo será dirigido ao universo dos sistemas operacionais (SO) tanto
por sua importância relativa em comparação com outros softwares, como pela possibilidade
de análise de dois SO concorrentes e, sob diversos aspectos, antagônicos, o Windows da
Microsoft e o GNU/Linux do movimento Open Source. A escolha destes dois sistemas
devese não tanto a suas características técnicas distintivas, que sem dúvida existem, mas
principalmente à divergência dos princípios que norteiam suas criações e desenvolvimentos.
Enquanto o Windows é um sistema comercial, propriedade de uma empresa norte
americana e desta forma protegido por patentes e segredos industriais, o GNU/Linux existe
como uma espécie de criação coletiva transnacional. Sobre estas diferenças e seus
significados trataremos adiante.
1.4. Considerações Metodológicas
O recorte temporal desta dissertação foi definido como compreendendo os anos de
1991 e 2005, anos que respondem respectivamente pela gênese do sistema Linux e pelo
15
Todas as máquinas citadas no exemplo de tecnologias recorrentes (início desta seção), apesar de fisicamente
parecidas trabalham com SO próprios e diversificados, lá temos: Mac OS X (uma variação do OpenBSD) no
caso da Apple, HPUX (uma variação do Unix) dentro do mainframe HP, uma versão do Windows, Linux ou
BSD no clone IBMPC, um SO proprietário e específico da CISCO para o seu roteador, e no Palmtop um
PalmOS.
16
Claro, sempre existem exceções, como por exemplo os softwares de particionamento de disco, ou mesmo os
códigos gravados dentro dos chips dos computadores, mas são aplicações específicas o bastante para que
possam ser ignoradas sem prejuízo ou invalidação das teses aqui apresentadas.
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surgimento do Brasil como uma das mais relevantes forças mundiais do Software Livre
(FLOSS)17.
Esta delimitação levounos a expor com clareza quatro aspectos que precisariam ser
abordados nesta dissertação: 1) a questão da propriedade das idéias, 2) a história dos
softwares e dos sistemas operacionais, 3) a história do desenvolvimento tecnológico
brasileiro e 4) os impactos do advento do Software Livre no Brasil; respectivamente as
quatro partes em que está dividida esta dissertação.
outro. A hipótese é que o próprio afã do capital em mercantilizar o conhecimento cria um
movimento contrário, animado justamente com a idéia de libertar o conhecimento das
amarras do capital.
Esta idéia só pôde ganhar o relevo que têm hoje graças ao advento da Internet, a
rede de computadores reelaborou a geografia espacial e política do conhecimento.
Reelaborou a geografia espacial na medida que distendeu o seu acesso para além dos Campi
das universidades e dos muros dos laboratórios das corporações, e reelaborou a geografia
17
FLOSS ou Free/Libre Open Source Software é a sigla pela qual o Software Livre é atualmente mais
conhecido. A idéia por trás do Software Livre (FLOSS) não é a da gratuidade do produto, mas sim (ou
também) a liberdade para usar, distribuir, copiar e alterar o programa sem restrições legais. Em nome da
simplicidade, será utilizado o termo Software Livre ao longo da dissertação. As principais características do
Open Source (Software Livre) se encontram ao final do capítulo 2, à frente.
18
Seqüência de mensagens em um fórum de debates eletrônico.
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política na medida em que diluiu o espaço das nações, criando um não lugar e não tempo,
onde convivem e convergem indivíduos cujas identidades não são pautadas unicamente por
uma condição de funcionários de uma empresa ou membros de uma nação, mas sim por um
ou mais interesses comuns.
Este convívio deu início, ou melhor acelerou tremendamente o compartilhamento,
reelaboração e geração de novos conhecimentos em torno dos interesses comuns destes
indivíduos que passaram a se organizar em grupos de interesse na rede de computadores.
Justamente partindo desta contestação surge a segunda hipótese, que deriva dela
com linearidade, a hipótese de que o capital vem promovendo uma apropriação indébita de
um conhecimento outrora pertencente a toda sociedade, privatizando idéias e processos
antes públicos. Tratase de um movimento que ocorre com maior vigor no centro do
capitalismo, nos países desenvolvidos ou mais industrializados, mas que repercute com
19
GORZ, André. O Imaterial. Conhecimento, valor e capital. São Paulo : Annablume; Janeiro de 2005
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maior força nas bordas do capitalismo prejudicando sensivelmente os países em
desenvolvimento ou subdesenvolvidos.
Uma terceira hipótese a ser verificada nesta dissertação é mais específica em relação
aos softwares e o seu desenvolvimento tecnológico. Mais à frente serão apresentados os
dois “macro modelos” de desenvolvimento tecnológico que competem na elaboração de
softwares na atualidade. O modelo empresarial tradicional, onde o desenvolvimento é
protegido por um segredo industrial e tem o objetivo de ser vendido como um produto, e o
modelo do Software Livre onde os códigos são conhecidos e alterados por uma rede trans
nacional de programadores e entusiastas (não necessariamente remunerados por seu
trabalho) e que é livremente distribuído.
Parte de nosso trabalho consiste em identificar até que ponto estas diferentes formas
de desenvolvimento e de licenciamento interferem nos rumos tomados pela tecnologia de
cada sistema operacional.
1.5. Estrutura da Dissertação
31/08/2006 20060830_rbns.odt 21
microcomputadores atuais. Contudo o foco deste capítulo estará na história dos Sistemas
Operacionais e não na história dos softwares como um todo. Também é neste capítulo que
trataremos de temas como Windows, Microsoft, Linux, movimento do Software Livre e
suas interações.
Assim esperamos ter as bases necessárias para entender o caminho traçado pelo
Brasil até ser reconhecido como uma das potências mundiais do Software Livre, tanto em
desenvolvimento como em adoção.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 22
2. A idéia de progresso e a disputa pelas patentes de softwares.
"We are like dwarfs sitting on the shoulders of giants. We see more, and things that are more distant,
than they did, not because our sight is superior or because we are taller than they, but because they raise us
up, and by their great stature add to ours."
John de Salisbury20, em 1159.
Este texto busca expor o antagonismo existente entre “a idéia de progresso”, situada
em termos do período histórico contemporâneo, abordandoa dentro das idéias dominantes
da sociedade; e a apropriação capitalista da Inteligência Geral21, como proposto por Marx
nos Grundrisse22, e posteriormente reelaborado pela escola autonomista 23. Para tanto
20
Aparentemente não é realmente possível estabelecer, com absoluta precisão, a autoria desta frase. Sendo
mais conhecida como um aforismo original de Isaac Newton ("If I have seen farther, it is by standing on the
shoulders of giants"), ela é de fato apenas uma reelaboração do que já havia sido dito por John de Salisbury
em 1159.
Segundo M.T. Clanchy (em From Memory to Written Record: England 10661307 e Abelard: A Medieval
Life) a idéia por trás desta frase possivelmente pertenceria a Bernard de Chartres (Bernardus Carnotensis)
outro acadêmico do século XII, hipótese provável uma vez que grande parte do que se sabe sobre seu trabalho
é conhecido somente por escritos de John de Salisbury. Devido aos estudos de Bernard de Chartes terem
aparentemente concentradose sobre a obra de Platão, há quem defenda que a idéia por trás desta frase
pudesse derivar diretamente do pensamento platônico, embora a comprovação de tal idéia não seja possível. O
eminente sociólogo Robert K. Merton, tem um livro entitulado On the Shoulders of Giants : The Post
Italianate Edition onde discute questões como o plágio, criatividade e o conceito de progresso partindo da
busca pela origem desta famosa frase.
21
Esta Inteligência Geral pode ser compreendida como a subjetividade das coletividades sociais, o conjunto
de saberes historicamente acumulados pelos grupos sociais, introjetados em diferentes atividades sem que
“pertençam” a um indivíduo ou mesmo que se lhes possa apontar um autor.
22
MARX, Karl. Grundrisse: Elementos Fundamentales Para La Critica de la economia politica (Borrador)
18571858; Buenos Aires; Siglo XXI Argentina Editores S.A: junho 1972.
23
Marxismo autonomista designa uma escola de pensamento que coloca o centro da autodeterminação na
classe trabalhadora. Esta corrente de pensamento marxista foi formulada durante as greves e protestos de
trabalhadores, movimento feminista e estudantes italianos nos anos 1960 e 70. Os principais intelectuais desta
linha do marxismo são Antonio Negri, Mario Tronti, Sergio Bologna, Mariarosa Dalla Costa, Francois Beradi
e Raniero Panzieri.
A autodeterminação da classe trabalhadora é uma idéia que tem ramificações profundas dentro de toda a
tradição marxista, mas o conceito autonomista em particular enfatiza o poder autônomo dos trabalhadores,
colocando sua autodeterminação acima do poder do capital, dos partidos, dos sindicatos. No marxismo
autonomista o poder autônomo de um grupo de trabalhadores é autônomo até mesmo dos outros grupos de
trabalhadores. Aqui autonomia entendese em geral como a habilidade dos trabalhadores de identificarem seus
próprios interesses e lutarem por eles, indo além da mera reação à exploração que são submetidos pelo capital
ou do direcionamento dado por "líderes trabalhadores" ao seu foco/objetivo de luta.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 23
pretendemos explorar a questão sob a luz do crescente recrudescimento das legislações de
Copyright e patentes.
Embora, por um lado, reconheçamos que a escola autonomista faz uma leitura um
tanto polêmica do conhecimento marxista, substituindo o operário como o “sujeito” da
revolução, por outro lado acreditamos que suas formulações sobre diversas facetas do
capitalismo contemporâneo e sobre as formas de trabalho imaterial são extremamente
pertinentes, merecendo portanto ser consideradas.
Esta formulação inserese na necessidade de compreender e explicitar a apropriação
capitalista da subjetividade dos trabalhadores e, em seu desdobramento, a apropriação da
subjetividade das coletividades sociais. O tema suscita o debate tanto sobre a necessidade
do Capital em dominar a cultura e a inteligência das massas, quanto sobre o seu poder e
“direito” de fazêlo.
Tratando então da relação entre o Copyright e a apropriação da Inteligência Geral,
procuraremos de forma específica explicitar o antagonismo existente entre a idéia de
progresso no desenvolvimento histórico da informática e o fenômeno contemporâneo do
recrudescimento das patentes de softwares. Estas idéias são parte do raciocínio acerca da
influência da ideologia no desenvolvimento dos softwares de computador, campo do
conhecimento humano tomado tacitamente como livre de influências de natureza
ideológica e percebido, em geral, como apenas técnico.
A idéia de progresso está bastante presente e solidamente documentada na história
da cultura ocidental, especialmente a idéia do progresso científicotecnológico24, progresso
do qual os atuais estágios e perspectivas para o futuro próximo nos campos da física,
biologia e microinformática parecem ser a materialização, apenas para ficarmos nos
exemplos mais recorrentes. Dentro destes trataremos, como dito acima, da micro
informática, ou da especificidade de seus softwares.
Não será portanto, foco deste texto discutir o conceito de progresso, nem pesquisar
sua validade. Dentro de nosso recorte o progresso parece tangível, se pretendemos atrelar
Cf. BASALLA G. The Evolution of Technology. Cambridge, 1988. e ROSSI, P. Naufrágios sem
24
Espectador. A idéia de progresso. EDUNESP, 2000.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 24
ao conceito meramente o aperfeiçoamento técnico, a potência das máquinas e o
generalizado espraiamento de suas aplicações em diferentes ramos da atividade humana.
Portanto, ficaremos com a idéia, por certo unânime, de que entre as primeiras
calculadoras mecânicas como a “pascalina” de Pascal (1642) ou o “relógio contador” de
Wilhem Schickard (1626),25 e os atuais computadores houve por certo um progresso
técnico, ou com a apropriação do conceito biológico, uma evolução, conforme
elaboraremos a seguir.
25
MAGALHÃES, Gildo. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto desenvolvimentista na
formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992). 1994. Tese (Doutorado
História) FFLCH, USP
26
BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press; 1995. p 14.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 25
Basalla cita Karl Marx27, na defesa da idéia de que a invenção é um processo social,
que repousa na acumulação de inúmeras pequenas melhorias e não nos esforços heróicos de
alguns poucos gênios. Como no exemplo do elevador, onde não é possível determinar sua
data de invenção, nem seu inventor, uma vez que seu princípio básico, o equilíbrio entre
peso e contrapeso era conhecido no mundo antigo, tendo sido usado na Idade Média, na
Roma antiga e possivelmente antes disso. Foi o Sr. Otis28 que no entanto entrou para a
história do elevador em 185229 como um grande inventor, mesmo que sua contribuição, os
freios de segurança, indispensáveis na proteção de pessoas e cargas, em um eventual
rompimento dos cabos, seja relativamente pequena em toda a tecnologia e conhecimento
empregados na máquina.
Parece haver, portanto, uma continuidade nas técnicas e ferramentas dos homens,
“qualquer coisa nova que apareça no mundo das coisas fabricadas é baseado em algum
objeto já existente.”30 Mas o que se verificou com o avanço da sociedade industrial foi a
emergência do inventor como herói, um tipo de gênio, fortemente defendido pelos estados
nacionais, logo que os reflexos econômicos e a importância estratégica da industrialização
passaram a ser por eles percebidos.
27
Idem, 1995. p 21.
É importante deixar registrado que embora cite Karl Marx, o texto de Basalla é crítico a um bom número de
idéias apresentadas pelo economista alemão, estando longe de um texto que poderia ser caracterizado como
marxista.
28
Elisha Graves Otis, inventou e iniciou a produção de elevadores com freios de segurança entre 1852 e 1856,
sendo com isso um dos principais responsáveis pela viabilização de edifícios cada vez mais altos nas grandes
cidades.
29
The New Encyclopaedia Britanica in 30 Volumes : Ready Reference and Index VII. USA;
Encyclopaedia Britannica, Inc.; 1980 15th edition
30
BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press; 1995. p 45.
31
Idem, 1995. p 57.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 26
Uma vez que com a revolução industrial, o desenvolvimento tecnológico foi
integrado aos sentimentos de nacionalismo pois o crescimento (e o poder) de uma nação
passou cada vez mais a estar a ele relacionado não apenas os inventores foram alçados à
categoria de heróis, mas também a tecnologia passou a ser foco de rivalidades, tensões e
negociações entre países. Esse movimento redundou no fortalecimento da idéia e do sistema
de patentes, legislações específicas que visam proteger a “propriedade intelectual” dos
inventores, garantindo a estes o pleno direito de exploração de seus inventos, proibindo a
outros a cópia não autorizada dos princípios e soluções empregados pelo detentor da
patente.
“Patentes são a forma jurídica pela qual as sociedades industriais
premiam e protegem os inovadores tecnológicos. Neste processo, uma
invenção é identificada unicamente com seu inventor e as associações com
os artefatos existentes são obscurecidas. Toda a legislação de patentes é
baseada na premissa que uma invenção é entidade única, nova que pode ser
atribuída ao indivíduo que os tribunais determinarem como sendo seu
legítimo criador. Desta forma, o sistema de patentes converte o fluxo
contínuo das coisas criadas em uma série de entidades distintas
32
Idem, 1995. p 60.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 27
decorrem do conhecimento acumulado por gerações passadas. Tratase portanto de um
conhecimento de massas, ou da Inteligência Geral como proposto por Karl Marx nos
Grundrisse33.
Aliese a isso a própria natureza do conhecimento científico, que repousa sobre uma
base acumulada de conhecimentos pretéritos para avançar (mesmo que seja negando e
reformulando o conhecimento do passado), a presente e crescente dificuldade para separar
ciência de tecnologia tornase mais espinhosa na questão das patentes.
E esta não é de maneira alguma uma percepção nova ou recente, o próprio Sir Isaac
Newton em carta enviada ao cientista inglês Robert Hooke em 1675 (ou 1676), admitia que
"If I have seen further, it is by standing on the shoulders of giants34", uma idéia, formulada e
registrada quase 500 anos antes (em 1159) pelo monge John de Salisbury, conforme a
citação que acompanha a epígrafe deste capítulo.
O que nos parece estar ocorrendo na atualidade é uma apropriação da inteligência,
da subjetividade construída pelas sociedades.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 28
not merely as instruments of capital domination, but also as potential resources for working
class struggle.”35 Uma interpretação subversiva da “Information Society”.
Nas últimas décadas tem havido uma crescente necessidade do Capital em dominar
a cultura e a inteligência das massas, refletido por exemplo no surgimento de termos como
“indústria cultural”, o que suscita o debate sobre o poder e o “direito” do Capital em
proceder a esta apropriação, pois esta parece de certa forma indébita.
A apropriação do conhecimento social encontrase refletida no recrudescimento da
proteção do direito autoral e das patentes, dentro de legislações que foram sucessivamente
alteradas nas últimas décadas em diversos países, especialmente aqueles das economias
mais desenvolvidas, pretendendo estender e reforçar o domínio sobre idéias, cuja original
definição de propriedade e autoria já seriam bastante contestáveis.
Para além dos softwares, talvez o campo onde o conflito das patentes esteja em
maior relevo seja a indústria farmacêutica, onde o direito às patentes esbarra em questões
éticas e morais de toda a sorte. Este assunto, especialmente no que tange à indústria
farmacêutica é recuperado pela jornalista Maria Helena Tachinardi, em seu livro A Guerra
das Patentes, onde são retratadas as rusgas entre Brasil e EUA neste campo, mas Tachinardi
não limita sua análise na questão moral e ética, indo além, apresentando questões
econômicas e de política internacional:
“Os países que lideram o processo tecnológico desejam sistemas de
propriedade intelectual fortes em nível internacional para compensar as
deficiências nos regimes de apropriação dos países que estão aumentando
sua capacitação tecnológica e de imitação, e para compensar, também, a
taxa de difusão acelerada de novas tecnologias, o que reduz o seu tempo de
vida.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 29
contra a imitação no exterior de tecnologias desenvolvidas nacionalmente
em seus mercados.
Os países em desenvolvimento, contudo, receiam que surja uma nova
modalidade de protecionismo tecnológico. Carlos Maria Corrêa chama
atenção para o fato de que os países desenvolvidos estão empenhados em
uma nova política comercial que tende a substituir a promoção do
investimento direto ou o licenciamento de tecnologia pelo acesso direto aos
mercados externos, incluindo a abertura forçada de alguns recalcitrantes.
Os países seguidores, que, recordese, são aqueles que se apropriam
de oportunidades, estão dificultando aos líderes na corrida tecnológica a
possibilidade de apropriação. É o caso dos países que estabeleceram
reservas de mercado, como a informática no Brasil.
A inovação é uma invenção incorporada à produção. A invenção é um
produto essencialmente intelectual, enquanto a inovação é um fenômeno
econômico.”36
31/08/2006 20060830_rbns.odt 30
endurecimento da política externa dos EUA contra a pirataria em outros países, que aventa
mesmo a possibilidade de sanções políticas e econômicas contra os países tidos por
corsários da cultura; segundo com alterações induzidas nas próprias legislações dos países
periféricos, como no caso brasileiro, que passou a produzir legislações específicas para o
combate a pirataria.
Este tema não deve ser tomado de maneira superficial, sua importância é central
para o desenvolvimento e perpetuação do conhecimento e da tecnologia e, para o
desenvolvimento econômico.
Em busca da proteção dos direitos (e dividendos) do Capital, elevase a questão a
um grau de importância tal, que se torna capaz de limitar o acesso à cultura, conseguindo
até fazer eco mesmo dentro das instituições de ensino público, como na situação recente da
USP40 frente ao cerceamento das cópias xerox no Campus41. Isto obrigou a universidade a
tomar uma posição oficial42, em um comunicado autorizando as cópias xerox, onde defende
pura e simplesmente o cumprimento da lei e a utilização justa do material protegido, uma
vez que até isso estava sendo perseguido.
Tachinardi, ainda em seu livro sobre o conflito de patentes Brasil/EUA observa que:
“Por trás do discurso de que o objetivo dos direitos de propriedade
intelectual é o incentivo à invenção, existe o real objetivo econômico de
permitir a apropriação financeira do conhecimento científico, um bem
39
BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press; 1995. p 34.
40
Vide: Anexos, documento I
41
Vide: jornal O Estado de S. Paulo (08/03/2005 Caderno 2); (04/03/2005 Metrópole DEIC apura a ação
de professores em xerox); (03/03/2005 Metrópole Polícia investiga comércio de cópias de livros em
universidade); (02/03/2005 Metrópole Faculdades mantêm xerox dentro das bibliotecas / Metrópole
Bibliotecas oferecem xerox); (21/02/2005 Índice); Jornal da Tarde (03/02/2005).
42
Vide: Anexos, documento II
31/08/2006 20060830_rbns.odt 31
público, intangível, mas que gera vantagens comparativas e aumenta a
competitividade dos países, além de lhes permitir a penetração nos
mercados e o seu controle e reduzir as incertezas associadas à inovação, ao
grau de obsolescência dos produtos.
A apropriação do conhecimento por parte do Capital já havia, como dissemos, sido
notada por Marx, nos Grundrisse, que constituem os fundamentos do pensamento marxista,
tendo sido publicados pela primeira vez entre 1939 e 1941, na União Soviética com o titulo:
Grundrisse der Kritik der politischen Ökonomie (Rohentwurf) 18571858. Tratase de uma
coletânea de obras inéditas até então, que para Marx tinham a característica de esboço,
utilizadas pelo autor como forma de organização de suas idéias, sem que houvesse a
intenção manifesta de sua publicação. Estes “cadernos” de Marx devem portanto ser
considerados em seu contexto, não representando o pensamento mais elaborado do autor,
mas sim uma fase pretérita, embrionária. Feita esta ressalva, sobre tratarse de um texto
ainda em formulação pelo autor, podemos considerar, sem sombra de dúvida, que os
Grundrisse estabeleceram as bases para a posterior redação do Capital, onde muitos dos
conceitos propostos serão retomados com maior profundidade.
“Las fuerzas de producción son en sí mismas un producto histórico y
social y para Marx el proceso productivo es un proceso social. Es
43
TACHINARDI, Maria Helena. A Guerra das Patentes : O conflito Brasil x EUA sobre propriedade
intelectual. São Paulo : Paz e Terra, 1993. p38.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 32
necessario enfatizar este punto con el fin de poner en evidencia que el
importante papel que Marx asigna al desarrollo de las fuerzas productivas
materiales bajo el capitalismo no lo convierte en un determinista
tecnológico. Por el contrario, no es la tecnologia la que obliga al
capitalista a acumular, sino la necessidad de acumular la que lo obliga a
desarrollar los poderes de la tecnología. La base del processo de
acumulación, del proceso por medio del cual las fuerzas productivas se
fortalecem, es la extracción de plusvalía de la fuerza de trabajo. La fuerza
de producción es la fuerza de explotación.
Diante das propostas de Marx sobre a apropriação do poder criador do trabalhador e
de George Basalla sobre o caráter evolucionário da tecnologia, onde um elemento criado
depende da préexistência de outro, já em uso corrente, começamos a nos aproximar da
tese central deste trabalho, a de que possa existir um antagonismo entre a idéia de progresso
no desenvolvimento histórico da informática e o fenômeno contemporâneo do
recrudescimento da defesa das patentes de softwares. Ou melhor formulando, a legislação
de patentes de software tende a emperrar ou atrasar a evolução deste ramo do
conhecimento.
NICOLAUS, Martin. El Marx Desconocido (Prefácio). Em MARX, Karl. Grundrisse: Elementos
44
Fundamentales Para La Critica de la economia politica (Borrador) 18571858; Buenos Aires; Siglo XXI
Argentina Editores S.A: junho 1972; p.30 (o grifo é nosso).
31/08/2006 20060830_rbns.odt 33
Com os argumentos até aqui colocados podemos constatar dois movimentos, 1) a
evolução da tecnologia baseada no conhecimento geral acumulado, e 2) a apropriação deste
conhecimento pelo Capital, que se apropria da Inteligência Geral e então procura cercear
seu acesso pela via legislativa.
A hipótese aqui é que estes dois movimentos fornecem o combustível para os
movimentos contrários, que buscam tanto romper com as amarras legislativas como libertar
a tecnologia (de softwares) do domínio exclusivo do Capital, retransferindo sua
propriedade para a comunidade. Casos como o dos movimentos Open Source e Creative
Commons45 parecem emblemáticos desta resistência e, no ramo dos sistemas operacionais, é
o GNU/Linux quem melhor representa esta tendência, politicamente confusa, mas sem
dúvida revolucionária46.
Aqui cabe a abertura de um pequeno parênteses para explicar o conceito do Open
Source.
45
Creative Commons é uma ONG sem fins lucrativos fundada em 2001 com o seguinte objetivo: "Thus, a
single goal unites Creative Commons current and future projects: to build a layer of reasonable, flexible
copyright in the face of increasingly restrictive default rules."
Em dezembro de 2002 o grupo lançou uma série de licenças livres para o uso público, permitindo que uma
obra intelectual e/ou artística seja licenciada em termos menos restritivos. Declaradamente o conceito por trás
da Creative Commons veio do Software Livre: "Taking inspiration in part from the Free Software
Foundation's GNU General Public License (GNU GPL)". Fonte: http://creativecommons.org/
O CTS, Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas no Rio de
Janeiro, dirige o projeto Creative Commons no Brasil, garantindo que as adaptações e traduções das licenças
estejam em total acordo com a legislação brasileira. Fonte: http://www.direitorio.fgv.br/cts/
46
Aspecto que pretendemos elaborar e aprofundar com maior ênfase à frente.
47
Bruce Perens, antigo líder do projeto Debian (uma das mais antigas e tradicionais distribuições Linux,
reconhecida como a que mais respeita os princípios do Software Livre) é cofoundador da Open Source
Initiative e diversas outras instituições de defesa dos Softwares Livres. Também trabalhou por 20 anos na
indústria de computação gráfica, 12 deles na Pixar Animation Studios, onde participou dos filmes Vida de
Inseto e Toy Story II.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 34
específicas ao Debian e criou a "Open Source Definition"48, hoje mantida e divulgada pela
Open Source Initiative49
As principais características de uma licença Open Source50 são:
● A liberdade de redistribuição, permitindo que o software seja dado
ou vendido livremente, sem pagamento de royalties;
● Permissão para criação de produtos derivados a serem distribuídos
na mesma forma de licenciamento;
● Não discriminar qualquer pessoa, grupo, ou finalidade de uso;
● Ser tecnologicamente neutra.
Com esta explicação fechase o parênteses para a retomada da linhas de
raciocínio anterior.
Ainda mais à frente em seu texto, quando George Basalla pretende definir os
mecanismos psicológicos que motivam a inovação (propondo três categorias: sonhos
tecnológicos, máquinas impossíveis e fantasias populares), volta a mencionar patentes, ao
tratar dos sonhos tecnológicos, onde afirma:
48
Open Source pode ser traduzido como Código Aberto, mas no Brasil tem sido em geral referido como
Software Livre.
49
Open Source Initiative (OSI) é uma ONG sem fins lucrativos dedicada à manutenção e promoção da
definição do Open Source. Fonte: http://www.opensource.org/
50
Para o texto integral vide anexos, documeto VI.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 35
examinadores e não são esquemas fantasiosos. Tomadas como um todo,
contudo, patentes são melhor representantes da potencialidade tecnológica
do que da tecnologia propriamente dita.51”
E parece ser desta contradição que emergem os movimentos de resistência, de que
trataremos à frente. É ainda irônico considerar que o esboço das resistências à apropriação
da Inteligência Geral parece ser mais sólido no competitivo mercado de softwares, ponta de
lança do moderno capitalismo financeiro, que só pôde se globalizar com a constituição de
redes informacionais de telecomunicações52, permitindo que o tempo do capital
transcendesse o espaço físico, unindo mercados em todos os fusos. Pois se só com a
constituição das redes de comunicação o capitalismo pôde efetivamente se globalizar 53 é
esta mesma rede o fator determinante para a existência dos movimentos contrários como
Open Source, Creative Commons e mesmo das redes alternativas de mídia e notícias, que
não poderiam existir e se articular sem as modernas via de comunicação por computador.
51
BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press; 1995. p 69.
52
MARQUES, Ivan da Costa. O Brasil e a abertura dos mercados: o trabalho em questão. Rio de Janeiro;
Contraponto; 2002.
53
CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet: os negócios e a sociedade; Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.,
2003
31/08/2006 20060830_rbns.odt 36
3. Uma História de softwares e sistemas operacionais
"Não havendo testemunhas, e se as houve não consta que tenham sido chamadas a estes autos para
nos relatarem o que se passou, é compreensível que alguém pergunte como foi possível saber que estas
coisas sucederam assim e não doutra maneira, a resposta a dar é a de que todos os relatos são como os da
criação do universo, ninguém lá esteve, ninguém assistiu, mas toda a gente sabe como aconteceu."
José Saramago Ensaio sobre a cegueira pg. 253
3.1. Do hardware ao software
Entendendo um computador dentro da definição já apresentada de uma máquina
capaz de processar instruções e apresentar um resultado, poderemos dividilos para efeitos
didáticos e práticos em 2 tipos: analógicos e digitais.
O senso comum tende a vislumbrar na presença ou ausência de chips a diferença
entre um computador digital e um analógico, mas esta diferença é na verdade determinada
pelo princípio que rege seu funcionamento para obter os resultados das contas processadas.
Considerados de maneira ampla, computadores são máquinas capazes de apresentar
resultados de contas54, e pensando na história das máquinas mecânicas que executam
54
Na definição atual se diria máquinas capazes de fazer contas e armazenar dados, de forma ordenada.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 37
cálculos podemos, com alguma elasticidade no conceito, citar o ábaco, a Pascalina de
Blaise Pascal, a Máquina de Diferenças do matemático Charles Babbage e os protótipos
frustrados de sua evolução, a Máquina de Diferenças 2 e a Máquina Analítica, todas de
certa forma precursoras dos atuais computadores.
Entre os anos de 1946 e 1947 foi construído o famoso ENIAC na Universidade da
Pensilvânia. ENIAC (ou Eletronic Integrator And Calculator) foi efetivamente o primeiro
computador eletrônico, embora seu funcionamento ainda estivesse baseado em válvulas e
não semicondutores.
O surgimento dos computadores, o momento de sua passagem ao “modo digital”, a
história de seu desenvolvimento, e a evolução do hardware encontramse hoje
extensivamente documentados e têm larga bibliografia disponível, contemplando inclusive
o caso brasileiro55, de forma que reconstituir novamente a trajetória do hardware não seria
pertinente a esta pesquisa. Também escapa ao escopo proposto nesta análise redesenhar
toda a trajetória da microinformática até a criação dos primeiros sistemas operacionais,
Cf. SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
55
31/08/2006 20060830_rbns.odt 38
outro tema que também conta com bom numero de trabalhos publicados, contudo cumpre
registrar que a relevância dos softwares foi logo notada. Gildo Magalhães destaca que:
“A programação cedo se revelou como o ponto sensível sem o qual as
imensas máquinas que foram os primeiros computadores não poderiam
operar com eficiência. Um dos primeiros programas a serem construídos foi
o que traduzia linguagem digital (binária) das máquinas para linguagem
mnemônica, de fácil manipulação. surgiram assim as linguagens ditas
“científicas”: o FORTRAN (Formula Translator) foi inventado por John
Backus entre 1953 – 56; o LISP (List Processing) foi inventado
especificamente para aplicação aos problemas de “inteligência artificial”,
em 1956; o COBOL (Common Business Oriented Language) e ALGOL
(Algorithimic Language) são de 1960, enquanto que o PL/1 (de
“Programming Language”) é de 1964, mesmo ano do PASCAL; o BASIC
(Beginner's All Purpose Symbolic Instruction Code) é da década de
1970.”56
56
Idem, 1994, p. 55
31/08/2006 20060830_rbns.odt 39
“A IBM desvinculou seus preços e fornecimentos de software e de
serviços em 1968, uma decisão que foi encorajada pela ameaça de um
processo antitruste. A “dissociação” do software por parte do principal
fornecedor de hardware (...) abriu oportunidades para a expansão de
vendedores de software independentes”.57
Esta posição aliada ao surgimento do microcomputador, criação atribuída a David
Ahl quando trabalhava na Digital – que ignorou o invento dado sua capacidade reduzida –
abriu espaço para um novo tipo de desenvolvimento na indústria, permitindo que
florescesse a “cultura” dos microcomputadores58, algo muito importante para a discussão
sobre a propriedade dos softwares e das idéias.
“O que as grandes empresas (inclusive a IBM) não perceberam é que
estava se abrindo a oportunidade para a apropriação individual de uma
máquina que até então era o privilégio apenas das empresas, devido ao seu
alto custo. No ambiente glorificador do mito individualista corporificado
pelo movimento “hippie”, a Califórnia dos anos 70 sediaria também os
primeiros fabricantes de microcomputadores, como Apple, Commodore,
etc. Tardiamente tendo se dado conta do erro estratégico cometido, a IBM
começou a recuperar o terreno perdido, lançando seu próprio modelo de
microcomputador, chamado de “computador pessoal” (PC, de “personal
computer”).”59
57
MOWERY, David C., ROSENBERG, Nathan. Trajetórias da Inovação : A Mudança Tecnológica nos
Estados Unidos da América no Século XX. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005. p. 172
58
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992).
1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de
São Paulo, São Paulo. p. 58
59
Idem, 1994, p. 58
60
PARC = Palo Alto Research Center
31/08/2006 20060830_rbns.odt 40
sobre “interfaces de usuário” focadas no desenvolvimento de novos produtos, chegaram nas
fronteiras mais perceptíveis de nosso objeto de estudo.
O PARC, desenvolveu uma estação de trabalho gráfica, algo inédito até então,
denominada Xerox Star, onde o sistema operacional e a interface com o usuário eram
inteiramente gráficas, baseadas em metáforas visuais e ícones. Foram destas pesquisas do
PARC que surgiram elementos centrais nos sistemas operacionais atuais (e em outros
diversos tipos de softwares), itens como o mouse61, as interfaces de janelas, os menus
"dropdown" e os ícones. O primeiro resultado prático destas pesquisas surgiu com o “Alto”
(1972) uma máquina que não chegou a ser comercializada, e já em 1981 estava disponível o
“Star 8010 workstation” a primeira máquina comercializada a contar com um mouse e uma
interface gráfica.
Comercialmente, o projeto foi mal recebido, especialmente por seu elevado custo,
mas serviu de base e inspiração para que a Apple Computer, fundada por Steve Wozniak e
Steven Jobs, pudesse desenvolver seu novo PC, um microcomputador chamado LISA
(Local Integrated System Architecture), lançado em 1983.
A Apple já havia lançado outros computadores, mas o LISA contava então com 16
bits, e inovava com um sistema operacional de interface gráfica, ou seja, baseado em
windows (janelas), dois itens inovadores que estavam pela primeira vez disponíveis em um
computador pessoal com preço mais acessível.
Esta geração de máquinas da Apple também não foi um grande sucesso, muito
embora tenha sido comercializada até 1985 com o nome de Macintosh XL, mas teve o
mérito de abrir caminho para a geração seguinte, os agora denominados Apple Macintosh
de 1984, uma geração de microcomputadores que penetrou rapidamente o mercado
acadêmico dos EUA, tendo também boa aceitação na automação de escritórios. Foi um
sucesso de vendas, até hoje lembrado pela indústria como um dos mais revolucionários
microcomputadores de todos os tempos, pois trazia a integração de soluções gráficas, aliada
a potência e um mouse.
61
De fato o mouse fora oficialmente apresentado em uma demonstração pública em 9 de dezembro de 1968
por Douglas C. Englebart e sua equipe do Satnford Research Institute, um projeto em que vinham trabalhando
desde 1962. Mais detalhes em: <http://sloan.stanford.edu/mousesite/1968Demo.html>
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O grande sucesso comercial de seu hardware encontrou a jovem Apple sem
capacidade para atender à demanda por softwares, assim a empresa precisou recorrer a
desenvolvedores externos, favorecendo o cenário para que empresas especializadas em
software pudessem surgir e/ou crescer com a indústria; podese pensar em nomes como
Lotus, Novell e Microsoft como empresas que foram beneficiadas por este momento.
Mas apesar da demanda por computadores Apple, foi a IBM que obteve maior
sucesso na forma de comercialização e fabricação de seu produto, o IBMPC, aumentando
muito sua participação no mercado, apesar de rodar um sistema operacional que em
comparação com o do Macintosh poderia, já naquela época, ser considerado antiquado62.
O sistema operacional dos IBM PC era o MSDOS63 da Microsoft, que não contava
com interface gráfica e tinha todos os seus comandos controlados exclusivamente por
inputs de teclado; mais à frente, ainda neste capitulo será narrada a história do MSDOS.
“Tanto a entrada de fornecedores independentes de software quanto o
crescimento até a dominância da arquitetura do IBMPC estiveram
relacionadas com a decisão da IBM de obter a maioria dos componentes
para seu microcomputador de fornecedores externos, incluindo a Intel
(fornecedora do microprocessador) e a Microsoft (fornecedora do sistema
operacional do PC, MSDOS), sem forçálos a restringir as vendas desses
componentes a outros produtores”64
Apesar da tecnologia defasada, em favor da IBM pesavam os canais de distribuição
já bastante estabelecidos, representantes comerciais, uma campanha de marketing e a sua
reputação no mercado. Todos fatores que aliados a um pesado investimento na
reestruturação das linhas de produção e canais de distribuição fizeramna sobrepujar a
Apple e os demais concorrentes com relativa rapidez, assim, “para concorrer com a
florescente Apple, a IBM vendeu seu PC nas mais conhecidas lojas de departamento, como
62
Esta colocação parte da constatação de que um sistema baseado em interfaces amigáveis é mais moderno
que um sistema baseado exclusivamente em linha de comando, permitindo por exemplo uma melhor curva de
aprendizagem dos usuários.
63
Sigla de Microsoft Disk Operational System
64
MOWERY, David C., ROSENBERG, Nathan. Trajetórias da Inovação : A Mudança Tecnológica nos
Estados Unidos da América no Século XX. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005. p. 173.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 42
Sears e Macy's, o que foi fundamental para transformar o computador em nova mercadoria
de consumo”65.
Este cenário fez com que em poucos anos, a participação do Macintosh no mercado
mundial de desktops declinasse, de seu auge em 30 %, para os menos de 2 %, estimados
hoje em dia. A crise que se instalou com a sucessiva perda de mercado dos computadores
Apple para os PCs da IBM fez com que a companhia afastasse seu executivo fundador,
Steven Jobs em 1985, assustando os leais usuários do “Mac”. Um novo presidente, John
Sculley, que vinha da PepsiCola trazendo na bagagem novas técnicas de marketing,
conseguiu, por um período, fazer a empresa reagir, contudo, para esta pesquisa o interesse
por Sculley darseá mais à frente, como coadjuvante de um significativo detalhe no
desenvolvimento do Windows.66
3.2. Do nascimento da Microsoft67 à conquista do Desktop
Fundada em 1975 por William H. Gates III e Paul Allen – dois estudantes que se
conheceram por partilharem um hobby em comum: programar o computador PDP10 da
Digital Equipment Corporation – a Microsoft viria a se tornar um dos gigantes do setor de
informática.
Foi neste ano (1975) que a revista Popular Electronics68 publicou uma reportagem de
capa sobre o Altair 8800, considerado o primeiro computador pessoal. Reza a lenda que foi
este artigo que empolgou Gates e Allen a desenvolverem a primeira versão da linguagem de
programação conhecida como BASIC, pensada para funcionar no Altair.
65
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992).
1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de
São Paulo, São Paulo. p. 58
66
KAWASAKI, Guy. O Jeito Macintosh. São Paulo: Callis, 1993.
67
O nome da Microsoft era originalmente escrito desta forma: Microsoft.
68
Janeiro de 1975, Popular Electronics Magazine
31/08/2006 20060830_rbns.odt 43
desenvolver novas versões de BASIC para outras companhias do setor. A Apple Computer,
fabricante do Applle II, a Commodore, fabricante do PET, e a Tandy Corporation,
fabicante do Radio Shack TRS80, foram alguns dos primeiros clientes da Microsoft.
Mas o que determinaria o destino da Microsoft foi o contrato com a IBM, em 1980,
para escrever um sistema operacional para o IBM PC, microcomputador que seria lançado
no ano seguinte para concorrer com a Apple e outras empresas do segmento.
Com o pouco tempo disponível para realizar a tarefa, a Microsoft adotou aquela que
seria uma de suas principais práticas nos anos vindouros sempre que quisesse entrar em um
mercado que não fosse de sua expertise: comprou a solução de outra empresa.
69
O FORTRAN ou Formula Translator já era empregado em 1955 no IBM 704, tendo sido inventado por John
Backus em 1953.
70
MOWERY, David C., ROSENBERG, Nathan. Trajetórias da Inovação : A Mudança Tecnológica nos
Estados Unidos da América no Século XX. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2005. p. 173174.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 44
A aquisição foi o QDOS (Quick and Dirty Operating System) de Tim Paterson, um
programador de Seattle, por US$ 50.000,00; este sistema seria rebatizado para MSDOS ou
Microsoft Disk Operational System.
Na medida que as vendas do MSDOS disparavam, a Microsoft passou a ampliar
seu leque de produtos, desenvolvendo novos ou portando uma série de aplicativos
comerciais para serem utilizados nos IBMPC. Em 1982 lançou softwares como o
Multiplan, um programa de planilha de cálculo, e no ano seguinte um processador de
textos, denominado MSWord.
Conforme apresentado anteriormente a Microsoft foi uma das primeiras companhias
do setor que se dedicou a desenvolver aplicações para o Macintosh, o já mencionado
microcomputador lançado com grande sucesso pela Apple em 1984. Inicialmente a empresa
obteve um grande êxito de venda em programas para Macintosh como o Word (1983) que
fora escrito originalmente para os IBM/PC e portado em 1984 para os Macintosh, o
Multiplan, um software de planilhas para CP/M (um sistema operacional da Digital
Research), mais tarde portado para MSDOS e Macintosh.
No ambiente do MSDOS o Multiplan foi quase totalmente obliterado pela famosa
planilha de cálculos Lotus 123, da Lotus Development Corporation e mesmo o Word
passou a enfrentar forte competição de diversos concorrentes como WordStar e
WordPerfect. Porém de posse do sistema operacional que viria a se tornar o sistema
operacional de facto dos microcomputadores, em pouco tempo a Microsoft conseguiria
eliminar ou absorver a concorrência em quase todas as frentes.
Para ela persistia a necessidade de “evoluir” o MSDOS até o nível do sistema dos
Macintosh, agregando a interface gráfica ao sistema, o que traz Sculley de volta à cena.
Além de promover a recuperação nas vendas de computadores Macintosh, o executivo John
Sculley da Apple, deixou outra importante herança durante sua temporada à frente da
companhia. Foi Sulley quem firmou um acordo, autorizando a Microsoft, de Bill Gates a
utilizar a interface gráfica do sistema operacional Macintosh no desenvolvimento do
software que viria a ser batizado como Windows 1.0, lançado em 1985.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 45
O Windows conseguira se tornar viável no final da década de 1980, sendo não
exatamente um sistema operacional, mas uma interface gráfica para a utilização do MS
DOS71, passo necessário no rompimento de uma das principais barreiras à adoção mais
generalizada dos PCs, que careciam de um ambiente amigável, que não exigisse do usuário
comandos escritos, algo, como sabemos, há muito disponível no Macintosh.
Com o Windows era possível ampliar (ou tornar mais acessíveis) as funcionalidades
do MSDOS e incorporar, pela primeira vez às máquinas IBMPC com este sistema
operacional uma interface gráfica, simplificando o trabalho do usuário.
Como o contrato da Microsoft com a IBM permitialhe, de forma expressa, vender
seu sistema operacional para outras empresas e fabricantes, a Microsoft cresceu
praticamente junto com o próprio mercado de computadores pessoais. Em 1984 ela já havia
licenciado seu MSDOS para mais de 200 fabricantes de equipamentos e, assim, seu
sistema operacional se converteu no mais utilizado entre todos os PCs; aliese a isso o fato
de que para tornar o MSDOS mais amigável era necessário adquirir também o Windows
1.0 (1985) e temos o cenário que proporcionou à empresa um crescimento vertiginoso na
década de 1980.
Para fazermos curta uma história longa, reproduzimos abaixo um trecho da
reportagem "The Gates Operating System", publicada na revista TIME:
71
Para rodar o Windows 1.0 era necessário ter instalado no computador o MSDOS 2.0 (no disco rígido) e um
mínimo de 256 KB de RAM.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 46
"Logo depois que Gates apresentou seu programa Windows 3.0 em
1990, a indústria de softwares estava se entregando. Mais de 60 milhões de
cópias do programa Windows haviam sido vendidas, o que estabeleceu o
sistema operacional da Microsoft como o software padrão dos PCs e deixou
companhias como a Lotus e WordPerfect incomunicáveis (fora do padrão)
pois elas vinham criando aplicações para o sistema da IBM, o OS/2. Seis
anos após o lançamento do Windows a Microsoft domina os mercados de
processadores de textos e planilhas de cálculo."72
Este caminho levou a Microsoft a consolidar seu domínio mundial no campo dos
sistemas operacionais para computadores pessoais (PCs) e conseguir assim uma enorme
capacidade de fundos e penetração em diversos outros segmentos. A base deste domínio da
Microsoft estava então estabelecida: o controle sobre o sistema operacional e o conseqüente
controle sobre os softwares de escritório como planilhas e processadores de texto.
Em 1994 a Microsoft e o Departamento de Justiça firmaram um acordo em que a
Microsoft deveria abandonar práticas que foram consideradas abusivas, modificando a
forma de vender e conceder licenças de seus sistemas operacionais aos fabricantes de
computadores (OEM), e impedindo que fossem feitos contratos que exigissem a
exclusividade de instalação do Windows. O acordo também impedia a Microsoft de celebrar
contratos de confidencialidade (NDAs) com outros desenvolvedores de software, e impedia
que a Microsoft exigisse de seus parceiros a assinatura de qualquer contrato de
confidencialidade que os proibisse de desenvolver software para outras plataformas.
72
The Gates Operating System; TIME; JANUARY 13, 1997 VOL. 149 NO. 2; USA.
73
Federal Trade Commission, ou Comissão Federal do Comércio
31/08/2006 20060830_rbns.odt 47
Em 1991 a Microsoft e a IBM encerraram uma década de parceria, quando a IBM,
apercebendose das dimensões do mercado de softwares, e da centralidade dos sistemas
operacionais neste mercado, decidiu dar seqüência a um antigo projeto que tinha em
comum com a Microsoft, o sistema operacional OS/2 (lançado no mercado em 1987).
Defasado o OS/2 Warp, segunda versão do OS/2, este não encontrou espaço e nunca chegou
a ser um real concorrente para o Windows nos desktops.
O efetivo domínio da Microsoft nas redes corporativas aconteceria apenas com o
lançamento do Windows NT em 1993, seu primeiro sistema multitarefa e multiusuário de
32 bits. O Windows NT foi um lançamento de sistema operacional especialmente
desenhado para ambientes corporativos, onde foi introduzida uma Nova Tecnologia 74 de
controle de arquivos no disco, chamada NTFS que permitiu um SO semelhante aos UNIX,
com controle de usuários e permissões de leitura e gravação.
Em 1995 a Microsoft lançou o Windows 95, que trazia uma mudança sensível na
interface gráfica e não necessitava mais do MSDOS, sendo agora um sistema totalmente
gráfico. Multitarefa e com uma boa capacidade multimídia, o Windows 95 foi um
sucesso, passadas apenas sete semanas de seu lançamento haviam sido vendidas sete
milhões de cópias. A Microsoft passou ainda nesta época a operar também meios de
comunicação, instituindo empresas e divisões como The Microsoft Network (1995) e
MSNBC (1996).
A visão de Bill Gates de que haveria um computador em cada mesa de cada casa e
escritório75 foi realmente uma grande antecipação do que estava por vir, porém tanto o
executivo como a Microsoft falharam em ver algo realmente grande que vinha na mesma
direção: a Internet.
74
New Technology, ou NT
75
http://www.microsoft.com/billgates/speeches/industry&tech/iayf2005.asp
31/08/2006 20060830_rbns.odt 48
A Internet, ou melhor a WWW ou World Wide Web nasceu como uma estrutura
descentralizada de computadores em rede, capazes de comunicaremse entre si e manterem
a comunicação independente da perda de algum servidor (ou algum nó da rede). A idéia
original partira dos militares norteamericanos e depois expandiuse para o mundo
acadêmico, contando com diversos protocolos de comunicação e transferência de arquivos.
Já na metade de 1995 a Internet começou a ganhar especial atenção do público e da
mídia, sendo colocada por muitos analistas e veículos de comunicação como a derradeira
evolução da indústria da informática, trazendo promessas de novos paradigmas em
educação, comunicação, lazer e trabalho. Sem dúvida as promessas vinham embaladas no
tradicional exagero que acompanha o entusiasmo por novas tecnologias, mas neste caso
estavam ao menos parcialmente dentro do que aconteceria nos anos vindouros.
76
O Internet Explorer utilizava já desde sua primeira versão o código fonte do Mosaic Spyglass, que a
Microsoft licenciou da Spyglass, uma empresa de Internet originada dentro da Universidade de Illinois.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 49
quer exemplificar o poder disponível à Microsoft por controlar o mercado de sistemas
operacionais como o Windows. A estratégia da Microsoft consistiu em oferecer versões
grátis dos produtos para servidores que a Netscape comercializava, o que inicialmente não
teve grande efeito pois o mercado central da Netscape eram servidores SUN, rodando
UNIX, mas com a popularização do Windows NT a companhia foi sendo asfixiada pela
baixa em suas receitas. Além disso, a Microsoft passou a integrar o Internet Explorer em
seus produtos, alegando que não era um software, mas sim uma funcionalidade do sistema.
Em 1996 surgiu o Windows CE (Compact Edition), projetado para computadores
portáteis e outros aparelhos de pequeno porte e processamento que necessitem de um
sistema operacional, e em 1998 surgia o Windows 98 que corrigia inúmeras falhas de seu
antecessor e tinha como diferencial uma alardeada integração do SO com a Internet,
viabilizada pelo Internet Explorer 4, um software que vinha praticamente “soldado” ao
Windows e interagia com diversas funções do SO e com outras camadas de software.
Esta fusão do Internet Explorer ao Windows, que era apresentada como uma
evolução do sistema, era também um golpe mortal no browser Netscape, que não tinha a
mesma vantagem competitiva de vir préinstalado no sistema operacional, muito embora a
Netscape, sem condições de se manter na briga com a Microsoft, tinha sido comprada pelo
provedor de acesso e conteúdo América OnLine neste mesmo ano.
No final de 1997 o Departamento de Justiça acusou a Microsoft de violar o acordo
de 1994, obrigando os fabricantes de computadores que instalavam o Windows 95 a
31/08/2006 20060830_rbns.odt 50
incluírem o Internet Explorer como seu browser de Internet. O Governo alegou que a
companhia estava se aproveitando de sua posição no mercado de sistemas operacionais para
conseguir o monopólio dos browsers. Em sua defesa a Microsoft justificava que deveria ter
o direito de melhorar as funcionalidades do Windows, integrando o browser ao sistema
operacional, acrescentando a este funções e capacidade relativas ao acesso à Internet.
Também em fins de 1997 a Sun Microsystems processou a Microsoft, alegando que
esta havia descumprido o contrato pelo qual se permitia que a Microsoft utilizasse a
linguagem JAVA, um tipo de linguagem de programação desenvolvida pela SUN, com forte
característica de universalidade, que em tese permite que programas escritos nesta
linguagem sejam executadas em qualquer plataforma e/ou sistema operacional. A SUN
acusava a Microsoft de introduzir na linguagem melhoras específicas e exclusivas para o
Windows, o que na prática equivalia a minar a principal característica do JAVA, sua
capacidade multiplataforma.
Em novembro de 1998 um tribunal atendeu às demandas da SUN e sentenciou a
Microsoft a revisar seu software para atender os padrões e especificações de
compatibilidade com JAVA.
No início de 1998 a Microsoft chegou a um acordo com o Departamento de Justiça
no caso relativo ao processo de 1997 (onde foi acusada de violar o acordo de 1994). Este
novo acordo permitia aos fabricantes de PC oferecerem uma versão do Windows 95 sem
acesso ao Internet Explorer.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 51
O julgamento da Microsoft por violação das leis antimonopólio começou em
outubro de 1998, nele testemunharam executivos da Netscape, SUN e diversas outras
empresas de software e hardware, sobre seus contratos empresariais com a Microsoft.
Em novembro de 1999, o juiz norteamericano Thomas Penfield Jackson do tribunal
federal, declarou que a Microsoft detinha o monopólio do mercado de sistemas
operacionais, em abril de 2000 esse juiz declarou sua sentença contra a companhia por
haver violado as leis antimonopólio ao empregar táticas que minavam a competitividade.
Diretores da Microsoft qualificaram a decisão de pouco razoável e afirmaram que
ela poderia ser anulada com uma apelação para os responsáveis pelo caso no Departamento
de Justiça. Esta vitória repercutiria em benefício tanto dos consumidores como da própria
indústria.
A sentença que ordenou a divisão da empresa foi, possivelmente, a mais rigorosa
desde 1982, quando a justiça norteamericana eliminou o monopólio da AT&T no ramo das
77
http://www.cfoasia.com/archives/991038.htm
78
Lançado em 1999.
79
http://money.cnn.com/2000/06/07/technology/microsoft_ruling/
31/08/2006 20060830_rbns.odt 52
telecomunicações, desmembrando a empresa. O Juiz Jackson baseou sua decisão nas
recomendações do Departamento de Justiça, e a ordem do juiz estipulou que uma das
companhias deveria ocuparse dos sistemas operacionais, enquanto a outra dos softwares de
aplicações e de serviços, como o MS Office, MS Exchange, a enciclopédia eletrônica
Encarta e os serviços de Internet oferecidos via MSN. Ainda segundo a decisão, os altos
executivos da empresa, entre eles Bill Gates e Steve Ballmer, deveriam escolher para qual
das duas novas empresas iriam trabalhar.
Na época o juiz afirmou que se vira forçado a tomar esta decisão porque
“relutantemente cheguei a conclusão que uma punição estrutural se tornou imperativa: a
Microsoft da maneira que está atualmente organizada e conduzida é incapaz de aceitar a
noção de que infringiu a lei ou cumprir uma decisão corrigindo sua conduta.”80.
Os representantes da Microsoft reagiram violentamente à decisão de Jackson de não
concederlhes o tempo que solicitaram para preparar e apresentar argumentos contra a
decisão. Especialistas em jurisprudência questionaram o abrupto final dado ao caso com
esta decisão do juiz Jackson, e os advogados da Microsoft expressaram sua confiança na
atuação do Tribunal de Apelações do Distrito de Colúmbia e recordaram que este tribunal já
havia contestado uma decisão de Jackson em 1998 e determinou que a companhia tinha
direito de fundir o Internet Explorer com o Windows se isso resultasse em benefício para o
consumidor.
80
http://money.cnn.com/2000/06/07/technology/microsoft_ruling/
31/08/2006 20060830_rbns.odt 53
Jackson ordenou deixar em suspenso o plano de divisão até que fosse cumprida a
fase de apelações. Em 20 de junho, inesperadamente, o juiz alterou sua opinião e obrigou a
empresa a mudar suas práticas comerciais até que um tribunal superior decidisse sobre o
caso. Ao mesmo tempo, posicionouse favoravelmente ao Departamento de Justiça e
decidiu enviar o caso para o Supremo Tribunal. Este, por sua vez, poderia dar andamento ao
caso ou devolvêlo ao Tribunal de Apelações.
Assim, o Windows como o conhecemos tem parte de sua origem no QDOS de Tim
Paterson, no Xerox Star e na interface dos Macintosh., já o outro sistema operacional objeto
de nossa análise, o Linux, deriva sua origem de um sistema operacional mais antigo, e
durante um bom tempo mais sofisticado81, o UNIX.
Criado nos Bell Laboratories82 o UNIX teve sua primeira versão compilada em
196983, e no que diz respeito a sua arquitetura e premissas o Linux é considerado um
“clone84” do UNIX utilizando inclusive a mesma nomenclatura em seus comandos
operacionais principais .
Enquanto o sistema operacional MSDOS e sua evolução, o Windows, avançavam
no domínio do mercado mundial de desktops, o UNIX e seus diversos clones tornavamse a
opção do mercado de servidores, tinham boa penetração entre pesquisadores,
81
Como exemplo dessa sofisticação podese indicar a existência de diferentes usuários com perfis próprios e a
faculdade de atribuir permissões de acesso aos arquivos
82
http://www.belllabs.com/history/unix/
83
http://cm.belllabs.com/cm/cs/who/dmr/hist.html
84
A popularidade do sistema UNIX, que em geral é atribuída às suas capacidades e arquitetura, fez com que
surgissem diversos “clones”, ou seja, outros sistemas operacionais que emulam seus conceitos. Alguns destes
clones são: HPUX (da HewlettPackard), Solaris da SUN Microsystems, MINIX e Linux.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 54
departamentos de ciência da computação e no meio acadêmico universitário em geral,
possivelmente por suas características de arquitetura e administração, então sem
similaridade nos produtos da Microsoft.
3.3. O nascimento do Linux
“From: torvalds@klaava.Helsinki.FI (Linus Benedict Torvalds)
Newsgroups: comp.os.minix
Subject: What would you like to see most in minix?
Summary: small poll for my new operating system
Keywords: 386, preferences
MessageID: 1991Aug25.205708.9541@klaava.Helsinki.FI
Date: 25 Aug 91 20:57:08 GMT
Organization: University of Helsinki
Lines: 20
Olá a todos aí fora usando minix
Eu estou fazendo um sistema operacional (grátis) (é só um passatempo, não vai ser grande e
profissional como o gnu) para clones 386(486)AT. Ele tem fermentado desde abril, e está
começando a ficar pronto. Eu gostaria de comentários sobre coisas que as pessoas
gostam/desgostam no minix, uma vez que meu SO lembrao de alguma forma (mesma organização
física do sistema de arquivos (devido a razões práticas) entre outras coisas).
Eu já portei o bash (1.08) e o gc(1.40), e as coisas parecem funcionar.
Isso sugere que eu vou conseguir algo prático em alguns poucos meses, e eu gostaria de saber quais
as funções que a maioria das pessoas quer. Qualquer sugestão é bemvinda, mas eu não vou
prometer que vou implementálas :)
Linus (torvalds@kruuna.helsinki.fi)
PS. Sim ele está livre de qualquer código do minix, e tem um fs (file system sistema de arquivos)
de múltiplas transações.
Ele NÃO é portável (utiliza chaveamento de tarefas do 386 etc), e ele provavelmente nunca irá
suportar qualquer coisa além de discos rígidos AT, uma vez que são tudo o que tenho :(.85”
85
Texto Original: “Hello everybody out there using minix
I'm doing a (free) operating system (just a hobby, won't be big and professional like gnu) for 386(486) AT
clones. This has been brewing since april, and is starting to get ready. I'd like any feedback on things people
like/dislike in minix, as my OS resembles it somewhat (same physical layout of the filesystem (due to
practical reasons) among other things).
31/08/2006 20060830_rbns.odt 55
Com esta mensagem, em 1991 Linus Torvalds deu início ao processo de construção
coletiva do sistema operacional Linux, um sistema operacional “tipo X”86.
O embate entre Windows e Linux traz, além do mérito técnico de cada sistema
operacional, uma avaliação e ponderação sobre as soluções tecnológicas e as metodologias
adotadas em cada sistema, que acabam evidenciando questões ideológicas em seara que
seria inicialmente apenas técnica.
3.4. O GNU/Linux e a antiga novidade do Software Livre
Linus (torvalds@kruuna.helsinki.fi)
PS. Yes it's free of any minix code, and it has a multithreaded fs.
It is NOT protable (uses 386 task switching etc), and it probably never will support anything other than AT
harddisks, as that's all I have :(.”
86
Diz se sistema “tipo X” quando um sistema operacional é derivado do UNIX.
87
GNU é um acrônimo recursivo para "GNU's Not Unix", um tipo de piadinha recorrente entre os hackers e
geeks. A página oficial do projeto GNU na internet (http://www.gnu.org/gnu/gnuhistory.html) oferece a
seguinte explicação sobre a sigla: "O nome 'GNU' foi escolhido porque atende alguns requisitos; primeiro, era
um acrônimo recursivo para 'GNU não é Unix' (GNU's Not Unix), segundo, porque era uma palavra
verdadeira, e terceiro, era divertida de dizer (ou cantar)."
31/08/2006 20060830_rbns.odt 56
Esta idéia ganhou força inicialmente na comunidade acadêmica e já em 1989 a
Universidade da California em Berkeley lançaria alguns softwares livres (protocolos e
ferramentas para rede) sob outra licença a Berkeley Software Distribution ou BSD como é
conhecida, e em 1991 sob a mesma licença quase todo o código fonte de seu clone do Unix,
o BSD Unix.
Assim dois aspectos fundamentais separam os dois sistemas operacionais que
analisamos, o primeiro sua maneira de licenciamento, enquanto o Windows vende licenças
de utilização para seu software compilado, o Linux é licenciado sob a égide do Software
Livre que permite a livre distribuição e utilização do software. Isso não significa apenas
uma diferença de custos, mas na verdade uma diferença de conceitos, em tese um usuário
do Linux pode ter acesso ao seu código fonte e fazer alterações diretamente no coração do
sistema, algo não permitido no Windows.
Esta primeira dicotomia, leva à segunda que é também relevante para este trabalho, a
forma de desenvolvimento das duas tecnologias. Além de estarem historicamente
enraizados em conceitos diferenciados os dois sistemas operacionais são desenvolvidos
dentro de duas lógicas completamente diferentes, o Windows tem uma equipe (ou equipes)
de desenvolvimento, que trabalham o código (ou parte do código) sem contato com o
mundo exterior e atendendo apenas as demandas internas de cada departamento ou líder de
projeto, construindo funcionalidades e otimizações que além de se originarem em
necessidades técnicas também são geradas por departamentos de marketing e mesmo por
psicólogos. Já o Linux, inserese em um anárquico processo de criação coletiva, sofrendo
interferências de programadores de diferentes países, companhias e formações. Parte de
nosso trabalho consiste em identificar até que ponto estas diferentes formas de
desenvolvimento e de licenciamento interferem nos rumos tomados pela tecnologia de cada
sistema operacional.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 57
3.5. Visões de Mundo.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 58
que passam não só pela busca da superação técnica do antagonista, mas também pela
conquista dos corações e mentes dos usuários, das empresas e dos governos.
Novamente não é uma análise de mérito quanto à qualidade de cada tecnologia que se
busca aqui, algo fora dos propósitos do texto, mas sim evidenciar que ainda que se pretenda
o contrário, para o desenvolvimento tecnológico, o futuro não está dado e não é certo, e que
críticas ao atual raciocínio economicista dominante podem surgir mesmo no interior dos
mecanismos que originalmente o haviam engendrado, sendo capazes de derivar em formas
de resistência. No fim as escolhas tecnológicas parecem estar marcadas de maneira
indelével por diferentes visões de mundo.
Aqui buscamos retratar o quanto da disputa pela técnica e pela tecnologia é
determinada por aspectos comerciais, ideológicos e passionais, pretendendo produzir um
resgate histórico e analítico dos discursos de dois universos coexistentes e antagônicos da
microinformática: a lógica empresarial já solidamente consolidada do software proprietário
e a recente alternativa a esta lógica proposta pelo movimento do Software Livre.
Uma vez que o Software Livre é alternativa de desenvolvimento tecnológico de
natureza difusa é impossível que seja identificado com uma única entidade ou grupo (já que
diferentes empresas, governos, ONGs e comunidades o representam e/ou advogam em seu
favor), aqui trabalharemos com duas vertentes, a forma de licenciamento GNU/GPL e o
sistema operacional Linux que dela faz uso. Na defesa das posições do software proprietário
e em oposição ao ideário do Software Livre, posicionamos a Microsoft Corporation – sem
dúvida um dos maiores expoentes deste outro modelo de desenvolvimento tecnológico.
Antes de avançarmos cabe breve conceituação sobre Software Livre e software
proprietário: o software proprietário é o software desenvolvido e comercializado por uma
determinada empresa da mesma maneira que um produto tradicional.
Porém a empresa tem sobre este produto (que é um produto essencialmente
intelectual) direitos de propriedade ainda mais abrangentes do que em outros segmentos,
podendo legalmente impedir o consumidor final de utilizar, copiar, distribuir, revender e
alterar o software da maneira que bem entender, algo por exemplo impensável com um
automóvel. O usuário fica portanto restrito aos termos de licenciamento do fabricante do
software.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 59
O software proprietário é o modelo mais conhecido de licenciamento de software, mas
é um modelo que vem sendo constantemente desafiado pelo Software Livre, que pode ser
definido da seguinte maneira:
88
CASSIANO, João. Cidadania Digital: Os Telecentros do Município de São Paulo. In: SILVEIRA, Sérgio
Amadeu da., CASSIANO, João (Org.) Software Livre e Inclusão Digital. São Paulo: Conrad Editora do
Brasil, 2003.
89
PC = Personal Computers, ou Computador Pessoal.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 60
3.6. O Linux e o movimento do Software Livre pelos olhos da
Microsoft, o Windows e a Microsoft pelos olhos do movimento do
Software Livre.
"Com as palavras todo cuidado é pouco, mudam de opinião como as pessoas."
José Saramago As Intermitências da Morte pg. 69
Roszack90 rememora que o espírito dos jovens técnicos que iniciaram a revolução da
microeletrônica nos EUA era o espírito do movimento “hippie”, a idéia de “compartilhar”
o fruto do trabalho estava na base do que viria a ser conhecido como a cybercultura, os
computadores pessoais eram per si socialmente revolucionários quando começaram a
surgir, ou pelo menos assim pensava uma grande parcela dos pioneiros.
Mas tão logo sua importância econômica tornouse evidente, ganhou força o
movimento de refluxo neste conceito de compartilhar, logo considerado amador e
inadequado ao mundo empresarial. Já em 1976 Bill Gates alertava para o problema da
pirataria, em sua uma “Carta aberta aos Hobistas91” onde acusava os entusiastas amadores
(hobbyists) de roubarem seu software e desta forma prejudicarem as possibilidades de
evolução, já que sem os dividendos ele não poderia contratar programadores para
aperfeiçoar os softwares.
Esta carta é nosso ponto de partida para a análise dos diferentes discursos envolvidos
na acirrada contenda dos sistemas operacionais que eclodiria com força total um quarto de
século adiante.
90
ROSZAK, Theodore. The Cult of Information : A NeoLuddite Treatise on High Tech, Artificial
Intelligence, and the true Art of Thinking. New York : Pantheon Books, 1986.
91
“Bill Gates is one of the first programmers to raise the issue of software piracy. In "An Open Letter to
Hobbyists," first published in MITS Computer Notes, Gates accuses hobbyists of stealing software and thus
preventing "...good software from being written." He prophetically concludes with the line, "...Nothing would
please me more than being able to hire ten programmers and deluge the hobby market with good software."”
Disponível em: Key Events in Microsoft History key_events_in_microsoft_history.doc (83 KB) em:
http://www.microsoft.com/downloads/info.aspx?na=46&p=4&SrcDisplayLang=en&SrcCategoryId=&SrcFam
ilyId=b604bb057c33464396b4
38e06383bda5&u=http%3a%2f%2fdownload.microsoft.com%2fdownload%2f6%2f3%2fa%2f63a018ae711f
4edb8b79ca109e5eed07%2fkey_events_in_microsoft_history.doc
31/08/2006 20060830_rbns.odt 61
Até 1999 o movimento do Software Livre foi solenemente ignorado pela Microsoft,
tratado como algo interessante para estudantes, mas inescapavelmente amador. Porém, neste
ano “vazou” o notório "Halloween Memo92" que trazia a primeira “imagem semipública de
reconhecimento do Software Livre como ameaça competitiva”93.
Neste documento interno da Microsoft eram apontados alguns aspectos considerados
nevrálgicos sobre o Software Livre, entre os quais o fato de representar uma ameaça direta à
Microsoft, especialmente no mercado de servidores; trazer um problema prático da
percepção de custo zero do Software Livre contra o modelo de licenças da Microsoft; a
constatação de que qualidade comercial poderia sim ser atingida e até excedida pelo
Software Livre.
O documento trazia ainda a concepção que uma política de FUD 94 não poderia ser
sustentada no longo prazo e que o ideal seria combater o conceito de Software Livre e não
uma companhia específica.
Além disto o mais interessante eram algumas constatações como a enormidade da
comunidade envolvida, com milhares de pessoas envolvidas em um desenvolvimento
simultâneo de velocidade sem precedentes, valendose de seu tempo livre e trabalhando
sem um objetivo financeiro imediato.
Apesar da idéia de que a política de FUD não teria como ser mantida no longo prazo,
sem dúvida, ela não foi evitada pela Microsoft e em 2000, durante o Microsoft's Annual
Financial Analysts Meeting, Steve Ballmer, agora presidente executivo da Microsft,
declararia:
92
Vide: http://www.catb.org/~esr/halloween/
93
DIBONA, Chris; STONE, Mark; COOPER, Danese (Eds.). Open Source 2.0. O'Reilly Media. ISBN
0596008023.
94
FUD é a sigla de Fear, Uncertanty, Doubt (ou em português Medo, Incerteza, Dúvida). Tratase de uma
técnica de marketing, pouco ética porém largamente difundida baseada na propagação de desinformação. Na
prática consiste em espalhar boatos que desacreditem um produto ou um concorrente, em geral no que tange à
qualidade, preço e sua capacidade de se manter no mercado. Um FUD pode incluir ainda confusão proposital
de conceitos, ameaças jurídicas fictícias e relatos inverídicos corroborando as testes sustentadas. Na
atualidade é comum associar a prática de FUD com a Microsoft dadas suas práticas em relação aos
concorrentes, mas em geral a primeira larga utilização de FUD no mercado de informática é atribuída a IBM
nos anos de 1970, quando preparavase para entrar no mercado dos computadores pessoais e desencadeou
diversas campanhas contra os concorrentes por meio de seus canais de vendas.
Mais informações sobre a história do FUD podem ser encontradas neste endereço:
<http://web.archive.org/web/20020807000404/www.geocities.com/SiliconValley/Hills/9267/fuddef.html>.
Acesso em: 27 abr. 2006 ou em <http://www.catb.org/~esr/jargon/html/F/FUD.html>. Acesso em: 01 jul. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 62
"Não há uma empresa chamada Linux, mal há um roadmap 95 do
Linux. Ainda assim o Linux brota organicamente da terra. E ele tem, você
sabe, as características do comunismo que as pessoas amam tanto, tanto
nele. Que são, ele é grátis.”96
Qualquer que fosse o tom de vermelho com que o pinguim 97 do Linux estivesse sendo
pintado ele seria logo coberto de um azul 98 bem capitalista pela IBM, que anunciou em
dezembro planos de investir 1 bilhão de dólares em Linux ao longo do ano seguinte 99, de
longe o maior investimento feito até então em um Software Livre e sem dúvida um fator de
atenção adicional em Redmond100.
Logo em seguida, em fevereiro de 2001101 Jim Allchin, executivo responsável pelo
Windows dentro da Microsoft, alertava sobre os danos que seriam causados por softwares
livremente diustribuídos como o Linux e sobre a necessidade de tornar isto claro aos
legisladores, para que eles entendessem a ameaça. Em junho do mesmo ano, em uma
entrevista ao jornal Chicago SunTimes102, novamente Ballmer, deixou claro como via o
movimento do Software Livre, elaborando com mais objetividade o ponto de vista esboçado
por Allchin: "
95
Roadmap, ou mapa da estrada é o termo utilizado para descrever as funcionalidades previstas para cada
nova versão de um software a ser lançada.
96
MS' Ballmer: Linux is communism. Disponível em:
<http://www.theregister.co.uk/2000/07/31/ms_ballmer_linux_is_communism/>. Acesso em: 12 jul. 2005
97
O mascote e símbolo do Linux é um pinguim, animal admirado por Linux Torvalds. O pinguim do Linux foi
batizado de Tux, derivado de “tuxedo” (fraque), dada a brincadeira de dizer que os pinguins estão vestidos
com esta roupa.
98
O azul é a cor da IBM, às vezes também referida como “Big Blue”.
99
WILCOX, Joe. IBM to spend $1 billion on Linux in 2001 : CNET News.com. Dez. 2000. Disponível em:
<http://news.com.com/21001001249750.html?legacy=cnet>. Acesso em: 18 abr. 2006.
100
Redmond é o local da sede da Microsoft nos EUA. No jargão da indústria é comum que se refira a
Redmond para falar da Microsoft.
101
Microsoft Executive Says Linux Threatens Innovation. Disponível em: <http://www.news.com>. Acesso
em: 15 dez. 2004; <http://www.linuxtoday.com/news_story.php3?ltsn=2001021500806PSMS>. Acesso
em: 12 set. 2005; <https://www.linux.org/news/2001/02/14/0002.html>. Acesso em: 12 set. 2005
102
NEWBART, Dave. Microsoft CEO take launch break with the SunTimes : Chicago SunTimes, 2001.
Disponível em: <http://www.suntimes.com/output/tech/cstfinmicro01.html>. Acesso em: 5 jun. 2001;
Disponível em: <http://nl.newsbank.com/nl
search/we/Archives?p_product=CSTB&p_theme=cstb&p_action=search&p_maxdocs=200&s_dispstring=(bal
lmer)%20AND%20AND%20date(5/31/2001%20to%206/2/2001)&p_field_date
0=YMD_date&p_params_date0=date:B,E&p_text_date
0=5/31/2001%20to%206/2/2001)&p_field_advanced0=&p_text_advanced
0=(%22ballmer%22)&p_perpage=10&p_sort=YMD_date:D&xcal_useweights=no>
31/08/2006 20060830_rbns.odt 63
Linux é um câncer que se fixa no sentido de propriedade intelectual em tudo o que
toca (...) Pela maneira como a licença é escrita, se você quiser utilizar um software open
source, você têm que fazer o resto do seu software Open Source". Assim não restaram
dúvidas sobre o que afinal deveria ser explicado aos legisladores de acordo com a ameaça
vislumbrada de dentro da Microsoft.
Menos de vinte dias depois, uma entrevista de Bill Gates reforçava estas idéias e
eliminava qualquer dúvida sobre se a Microsoft tinha ou não uma política de FUD em
andamento, em um primeiro momento o objetivo parece efetivamente ser o de criar
confusão sobre os termos pertinentes ao Software Livre e caracterizálos com cores
comunistas ou pelo menos anticapitalistas.
“Há uma parte do Open Source chamada GPL que interrompe aquele
cicloque é, ele torna impossível para uma companhia comercial utilizar
qualquer parte daquele trabalho ou construir sobre qualquer parte daquele
trabalho. Então o que você viu com o TCP/IP ou (tecnologia de email)
Sendmail ou o browser nunca poderia ter acontecido. Nós acreditamos que
deve existir software grátis e software comercial; que deve existir um rico
ecossistema que trabalhe em torno disto. Existem pessoas que acreditam
que o software comercial não deve existir sob nenhuma formaque não
devem existir empregos ou impostos em torno do software comercial. E este
é um grupo pequeno, mas a GPL foi criada com este objetivo em mente.
E assim, as pessoas devem entender a GPL. Quando as pessoas dizem
Open Source elas em geral querem dizer GPL. Quando alguém faz uma
pergunta, “E que tal Open Source?” eles querem dizer Open Source ou eles
querem dizer a GPL?
Nós acreditamos naquele ecossistema e em ter um mix de software
comercial e grátis.”103
103
RICCIUTI, Mike . Gates' grand design : CNET News.com, Jun. 2001. Disponível em:
<http://news.com.com/Gates+grand+design/20091082_3268707.html>. Acesso em: 22 mar. 2005.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 64
Em 2002 a Microsoft já admitia o Linux como um competidor que viera para ficar, e
novamente declarava na voz de Ballmer:
"Nós temos que competir com software grátis, em valor, mas de uma
maneira esperta. Nós não podemos precificar a zero, então nós precisamos
justificar nossa postura e precificação. O Linux não vai desaparecernosso
trabalho é fornecer um produto melhor no mercado."104
Assim parece claro que desde os primeiros momentos de consolidação do Software
Livre a Microsoft esteve consciente da ameaça que estava colocada ao seu modelo de
negócios. Pela primeira vez as estratégias empresariais a que se acostumara não valeriam,
não havia uma companhia específica para combater ou comprar, nem tão pouco era possível
oferecer ao mercado um produto competitivo com um preço mais atraente, como constatava
o próprio Ballmer com certa perplexidade em dezembro de 2003 ao falar do Linux:
“É um concorrente esquisito. Não há uma empresa por trás dele. Você
não sabe exatamente quem o faz. Ele é grátis. Eu prefiro dizer: “Olhe, o que
temos aqui é uma pequena desvantagem no preço.” É a primeira vez que
temos uma desvantagem no preço.”105
Ainda em 2002 fora fundado o consórcio UnitedLinux, que tinha o objetivo de
consolidar e padronizar diversas distribuições Linux, que eram populares em pontos
geográficos distintos, dando origem a uma única e nova distribuição. A idéia era tanto
fundir as qualidades específicas de cada distribuição quanto produzir um sistema que fosse
global, unificado e capaz de fazer frente ao Windows.
O consórcio era composto pela norteamericana Caldera (mais tarde renomeada de
Santa Cruz Operation, ou SCO), pela brasileira Conectiva (mais tarde adquirida por uma
distribuição francesa chamada Mandrake, de cuja fusão resultou a Mandriva), pela SUSE
104
JUDGE, Peter. Ballmer: We'll outsmart Open Source : ZDNet News. Set. 2002. Disponível em:
<http://news.zdnet.com/21003513_22959112.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.
105
Steve Ballmer On Microsoft's Future : BusinessWeekOnline, Jan. 2003. Disponível em:
<http://www.businessweek.com/magazine/content/03_48/b3860078_mz063.htm>. Acesso em: 18 abr. 2006.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 65
LINUX (distribuição alemã considerada a mais popular da Europa) e pela Turbolinux
(distribuição asiática).
O consórcio lançou uma única versão e nunca chegou a dar efetivamente certo, fato
que atribuímos em especial a uma mudança de postura de um dos participantes e ao fato de
não ter contado com a adesão da Red Hat, então a distribuição mais importante, e do
Debian, uma das mais populares entre os antigos usuários do Linux.
Porém independente do insucesso deste consórcio, em 2003 o combate dos sistemas
operacionais já se dava em campo aberto, e se Ballmer afirmava que não havia uma
empresa por trás do Linux, também poderia ter afirmado que havia várias.
Cada vez mais empresas passaram a basear seus negócios em Linux para competir
com a Microsoft; além da IBM e seu mega investimento outras companhias de vulto
aderiam ou erguiamse diretamente do Software Livre. Empresas como a novata Red Hat,
fundada em 1993 com o objetivo de distribuir e dar suporte ao Linux, mantenedora de uma
das distribuições mais populares na América do Norte e que viu seu negócio crescer no
mesmo rítimo do Software Livre. Ou a Novell, talvez o mais ilustrativo exemplo das novas
possibilidades colocadas pelo Software Livre.
A histórica Novell, uma empresa de softwares fundada em 1979, que competiu no
mercado de sistemas operacionais e chegou a dominar o filão das redes corporativas nos
anos 80 com o seu lendário “NetWare”, constitui um sólido exemplo de empresa quase
colocada fora do mercado com a ascenção dos produtos de rede e dos sistemas operacionais
da Microsoft.
Iniciando um reposicionamento estratégico em janeiro de 2004 a Novell mudou
radicalmente sua inserção no mercado de softwares, adquiriu a SUSE, principal distribuição
Linux da Europa, alterou sua estratégia de ação e fez investimentos pesados em Linux, e
desde então vem tentando – com relativo sucesso – se equilibrar na fina linha entre
Software Livre e Software Proprietário.
Assim, mesmo com o confortável virtual monopólio dos sistemas operacionais dos
microcomputadores desktop, a Microsoft passou a enfrentar dificuldades em setores
específicos com a ascensão do Linux, setores como servidores de Internet e super
computadores apenas para nomear dois nichos.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 66
Um movimento inesperado, que pegou o mercado de tecnologia de surpresa,
aconteceu em março de 2003 quando uma empresa membro da iniciativa United Linux, a
Caldera, agora adotando o nome de SCO (Santa Cruz Operation), para espanto geral
processou a IBM em mais de 1 bilhão de dólares, alegando que os investimentos desta
empresa no Linux violavam e tornavam públicos códigos UNIX, de propriedade da SCO,
que agora estariam inseridos no Linux.
A SCO afirmava ser, em um complicado emaranhado de transferências, compras e
fusões a atual proprietária das patentes do UNIX, e que estas estariam sendo violadas pela
IBM e por qualquer empresa, indivíduo ou Governo que utilizasse o Linux.
A resposta da IBM foi contraprocessar a SCO, seguida logo depois pela Red Hat em
um processo onde afirma que as alegações da SCO prejudicam seu negócio 106; ainda para
continuarmos falando dos advogados e de táticas de FUD a SCO passou a enviar cartas para
grandes corporações usuárias de Linux, alertandoas sobre a possibilidade de virem a ser
processadas por violação de sua propriedade, e em Novembro a SCO finalmente passou da
ameaça à ação processando as empresas AutoZone e DaimlerChrysler107. Red Hat, Novell, e
HP prontamente passaram a oferecer proteção legal a seus clientes e o OSDL (Open Source
Development Labs) criou um fundo para defesa contra processos.
Não é razoável sugerir que a Microsoft estivesse envolvida nas demandas da SCO
(como muito da imprensa especializada aventou na época) 108, mas o movimento foi
providencial e com um bom senso de oportunidade a Microsoft rapidamente licenciou o
código fonte e patentes do UNIX da SCO com o objetivo declarado de deixar claro que a
"Microsoft respects legitimate licenses, and Microsoft took that license (from SCO)."
106
Detalhes sobre o andamento do processo, seus desdobramentos e outras questões de Propriedade Intelectual
podem ser acompanhadas no site <http://www.groklaw.net>. Mas cabe apontar que até o momento (julho de
2006) a SCO falhou em todas as oportunidades de demonstrar onde e quais de suas patentes teriam sido
infringidas, encaminhando o processo para um vitória quase certa da IBM, de forma que em geral a imprensa
especializada da indústria já raramente menciona os desdobramentos do processo.
107
SHANKLAND, Stephen. SCO suits target two big Linux users : CNET News.com. Mar. 2004. Disponível
em <http://news.com.com/210010145168921.html>. Acesso em: 18 abr. 2006
LYMAN, Jay. SCO Sues DaimlerChrysler, AutoZone : www.TechNewsWorld.com / LinuxInsider. mar. 2004.
Disponível em <http://www.linuxinsider.com/story/33031.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.
108
SHANKLAND, Stephen. Fact and fiction in the MicrosoftSCO relationship : CNET News.com / ZDNet
News. Nov. 2004. Disponível em <http://news.zdnet.com/21003513_225450515.html>. Acesso em: 18 abr.
2006.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 67
O efeito colateral deste licenciamento foi, além de um reforço na política de FUD,
alguma injeção de fundos no caixa da SCO que vinha apresentando balanços
sucessivamente negativos, e que após a divulgação do acordo viu suas ações subirem quase
38%109. Estes aportes de fundos deram à SCO fôlego para seguir com os processos.
Assim, a questão principal da argumentação desenvolvida no capítulo sobre a
propriedade das idéias, é novamente colocada, agora no mundo dos sistemas operacionais.
Já que o Linux não pode ser comprado, apropriado, ou diretamente processado, podese
utilizar o sistema de proteção intelectual estabelecido, o sistema de patentes, contra os seus
desenvolvedores e até contra os seus usuários. O raciocínio é linear: na impossibilidade de o
superar, destruir ou assimilar, resta a possibilidade de o proibir.
Assim, se em um primeiro momento, possivelmente pega de surpresa com o veloz
crescimento do Linux, a estratégia defensiva da Microsoft foi a de rotular o Linux como
brinquedo e depois como algo antiamericano, uma nova possibilidade de barrar o avanço
do concorrente (e dos Softwares Livres em geral) passa a ser a possibilidade de valerse do
sistema legal norte americano. Tendo sido tantas vezes arrastada as barras do tribunal por
concorrentes, consumidores e órgãos governamentais ao redor do globo, a idéia até que faz
bastante sentido.
Em 2004 Ballmer, falando a líderes asiáticos, mencionou, de passagem, um estudo do
qual ficara sabendo, onde o Linux estaria violando mais de 200 patentes 110, algumas delas
da Microsoft, e claro, eles (a Microsoft) “ deviam algum tipo de estratégia a seus
acionistas”. Depois, com a repercussão que encontraram na Internet, os comentários foram
oficialmente desmentidos pela Microsoft, que alegou uma interpretação errônea das
palavras de seu presidente executivo. Contudo, desde a ação da SCO contra a IBM, a
109
LaMONICA, Martin. RICCIUTI, Mike. Microsoft sends message with Unix deal : CNET News.com. Mai.
2003. Disponível em <http://news.zdnet.com/21003513_221007715.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.
Microsoft Licenses Unix From SCO : Wired News. Mai. 2003. Disponível em:
<http://www.wired.com/news/business/0,1367,58904,00.html>. Acesso em: 18 abr. 2006.
110
KERNER, Sean Michael. Linux's Patent Risk. : InternetNews. Ago. 2004. Disponível em:
<http://www.internetnews.com/devnews/article.php/3389071>. Acesso em: 18 abr. 2006.
VAUGHANNICHOLS, Steven J. Author of Linux Patent Study Says Ballmer Got It Wrong. : Eweek.com.
Nov. 2004. Disponível em: <http://www.eweek.com/article2/0,1759,1729908,00.asp>. Acesso em: 18 abr.
2006.
FOLEY, Mary Jo. Is Microsoft Rattling the LinuxPatent Sabers? : Eweek.com. Nov. 2004. Disponível em:
<http://www.microsoftwatch.com/article2/0,1995,1729352,00.asp>. Acesso em: 18 abr. 2006.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 68
questão das patentes vem sendo a principal ameaça ao Linux, dando inclusive origem a um
movimento contrário à aprovação de leis que regulamentem patentes de softwares – que
seriam em última análise, patentes de idéias.
É oportuno lembrar que foram justamente patentes de softwares e acusações de
pirataria que que ajudaram a derrubar a Política Nacional de Informática, durante a
redemocratização do Brasil, como será melhor elaborado na segunda metade do capítulo
quatro111.
A leitura dos documentos oficiais da Microsoft, mantidos em seu site de relações com
os investidores permite traçar a mudança que se processou na cultura da empresa em
relação à ameaça do Linux e dos Softwares Abertos.
Em julho de 2003 Bill Gates, em um encontro com analistas financeiros,
comentando o processo da SCO dava como certo que a propriedade intelectual da Microsoft
e de muitas outras empresas estava sendo utilizada e clonada pelo movimento do Open
Source:
“BILL GATES:
111
Sobre este tema ver: COSTA MARQUES, Ivan da. Cloning Computers: From Rigths of Possession to
Rigths of Creation. In: Science as Culture. Routledge, Jun. 2005. Vol. 14, No. 2, 139160. e SANTOS
FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto desenvolvimentista na
formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992). 1994. 280f. Tese
(Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São
Paulo.
112
Financial Analyst Meeting Executive Q&A : MSFT Investor Relations. 24 Jul. 2003. Disponível em:
<https://www.microsoft.com/msft/speech/FY03/ExecQAFAM2003.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 69
Um assunto, sem dúvida, palpitante, retomado por Steve Ballmer na mesma reunião,
agora com ênfase no aspecto da clonagem:
“Existe um item crítico: Irá o software – e irá TI, você pode dizer em
geral, mas eu vou falar apenas do preço do software – irá o software ser um
negócio de inovação e valor, ou irá ele ser um negócio que se torna
comoditizado? E ele é comoditizado por clones, ele é comoditizado por
custos menores, ou alternativas com custo menor do que aquelas que os
vendedores comerciais produzem. E essa é a questão”113.
Determinar os termos em que se dará a discussão é, como se sabe, ter metade da
discussão ganha, se Steve Ballmer é famoso no mundo da tecnologia por seu temperamento
explosivo, estilo performático, personalidade intempestiva e pelo hábito de falar em alto e
bom som o que lhe vem à mente, podemos dizer que com certeza se trata de um homem que
sabe escolher bem as palavras. Ao opor a “comoditização” como diz, à “inovação e valor”
Ballmer sugere que o software proprietário é o único capaz de inovar e entregar valor,
justamente por seu aspecto comercial, ao contrário do Software Livre, que estaria
transformando a indústria de softwares em uma indústria de commodities. Quando Ballmer
coloca o Software Livre na categoria de commoditie, a interpretação possível é a seguinte:
um produto de baixo valor agregado, com pouca industrialização, que portanto mantidas as
condições mínimas de qualidade pode ser adquirido de qualquer produtor (ou distribuição,
no caso do Linux) utilizandose apenas o critério do menor preço.
Os dois discursos acima também deixam claro, que a esta altura, tanto Ballmer
quanto Gates se esqueceram completamente (ou convenientemente) do acordo firmado com
John Sculley em meados dos anos 80, e do subsequente processo da Apple em 1993,
acusando a Microsoft de ter clonado sua interface gráfica.
113
Financial Analyst Meeting Changing the World with Software : MSFT Investor Relations. 24 Jul. 2003.
Disponível em: <https://www.microsoft.com/msft/speech/FY03/BallmerFAM2003.mspx>. Acesso em: 29 abr.
2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 70
Ballmer continua explicitando que o problema da “comoditização” do software não
afeta apenas a Microsoft, mas toda indústria de tecnologia, inclusive seus principais rivais,
pois para Ballmer o Software Livre é um obstáculo à inovação:
A conclusão de Ballmer aponta inevitavelmente o vilão que ameaça a continuidade
da indústria de tecnologia:
E novamente a escolha de palavras de Ballmer é feita sobmedida para transmitir
mais do que o que está dito de forma direta. A idéia de um modelo de software “não
comercial” coloca o Linux e seus pares do Software Livre fora da indústria de tecnologia. É
muito bem pensado identificar estes softwares como não comerciais, o não comercial se
ajusta como uma luva às idéias anteriores da Microsoft sobre o Software Livre, ou seja:
Não comercial é algo fora do mercado, um brinquedo; não comercial é comunista;
não comercial é grátis e não gera renda ou arrecadação; não comercial é a infração da
propriedade intelectual, enfim, não comercial é um termo carregado de preconceito e que
114
idem.
115
idem.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 71
será comum nas declarações, entrevistas e documentos da Microsoft e seus executivos deste
momento em diante, o Software Livre, em inglês, é uma expressão que vem carregada de
promessas de liberdade e transparência, portanto, algo a ser evitado.
“Eu gostaria de reiterar os fatores de risco que são muito importante
para as pessoas gerenciando dinheiro. Primeiro de tudo, o ambiente
econômico. Nós falamos sobre o fato de que não antecipamos que a
economia melhore radicalmente por todo o mundo mas nós também não
esperamos que ela decline de forma mensurável.
116
Microsoft Senior Vice President, Finance and Administration, Chief Financial Officer
117
Financial Analyst Meeting Financial Update : MSFT Investor Relations. 24 Jul. 2003. Disponível em:
<https://www.microsoft.com/msft/speech/FY03/ConnorsFAM2003.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 72
disponibilizado por comunidades de pessoas trabalhando em uma base
voluntária sem custo pela Internet.
Nós acreditamos que temos um bom plano, um plano que nos vai
permitir inovar e entregar valor que exceda aquele que vem de softwares
não comerciais. Mas eu tenho que lhe contar, sempre que alguém diz não
ter custo inicial de aquisição, ou seja, que é gratuito, isso atraí muita
atenção.
Os quatro trechos destacados em negrito, sintetizam pontos importantes do que a
Microsoft já havia concluído sobre o Linux e sobre quais seriam os passos da empresa para
enfrentar a competição no ano seguinte.
O primeiro destaque já foi apontado, trata da definitiva mudança do Linux para o
centro das atenções na Microsoft, agora considerado como um concorrente “único” por
suas característica, e (terceiro destaque) a repetição daquilo que Ballmer aponta como o
grande diferencial do Linux: o preço (algo que mencionara em 2002, vide nota 105).
O segundo destaque é a declaração de que a empresa já elaborou uma estratégia de
combate ao inimigo, que se liga ao quarto destaque, que é na verdade um vislumbre desta
estratégia: Ballmer propõe ajudar as pessoas a perceberem como o custo do produto da
Microsoft é, de fato, mais vantajoso. Este é um conceito inusitado, que ainda será melhor
explorado neste texto.
118
Microsoft Corporation 2003 Shareholder Meeting : MSFT Investor Relations. 11 Nov. 2003. Disponível
em: <https://www.microsoft.com/msft/speech/FY03/shareholdermeeting03.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 73
Seis dias mais tarde outro executivo da Microsoft, Jeff Raikes119, surgia com uma
idéia parecida, embora agora já um pouco mais elaborada:
Qual é nossa estratégia? Nossa estratégia é ter certeza de que criamos
o melhor custo total de propriedade, e eu penso que na maioria dos casos
nós estaremos aptos a ter custos totais de propriedade menores quando você
considera o espectro do custo total.
Muitas pessoas ouvem sobre o governo de uma cidade, um governo na
Alemanha120 buscando o Linux como uma alternativa. Esse é um importante
pensamento para concluirmos e entendermos o que nós deveríamos ter feito
diferentemente. (...) então o levamos muito seriamente”.121
Assim, a Microsoft vai dando forma ao conceito de “custo total de propriedade”,
com o qual pretende demonstrar ao mercado que seus softwares são, na verdade, mais
baratos do que os Softwares Livres. Outro destaque é a intensificação da pressão de
governos ao redor do mundo na adoção do Software Livre, postura que será cada vez mais
difundida.
“(...) Algumas organizações migrando do UNIX estão considerando
software não comercial como Linux e OpenOffice. Enquanto o custo inicial
119
Microsoft Group VP, Productivity and Business Services
120
Jeff está falando da cidade de Munich.
121
Bear Stearns Trek to COMDEX Conference : MSFT Investor Relations. 17 Nov. 2003. Disponível em:
<https://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/raikes1117comdex.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 74
de aquisição de sistema operacional simplificado, faça você mesmo possa
parecer atraente, um conjunto crescente de pesquisas independentes,
mostram que nossa plataforma integrada fornece não apenas melhor
funcionalidade, mas também menor custo total de propriedade nas funções
mais comuns nos negócios.
(...) Contudo, Linux e outros softwares não comerciais apresentam um
desafio, e nós não somos complacentes. Nós estamos trabalhando duro para
assegurar que nossos produtos e serviços continuem a melhorar e atender
demandas dos consumidores por valor. Nós estamos comprometidos a
ultrapassar as expectativas do consumidor por produtos confiáveis, seguros,
e com excelência em engenharia.”122
Não é demais notar a observação pejorativa sobre o Linux “strippeddown, doit
yourself operating system”, ou “sistema operacional simplificado, faça você mesmo”, um
comentário que dificilmente encontraria eco em um administrador de sistemas da época que
tenha tido oportunidade de trabalhar com os dois sistemas. Podese sem dúvida atribuir ao
Linux de então o rótulo do “faça você mesmo”, mas considerar isto algo bom ou ruim, é
questão de opinião, e pode, na verdade, ser dito até mesmo do Linux atual. Mas classificar o
Linux, herdeiro do UNIX de “sistema operacional simplificado” estampa perplexidade no
rosto de um técnico que conheça os dois sistemas. O ponto nevrálgico desta carta aos
acionistas é a informação de que “um crescente corpo de pesquisas independentes” estaria
mostrando a maior funcionalidade e menor custo total de propriedade das soluções
Windows da Microsoft, este é o tom da fase seguinte do combate entre o Windows e o
Linux.
A organização do pensamento e do discurso da Microsoft acompanhado até aqui
desemboca no que seria sua evolução natural, o lançamento em janeiro de 2004, da
campanha publicitária “Get the Facts”. Voltada aos administradores de sistemas e
122
MSFT Annual Report 2003 Letter to Shareholders : MSFT Investor Relations. 2003. Disponível em:
<http://www.microsoft.com/msft/reports/ar03/alt/brazil.htm> (português) e
<http://www.microsoft.com/msft/reports/ar03/alt/letter.htm> (inglês). Acesso em: 29 abr. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 75
profissionais de TI em geral a campanha, que contava com mídia impressa, anúncios em
sites de tecnologia e até seu próprio site123, veiculava “estudos” comparando os custos entre
a adoção do Linux e do Windows, chegando invariavelmente à conclusão sobre o custo
superior do Linux.
Esta campanha marcou uma mudança de posição da Microsoft em relação ao Linux,
se inicialmente o foco era desacreditar o concorrente com preconceitos, agora pretendiase
desacreditar o concorrente com “fatos”. Não que as prática anteriores de FUD estivessem
totalmente desautorizadas, especialmente no que tange à propriedade intelectual, a ameaça
mais relevante recebida pela comunidade do Linux, como discursava o executivo da
Microsoft John Connors em janeiro para analistas financeiros:
(...) Open Source continua sendo uma ameaça para nós porque somos
a maior empresa de software no mundo que ganha dinheiro vendendo
software, mas é uma ameaça para qualquer um que licencia IP (Intellectual
Property) e são pagos pelo software. É uma ameaça se você é a Oracle no
espaço de banco de dados. É uma ameaça se você é a IMB e você vende
software.”124
31/08/2006 20060830_rbns.odt 76
americano de Massachusetts, que fazia movimentos semelhantes, e embora não tenha
mencionado o Brasil, poderia, já que o país também havia se engajado no mesmo
movimento.
Ao que parece esta é um pergunta sem resposta satisfatória, pois embora tenha sido
respondida com objetividade por Connors, os trechos destacados em negrito na resposta
abaixo, deixam claro que a visão da Microsoft só consegue contemplar o desenvolvimento
da indústria de softwares da cada um destes países subordinada ao seu próprio
desenvolvimento. A inovação da própria Microsoft é a inovação possível para os países
submetidos, situação da qual a empresa tem aparente consciência, e que pretende manter.
“JOHN CONNORS: Bem, primeiro de tudo, é meio estranho ter um
estado nos Estado Unidos no mix que você menciona, mas isso é o que é.
Se você olhar para a companhia e o que nós tentamos fazer, temos
tentado ser muito claros que Linux é um competidor e um desafio para a
Microsoft. Temos também sido muito claros que o Open Source e modelos
de software gratuitos são uma ameaça para todos os vendedores de software
comercial. Visto que obtemos o maior lucro que qualquer vendedor de
software comercial, nossa ameaça é maior. Mas é uma ameaça para todos.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 77
software, e desenvolver uma área onde postos de trabalho possam ser
criados.
A maioria dos estados durante o período de '99 a 2000, com o caso do
DOJ (Department of Justice), ficam surpresos em saber quantas pessoas no
seu estado realmente desenvolvem, distribuem e suportam a tecnologia
Microsoft. Achamos que muitos países similarmente não estão conscientes
do quão grande um ecossistema de pessoal de TI existe em torno da
plataforma Microsoft – com quantos clientes nós trabalhamos de seus
países que recebem valor pela entrega de nossa inovação.
125
John Connors, CFO, Presentation at the Goldman Sachs Technology Investment : MSFT Investor Relations.
25 Fev. 2004. Disponível em: <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/Connors0225GSTech.mspx>.
Acesso em: 29 abr. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 78
A questão do interesse dos governos pelo controle das ações do sistema operacional
parece ser o maior calcanhar de Aquiles da estratégia da Microsoft, o modelo do software
proprietário e estrangeiro não tem como superar as questões macroeconômicas que coloca,
como a evasão de divisas, nem tampouco as questões da segurança das informações e da
autonomia tecnológica.
Assim em 2004 a emergência do Linux já havia se convertido em um problema de
grande relevo dentro da Microsoft e todos os executivos tinham os discursos alinhados na
estratégia de se aterem aos “fatos”:
CURT ANDERSON (18/05/2004) : “Primeiro os riscos: obviamente
software não comercial é um risco para o nosso negócio. O software grátis
pode ter um impacto em nosso modelo do negócio. E nós estamos pensando
sobre como o que isso se pareceria.
A maneira que nós combatemos o Linux e os Softwares não comerciais
francamente é superandoos na inovação e nós acreditamos que nossos
produtos ofereçam mais valor ao consumidor, menor custo total de
propriedade (TCO) e melhor interoperabilidade avançando, e esse é
realmente o nome do jogo, para nós é continuar a investir e diferenciar
126
Martin Taylor Presentation on Microsoft Platform Competitive Strategy : MSFT Investor Relations. 27 Fev.
2004. Disponível em: <http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/taylor022704.mspx>. Acesso em: 29
abr. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 79
nossos produtos contra o Open Source, mais isso é de fato um risco
importante.”127
(...) Número um, custo total de propriedade (TCO). Muitos clientes
notaram que uma vez que software Open Source como o Linux tem um custo
de aquisição de software de zero, que ele deve ter o menor custo de
propriedade (TCO). Contudo se você olhar os fatos, eles não corroboram
isto. Em nosso site, www.getthefacts.com, nós temos mais de 17 analistas da
indústria e mais de 100 consumidores que passarm pela experiência de ou
testar o Linux e descobrirem que o custo total de propriedade (TCO) era
maior do que no Windows ou fazerem a análise.”128
E no final do ano, na carta anual aos acionistas, assinada por Bill Gates e Steve
Ballmer, o esforço era apresentado:
“Ao longo do último ano, nós trabalhamos duro para comunicar aos
consumidores sobre o valor único da plataforma Windows em comparação
com o Linux e outros softwares opensource. Inúmeros analistas
independentes reportaram que o Windows oferece um menor custo total de
127
Curt Anderson Address to Institutional Investors at Ragen MacKenzie Investment Conference : MSFT
Investor Relations. 18 Mai. 2004. Disponível em:
<http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/Anderson051804.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006
128
Kevin Johnson (Group Vice President, Sales, Marketing, Services Group) at Credit Suisse First Boston
Technology Conference : MSFT Investor Relations. 30 Nov. 2004. Disponível em:
<http://www.microsoft.com/msft/speech/FY04/Johnson113004.mspx>. Acesso em: 29 abr. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 80
propriedade (TCO), maior segurança, e uma proteção mais abrangente
contra processos na justiça129.”130
Em julho de 2005 o executivo da Microsoft Kevin Johnson131 oferecia no encontro
dos analistas financeiros, um resumo da situação do combate contra o Linux e o Software
Livre, fornecendo além de um panorama claro da atuação da Microsoft, interessantes
insights sobre o que reservaria o futuro para os mercados de países pobres como o Brasil.
Esse assunto será tratado em maior detalhe no capítulo sobre a industrialização brasileira,
quando esta apresentação de Johnson será novamente utilizada:
Em 2004, construímos com base nisto. (...) Nós agora temos mais de
300 casos de estudo de consumidores, onde consumidores em cenários reais
medindo perfomance, testaram o Linux, mediaram sua performance contra
a plataforma Microsoft, e tomaram a decisão de que a plataforma Microsoft
provê claro valor para eles.
129
N. do A. No caso a expressão em inglês era more comprehensive indemnification, mas optouse por
traduzir pelo sentido, já que é da proteção legal contra processos semelhantes ao da SCO a que Ballmer e
Gates pretendem se referir.
130
GATES, Bill (Chairman and Chief Software Architect). BALLMER, Steve A. (Chief Executive Officer)
MSFT Annual Report 2004 Letter to Shareholders : MSFT Investor Relations. 2004. Disponível em:
<http://www.microsoft.com/msft/reports/ar04/flash/default.html>. Acesso em: 29 abr. 2006
131
Group Vice President, Worldwide Sales, Marketing and Services Group
132
N. do A. O correto nesta tradução seria “independentes” no lugar de “terceirizados”, mas a palavra
acrescentaria um duplo sentido a frase que não existe no original em inglês.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 81
(...) Gartner acaba de divulgar um estudo que eles fizeram, eu acho,
com uma grande instituição de serviços financeiros que avaliou o Linux no
desktop. E eles concluíram que o Windows não apenas provê um menor
custo de propriedade (TCO) mas que também os custos de aquisição
daquela solução Linux eram maiores que os custos de aquisição do
Windows. Então mais e mais evidência surge suportando a proposição em
torno de um menor custo de propriedade.”133
O ano de 2006 está fora do período analisado neste texto, mas é muito importante,
para a apreciação dos eventos narrados até aqui, deixar registrado que foi o ano de
lançamento do website “Port 25” 134, que marca uma nova postura da Microsoft em relação
ao “não comercial”, Software Livre.
O Port 25 agrega os esforços da Microsoft no universo do Software Livre, e aborda
muito a interoperabilidade do Windows, Unix e Linux, configurando um reconhecimento
do Linux pela Microsoft como um player do mercado, um sistema com o qual, a despeito
dos esforços empreendidos até aqui, terminouse por chegar à conclusão que será
necessário estabelecer uma convivência.
O nome Port 25 se refere à porta de um servidor usualmente utilizada pra o tráfico
de emails SMTP, uma vez que o site é a tentativa da Microsoft de se comunicar com a
comunidade do Software Livre. O site é mantido pelo Open Source Software Lab da
Microsoft, dirigido por Bill Hilf, um antigo militante do Linux, exempregado da IBM e
agora gerente geral de estratégia da Microsoft para o Software Livre.
É claro, há o sempre um outro lado, e lá do outro lado as comunidades do Linux e
do Software Livre não assistiram pacificamente aos ataques da Microsoft e, de fato, seria
muito difícil determinar qual lado atirou a primeira pedra.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 82
comentários de blogs, sites e correntes de email todo tipo de críticas e comentários jocosos
contra a Microsoft. As frases mais comuns referemse à Microsoft como “the evil empire”
e “dark side of the force”, a Bill Gates como “Darth Gates”, todas referências aos vilões
da série Guerra nas Estrelas (Star Wars). Também é comum que a Microsoft seja referida
como “The Borg” em referência aos alienígenas da série de cinema e televisão Jornada nas
Estrelas (Star Trek), a crítica aqui se dá pela característica dos Borgs de “assimilarem”
outras formas de vida em uma única consciência coletiva, e pelo bordão sempre repetido
pelos alienígenas: “resistance is futile”, duas referências ao comportamento da Microsoft
no mercado. Esta última crítica é tão recorrente que no site Slashdot, um portal de notícias
fundado em 1997 e um dos redutos das comunidades Linux e do Software Livre, as notícias
referentes a Microsoft vêm acompanhadas por um ícone de Bill Gates, transfigurado em
“borg”.
O que se pode dizer sobre os dois lados da contenda é que se a Microsoft trata o
Linux inicialmente como um brinquedo para estudantes, depois como um câncer anti
capitalista, depois um inimigo, até que tenta mostrar os “fatos” e termina admitindo a
concorrência, do outro, a comunidade do Software Livre em geral e do Linux em especial,
tratam a Microsoft de forma bem mais constante e consistente135.
Em quase todas as suas manifestações a Microsoft é retratada como o império do
mal, sem muitas concessões, e coube à Red Hat em 2005, possivelmente pela pressão que
sofreu com campanha Get The Facts da Microsoft, sendo a maior distribuidora de soluções
Linux da América do Norte, responder com outra campanha publicitária, que parece
traduzir o espírito da comunidade Linux de maneira fidedigna.
A campanha “Truth Happens”, ou “A Verdade Acontece” é sintetizada desta forma:
135
Sobre a imagem da Microsoft e sua representação na cultura de massas ver: SOUZA F., Rubens A.
Menezes. Percepção e imagem da informática. In: XXII Simpósio Nacional de História História: Guerra e
Paz, 2005, Londrina. XXII Simpósio Nacional de História História: Guerra e Paz. Londrina, PR :
Associação Nacional de História ANPUH / Editorial Midia., 2005.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 83
determinação e visão. Nós acreditamos que o open source é uma maneira
melhor. Uma maneia melhor de desenvolver tecnologia e uma maneira
melhor de a tornar acessível. E ainda que existam aqueles que ignoraram o
open source ou alegassem que não funcionaria ou alegassem que não
duraria, nós acreditamos que a verdade acontece.”136
Realizar o impossível com determinação e visão dão bem o tom messiânico que por
vezes o Software Livre e o Linux adotam, e são exatamente as variações desta postura, em
maior ou menor grau, que a Microsoft pretendeu combater com com sua campanha de
“fatos”.
A Red Hat por sua vez, tem sua peça publicitária principal em um vídeo137 que pode
ser dividido em duas partes, na primeira ele é genérico e trata da evolução tecnológica geral
da humanidade, apresentando cenas dos primórdios da aviação, do automóvel, do
fonógrafo, alternadas com imagens de células, animais e microscópios, dando um “ar de
tecnologia” às imagens. Sua estrutura consiste em imagens, vídeos ou fotos de época,
contrastando com frases que são colocadas sobre as imagens e que expõem o ridículo de
certas previsões do futuro.
Na segunda parte mantémse a linguagem, mas se concentra no caso específico do
Linux, onde acontece o ponto alto do vídeo, uma frase de Gandhi, entrecortada com
declarações sobre o Linux, concluindo que se estaria vivendo o último estágio, o estágio da
vitória. A transcrição abaixo ajudará a compreensão da peça publicitária.
O MUNDO É PLANO
A TERRA É O CENTRO DO UNIVERSO APESAR DA IGNORÂNCIA
[FATO] ATÉ PROVA EM CONTRÁRIO O TELEFONE TEM MUITAS LIMITAÇÕES
PARA SER SERIAMENTE CONSIDERADO COMO
APESAR DA IGNORÂNCIA UM MEIO DE COMUNICAÇÕES
APESAR DO RIDÍCULO WESTERN UNION [1876]
APESAR DA OPOSIÇÃO
A VERDADE ACONTECE
136
http://www.redhat.com/magazine/008jun05/features/truth_happens/
137
http://www.redhat.com/truthhappens/
31/08/2006 20060830_rbns.odt 84
EM [1899] O ESCRITÓRIO NORTE
AMERICANO DE PATENTES DECLAROU, TUDO O 640K DEVEM SER O BASTANTE PARA
QUE PODE SER INVENTADO JÁ FOI INVENTADO QUALQUER UM
BILL GATES [1981]
APESAR DO RIDÍCULO
O FONÓGRAFO NÃO TÊM NENHUM VALOR PRIMEIR ELES IGNORAM VOCÊ...
COMERCIAL LINUX É O HYPE DU JOUR
THOMAS EDISON [1880] GARTNER GROUP [1999]
ENTÃO ELES RIEM DE VOCÊ...
A LOUCURA DO RÁDIO VAI MORRER LOGO NÓS PENSAMOS NO LINUX COMO UM
THOMAS EDISON [1922] COMPETIDOR NO MERCADO DOS ESTUDANTES E
AFICCIONADOS MAS EU REALMENTE NÃO
O AUTOMÓVEL PRATICAMENTE ATINGIU O PENSO QUE NO MERCADO COMERCIAL NÓS O
LIMITE DO SEU DESENVOLVIMENTO VEJAMOS DE QUALQUER FORMA SIGNIFICATIVA
SCIENTIFIC AMERICAN [1909] BILL GATES [2001]
APESAR DA OPOSIÇÃO ENTÃO ELES LUTAM CONTRA VOCÊ...
APESAR DISTO TUDO LINUX NÃO VAI DESAPARECER
A VERDADE ACONTECE LINUX É UM COMPETIDOR SÉRIO
NÓS VAMOS ENFRENTAR ESTE DESAFIO
O HOMEM NÃO IRÁ VOAR POR CINQUENTA STEVE BALLMER [2003]
ANOS
ORVILLE WRIGTH [1901] ENTÃO VOCÊ VENCE...
PRIMEIRO ELES IGNORAM VOCÊ...
UM FOGUETE NUNCA IRÁ DEIXAR A ENTÃO ELES RIEM DE VOCÊ...
ATMOSFERA DA TERRA ENTÃO ELES LUTAM CONTRA VOCÊ...
NEW YORK TIMES [1936]
ENTÃO VOCÊ VENCE...
HÁ UM MERCADO MUNDIAL PARA TALVEZ MOHANDAS GANDHI
CINCO COMPUTADORES
THOMAS WATSON DA IBM [1943] VOCÊ ESTÁ AQUI
"First they ignore you, then they laugh at you, then they fight you, then you win",
Mohandas Karamchand Gandhi, o “Mahatma138 Gandhi”, utilizou esta frase para descrever
a luta de independêcia do subcontinente indiano sob o jugo colonial britânico.
138
O termo “mahatma” pode ser traduzido como “grande alma”.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 85
Uma luta que poderia ser caracterizada como uma história de Davi e Golias, onde os
ingleses, tal como o Golias bíblico, apesar da desproporção das forças e da percepção óbvia
de que eram inimigos formidáveis, possivelmente invencíveis e contra os quais nada valia
lutar, perderam.
A imagem bíblica associada ao parágrafo anterior vem no socorro de ampliar a
compreensão da autoimagem que parte das comunidades do Linux e Software Livre fazem
de suas atividades.
A comparação lateral da Microsoft ao poderoso império britânico, que apesar de tudo
foi derrotado pelo movimento de independência indiano, esbarra novamente no tom
messiânico mencionado acima, apontando para a crença da inevitabilidade da vitória.
O fato do movimento do Software Livre ter se espalhado pelo planeta, ganhando
grande torque com a adoção por governos ao redor do mundo – com destaque para o caso
brasileiro – e ter também contado com a adesão de grandes companhias de software que
competiam com a Microsoft em um ou mais produtos, só faz aumentar a certeza da vitória.
Portanto dos discursos de Ballmer ao vídeo da Red Hat, é possível constatar como
os dois lados competem, como já foi dito, por corações e mentes de usuários, empresas e
governos.
3.7. Considerações Sobre a Natureza da Informática e a
Autodeterminação Tecnológica
31/08/2006 20060830_rbns.odt 86
ainda serão percorridos pela tecnologia, ou como definiu Sérgio Amadeu, então presidente
do ITI: “O que está em disputa é o futuro, não o presente”139.
Ainda que seja recorrente encontrar profetas pregando o contrário, o futuro não está
dado e não é certo, sendo já isto razão suficiente para que o raciocínio economicista
determinista dominante deva ser contestado. Mesmo diante do imponderável, a resistência
existe e acontece de forma vibrante, oscilando entre o heróico e o quixotesco, muitas
resistências ocorrem como lutas de apropriação; desta forma as populações não se deixam
levar e praticam sim diversas formas de resistência, até mesmo a apropriação da tecnologia.
Sem o objetivo de fazer análises de mérito quanto à qualidade de cada tecnologia, é
possível evidenciar que existem rachaduras no atual raciocínio economicista dominante e
que a tecnologia não contém apenas a componente técnica, sendo também política e
ideológica, mesmo em campos onde isso não transpareceria em um primeiro olhar, como
nos sistemas operacionais de computadores.
O conceito que apresentaremos a seguir é original do pesquisador e “evangelista” do
movimento do Software Livre140, Eric S. Raymond, conforme apresentado em seu livro
"The Cathedral & the Bazaar141".
Baseado em sua observação do kernel142 do Linux e no processo de desenvolvimento
do software fetchmail, em a Catedral e o Bazar143, Raymond apresenta duas metodologias de
desenvolvimento de software aberto radicalmente diferentes e por vezes quase antagônicas:
o modelo da catedral, onde o código fonte está disponível juntamente com o lançamento do
software, mas somente neste momento, sendo até então exclusivo ao grupo de
desenvolvedores; e o bazar, onde o código é desenvolvido via Internet, aos olhos do público.
Raymond concede a Linus Torvalds, lider do projeto do kernel do Linux, o título de
inventor deste processo.
139
O Pingüim Avança. Carta Capital, 17 de março de 2004 Ano XI Número 345.
140
The Open Source Definition is used by the Open Source Initiative to determine whether or not a software
license can be considered Open Source. The definition was based on the Debian Free Software Guidelines,
adapted primarily by Bruce Perens and by April 2004 has reached version 1.9, conforme definido na
WIKIPEDIA em: http://en.wikipedia.org/wiki/Open_Source_Definition
141
Inicialmente apresentado como um ensaio no Linux Kongress em 27 de maio de 1997.
142
Parte central do sistema operacional, responsável por funções básicas.
143
http://www.catb.org/~esr/writings/cathedralbazaar/
31/08/2006 20060830_rbns.odt 87
A constatação de Raymond é importante para nossa análise na medida em que
evidencia um aspecto particularmente anárquico do processo de criação do Linux e talvez o
elemento que permitiu a ele crescer onde tantos projetos semelhantes fracassaram: “o
código é desenvolvido via Internet, aos olhos do público”.
Este talvez seja, para além dos modelos de licenciamento das duas alternativas
estudadas aqui (Windows e Linux) o principal ponto de divergência entre duas abordagens
para o desenvolvimento tecnológico.
Enquanto a Microsoft trabalha fornecendo tecnologia a seus clientes, tecnologia
proprietária, feita sob segredo industrial em seus laboratórios, o Linux tem cada segundo de
sua evolução aberto e acompanhado por seu público consumidor, que opina e altera os
rumos tomados por esta tecnologia.
Isso leva a dois resultados muito distintos, se o objetivo perseguido pela Microsoft ao
desenvolver o Windows é a obtenção de lucro e conquista e manutenção de novos mercados,
este com certeza não é o objetivo do Linux, ou pelo menos não é o objetivo central de seus
desenvolvedores, que em seu trabalho buscam atender as demandas diretas de seus usuários
e mantenedores. E as demandas dos usuários podem não necessariamente coincidir com
conquista de novos mercados, ou traduzindo, para a criação, integração e instalação de
novas características no sistema operacional.
Esta disparidade de objetivos distancia ainda mais os dois sistemas operacionais do
que suas próprias origens históricas, levando as duas tecnologias, focadas na solução do
mesmo problema (a operação básica do computador), a adotarem padrões e mesmo opções
arquitetônicas muito diferenciadas.
Por sua gênese e tradição a comunidade Linux busca apoiar e manter padrões abertos
de computação, intercambiáveis entre todos os sistemas operacionais e plataformas,
enquanto a Microsoft, dentro da lógica de empresa privada, busca padrões proprietários,
compatíveis apenas com seus produtos.
Constatado que os dois sistemas operacionais divergem em seus objetivos e métodos,
é cabível iniciar a ponderação do quanto isso afeta o usuário final destas tecnologias
distintas.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 88
No caso do Windows, a mesma empresa que fabrica o sistema operacional, fabrica
também suítes de escritório (os pacotes Office), leitores de email, browser de Internet,
instant messenger e toda uma gama de softwares em diferentes funções e atividade. Isso
significa que além do sistema operacional, a Microsoft compete com outras empresas em
diversos segmentos, e todas estas empresas fazem seus produtos para serem utilizados no
Windows.
Como apenas a Microsoft tem acesso ao código fonte do Windows e apenas ela
comanda os rumos de seu desenvolvimento, pratica muitas vezes uma política considerada
predatória e também perigosa. Ela promove uma grande integração entre seus aplicativos e
o kernel do sistema, o que é, desconsiderandose o aspecto de falta de competitividade, um
risco de segurança.
Por ocasião do processo dos estados americanos contra a Microsoft por políticas anti
competitivas os advogados da Microsoft chegaram a alegar que não era possível remover o
browser Internet Explorer do Windows dado seu grau de integração com o sistema, e que
mesmo que tal fosse possível não cabia ao Departamento de Justiça interferir e impedir a
Microsoft de “inovar”.
Porém este princípio de “inovação” não é adotado pelos mantenedores do Linux,
sendo na verdade considerado um erro conceitual, Eric Raymond, apesar de seu estilo
notadamente panfletário, parece estar baseado nos argumentos corretos em seu artigo
“Editorial Microsoft: Designed for Insecurity 144” que traz maiores detalhes sobre outro
problema de arquitetura de produtos Microsoft.
Assim enquanto o Windows segue um plano de desenvolvimento onde os executivos,
pessoal de marketing e analistas de mercado foram ouvidos, o Linux permanece uma
criação coletiva da comunidade, ou como definiu Linus Torvalds: "Linux is evolution, not
intelligent design."145
144
http://www.oreillynet.com/pub/a/oreilly/opensource/news/insecure_0400.html
145
Citação atribuída a Linus Torvalds por Greg KroahHartman, funcionário da SUSE e um dos mantenedores
do kernel do Linux (e de diversos subsistemas de drivers), que exibiu esta citação em um slide de sua
apresentação no encerramento do OLS 2006 (Ottawa Linux Symposium), uma das principais conferência
sobre o desenvolvimento do kernel do Linux.
A tradução desta citação é Linux é evolução, não desenho inteligente, e faz referência ao combate entre as
idéias do evolucionismo biológico e criacionismo divino. Daí a comparação de Torvalds, que não vê um plano
traçado de para onde o Linux deva seguir, mas o vê sendo capaz de se adaptar a novos ambientes e novas
condições.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 89
Esta diferença de abordagem entre os dois sistemas operacionais, traz um reflexo
direto na vida dos usuários de computadores, na medida em que os usuários do Linux
parecem muito menos sujeitos a ataques de vírus e sempre com efeitos notadamente menos
devastadores, já que o coração do sistema não é facilmente atingido por outros programas.
Há portato, menos lógica matemática e muito mais idéias e ideais, direcionando os
rumos dos bits e bytes, dentro dos onipresentes computadores.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 90
4. Uma História do desenvolvimento tecnológico brasileiro
4.1. Brasil: raízes da industrialização e do desenvolvimento
tecnológico.
Tendo em vista que a existência pretérita do material humano qualificado tem sido
um prérequisito para a inserção do Brasil como um ator relevante no atual estágio de
desenvolvimento tecnológico do capitalismo e na arena do Software Livre, cabe a pergunta:
“Qual a origem dos técnicos e engenheiros de informática brasileiros?”
Não há, como é de se imaginar, uma resposta curta para esta pergunta. Chegar até
ela exige a reconstrução dos caminhos que conduziram à industrialização brasileira, pois só
assim podese compreender a origem dos técnicos, engenheiros e cientistas nacionais.
Esta necessidade aqui colocada já foi bem explicitada por Milton Vargas ao
constatar que existe um “fato primordial de que a tecnologia depende do valor e do
preparo do corpo de pesquisadores nacionais”.146 Gildo Magalhães aponta ainda que “Se o
próprio mecanismo da tecnologia avançada implica na adaptação e no progresso do
conhecimento, não há como separar ciência, pura ou aplicada, bem como sua utilização,
do desenvolvimento como um todo. (...) Muitos, imprecisa e vagamente, denominam isto de
“knowhow” (e para nós, o verdadeiro conhecimento tecnológico precisa incluir o “know
why”).”147
31/08/2006 20060830_rbns.odt 91
derivados. Para implantar as primeiras indústrias, por rudimentares que fossem era
necessária a existência de um corpo mínimo de técnicos e/ou de artesãos mais bem
preparados, até com algum rudimento de conhecimento em ciências.
Assim as raízes da industrialização brasileira encontramse parcialmente plantadas
no século XIX, pois em meados deste século o Brasil já havia experimentado um pequeno
surto de industrialização com o desenvolvimento da indústria têxtil, a implantação de
ferrovias para escoar a produção agrícola, alguns portos, hidrelétricas e mesmo sistemas de
comunicação149.
No início do século XX a implantação dos institutos de pesquisa é talvez o primeiro
ponto importante para o desenvolvimento científico no Brasil, já que tinham como objetivo
resolver problemas da sociedade por meio da pesquisa. Refletindo as necessidades sociais
148
Idem, 1994, p. 226227
149
PEREIRA, L.C. Bresser. Desenvolvimento e Crise no Brasil. Zahar Editores, 1968, Rio de Janeiro, pág.
29.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 92
estes institutos eram biológicos, agronômicos e de tecnologia, cobrindo as searas da saúde
pública, agricultura e engenharia150.
Mesmo assim o país permanecia basicamente agrário, e por contraditório que possa
parecer é com a crise mundial de 1929, com a quebra da bolsa de Nova York que serão
dadas as condições para o início da industrialização brasileira, pois a crise trará a
necessidade de substituição das importações.
Quando a família real portuguesa foi forçada a se transferir para o Brasil cuidou de
ajustar a “nova sede” aos padrões de quem agora era o centro do Império, assim em 1808 o
Príncipe Regente D. João liberava às colônias portuguesas a liberdade de indústria, que por
si só era insuficiente para iniciar a industrialização, como já apontou Nícia Vilela Luz:
31/08/2006 20060830_rbns.odt 93
podiam deixar de ser aplaudidas pelos liberais, estabeleciamse certas
concessões que iriam, no decorrer do século, favorecer certos abusos contra
os quais protestariam defensores do liberalismo econômico.”151
Como a propriedade das idéias, patentes e o direito autoral são assuntos centrais
neste texto, cumpre notar que parte desses “abusos” consistia na “outorga de privilégios
exclusivos, por 14 anos, aos inventores ou introdutores de novas máquinas”152.
Mas apenas dois anos depois, por imposição dos interesses ingleses os
manufaturados oriundos da GrãBretanha conseguiram uma tarifa de importação
preferencial, inferior a 15%, menor que os 16% praticados contra os produtos portugueses,
sendo isto o bastante para minar os esforços anteriores de industrialização e estabelecer
clara dependência externa. Findos estes tratados na década de 40 o Brasil buscou novo
protecionismo à sua indústria quando em 1843 estabeleceu impostos de 50 a 60% sobre
bens que tivessem similares nacionais, mas logo em 1844 a tarifa Alves Branco estabeleceu
uma taxa de importação na casa de 30%. Os anos de 1846 e 1847 viram novos esforços e
incentivos à indústria brasileira, em especial a têxtil, mas o café então já tomava o cenário
político e econômico, tornando menos favorável o ambiente para as discussões sobre o
desenvolvimento industrial brasileiro, reforçando a crença da notória “vocação agrícola” do
Brasil e colocando os dirigentes em uma gangorra oscilando ora para o protecionismo ora
para a liberalização. Para Nícia Vilela Luz:
“Colocados nesse dilema – promover a industrialização do país, que
reconheciam ser uma necessidade nacional, e atender ao mesmo tempo os
interesses da lavoura – hesitaram, assim, os dirigentes brasileiros em adotar
uma política francamente protecionista. Por outro lado, repousando o
sistema tributário brasileiro na renda alfandegária, exigiam os interesses
do fisco uma tarifa essencialmente fiscal. Nesse impasse permanecerá a
política alfandegária brasileira, durante todo o período abrangido por este
151
LUZ, Nícia Vilela. A Luta pela Industrialização do Brasil. Editora Alpha Omega, 1978, São Paulo, pág.
21.
152
Idem, 1978, p. 21.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 94
estudo, incapaz de satisfazer nem aos partidários de uma política
protecionista, nem aos defensores de um regime de livre troca.”153
Os anos seguintes trouxeram novas discussões sobre as taxas a serem aplicadas aos
produtos importados e sobre a proteção da indústria nacional; se num primeiro momento o
principal entrave à industrialização haviam sido os interesses ingleses, nos anos seguintes
este entrave foi interno, configurado como a pressão exercida pelos interesses da
monocultura. Mas em 1878 os problemas de caixa do Tesouro cuidaram de elevar para 50%
as taxas de importação, que redundaram em alívio e certa proteção para a indústria interna,
finalmente dando condições para um primeiro surto industrial entre as décadas de 1880 e
1890.
“Em 1885, registrase em São Paulo o funcionamento de 13 fábricas
têxteis com 1.670 operários e 3 fábricas de chapéus com 315 operários. No
mesmo ano no mesmo Estado sabemos ainda da existência de 7 empresas
metalúrgicas que reúnem cerca de 500 operários. Em 1889, contase no
Brasil 636 empresas industriais onde trabalham 54 mil operários. Em 1901,
entre as 91 mais importantes empresas industriais paulistas, 33 empregam
de 10 a 49 operários, 33 de 50 a 199, 22 de 200 a 499, duas outras ocupam
600 operários cada e uma empresa possui cerca de 800 operários.”154
4.2. Mudanças no quadro político
Mas a real implantação da industrialização brasileira só poderia ter seu início com
uma mudança radical processada nas direções políticas do país, onde os exportadores
agrícolas não fossem mais os controladores da máquina estatal, ainda que o processo de
acumulação da lavoura tenha sido determinante para o nascimento da indústria, como
destaca Sérgio Silva:
153
Idem, 1978, p. 2627.
154
SILVA, Sérgio. Expansão Cafeeira e Origens da Indústria no Brasil. Editora Alpha Omega, 1976, São
Paulo, pág. 77.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 95
“Ainda assim a produção de café serviu de base para a
industrialização enquanto cumpriu seu papel na acumulação de capital.
Mas na década de 1880 a 1890, as necessidades historicamente
determinadas pelo próprio desenvolvimento do capitalismo no Brasil e pela
sua inserção na economia mundial capitalista em formação conduzem ao
rompimento com as formas de acumulação do trabalho escravo,
características da economia colonial.
São essas transformações que fazem da economia cafeeira o centro de
uma rápida acumulação de capital baseada no trabalho assalariado. E é
como parte integrante dessa acumulação de capital que nasce a indústria
no Brasil.”155
155
Idem, 1976, p. 8081.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 96
Da Revolução de 1930 que levou Vargas ao poder, desencadeouse o Movimento
Constitucionalista onde os paulistas em 1932 levantaram armas contra o Governo. Durante
três meses ocorreram combates no território paulista e matogrossense, isolando São Paulo
do restante do país durante julho, agosto e setembro de 1932.
Comandada pelas elites a Revolução de 1932 foi apoiada pela FIESP que engajou
diversas fábricas na produção de material bélico; assim durante estes três meses, além de
tentar seguir com a vida civil na retaguarda, a indústria, o comércio, os transportes e as
comunicações, foram colocados diante do invulgar desafio de abastecer também várias
frentes de batalha com armas, munições e suprimentos. “A primeira vez que um instituto de
pesquisas brasileiro tomou parte ativa num movimento político militar foi quando o LEM156
desenvolveu atuação decisiva na Revolução Constitucionalista de São Paulo em 1932”.157
Os outros estados que inicialmente apontaram que iriam apoiar São Paulo como
Rio Grande do Sul e Minas Gerais recuaram, vindo a única adesão do Mato Grosso.
Isolados e em inferioridade numérica os paulistas foram derrotados, mas mesmo assim a
elite empresarial posará, no ano seguinte, com a convocação da Constituinte, de vencedora
moral e política do combate, alegando que Vargas foi incapaz de ignorar o clamor de São
Paulo. Por conta desta “visão paulista”, que em grande medida persiste até hoje, a revolução
de 1932 teve e tem um curioso aspecto bairrista do qual ainda se ufanam os paulistas.
Assim em 1934 foi fundada a Universidade de São Paulo, criada com a união de
faculdades préexistentes (como Direito e Medicina) e a criação de novos institutos (como a
Faculdade de Filosofia). A a USP já nasceu com um brasão onde se lê sugestiva divisa
latina "Scientia Vinces", ou “Vencerás pela Ciência”.
156
LEM – Laboratório de Ensaio de Materiais da Escola Politécnica de São Paulo.
157
VARGAS, Milton. Para uma Filosofia da Tecnologia. Editora Alpha Omega, 1994, São Paulo, pág. 233.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 97
O mais interessante do episódio talvez resida no fato de que pela primeira vez
tomouse consciência em território nacional do valor prático da pesquisa científica e a
necessidade de se investir nela. Nos anos seguintes a Universidade de São Paulo irá se
firmar como uma das mais relevantes instituições de ensino e pesquisa da América Latina,
contribuindo decisivamente para o desenvolvimento científico e industrial alcançado por
São Paulo e pelo Brasil.
4.3. A Industrialização
Desta forma, se por um lado a revolução de 30, não permite a Vargas romper
totalmente com a antiga elite agrária do país, por outro afastaa pela primeira vez na
história do cume do poder, abrindo espaço para novas posturas e novos interesses.
Porém transições desta natureza raramente são tão simples, e diante do levante
armado de 1932 em São Paulo, o Governo provisório se viu coagido pela necessidade de
compor com a elite cafeeira. O resultado desta composição foi a série de medidas
destinadas a auxiliar o setor em sua crise, lançadas em 1933.
A crise leva o Governo a comprar as safras de café que não tinham mais condições
de serem exportadas. Agindo desta maneira o Governo manteve o nível de demanda interna,
impedindo o colapso da economia cafeeira.
158
Idem, 1994, p. 238.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 98
“Ao garantir preços mínimos de compra, remuneradores para a
grande maioria dos produtores, estavase na realidade mantendo o nível de
emprego na economia exportadora e, indiretamente, nos setores produtores
ligados ao mercado interno. Ao evitarse uma contração de grandes
proporções na renda monetária do setor exportador, reduziamse
proporcionalmente os efeitos do multiplicador de desemprego sobre os
demais setores da economia.
(...) Dessa forma, a política de defesa do setor cafeeiro nos anos de
grande depressão concretizase num verdadeiro programa de fomento da
renda nacional.
(...) É portanto perfeitamente claro que a recuperação da economia
brasileira, que se manifesta a partir de 1933, não se deve a nenhum fator
externo e sim à política de fomento seguida inconscientemente no país e que
era um subproduto da defesa dos interesses cafeeiros.159”
Assim, quando o primeiro Governo de Vargas deu início ao processo de substituição
de importações, causou um surto – talvez inadvertido – de industrialização no país, logo,
em pouco tempo a capacidade ociosa da empresa nacional foi preenchida e o investimento
na produção industrial passou a ser altamente lucrativo, mesmo que contemplando apenas o
mercado interno, conforme relata Bresser Pereira:
“Vaise desenrolar então, a partir de 30, um drama, cujos contornos
se irão definindo cada vez mais. De um lado, lutando por uma volta ao
antigo regime, a agricultura latifundiária do café e o alto comércio ligado
ao café ou diretamente ao capitalismo internacional, com o apoio da classe
159
FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Nacional, 1999. p.190, 192 e 193.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 99
média parasitária ligada por laços econômicos e sociais (familiares mesmo)
à antiga classe dominante. Do outro, o Governo, no qual, além de parte das
referidas classes de oposição que aderiram para poder lutar por seu
interesses em campos mais favoráveis, além dêsse grupo vamos encontrar a
classe industrial, a classe proletária e uma nova classe média.” 160
A economista Maria da Conceição Tavares estudou o processo de substituição de
importações que foi operado no Brasil e no restante da América Latina a partir deste
período, para ela o desequilíbrio externo de 1914 a 1945 levou os governos a adotarem
medidas objetivando a defesa do mercado interno frente à crise mundial. O objetivo seria
antes defenderse do desequilíbrio externo do que estimular o mercado interno, e estas
medidas consistiam quase que exclusivamente em controle e restrição de importações.
160
PEREIRA, L.C. Bresser, Desenvolvimento e Crise no Brasil, Zahar Editores, 1968, Rio de Janeiro, pág.
25. [sic]
161
TAVARES, Maria da Conceição. Da Substituição de importações ao capitalismo financeiro: ensaios
sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
162
Idem, 1982, p. 33.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 100
Outros fatores contribuiriam para o desenvolvimento da industrialização brasileira,
como a facilidade do transporte e a presença do imigrante que produziram um salto
qualitativo entre 1919 e 1929 na indústria paulista.
Além disso, as relações capitalistas estavam mais avançadas no Sul, dando as
condições, juntamente com a política estatal de substituição de importações, para que
tivesse início, após a crise de 1929, a produção industrial de manufaturados no Brasil.
Alinhados a estes fatores podemos colocar a dependência nordestina com o comércio
internacional e sua baixa integração regional para começamos a pintar o quadro das
desigualdades regionais que a industrialização brasileira agravaria.
Apesar de ainda sentir a pressão da elite agroexportadora, neste período o Governo
passa a atender as demandas de novas classes emergentes: a classe proletária e uma nova
classe média, que agora é menos parasitária do Estado. Uma disputa política que pode ser
mais claramente compreendida quando analisamos a composição da nova classe industrial.
É comum encontrar relatos de que com a crise do café os produtores da monocultura
cederam espaço para os imigrantes, porém parece haver mais cinza nesta transição do que
preto e branco. Bresser Pereira sustenta que, com efeito, apenas uma pequena fração da
classe industrial surge na parcela da antiga classe dirigente que se alinha ao novo Governo,
tendo seus principais representantes na classe média paulista, especialmente entre os
imigrantes:
“Os empresários brasileiros, ou melhor, paulistas, segundo pesquisas
que realizamos, eram em geral imigrantes êles mesmos (50%), ou filhos e
netos de imigrantes. Apenas 16% dos empresários tinham origem em
famílias brasileiras, em que os pais e os avós eram brasileiros” 163
Aqui está colocada a controversa idéia de que o capital para esta produção industrial
era inicialmente familiar e imigrante, que passou a ser reinvestido na produção e expandiu
se. Mesmo Caio Prado Junior cai, em sua História Econômica do Brasil, na armadilha de
163
PEREIRA, L.C. Bresser, Desenvolvimento e Crise no Brasil, Zahar Editores, 1968, Rio de Janeiro, pág.
55.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 101
visualizar uma origem modesta para o empresariado brasileiro. Sérgio Silva não deixa de
notar esta imprecisão quase tradicional da historiografia e aponta que:
Corroborando esta tese está também Conceição Tavares ao apontar que “grande
parte das atividades substituidoras de importações era realizada por investimentos diretos
estrangeiros, associados ou não a empresários nacionais, que traziam consigo, além do
capital, a técnica adotada em seus países de origem”165. Somese a isso, o fato inegável de
164
SILVA, Sérgio. Expansão Cafeeira e Origens da Indústria no Brasil. Editora Alpha Omega, 1976, São
Paulo, pág. 93 e 95.
165
TAVARES, Maria da Conceição. Da Substituição de importações ao capitalismo financeiro: ensaios
sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. p.51
31/08/2006 20060830_rbns.odt 102
que com o florescimento da indústria parte do capital acumulado pela monocultura
encontrou seu caminho até esta nova fase de acumulação.
Os anos 30 trazem assim um conturbado período na história brasileira, marcados
por um forte nacionalismo, disputas políticas166 e pelo início da industrialização. Se até os
anos 30 o foco das políticas econômicas era a monocultura, não havendo política industrial
no Brasil, a mudança de atitude que vinha se consolidando, tomaria vulto durante o
segundo Governo Vargas167.
Em 1948 com o esgotamento das reserva de divisas o país precisa entrar em uma
política de controle cambial e discriminação das importações, o que termina por oferecer
166
Com a instituição do Estado Novo em 1937 foi dissolvido o Congresso, outorgada uma nova Constituição e
garantida a permanência de Vargas no poder até 29/10/1945, data em que tomou posse o advogado José
Linhares, levado à presidência por convocação das Forças Armadas, como Presidente do Supremo Tribunal
Federal, tendo em vista a deposição do titular Getúlio Vargas.
167
José Linhares permanecerá no cargo apenas até 1946, quando em 31/01/1946, toma posse o Marechal
Eurico Gaspar Dutra, eleito por sufrágio direto e de acordo com todos os dispositivos constitucionais de então.
Dutra é novamente sucedido por Getúlio Vargas, também em eleição direta.
168
TAVARES, Maria da Conceição. Da Substituição de importações ao capitalismo financeiro: ensaios
sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. p.70
169
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992).
1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de
São Paulo, São Paulo. p. 131
31/08/2006 20060830_rbns.odt 103
novo estímulo à industrialização, pois além da proteção cambial institui uma reserva de
mercado. Esta foi basicamente a fase de implantação das indústrias de aparelhos
eletrodomésticos e outros artefatos de consumo durável170.
Apesar de toda a “confusão”171 no quadro político durante os anos 50, a necessidade
de industrialização e a sua importância haviam se tornado quase consenso nas camadas
dominantes da sociedade brasileira, em parte pela situação deficitária da balança comercial,
em parte pela influência do pensamento de Raul Prebish e da CEPAL 172, que após a 2ª
Guerra Mundial ocuparamse do estudo do desenvolvimento dos países subdesenvolvidos
da América Latina. Assim, “Graças à emergência de uma camada tecnoburocrática
imbuída dessas idéias, criouse um padrão de intervenção de forma até relativamente
independente do grupo político no poder: o plano SALTE, de 19491954 (governos Dutra e
Vargas), o Programa de Metas, de 19561960 (governo JK) e o Plano Trienial (governo
Goulart). Também nesta fonte podem ser encontradas as raízes das grandes empresas
brasileiras, tais como a Petrobrás, BNDE e SUDENE.”173
170
Idem, 1994, p. 71
171
Vargas suicidase em 24 de agosto de 1954, assumindo então seu vice João Fernandes Campos Café Filho.
Seguese um novo período bastante conturbado na arena política brasileira, onde Café Filho é afastado por
motivo de saúde e depois sofre um impedimento. Com o afastamento de Café Filho, em 08/11/1955, o
advogado Carlos Coimbra da Luz, Presidente da Câmara dos Deputados, assume a presidência, onde
permanece por apenas três dias, tendo sido deposto por um dispositivo militar e considerado impedido de
exercer o cargo de Presidente da República pelo Congresso Nacional.
Entre 11/11/1955 a 31/01/1956 Nereu de Oliveira Ramos, então VicePresidente do Senado Federal, assumiu o
Governo em virtude do impedimento do Presidente João Fernandes Campos Café Filho e do Presidente da
Câmara dos Deputados, conforme deliberação do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. Somente em
31/01/1956, por eleição direta, a normalidade é restaurada, com a eleição do médico Juscelino Kubitschek de
Oliveira como Presidente da República. dados e datas: https://www.planalto.gov.br/historia.htm
172
CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina
173
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992).
1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de
São Paulo, São Paulo. p. 115
31/08/2006 20060830_rbns.odt 104
outras indústrias mecânicas de bens de capital”174. O preço desta nova fase da
industrialização foi o agravamento das desigualdade regionais e aumento da inflação, além
disto passa a existir a percepção de que algo está faltando na industrialização brasileira e
que a mesma ocorre acelerada, mas incompletamente:
“Nesse modelo de desenvolvimento “dependente”, havia lugar para o
crescimento de um setor industrial local, que se efetuaria com recurso à
tecnologia estrangeira. Notese porém que a produção transplantada dos
países adiantados se desloca para a periferia do subdesenvolvimento
apenas após a tecnologia envolvida ter se tornado rotineira.
Até a implantação da indústria automobilística não são feitas grandes perguntas ou
reflexões sobre a origem da tecnologia, aceitandose como certo que a tecnologia seria de
alguma forma importada e paga, porém, entre o fim dos anos 60 e início dos 70 com a
percepção de que “[u]m país que não desenvolva por si mesmo sua capacidade científica e
tecnológica, sem dúvida se tornará dependente tecnológicamente e será dominado pelos
países mais avançados.”176, foi desencadeando uma mudança de postura do Governo
brasileiro.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 105
Em 1974 Geisel lançou o II PND, que incluía a acentuada atuação das estatais na
economia e visou promover novamente um movimento de substituição de importações
como forma de poupar divisas (especialmente devido à crise do petróleo). Os empresários
brasileiros encontraram neste período uma infraestrutura bastante favorável em energia,
metalurgia, química e bens de capital, além de um novo padrão qualitativo na mão de obra
oriunda das universidades e institutos de pesquisa.
Dentro do segundo PND estava finalmente uma política de informática icialmente
desvinculada de outras áreas em geral, que não a militar como nota Gildo Magalhães, “[a]
formação de uma política nacional de informática após 1974 se daria no ápice de um
segundo ciclo industrial após Vargas, que se poderia situar em princípio entre os anos de
1967 e 1981.”177 É nesta época, com a formulação desta política nacional de informática, que
ganha corpo, entre os profissionais da nova área, a idéia de que a dependência tecnológica
era muito prejudicial ao desenvolvimento:
Durante os anos 70 o Governo brasileiro buscou fugir do seu modelo tradicional de
importação de tecnologia e objetivou desenvolver uma indústria de microcomputadores
100% nacional, empreendimento que ao menos no quesito técnico teve significativo
177
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992).
1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de
São Paulo, São Paulo. p. 135
178
COSTA MARQUES, Ivan da. Cloning Computers: From Rigths of Possession to Rigths of Creation. In:
Science as Culture. Routledge, Jun. 2005. Vol. 14, No. 2, 139160.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 106
sucesso. Além da idéia de capacitação nacional, animava também este projeto o peso dos
computadores e componentes eletrônicos na situação desfavorável da balança comercial.
A capacitação nacional deveria ser baseada na criação de uma massa crítica de
técnicos brasileiros, uma posição que inicialmente encontra eco em diferentes setores da
sociedade, dos militares à comunidade científica e burocracia estatal, fortalecida ainda com
a existência de relativa capacitação tecnológica no Brasil179.
Neste período está a resposta da pergunta que abre este capítulo, qual a origem dos
técnicos e engenheiros de informática brasileiros?
Basicamente a partir do final dos anos 60, com o esforço da engenharia reversa e a
posterior reserva de mercado181 – implementada quando o Brasil atingiu capacidade técnica
para produção de computadores, sem ter a capacidade industrial para sua produção – foram
formados os primeiros grupos de profissionais de informática com profundo domínio de
hardware e software, o material humano que foi base de sustentação e multiplicação da
informatização brasileira nas décadas de 80 e 90.
Vigevani, assim como Gildo Magalhães (vide nota 173) também enxerga uma tecno
burocracia que adere ao conceito de capacitação nacional para além das visões ideológico
partidárias, “[o]s técnicos desses núcleos tinham diferentes origens: escolas de alto
179
VIGEVANI, Tullo. O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma Análise Sobre
Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995.
180
COSTA MARQUES, Ivan da. Cloning Computers: From Rigths of Possession to Rigths of Creation. In:
Science as Culture. Routledge, Jun. 2005. Vol. 14, No. 2, 139160.
181
Para a discussão detalhada da Reserva de Mercado da Informática, estressando diferentes aspectos, ver:
Ivan da Costa Marques, Gildo Magalhães do Santos Filho, Maria Helena Tachinardi e Tullo Vigevani.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 107
gabarito tecnológico (Politécnica da USP, ITA, Engenharia da PUC/RJ, COPPEUFRJ),
orgãos públicos, etc.”182
Chegando nos anos 1980 a crise econômica aliada à ideologia liberalizante colocou
um freio nas conquistas até aqui realizadas:
31/08/2006 20060830_rbns.odt 108
Ao contrário do que aconteceu em outros países, nos anos 80, o capital para a
produção do computador brasileiro não teve origem nos grupos industriais, mas sim no
sistema financeiro. Duas razões são apontadas para esta origem, a primeira sendo a
indução do Estado, e a segunda a visão do setor, que considerou os benefícios da automação
como caminho para a diminuição de custos na operação da economia inflacionária; assim
nos anos 80, no Brasil, os bancos criam e/ou adquirem empresas de tecnologia. Grandes
empresas de tecnologia, ainda em operação no Brasil, são herança deste movimento como a
Scopus (banco Bradesco) e a Itautec (banco Itaú).
Porém, a pressão americana sobre as reservas aplicadas ao setor de informática pelo
governo brasileiro – formalizada em ameaça de sanções aos produtos exportados pelo
Brasil – aliada ao descontentamento interno com a burocracia e questionamentos sobre a
capacidade do governo em gerir a política de informática, indicavam que logo este mercado
sofreria uma mudança185. Um dos principais pontos do qual faziam questão os americanos
era uma lei brasileira do software, assunto abordado a seguir.
4.4. História do Software no Brasil
Como já foi mencionado neste texto, além da pesquisa, são necessários mais dois
passos na consolidação da tecnologia: produção e uso. O uso é um fato culturalmente
determinado e se relaciona com a capacidade social de absorver a tecnologia, está
diretamente ligado ao nível educacional da população. Produção, contudo, é um fator mais
Cf. SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
185
31/08/2006 20060830_rbns.odt 109
complexo, está relacionado com a existência ou criação da base industrial necessária para
tornar a inovação em produto viável, logo depende da acumulação prévia de capital já
convertido ou passível de conversão em instalações produtivas.
“No Brasil, como, aliás, em outros países, a indústria de informática
não surgiu como consequência do fluir das forças produtivas ou da “mão
invisível do mercado”, mas como consequência de uma ação deliberada do
Estado, que foi levado a isto pela conjugação de diferentes razões, inclusive
e principalmente por vontade política e por interesses que não eram
diretamente empresariais, ao menos na origem”186.
O protótipo G10 (“Patinho Feio”), realizado pela Escola Politécnica da USP em
1971 foi o primeiro computador brasileiro, construído sob o patrocínio do GTE (Grupo de
Trabalho Especial) da Marinha/BNDE, formado com objetivo de desenvolver o projeto do
computador nacional. Além da Escola Politécnica da USP que ficou responsável pelo
projeto do hardware, a PUCRJ foi patrocinada para desenvolver o software188.
Fundada em 1974 a COBRA 189 industrializou o protótipo G10, cuja evolução o G
11 foi o início de sua linha comercial (modelo 530). “Ao mesmo tempo foi nacionalizado o
computador da Ferranti inglesa, para a Marinha (que como vimos estava na origem da
186
VIGEVANI, Tullo. O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma Análise Sobre
Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. p.75.
187
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992).
1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de
São Paulo, São Paulo. p. 157
188
SANTOS FILHO, loc. cit.
189
Computadores Brasileiros S.A.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 110
substituição de importações de computadores), resultando na fabricação de um modelo
destinado também para o uso civil em controle de processos.190”
O dirigismo estatal na criação da indústria de informática deu origem a diferentes
atritos com os Estados Unidos191, agravados sensivelmente em outubro de 1984, com a
aprovação pelo congresso nacional da Lei de Informática 192 quando se intensificou a pressão
norteamericana contra a política de informática do governo brasileiro, com a possibilidade
concreta de retaliações contra produtos brasileiros. Desde os primórdios destes atritos, os
softwares se apresentam como questão estratégica para o Brasil, estratégia e problemática
com o forte impulso protecionista dos anos de 1982, 1983 e 1984.
“Com o Ato Normativo 022/82 a SEI conferiu ao software natureza de
tecnologia não patenteável, negando a tais produtos direitos de propriedade
autoral (copyright), e ao mesmo tempo instituiu o registro dos programas de
computador comercializados no mercado local, cedendo preferência aos
produtos desenvolvidos no país”193.
Essa medida foi tomada em resposta à tentativa de empresas norteamericanas de
registrar no Brasil os seus softwares como obras intelectuais, ou seja, já em 1982 a questão
da propriedade das idéias estava colocada no mercado brasileiro de softwares.
No ano de 1986 as relações com os Estados Unidos estavam extremamente tensas e
o copyright para o software era uma das principais questões em discussão. Os órgãos do
190
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992).
1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de
São Paulo, São Paulo. p. 159
191
Cf. VIGEVANI, Tullo. O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma Análise Sobre
Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. ;
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do projeto
desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para o Brasil (19711992).
1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Universidade de
São Paulo, São Paulo. ; TACHINARDI, Maria Helena. A Guerra das Patentes : O conflito Brasil x EUA
sobre propriedade intelectual. São Paulo : Paz e Terra, 1993.
192
Vide: Anexos, documento III
193
VIGEVANI, Tullo. O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma Análise Sobre
Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995.
p.104.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 111
governo encarregados de gerir a política de informática, pretendiam que o software fosse
comercializado com controle sobre o limite de pagamentos de royalties e pela via do
licenciamento de empresas brasileiras. Havia também a intenção de exigir que o registro
dos softwares fosse feito na forma de código fonte, reflexo da busca da capacitação para a
concepção e engenharia dos produtos, tom principal de toda a política brasileira de
informática, o que alarmava as empresas norte americanas.
(...) a abertura do programa fonte era um risco inaceitável para as
empresas produtoras de software, pois abririam mão da matériaprima
básica do retorno de seu investimento intelectual em pesquisa e
desenvolvimento. Este era, certamente, um caso de conflitualidade
estrutural de difícil equacionamento, em que a perspectiva cooperativa
tinha difícil aplicação”.194
A questão do software mereceu então lei específica 195, criada devido à pressão
americana e que foi enviada para tramitar no Congresso, mantendo as premissas brasileiras
194
Idem, 1995, p. 246 e 248.
195
Vide: Anexos, documento III (Lei No 7,646, de 18 de dezembro de 1987)
31/08/2006 20060830_rbns.odt 112
de inserção na indústria de informática: mantendo o controle do mercado e buscando a
capacitação para a concepção e engenharia dos produtos informáticos.
“A iniciativa da Microsoft visou, inicialmente, a algumas empresas
brasileiras: além da Itautec, Sid, Microtec, Prológica e outras. Cerca de
cinqüenta empresas brasileiras poderiam ser atingidas pela acusação. (...) a
SDD – Sistemas de Informática que licenciou para outros quinze fabricantes
o chamado SSDDOS, negou desde o princípio qualquer plágio. (...) provas
em poder da Microsoft, obtidas através de peritagem em micros e
programas, eram em alguns casos comprobatórias e em outros
insustentáveis, mas o fato é que estas pressões produziram resultados
importantes (...)”.196
Destes o mais relevante talvez tenha sido o auxílio em minar o apoio interno à
Reserva de Mercado. Diante das acusações, diversos empresários viramse compelidos a
considerar e defender o licenciamento do produto da Microsoft. Esta postura parece ter sido
particularmente forte entre os casos onde havia a perspectiva “comprobatória” de fraude,
que tornava o licenciamento ainda mais atraente, já que não haveria grande investimento em
pesquisa e desenvolvimento a ser perdido.
Este relato dá a idéia da importância para o Brasil da autonomia sobre os softwares
e em especial sobre o seu próprio sistema operacional, assunto sobre o qual podese juntar a
efetiva atuação do USTR197 contra a obtenção de um sistema operacional pelo Brasil.
196
VIGEVANI, Tullo. O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma Análise Sobre
Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995. p.
252.
197
United States Trade Representative
31/08/2006 20060830_rbns.odt 113
Um conjunto de empresas brasileiras, unidas na Associação para o Progresso da
Informática (API) vinha negociando há três anos com a ATT 198 a compra de seu sistema
UNIX, com o código fonte incluso, até que a negociação foi terminada pela ATT.
“(...) o Departamento de Comércio e o USTR não ordenaram medidas
concretas à ATT, mas alertaram para os perigos que a falta de proteção de
software no Brasil traria para um produto no qual estava implícito o
licenciamento do códigofonte.
(...) a ATT interrompeu as negociações, o que evidenciou a força de
liderança da ação estatal norteamericana, que, confirmando mais uma vez
nossa hipótese, tinha objetivos de caráter estratégico, mais amplos que os
aspectos comerciais específicos”.199
Nesta época o Brasil já contava com inúmeros “clones” do UNIX desenvolvido por
empresas como “COBRA (SOX), Digirede (Digix), Edisa (Edix), USP e Prológica (Real),
Núcleo de Computação e Eletrônica da UFRJ (Plurix)”200, mas os empresários brasileiros
estavam em busca do licenciamento do UNIX para contarem com um padrão único.
O contencioso da informática entre Estados Unidos e Brasil arrastouse por anos,
periodizados entre setembro de 1985 e outubro de 1989 pelo Prof. Tullo Vigevani. Entre
todas as questões levantadas nos anos de debate entre as duas nações foram contestadas
posições sobre: a legalidade da engenharia reversa, o direito à autonomia tecnológica,
proteção à indústrias nascentes, reserva de mercado e clonagem de sistemas.
198
American Telephone and Telegraph
199
VIGEVANI, Tullo. O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma Análise Sobre
Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da Universidade de São Paulo, 1995.
p.264.
200
Idem, 1995, p. 264.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 114
Atuando dentro dos limites técnicos da lei de reserva de mercado, a SEI (Secretaria
Especial de Informática) recusou o registro e proibiu a comercialização no Brasil do MS
DOS em setembro de 1987, por existir um similar nacional, o Sisne, da Scopus. Com a crise
econômica instalada no Brasil o momento era oportuno para o governo americano “atender
às reivindicações da Microsoft”201 (que então não tinha nenhuma participação no mercado
brasileiro) e anular porções da lei do software, relacionadas à propriedade intelectual,
inaceitáveis para os negociadores norteamericanos.
Esta ação fora desencadeada por empresas brasileiras que considerando a posição da
Microsoft de líder neste segmento, entraram em um acordo com a empresa e solicitaram o
registro do MSDOS a SEI. O resultado da negativa foi a Scopus ser acusada de pirataria
pela Microsoft, que inclusive ao lado de outras produtoras de software como Lotus e
Autodesk, buscou levar o caso ao Congresso Norte Americano.
O resultado direto dos protestos da Microsoft foi o anúncio, pelo presidente Reagan,
que o Brasil sofreria sanções no valor de 105 milhões de dólares, em produtos a serem
definidos, ação que serviu definitivamente para minar o já vacilante apoio da sociedade e
da classe empresarial (que como sabemos nunca aderiu com muita convicção) à reserva de
mercado. O valor da sanção inclusive cheou a ser contestado, pois se fosse constatado
algum prejuízo da Microsoft ele escilaria entre 1,5 e 4 milhões de dólares.
Pela segunda vez neste texto é necessário remeter o leitor, pela semelhança dos
casos, à questão da clonagem do software do Lisa, o acordo da Microsoft com John Sculley
e o indeferido processo da Apple contra a Microsoft por conta da “similaridade” do
Windows com os sistemas operacionais dos Macintosh.
201
Idem, 1995, p. 298
202
Idem, 1995, p. 301
31/08/2006 20060830_rbns.odt 115
Como forma de suavizar a postura americana e tentar evitar as sanções anunciadas
Sarney sancionou a Lei 7.646 (18/12/1987), chamada Lei dos Softwares, com 13 vetos, que
atendiam parcialmente às demandas norteamericanas, que viriam a ser plenamente
satisfeitas até a regulamentação da lei203.
E em 1991 a Lei 8.248, de 23 de outubro é sancionada pelo presidente Fernando
Collor de Mello, terminando em definitivo com a reserva do mercado brasileiro de
informática em outubro de 1992, datas que marcam a capitulação brasileira no seu objetivo
de autodeterminação tecnológica.
203
VIGEVANI, Tullo, loc. cit.
204
TIGRE, Paulo Bastos. Liberalização e capacitação tecnológica: o caso da informática pósreserva de
mercado no Brasil. In: SWARTZMAN, Simon (Coord.); KRIEGER, Eduardo... [et. al.]. Ciência e Tecnologia
no Brasil : política industrial, mercado de trabalho e instituição de apoio. Rio de janeiro: Editora da
Fundação Getúlio Vargas, 1995. p. 179.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 116
4.5. O Software Livre e a política brasileira de desenvolvimento
tecnológico, uma nova tentativa de autodeterminação.
O florescimento dos microcomputadores nos Estados Unidos e no Brasil, apesar de
tudo, guarda certas semelhanças. Se nos Estados Unidos foi a contracultura quem criou o
PC, no Brasil ele foi criado pela engenharia reversa, ambos movidos a combustíveis com
uma identidade comum: a rebeldia.
É preciso destacar o peso do conceito de “engenharia reversa” e dar alguma noção
de sua importância, pois mesmo diante do fracasso, ele capacitou toda uma geração de
técnicos brasileiros.
Este conceito faz um paralelo com a importância do conhecimento do código fonte
dos softwares e do sistema operacional, já que é nesta dimensão que está a diferença
fundamental da capacitação para o Estado: ter técnicos que sejam apenas “operadores
certificados” de um sistema operacional alienígena ou ter “engenheiros” de um sistema
operacional, nacional (ou transnacional no caso do Linux).
31/08/2006 20060830_rbns.odt 117
de consumo, dirigir a orientação das atividades sociais produtivas, e
determinar o uso dos recursos naturais.”205
Dos três pontos que Sagasti elege como centrais na autodeterminação tecnológica de
um país206, o Brasil só conseguiu implementar satisfatoriamente a capacidade de gerar
conhecimento técnico, falhando na tomada de decisões autônomas e falhando na capacidade
de produção interna. Assim, os anos 90 vão configurar o Brasil basicamente em mais um
mercado consumidor de informática.
Este cenário ficará praticamente inalterado até 2002 quando o PT chega ao poder
com a eleição de Lula. O PT trazia consigo diversas experiências implantação bem sucedida
de Softwares Livres em administrações municipais, embora o Software Livre não seja seja
exclusividade do PT207 é sintomático que logo que se confirmou a vitória de Lula, a
imprensa tenha especulado que Bill Gates, por intermédio do senador Cristóvão Buarque,
tenha enviado uma cópia de seu livro A empresa na velocidade do pensamento, e uma carta
convidado Lula para visitar os EUA e conversar sobre como implementar projetos de alta
tecnologia no Brasil208. Afinal, a adoção em escala Federal da políticas petistas
representaria não apenas uma perda de mercado, como um péssimo precedente para a
Microsoft.
205
SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, Planejamento e Desenvolvimento Autônomo. São Paulo:
Perspectiva, 1986. p. 130131
206
Francisco Sagasti, professor da Universidade do Pacífico, em Lima na década de 90, foi chefe de
Planejamento Estratégico do Banco Mundial de 1987 a 1991 e trabalhou nos ministérios das Relações
Exteriores e Planejamento e Indústria, do Peru. Segundo Sagasti três pontos são centrais na autodeterminação
tecnológica:
a) A capacidade de tomar decisões autônomas em questões de tecnologia.
b) A capacidade de gerar de modo independente os elementos críticos do conhecimento técnico que
são necessários à obtenção de um determinado produto ou processo.
c) Capacidade potencial autônoma de produzir, dentro do país, os bens e serviços considerados
essenciais na estratégia de desenvolvimento.
in SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, Planejamento e Desenvolvimento Autônomo. São Paulo:
Perspectiva, 1986. p.128129
207
O Metrô da cidade de São Paulo constituí um dos casos de sucesso mais antigos na implantação de
Software Livre na administração pública brasileira, com um processo cujo início data de 1997 e tem servido
de modelo para diversas autarquias, mas é com os programas governamentais de inclusão digital que o
Software Livre vai ganhar o seu momentum no Brasil.
208
LÓPEZ, Nayse Publico.pt Eleições Brasil 2002 : Lula virtualmente eleito com 66 por cento das
intenções de voto. 22 set. 2002. Disponível em:
<http://dossiers.publico.pt/shownews.asp?id=191976&idCanal=989>. Acesso em: 20 ago. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 118
Do exposto até agora, fica evidente a importância estratégica do Software Livre,
para o governo brasileiro (e para outros governos); um ponto importante é a diminuição dos
gastos com licenciamento de softwares, que reflete na remessa de dólares ao exterior, e traz
o benefício adicional de diminuir os impedimentos orçamentários para programas
governamentais de inclusão digital, uma característica que é em si mesma geradora de
resultados sociais maiores.
209
Jornal O Estado de S. Paulo (15/08/2004 – Geral Um militante na batalha pelo software livre Ex
comunista, chefe do ITI agora luta pela adoção dos programas gratuitos).
210
Notícias veiculadas pela imprensa em 05/05/2006 dão conta da disposição da Prefeitura paulista em utilizar
softwares proprietários nos Telecentros indicando uma mudança de postura sobre o Software Livre juntamente
com a mudança da administração. Vide:
IDG Now! Internet Governo Eletrônico : Telecentro de São Paulo começa a usar softwares da Microsoft.
05 Abr. 2006. Disponível em: <http://idgnow.uol.com.br/internet/2006/04/05/idgnoticia.200604
05.6370476977/IDGNoticia_view>. Acesso em: 12 Abr. 2006
IDG Now! Computação Corporativa Software Livre : Software livre não é prioridade em SP, diz
secretário. 26 Mai. 2006. Disponível em:
<http://idgnow.uol.com.br/computacao_corporativa/2006/05/25/idgnoticia.200605
25.1402726512/IDGNoticia_view>. Acesso em: 12 Abr. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 119
Com a chegada do PT ao poder em 2002, chega também a política petista de
adoção de Software Livre em geral e do Linux em particular, consolidada por experiências
em diversas prefeituras e no governo do Rio Grande do Sul, e pelos Telecentros paulistas.
Quando Lula assume em 2002 Sérgio Amadeu da Silveira é indicado como diretor
do ITI (Instituto Nacional da Tecnologia da Informação) onde dá início a agressiva política
de implantação do Software Livre em toda a administração federal.
As motivações desta política são consistentes, para um governo o Software Livre é
estratégico por diversas razões, além da já mencionada questão macroeconômica, existem
ainda a independência e autonomia tecnológica, a segurança de informações, e a
independência em relação a fornecedores para serem consideradas.
Razões que não passam despercebidas pelo novo Governo Federal, que oficialmente
integra o Software Livre à política de ciência e tecnologia:
“O presidente Luís Inácio Lula da Silva, em Decreto de 29 de outubro
de 2003211, instituiu oito comitês técnicos com o objetivo de coordenar e
articular o planejamento e a implementação de Software Livre, inclusão
digital e integração de sistemas, dentre outras questões relacionadas.
Atualmente, o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação ITI
coordena o Comitê Técnico de Implementação de Software Livre.”212
A posição do governo é reiterada em várias oportunidades, onde incentiva a adoção
e a produção de Software Livre como um novo paradigma capaz de possibilitar o
crescimento e fortalecimento da indústria de softwares, gerando emprego e renda.
211
Vide: Anexos, documento IV.
212
fonte: http://www.iti.br/
31/08/2006 20060830_rbns.odt 120
O discurso do então Ministro da Casa Civil (ministério ao qual o ITI é filiado), José
Dirceu, feito na abertura do Seminário de Software Livre organizado pelo Congresso
Nacional213, dá o tom dessa dimensão política:
Senhoras e senhores...
(...) A tecnologia da informação é um dos caminhos para o almejado
crescimento. É necessário que o país produza bens de elevado valor
agregado, como é o caso de softwares, e seja capaz de colocálos de forma
competitiva no mercado internacional. Somente assim conseguirá quebrar
o ciclo histórico e empobrecedor caracterizado por importações de bens de
elevado custo contra exportação de mercadorias de pequeno valor. (...) Da
mesma forma devemos incentivar a nossa inteligência coletiva que
permita a redução do pagamento de direitos autorais, na forma de
royalties.
(...) O movimento do software livre traduz exatamente esses anseios,
além de reafirmar nosso compromisso com a redução de custos, com a
diversificação de fornecedores, com o domínio tecnológico e com a
capacitação de nossas empresas. Dominar o código fonte, usar totalmente
213
Com o objetivo de discutir a utilização do Software Livre no Brasil, o Senado Federal e a Câmara dos
Deputados promoveram a “Semana do Software Livre no Legislativo”, entre os dias 18 e 22 de agosto de
2003, no Congresso Nacional. Vide: www.congresso.gov.br/softwarelivre
31/08/2006 20060830_rbns.odt 121
um software sem restrições, propiciar a criatividade e o desenvolvimento
coletivo são condições para o rápido progresso nessa área.
Além do convite para Lula visitar a Microsoft, a empresa norteamericana passou a
atuar com renovado interesse no estabelecimento de parcerias com diversas esferas do
governo, na forma de descontos e/ou doações de softwares, enquanto este por sua vez mais
se mostrou arredio aos novos gestos de amizade, declinando e optando por buscar outras
soluções tecnológicas.
214
Discurso do ministrochefe da Casa Civil, José Dirceu, na solenidade de abertura do seminário "Software
livre e Desenvolvimento do Brasil", no Americel Hall, localizado na Academia de Tênis, em Brasília/DF. 19
Ago. 2003. Disponível em:
<www5.senado.gov.br/boletimprodasen/ssl/semanaslleg/dirceu/document_view?month:int=6&year:int=2005>
ou <www.iti.br/twiki/bin/view/Main/DiscursoDirceu> ou
<www.presidencia.gov.br/casacivil/pronunciamentos/jd_19082003pr.htm>
Acesso em: 10 Ago. 2006. Grifos nossos.
215
O Pingüim Avança. Carta Capital, 17 de março de 2004 Ano XI Número 345.
216
Interpelação judicial da Microsoft contra Sérgio Amadeu, presidente do ITI.
3a. Vara de Justiça Federal de Barueri, SP. Disponível online em:
<http://www.cic.unb.br/docentes/pedro/trabs/eucaristia_files/interpMS.html> e
<http://www.softwarelivre.org/downloads/interpelacaoMicrosoftxAmadeu.pdf>. Acesso: 17 Ago. 2006
217
Group Vice President, Worldwide Sales, Marketing and Services Group
31/08/2006 20060830_rbns.odt 122
mencionado encontro dos analistas financeiros (os negritos destacam os trechos
considerados mais relevantes):
“(...) Eu gostaria de lhes dar três coisas: Eu gostaria de falar um
pouco sobre como nós mobilizamos. (...) Eu gostaria de tocar brevemente
no trabalho que estamos fazendo com governos acerca de alguns destes
cenários de inclusão digital.
(...) Agora nós temos um programa chamado Partners in Learning218
que está operando em 91 países, onde nós fornecemos softwares para
educação, treinamos professores, e fazemos parcerias com empresas locais
para a reciclagem de PCs. (...) Um exemplo que encontramos em diversos
países é que eles focam em programas de PCs populares. Vou lhes
apresentar um cenário. Vou tratar do Windows Starter Edition, mas quero
lhes apresentar o cenário no Brasil. O governo brasileiro estava bastante
focado na inclusão digital, e eles iniciaram uma discussão sobre o que
chamam PC Conectado, que era fornecer no país um PC de baixo custo
para usuários iniciantes. O governo, através de um boa discussão com
parceiros, promoveu uma redução de impostos para PCs independente de
qual sistema operacional eles usem, sendo ele Linux ou Windows, deixando
o consumidor decidir.
218
ou “Parceiros no aprendizado” em português.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 123
Nós então trabalhamos bem próximos aos consumidores no Brasil
para criar uma versão do Windows Starter Edition em português
brasileiro. Nós trabalhamos com inúmeras empresas brasileiras, incluindo
Positivo, um OEM local, e outros OEMs incluindo Itautec, Novadata, Semp
Toshiba; e trabalhamos com os principais distribuidores brasileiros
incluindo Magazine Luiza, Casas Bahia, Extra, e Ponto Frio.
E conforme o governo continua a dar forma ao seu programa, nós
descobrimos que indo ao mercado com estes parceiros, com a versão focada
do Windows Starter Edition, obtivemos resultados muito positivos. Na
verdade, no Brasil, se olharmos para o trimestre atual versus o trimestre de
um ano atrás, a venda de PCs para o consumidor cresceu 45%, e nossa
venda de unidades do Windows cresceu 107%.
Windows Starters Edition foi uma grande parte desse crescimento,
mas também o Windows XP Windows XP Home Edition cresceu,então não
apenas atingimos o usuário iniciante de PCs, como a oportunidade de
upgrades no país é ainda bastante positiva.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 124
As declarações de Kevin Johnson são verdades parciais, suscitam a reflexão de
alguns pontos, e auxiliam na contextualização de outros. Primeiro há a admissão clara e
formal de uma política de lobby sobre os governos e seus representantes 220, o que não é
exclusividade da Microsoft, mas ajuda a contextualizar o convite feito por Bill Gates a Lula.
Depois há a questão da catequização de professores e alunos, conforme a Microsoft
fornece “software para educação”, que por sua vez ajuda a contextualizar as declarações de
Sérgio Amadeu à Carta Capital.
Ele é vendido com um preço diferenciado e faz parte da estratégia da Microsoft de
combate à pirataria. Também tem sido utilizado pela empresa como forma de concorrer
com o custo quase zero do Linux nos programas governamentais de inclusão digital.
Devido às suas limitações práticas foi apelidado por seus críticos de "Windows dos
pobres", em referência ao fato de que a simplificação do sistema, alegadamente a razão para
o preço diferenciado, traduzse em limitações de uso em relação as outras versões do
Windows XP.
Segundo a Microsoft as limitações não são relevantes para o primeiro computador
de um usuário, e o públicoalvo do Starter Edition é justamente a população que busca sua
inclusão digital com o programas como o do PC Conectado.
Entre as limitações do Starter Edition temos a fato de que o usuário não pode abrir
mais de três aplicativos por vez, com três janelas de cada um; desconsiderados programas
antivírus e discadores de internet que não são contabilizados. Esta versão simplificada do
Windows também não traz recursos de conexão para redes locais de computadores.
220
Sobre isto é interessante notar, por exemplo, a insistência de Bill Gates em um encontro pessoal com Lula.
Depois do primeiro fracasso em 2002, logo após a eleição presidencial, o fundador da Microsoft faz nova
investida em 2005 no fórum de Davos.
Vide: SOUZA, Leonardo Folha OnLine Presidente evita ter encontro com Bill Gates. 29 Jan 2005.
Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u66930.shtml>. Acesso em: 20 ago. 2006
31/08/2006 20060830_rbns.odt 125
O Windows XP Starter Edition é talvez o mais eloqüente exemplo da importância
da autodeterminação tecnológica para os países do Terceiro Mundo 221, pois exibe
claramente a impossibilidade de um país consumidor de tecnologia alienígena em tomar
decisões autônomas e ter acesso a artefatos técnicos avançados, novamente recorremos à
citação de Gildo Magalhães lembrando que “a produção transplantada dos países
adiantados se desloca para a periferia do subdesenvolvimento apenas após a tecnologia
envolvida ter se tornado rotineira” (citação na página 105). No caso específico do
Windows XP Starter Edition há um componente perverso que é a intenção de produzir um
produto inferior derivado de outro superior. Todas as explicações técnicas, comerciais e
mercadológicas que possam ser enumeradas na defesa desta abordagem não podem
competir com o argumento de que no Software Livre as limitações, quando existirem, serão
determinadas pelo usuário que tem pleno acesso a tecnologia e não por uma empresa
estrangeira. Este aspecto será melhor discutido nas conclusões que se seguem.
221
O conceito de “TerceiroMundo”, com o desaparecimento daquele que seria o SegundoMundo, vem sendo
revisto e muitos acadêmicos concordam que é uma categoria ultrapassada, melhor substituída por expressões
como “em desenvolvimento”. Sendo este um trabalho de história a defesa da expressão “Terceiro Mundo” é
baseada na carga histórica e ideológica que carrega, já que separa com clareza o lado da mesa em que países
como o Brasil estão sentados. O peso do termo “Terceiro Mundo” não nos parece nem próximo da
subentendida direção de progresso presente no termo “em desenvolvimento” justificando assim, plenamente,
sua utilização.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 126
5. Conclusões
Francisco Sagasti alerta em sua obra “Tecnologia, Planejamento e Desenvolvimento
Autônomo” que os meios de controle dos países desenvolvidos sobre os subdesenvolvidos
mudaram dos equipamentos produtivos para a os recursos financeiros e agora estão
representados no controle da tecnologia. “Haverá uma tendência em utilizar o acesso à
tecnologia como alavanca principal nas relações de dominação entre os hemisférios norte
e sul, com a utilização subsidiária dos alimentos e, em alguns casos, do capital, como
complemento.”222
Para esta pesquisa, tratando agora do significado que tem para o Brasil o Software
Livre, é interessante refletir sobre a proposta de Sagasti para a superação desta dominação
tecnológica e a eventual viabilização de uma autodeterminação tecnológica para o Terceiro
Mundo.
Esta proposta passa pela criação de uma aliança de cooperação científica, que
confessadamente só funcionaria em um contexto de cooperação econômica e política mais
amplo. Destarte, ciente das dificuldades e da aparência utopista de sua proposta, Sagasti
enumera as vantagens que tal cooperação traria aos países subdesenvolvidos:
2. Aumento da massa crítica mínima necessária para que o esforço tecno
científico seja viável.
4. Redução dos gastos individuais dos países com recursos humanos.
Perspectiva, 1986. p. 133.
N. do A. a versão original em espanhol, Tecnología, Planificación y Desarrollo Autónomo, data de 1977
31/08/2006 20060830_rbns.odt 127
E aponta também o que considera as principais dificuldades na implementação de
sua proposta:
2. Mudança do conceito de “região”, onde o agrupamento dos países dar
seia não mais por critérios geográficos e sim pela natureza dos problemas a
serem resolvidos.
3. Heterogeneidade dos regimes políticos e suas orientações.
4. Diferença nos níveis de desenvolvimento, especialmente tecnológico.
5. Pressões dos países industrializados.
6. Conduta das comunidades científicas autóctones, que não raro preferem
ligarse a centros de excelência nos países desenvolvidos.
Por tudo que se leu até aqui, a proposta de cooperação do livro de Francisco Sagasti,
aparece contemplada na maioria das vantagens e superando as desvantagens no atual
movimento do Software Livre e em especial no caso do Linux.
A massa crítica mínima necessária para tornar viável o esforço tecnocientífico do
seu desenvolvimento é fornecida pela própria comunidade de desenvolvedores de Software
Livre, superando sob qualquer forma de aritmética a capacidade individual de
desenvolvimento de um Governo ou empresa. A redução dos gastos individuais dos países
em pesquisa e desenvolvimento ou com com recursos humanos acontece igualmente pelo
mesmo fator.
Representado por um “mercado” global transnacional, os vendedores de tecnologia,
sempre estarão colocados frente a uma tecnologia com enorme penetração e conseqüente
poder de barganha.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 128
Além de englobar estas vantagens o Linux e os Softwares Livres superam com
galhardia as principais dificuldades apontadas na cooperação entre países, pois:
O desenvolvimento da tecnologia acontece sem restrições ou dirigismos sobre o uso
comercial que cada membro da comunidade fará dela, a aplicação econômica é direta e
livre. O aspecto transnacional mencionado acima já faz com que as comunidades se
organizem por interesses, ou pela natureza dos problemas a serem resolvidos. A questão
geográfica não chega nem mesmo a ser uma questão, e a heterogeneidade de regimes
políticos e suas orientações tem um peso muito pequeno. Apenas para ficar com o caso do
Linux, este atende programas governamentais implementados em países tão diversos como
Alemanha, Brasil, China, Argentina, Índia, Coréia do Sul, Rússia, Japão, Peru e Bélgica,
para citar alguns223.
O que nos demonstra que a diferença nos níveis de desenvolvimento social ou
tecnológico não chegaram a constituir uma barreira para nenhum destes países nem para os
desenvolvedores nativos, já que com todos ligados entre si, diluemse os conceitos de
“centro” e “periferia”. Com adoção tão diversificada na esfera geográfica, econômica e
política a pressão que poderia ser exercida pelas nações industrializadas não tem um ponto
focal onde ser aplicada.
Sagasti concluí em tom sombrio que “a menos que países subdesenvolvidos
empreendam a curto prazo ações concretas – organizando um plano de cooperação como o
que aqui se propõe, ou executando na prática qualquer outra forma de esquemas de
colaboração – a autodeterminação em matéria de tecnologia continuara uma ilusão para a
quase totalidade do Terceiro Mundo”224.
Não se trata aqui de pretender mudar os destinos dos países subdesenvolvidos pela
via do Software Livre, mas sim apontar a relevância desta peça no quebracabeças a ser
montado por cada nação do Terceiro Mundo.
223
Brasil, Índia, Rússia e China são constantemente referidos como os “BRIC Countries”, países com
potencial de crescimento, grandes mercados e políticas governamentais incentivando maciçamente a adoção
de Softwares Livres.
224
SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, Planejamento e Desenvolvimento Autônomo. São Paulo:
Perspectiva, 1986. p.142
31/08/2006 20060830_rbns.odt 129
Outro ponto a ser tratado aqui, é que a questão dos softwares se coloca além da
ideologia motriz do seu desenvolvimento, ela coloca a relevante questão do domínio
tecnológico e cultural, passando assim a ser uma questão estatal, relevante ao ponto de
mobilizar países díspares em população, cultura e interesses como Coréia do Sul, Japão,
Alemanha, Brasil, Rússia, Índia e China.
Consolidados os efeitos perversos da mundialização do capital, da globalização da
cultura e com o crescente recrudescimento das posturas e constantes tomadas de
posição unilaterais por parte do Governo Norte Americano, os governos passam a ter
real interesse no desenvolvimento de soluções computacionais "domésticas", capazes de
retirar área tão sensível de sua economia do monopólio de empresas americanas.
O Brasil é hoje um dos países mais envolvidos e ativos na defesa, implantação e
desenvolvimento do Software Livre, esta posição só é possível como colheita de
dividendos do investimento estatal feito na indústria de informática durante o período
de reserva de mercado. O Brasil se tornou capaz de produzir tecnologia informática e o
software (livre ou não) surge hoje como produto de alto valor agregado passível de
exportação. O Software Livre concede ao Brasil a possibilidade de permanecer na
vanguarda tecnológica, tanto se aproveitando, como contribuindo com o
desenvolvimento tecnológico de diversos outros países.
Investir no Software Livre é por estas razões e por todas as outras que já foram
apontadas estratégico para o desenvolvimento tecnológico brasileiro. A maciça adesão
das administrações petistas ao Software Livre coloca, portanto, tanto uma oportunidade
de desenvolvimento que não acontecia em uma década, como um perigo de ter este
processo abortado a qualquer momento.
O sistema democrático pressupõe a alternância de partidos no poder, a
partidarização da tecnologia pode colocar o país em um ciclo interminável de
desmandos capazes de comprometer o desenvolvimento tecnológico brasileiro.
Ao identificar o Software Livre como “bandeira petista” imediatamente ele é
posto como algo a ser combatido, substituído ou no mínimo evitado no exato momento
em que muda uma administração. Não faltam exemplos desta consequência, onde a
prefeitura da cidade de São Paulo parece caminhar para se tornar o caso emblemático.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 130
A ação em favor do Software Livre não pode estar identificada com um partido ou
uma causa partidária, embora o Software Livre seja sem sombra de dúvida uma
tecnologia política, esta tecnologia não pode e não deve ser partidarizada. A causa
política do Software Livre deve ser social e não partidária, não é a bandeira de um
partido que deve ser com ela erguida, mas sim a bandeira do desenvolvimento
tecnológico nacional.
Por fim, um último aspecto que merece ser abordado é o da apropriação capitalista
dos conhecimentos sociais. Uma das questões centrais neste trabalho, perseguida sempre
pela questão subjacente de como romper com o Capital?
31/08/2006 20060830_rbns.odt 131
ou mesmo dominante do ponto de vista qualitativo. O coração, o centro da
criação de valor, é o trabalho imaterial”225.
O Software Livre não é, claro, a única forma de apropriação de trabalhado não pago
da sociedade atual. O engajamento exigido pela maior parte das companhias e o avanço das
redes telemáticas fazem com o que o trabalhador esteja 24h por dia “conectado” à empresa;
assim, ainda que formalmente trabalhe um número menor de horas, ele está todo o tempo
conectado à empresa e a ela agregando sua subjetividade, esta última a nova unidade
utilizada para medir sua produção em contraste com antigas medidas de tempo de trabalho.
Com isto podese chegar à conclusão de que o Software Livre deva na verdade ser
combatido e não incentivado, mas esta conclusão estaria considerando apenas a relação do
trabalho com a empresa capitalista, esquecendo sua relação com a sociedade, já que o
trabalho busca sua emancipação do capital. Ou como coloca André Gorz:
“Essa tendência se vê abertamente ilustrada na luta que, no centro
dos dispositivos de poder do capital, os artesãos dos programas de
computador e das redes livres levam adiante. Com eles, ao menos uma
parte dos que detém o “capital humano”, em seu mais alto nível técnico, se
opõe à privatização dos meios de acesso a esse “bem comum da
humanidade”, que é o saber sob todas as suas formas. Tratase aqui de uma
dissidência social e cultural que reivindica abertamente uma outra
concepção de economia e sociedade. Ela tem um alcance estratégico em
relação da importância com que a classe dos trabalhadores do imaterial –
os americanos a chamam de knowledge class – pensa a evolução da
sociedade e seus conflitos.”226
225
GORZ, André. O Imaterial. Conhecimento, valor e capital. São Paulo : Annablume; Janeiro de 2005.
p.19
226
Idem, 2005, p. 6364
31/08/2006 20060830_rbns.odt 132
Livre, não se pode perder de vista o panorama geral, onde este trabalho aparece como a
busca da emancipação do capital.
5.1. Balanço Final.
Com esta dissertação se espera ter contribuído para colocar em relevo um novo
processo histórico em andamento. No coração das principais ferramentas de controle e
otimização desenvolvidas pelo Capital para se apropriar do tempo e da Inteligência Geral,
surge de forma dialética, um movimento contrário, contestador das próprias amarras que
esta otimização e controle estenderam sobre a sociedade e seus bens intangíveis.
Também se espera contribuir com argumentos para a discussão da propriedade das
idéias, em especial destacando o quanto a defesa cada vez mais ferrenha das propriedades
imateriais é prejudicial aos países em geral e aos países subdesenvolvidos em especial.
Outro objetivo perseguido foi o de compreender o processo histórico que fez do Brasil
um ator relevante na arena do Software Livre, premissa necessária para que se aponte na
direção do desenvolvimento tecnológico autônomo. Este desenvolvimento passa pela
estreita janela de oportunidade que o Software Livre agora nos oferece, oportunidade que se
aproveitada pode, por sua natureza, trazer reflexos benéficos nos campos social e
econômico.
Dentro dos objetivos que não foram atingidos o maior destaque é para a omissão sobre
a anômala articulação política da comunidade do Software Livre, pois ao mesmo tempo que
tem uma grande amplitude, articulação social e por vezes econômica, parece ser totalmente
desprovida de uma ideologia política no sentido clássico, tendo mesmo dificuldade em
admitir que promove uma atividade que rompe com as regras estabelecidas pelo Capital. A
desarticulação da comunidade do Software Livre em torno de bandeiras políticas (ao menos
para além da defesa da liberdade do conhecimento) é um processo sintomático de nossa era
e mereceria estudo a parte.
O trabalho realizado e não pago do Software Livre é por si um tema controverso e que
mereceria aprofundamento teórico, ele permite que seja feito um questionamento sobre as
direções em que avança o Capitalismo.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 133
Também não se conseguiu tratar das novas articulações geopolíticas que emergem
com as redes e os softwares, como os BRIC Countries (Brasil, Rússia, Índia e China) e
outros países. Estas relações, como foi colocado na introdução, passam a independer do
tempo e do espaço, já que acontecem o tempo todo e em todos os lugares.
Novas perspectivas que parecem se abrir a partir dessa dissertação são justamente o
estudo mais aprofundado das relações do trabalho imaterial com o Capital, no seio da alta
tecnologia. Também haveria relevância em uma análise que perscrutasse como se dá, se deu
ou se dará a implementação de políticas tecnológicas quando estas se encontram frente a
uma tecnologia essencialmente política como a do Software Livre.
Ainda outro tema seriam os desdobramentos de conceitos que “vazam” do software
livre e escorrem para outras áreas como o Direito e a Arte, se descolando cada vez mais da
tecnologia, como o Creative Commons.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 134
6. Glossário
1. Baixa Plataforma – termo utilizado para referir os microcomputadores de arquitetura Intel,
geralmente em oposição à Alta Plataforma dos Mainframes.
2. Geek – De acordo com a Wikipédia [http://pt.wikipedia.org/wiki/Geek] “Geek é uma palavra
associada a subculturas ligadas aos computadores e à internet. Nestas subculturas, um
geek é uma pessoa com um talento e um interesse por tecnologia e programação acima do
normal.”
3. Hacker – Termo utilizado para designar um especialista em Informática, habitual e
errôneamente confundido com cracker, que seria o equivalente para criminosos
eletrônicos.
4. Kernel “Kernel de um sistema operacional é entendido como o núcleo deste ou, numa
tradução literal, cerne. Ele representa a camada mais baixa de interface com o Hardware,
sendo responsável por gerenciar os recursos do sistema computacional como um todo. É
no kernel que estão definidas funções para operação com periféricos (mouse, disco,
impressora, interface serial/interface paralela), gerenciamento de memória, entre outros.”
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Kernel.
5. Mainframe – computadores de grande porte, que são em geral soluções caras utilizadas
em aplicações de missão critica, em geral administrados por técnicos e DBAs
especializados.
6. Multitarefa Capacidade de executar mais de uma ação simultaneamente, como rodar um
programa e formatar um disquete.
7. Multiusuário Capacidade de administrar diferentes perfis e permissões para usuários em
uma mesma máquina.
8. Palmtop – ou (Personal Digital Assistant), ou Assistente Pessoal Digital. Um modelo de
computador portátil popularizado pela empresa Palm.
9. Portar No jargão da indústria “portar” uma aplicação significa traduzir e adaptar
determinado software desenvolvido para uma plataforma para outra que não era seu foco
inicial.
10. Setup – sinônimo para configuração. Largamente utilizado na indústria e na literatura
especializada.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 135
7. Bibliografia
7.1. Livros
1. ARRIGHI, Giovanni. O longo século XX: dinheiro, poder e as origens de nosso tempo.
São Paulo: Contraponto: Unesp, 1996.
2. BASALLA, George. The Evolution of Technology. USA; Cambridge University Press;
1995
3. BLOCH, Marc. Introdução à H istória. Edições EuropaAmérica.
4. CANGUILHEM, Georges. Ideologia e racionalidade nas ciências da vida. Lisboa :
Edições 70, 1997;
5. CASSIANO, João. Cidadania Digital: Os Telecentros do Município de São Paulo. In:
SILVEIRA, Sérgio Amadeu da., CASSIANO, João (Org.) Software Livre e Inclusão
Digital. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2003.
6. CASTELLS, Manuel. A galáxia da Internet: os negócios e a sociedade; Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Ed., 2003
7. CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. 8ª edição. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
8. CERUZZI, Paul E. A History of Modern Computing. Massachusetts : MIT Press, 1998.
9. CHALMERS, Alan. A Fabricação da Ciência. SP: UNESP, 1994;
10. COUTINHO, Luciano; FERRAZ, João Carlos (Coord.). Estudo da competitividade da
indústria brasileira. Campinas, SP: Papirus; Editora da Universidade Estadual de
Campinas, 1995.
11. DIBONA, Chris; STONE, Mark; COOPER, Danese (Eds.). Open Source 2.0. O'Reilly
Media. ISBN 0596008023.
12. FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Nacional, 1999.
13. GAMA, Ruy. A tecnologia e o trabalho na história. São Paulo: Nobel; Editora da
Universidade de São Paulo, 1986.
14. GORZ, André. O Imaterial : Conhecimento, valor e capital. São Paulo : Annablume;
Janeiro de 2005.
15. GUROVITZ, Helio. Linux: o fenômeno do Software Livre. [São Paulo]: Editora Abril,
2002.
16. JAPIASSU, Hilton. As Paixões da ciência. São Paulo : Letras & Letras, 1991;
17. KAWASAKI, Guy. O jeito Macintosh. São Paulo: Callis, 1993.
18. LACEY, Hugh. Is Science Value Free? Values and Scientific Understanding. London
and New York: Routledge, 1999.
19. LACEY, Hugh. Valores e Atividade Científica. São Paulo: Discurso Editorial, 1998.
20. LAZZARATO, Maurizio & NEGRI, Antonio. Trabalho Imaterial. Formas de vida e
produção de subjetividade. Rio de Janeiro: DP&A editora, 2001
21. LOHR, Steve. Go to. [New York]: Basic Books, 2001
22. LUZ, Nícia Vilela. A Luta pela Industrialização do Brasil. Editora Alpha Omega, 1978,
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23. MAGALHÃES, Gildo. Introdução à metodologia científica: caminhos da ciência e
tecnologia. São Paulo : Ática, 2005;
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24. MARQUES, Ivan da Costa. O Brasil e a abertura dos mercados: o trabalho em questão.
Rio de Janeiro; Contraponto; 2002
25. MARX, Karl. Grundrisse: Elementos Fundamentales Para La Critica de la economia
politica (Borrador) 18571858; Buenos Aires; Siglo XXI Argentina Editores S.A: junho
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26. MAZA, Fábio. O idealismo prático de Roberto Simonsen: ciência, tecnologia e
indústria na construção da Nação. São Paulo: Instituto Roberto Simonsen, 2004.
27. MELLO, João Manoel C. de, O Capitalismo Tardio. 6ª edição. São Paulo: Editora
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28. MOWERY, David C., ROSENBERG, Nathan. Trajetórias da Inovação : A Mudança
Tecnológica nos Estados Unidos da América no Século XX. Campinas, SP: Editora da
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30. PEREIRA, L.C. Bresser. Desenvolvimento e Crise no Brasil. Zahar Editores, 1968, Rio de
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8508040857.
32. ROSSI, P. Naufrágios sem Espectador. A idéia de progresso. EDUNESP, 2000.
33. ROSZAK, Theodore. The Cult of Information : A NeoLuddite Treatise on High Tech,
Artificial Intelligence, and the true Art of Thinking. New York : Pantheon Books, 1986.
34. SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, Planejamento e Desenvolvimento Autônomo. São
Paulo: Perspectiva, 1986.
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37. SILVEIRA, Sérgio Amadeu da; CASSINO, João (Org.). Software Livre e inclusão digital.
São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2003.
38. SILVEIRA, Sérgio Amadeu da. Exclusão digital: a miséria na era da informação. 1ª
reimpressão. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2003.
39. SILVEIRA, Sérgio Amadeu da. Software Livre: a luta pela liberdade do conhecimento.
São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2004. (Coleção Brasil Urgente).
40. SINGER, Paul. Economia Política da Urbanização. Editora Brasiliense, 1973.
41. TACHINARDI, Maria Helena. A Guerra das Patentes : O conflito Brasil x EUA sobre
propriedade intelectual. São Paulo : Paz e Terra, 1993.
42. TAVARES, Maria da Conceição. Da Substituição de importações ao capitalismo
financeiro: ensaios sobre a economia brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
43. TIGRE, Paulo Bastos. Liberalização e capacitação tecnológica: o caso da informática pós
reserva de mercado no Brasil. In: SWARTZMAN, Simon (Coord.); KRIEGER, Eduardo...
[et. al.]. Ciência e Tecnologia no Brasil : política industrial, mercado de trabalho e
instituição de apoio. Rio de janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1995.
44. TIGRE, Paulo Bastos. Liberalização e capacitação tecnológica: o caso da informática pós
reserva de mercado no Brasil. In: SWARTZMAN, Simon (Coord.); KRIEGER, Eduardo...
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instituição de apoio. Rio de janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1995. p. 179.
45. TROTSKY, Leon. Resultados y perspectivas: las fuerzas motrices de la revolucion.
Buenos Aires: Ediciones CEPE, 1972
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46. UTTERBACK, James M. Dominando a dinâmica da inovação. Rio de Janeiro:
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47. VARGAS, Milton. Para uma Filosofia da Tecnologia. Editora Alpha Omega, 1994, São
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48. VIEIRA, Eduardo. Os bastidores da internet no Brasil. Barueri, SP: Manole, 2003.
49. VIGEVANI, Tullo. O Contencioso Brasil x Estados Unidos da Informática : Uma
Análise Sobre Formulação da Política Exterior. São Paulo : Alfa Omega : Editora da
Universidade de São Paulo, 1995.
7.2. Teses e Dissertações
SANTOS FILHO, Gildo Magalhães. Um bit auriverde: Caminhos da tecnologia e do
projeto desenvolvimentista na formulação duma política nacional de informática para
o Brasil (19711992). 1994. 280f. Tese (Doutorado História) Faculdade de Filosofia
Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo.
7.3. Artigos
1. WHITHEFORD, Nick. Autonomist Marxism And The Information Society. Capital &
Class, 52, p.8595, Spring 1994.
2. CHAUI, Marilena. USP 94: a terceira fundação. Estudos Avançados, Set./Dez. 1994, vol.8,
no.22, p.4968.
3. COSTA MARQUES, Ivan da. Cloning Computers: From Rigths of Possession to Rigths of
Creation. In: Science as Culture. Routledge, Jun. 2005. Vol. 14, No. 2, 139160.
4. SOUZA F., Rubens A. Menezes. Percepção e imagem da informática. In: XXII Simpósio
Nacional de História História: Guerra e Paz, 2005, Londrina. XXII Simpósio Nacional de
História História: Guerra e Paz. Londrina, PR : Associação Nacional de História ANPUH
/ Editorial Midia., 2005
7.4. Artigos da Imprensa Diária
1. O Pingüim Avança. Carta Capital, 17 de março de 2004 Ano XI Número 345.
2. Jornal da Tarde: em 03/02/2005 Polícia apreende cópias de livros em universidades.
3. Jornal O Estado de S. Paulo (15/08/2004 – Geral Um militante na batalha pelo software
livre Excomunista, chefe do ITI agora luta pela adoção dos programas gratuitos).
4. Jornal O Estado de S. Paulo: 02/03/2005 Metrópole Faculdades mantêm xerox dentro
das bibliotecas / Metrópole Bibliotecas oferecem xerox;
5. Jornal O Estado de S. Paulo: 03/03/2005 Metrópole Polícia investiga comércio de
cópias de livros em universidade;
6. Jornal O Estado de S. Paulo: 04/03/2005 Metrópole DEIC apura a ação de professores
em xerox;
7. Jornal O Estado de S. Paulo: 08/03/2005 Caderno 2
8. Jornal O Estado de S. Paulo: 21/02/2005 Índice;
31/08/2006 20060830_rbns.odt 138
9. RIVLIN, Gary. Leader of the free world. Wired, EUA, n.11, p.152157/206208, nov. 2003.
10. The Gates Operating System; TIME; JANUARY 13, 1997 VOL. 149 NO. 2; USA.
7.5. Bibliografia Técnica de Referência
7.6. Documentos na Internet
1. key_events_in_microsoft_history.doc (83 KB) em:
http://www.microsoft.com/downloads/info.aspx?na=46&p=4&SrcDisplayLang=en&SrcCat
egoryId=&SrcFamilyId=b604bb057c33464396b4
38e06383bda5&u=http%3a%2f%2fdownload.microsoft.com%2fdownload%2f6%2f3%2fa
%2f63a018ae711f4edb8b79ca109e5eed07%2fkey_events_in_microsoft_history.doc
2. fastfacts.doc (1255 KB) em:
http://www.microsoft.com/downloads/info.aspx?na=46&p=3&SrcDisplayLang=en&SrcCat
egoryId=&SrcFamilyId=b604bb057c33464396b4
38e06383bda5&u=http%3a%2f%2fdownload.microsoft.com%2fdownload%2f6%2f3%2fa
%2f63a018ae711f4edb8b79ca109e5eed07%2ffastfacts.doc
7.7. Legislação Consultada
1. DECRETO DE 29 DE OUTUBRO DE 2003 Institui Comitês Técnicos do Comitê
Executivo do Governo Eletrônico e dá outras providências. (Diário Oficial da União –
Seção 1. No 211, quintafeira, 30 de outubro de 2003. p.4, ISSN 16777042)
2. LEI No 7.646, DE 18 DE DEZEMBRO DE 1987 Dispõe quanto à proteção da propriedade
intelectual sobre programas de computador e sua comercialização no País e dá outras
providências (Revogado pela Lei nº 9.609, de 19.2.1998)
3. LEI Nº 7.232, DE 29 DE OUTUBRO DE 1984 Dispõe sobre a Política Nacional de
Informática, e dá outras providências. (publicado no D.O.U. de 30 de outubro de 1984)
7.8. Material de Apoio
The Columbia Dictionary of Quotations. Columbia University Press. 1993
31/08/2006 20060830_rbns.odt 139
8. Anexos
8.1. Documento I
POLÍCIA APREENDE CÓPIAS DE LIVROS EM UNIVERSIDADES227
Um inquérito aberto na Divisão de Investigações Gerais DIG apura o comércio de cópias de livros em
universidades de São Paulo. Ele foi aberto em dezembro com base em uma representação da Associação
Brasileira de Direitos Reprográficos.
A entidade apresentou aos policiais uma lista de locais usados pelos estudantes para fazer cópias dos
livros. "Nossos homens apreenderam grande quantidade de cópias e livros", disse o delegado Edson Soares,
diretor da DIG, do Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic).
Segundo o delegado, os investigadores apreenderam cópias perto de instituições de ensino
tradicionais, como a Universidade de São Paulo USP, a Pontifícia Universidade Católica PUC e a Universidade
Mackenzie. O inquérito ainda não foi concluído, pois a polícia termina a identificação dos envolvidos. "Os
locais eram próximos das universidades. Não encontramos nenhum dentro delas."
A reprodução de trechos de livros é crime contra a propriedade intelectual, cuja pena varia de 2 a 4 anos de
reclusão. O combate a essa prática é uma das medidas aprovadas pelo Conselho de Combate à Pirataria e
Delitos contra a Propriedade Intelectual, do Ministério da Justiça. Divulgado anteontem, o plano do governo
federal prevê a execução dessas ações nos próximos dois anos.
"Se eu não pudesse tirar xerox certamente não poderia estudar. No início do ano, os professores
passam a bibliografia e a gente vê que não dá para comprar tudo. E muita coisa não tem na biblioteca",
protestou a pósgraduanda de língua portuguesa da USP D.C., 30, que tirava cópias de um livro europeu cujo
preço fica em torno de R$ 300. O xerox saiu por R$ 28.
"Outro dia, eles não quiseram tirar a cópia, disseram que era proibido, mas assim ninguém estuda.
Consegui o original com uma amiga que viajou para fora, mas não posso ficar com o exemplar dela."
A colega de classe de D. Verena Kewitz, 30, sofre com o mesmo problema. "Muitos títulos já saíram de
catálogo e aí não tem jeito, temos de fazer cópia."
Outro crime de falsificação foi flagrado pela reportagem ontem à tarde, na Avenida Senador Queiroz,
Centro da Cidade. Cinco ambulantes vendiam mercadoria falsificada na calçada, em sua maioria camisetas,
CDs e DVDs, ao lado de um carro do DEIC.
227
Jornal da Tarde 03/02/2005
31/08/2006 20060830_rbns.odt 140
8.2. Documento II (Resolução n° 5.213 de junho de 2005)
RESOLUÇÃO Nº 5.213, DE 02 DE JUNHO DE 2005.228 (D.O.E. 06.2005)
Regula a extração de cópias reprográficas de livros, revistas científicas ou periódicos no âmbito da
Universidade de São Paulo.
O Reitor da Universidade de São Paulo, no uso de suas atribuições legais, com fundamento no art.
207 da Constituição Federal e no art. 42, IX, do Estatuto, baixado pela Resolução nº 3461, de 07.10.88, e de
acordo com o deliberado pelo Conselho Universitário, em Sessão de 31 de maio de 2005, baixa a seguinte
RESOLUÇÃO:
Artigo 1º As normas constantes desse ato deverão ser observadas em todas as instalações e
órgãos da Universidade de São Paulo, quer sejam vinculados diretamente à autarquia, quer se trate de
permissionários ou concessionários de serviços.
Artigo 2º Visando garantir as atividadesfins da Universidade, será permitida a extração de cópias
de pequenos trechos, como capítulos de livros e artigos de periódicos ou revistas científicas, mediante
solicitação individualizada, sem finalidade de lucro, para uso próprio do solicitante.
Artigo 3º As bibliotecas deverão marcar seu acervo com sinais distintivos diferenciando as
seguintes categorias de obras:
I – esgotadas sem republicação há mais de 10 anos;
II – estrangeiras indisponíveis no mercado nacional;
III – de domínio público;
IV – nas quais conste expressa autorização para reprodução.
Parágrafo único De qualquer obra que contenha o sinal distintivo de uma dessas categorias, será
permitida a reprodução reprográfica integral.
Artigo 4º É permitido, por parte de docentes, o fornecimento de material destinado estritamente ao
ministério de disciplina constante do programa da universidade, sendo autorizada sua reprodução para os
alunos regularmente inscritos, observado o disposto nos artigos precedentes.
228
Fonte: http://www.fflch.usp.br/sdi/imprensa/eventos/resolucao_xerox.html
31/08/2006 20060830_rbns.odt 141
Artigo 5º Fica garantido o livre exercício das atividades desenvolvidas pelas bibliotecas de
intercâmbio de material entre instituições de ensino e pesquisa nos limites desta Resolução.
Artigo 6º Esta Resolução entrará em vigor na data de sua publicação. (Proc. 2005.1.13361.1.1)
Reitoria da Universidade de São Paulo, 02 de junho de 2005.
ADOLPHO JOSÉ MELFI
Reitor
NINA BEATRIZ STOCCO RANIERI
Secretária Geral
31/08/2006 20060830_rbns.odt 142
8.3. Documento III (Lei n° 7.646 de 18 de dezembro de 1987)
LEI No 7.646, DE 18 DE DEZEMBRO DE 1987.
Revogado pela Lei nº 9.609, de 19.2.1998
Dispõe quanto à proteção da propriedade intelectual sobre programas de computador e sua
comercialização no País e dá outras providências.
TÍTULO I TÍTULO II
Disposições Preliminares Da Proteção aos Direitos de Autor
Art. 1º São livres, no País, a produção e a Art. 3º Fica assegurada a tutela dos direitos
comercialização de programas de computador, de relativos aos programas de computador, pelo prazo
origem estrangeira ou nacional, assegurada integral de 25 (vinte e cinco) anos, contado a partir do seu
proteção aos titulares dos respectivos direitos, nas lançamento em qualquer país.
condições estabelecidas em lei. § 1º A proteção aos direitos de que trata esta
intelectual de programas de computador é o disposto poderão, a critério do autor, ser registrados em órgão
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a ser designado pelo Conselho Nacional de Direito instalações ou equipamentos do empregador ou
Autoral CNDA, regido pela Lei nº 5.988, de 14 de contratante de serviços.
dezembro de 1973, e reorganizado pelo Decreto nº Art. 6º Quando estipulado em contrato
84.252, de 28 de julho de 1979. firmado entre as partes, os direitos sobre as
§ 1º O titular do direito de autor submeterá ao modificações tecnológicas e derivações pertencerão à
órgão designado pelo Conselho Nacional de Direito pessoa autorizada que as fizer e que os exercerá
Autoral CNDA, quando do pedido de registro, os autonomamente.
trechos do programa e outros dados que considerar Art. 7º Não constituem ofensa ao direito de
suficientes para caracterizar a criação independente e autor de programa de computador:
a identidade do programa de computador. I a reprodução de cópia legitimamente
§ 2º Para identificarse como titular do direito adquirida, desde que indispensável à utilização
de autor, poderá o criador do programa usar de seu adequada do programa;
nome civil, completo ou abreviado, até por suas II a citação parcial, para fins didáticos,
iniciais, como previsto no art. 12 da Lei nº 5.988, de desde que identificados o autor e o programa a que
14 de dezembro de 1973. se refere;
§ 3º As informações que fundamentam o III a ocorrência de semelhança de programa
registro são de caráter sigiloso, não podendo ser a outro, preexistente, quando se der por força das
reveladas, a não ser por ordem judicial ou a características funcionais de sua aplicação, da
requerimento do próprio titular. observância de preceitos legais, regulamentares, ou
Art. 5º Salvo estipulação em contrário, de normas técnicas, ou de limitações de forma
pertencerão exclusivamente ao empregador ou alternativa para a sua expressão;
contratante de serviços, os direitos relativos a IV a integração de um programa, mantendo
programa de computador, desenvolvido e elaborado se suas características essenciais, a um sistema
durante a vigência de contrato ou de vínculo aplicativo ou operacional, tecnicamente indispensável
estatutário, expressamente destinado à pesquisa e às necessidades do usuário, desde que para uso
desenvolvimento, ou em que a atividade do exclusivo de quem a promoveu.
empregado, servidor ou contratado de serviços seja TÍTULO III
prevista, ou ainda, que decorra da própria natureza Do Cadastro
dos encargos contratados. Art. 8º Para a comercialização de que trata o
§ 1º Ressalvado ajuste em contrário, a art. 1º desta lei, fica obrigatório o prévio
compensação do trabalho, ou serviço prestado, será cadastramento do programa ou conjunto de
limitada à remuneração ou ao salário convencionado. programas de computador, pela Secretaria Especial
§ 2º Pertencerão, com exclusividade, ao de Informática SEI, que os classificará em diferentes
empregado, servidor ou contratado de serviços, os categorias, conforme sejam desenvolvidos no País ou
direitos concernentes a programa de computador no exterior, em associação ou não entre empresas
gerado sem relação ao contrato de trabalho, vínculo não nacionais e nacionais, definidas estas pelo art. 12
estatutário ou prestação de serviços, e sem utilização da Lei nº 7.232, de 29 de outubro de 1984, e art. 1º do
de recursos, informações tecnológicas, materiais, Decretolei nº 2.203, de 27 de dezembro de 1984.
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§ 1º No que diz respeito à proteção dos I ser original e desenvolvido
direitos do autor, não se estabelecem diferenças entre independentemente;
as categorias referidas no caput deste artigo, as quais II ter, substancialmente, as mesmas
serão diversificadas para efeito de financiamento com características de desempenho, considerando o tipo
recursos públicos, incentivos fiscais, comercialização de aplicação a que se destina;
e remessa de lucros, ou pagamento de direitos aos III operar em equipamento similar e em
seus titulares domiciliados no exterior, conforme o ambiente de processamento similar;
caso. b) observar padrões nacionais estabelecidos,
§ 2º O cadastramento de que trata este artigo quando pertinentes;
e a aprovação dos atos e contratos referidos nesta lei, c) (Vetado);
pela Secretaria Especial de Informática SEI, ficarão d) executar, substancialmente, as mesmas
condicionados, quando se tratar de programas funções, considerando o tipo de aplicação a que se
desenvolvidos por empresas não nacionais, à destina e as características do mercado nacional.
apuração da inexistência de programa de computador Art. 11. Fica estipulado o prazo de 120 (cento
similar, desenvolvido no País, por empresa nacional. e vinte) dias para que a Secretaria Especial de
§ 3º Além do disposto no caput deste artigo, o Informática SEI se manifeste sobre o pedido de
cadastramento de que trata esta lei é condição prévia cadastramento (Vetado), contado a partir da data do
e essencial à: respectivo protocolo.
I validade e eficácia de quaisquer negócios Art. 12. Às empresas não nacionais, o
jurídicos relacionados a programas; cadastramento será concedido, exclusivamente, a
II produção de efeitos fiscais e cambiais e programas de computador que se apliquem a
legitimação de pagamentos, créditos ou remessas equipamentos produzidos no País ou no exterior, aqui
correspondentes, quando for o caso, e sem prejuízo comercializados por empresas desta mesma
de outros requisitos e condições estabelecidos em lei. categoria.
Art. 9º O cadastramento, para os fins do Art. 13. Será tornado sem efeito, a qualquer
disposto no artigo anterior, terá validade mínima de 3 tempo, o cadastramento de programa de computador:
(três) anos, e será renovado, automaticamente, pela I por sentença judicial transitada em julgado;
Secretaria Especial de Informática SEI, observado o II por ato administrativo, quando
disposto no § 2º do citado artigo. comprovado que as informações apresentadas pelo
Parágrafo único. Da decisão que deferir ou interessado para instruir o pedido de cadastramento
denegar o pedido de cadastramento, caberá recurso não forem verídicas.
ao Conselho Nacional de Informática e Automação Art. 14. A Secretaria Especial de Informática
CONIN, observado o disposto no Regimento Interno SEI poderá cobrar emolumentos pelos serviços de
deste Conselho. cadastro (Vetado), conforme tabela própria a ser
Art. 10. Para os efeitos desta lei, um aprovada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.
programa de computador será considerado similar a TÍTULO IV
outro, quando atender às seguintes condições: Da Quota de Contribuição
a) ser funcionalmente equivalente, Art. 15. O Fundo Especial de Informática e
considerando que deve: Automação, de que trata a Lei nº 7.232, de 29 de
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outubro de 1984, será destinado ao financiamento a II assegurar, aos respectivos usuários, a
programas de: prestação de serviços técnicos complementares
a) pesquisa e desenvolvimento de tecnologia relativos ao adequado funcionamento do programa de
de informática e automação; computador, consideradas as suas especificações e
b) formação de recursos humanos em as particularidades do usuário.
informática; Art. 25. O titular dos direitos dos programas
c) aparelhamento dos Centros de Pesquisas de computador, durante o prazo de validade técnica,
em Informática, com prioridade às Universidades tratado nos artigos imediatamente anteriores, não
Federais e Estaduais; poderá retirálos de circulação comercial, sem a justa
d) capitalização dos Centros de Tecnologia e indenização de eventuais prejuízos causados a
Informática, criados em consonância com as terceiros.
diretrizes do Plano Nacional de Informática e Art. 26. O titular dos direitos de programas de
Automação PLANIN. computador e de sua comercialização responde,
Parágrafo único. O Fundo Especial de perante o usuário, pela qualidade técnica adequada,
Informática e Automação será constituído de: bem como pela qualidade da fixação ou gravação dos
a) dotações orçamentárias; mesmos nos respectivos suportes físicos, cabendo
b) quotas de contribuição; ação regressiva contra eventuais antecessores
c) doações de origem interna ou externa. titulares desses mesmos direitos.
Art 16. (Vetado). Art. 27. A exploração econômica de
Art. 17. (Vetado). programas de computador, no País, será objeto de
Art. 18. (Vetado). contratos de licença ou de cessão, livremente
Art. 19. (Vetado). pactuados entre as partes, e nos quais se fixará,
TÍTULO V quanto aos tributos e encargos exigíveis no País, a
Da Comercialização responsabilidade pelos respectivos pagamentos.
Art. 21. (Vetado). que:
Art. 22. (Vetado). a) fixem exclusividade;
forma facilmente legível pelo usuário, o número de responsabilidade por eventuais ações de terceiros,
ordem de cadastro, (Vetado) e o prazo de validade decorrente de vícios, defeitos ou violação de direitos
técnica da versão comercializada. de autor.
comercialização de programas de computador, computador, ressalvado o disposto no art. 12 desta
durante o prazo de validade técnica da respectiva lei, somente é permitida a empresas nacionais que
versão, fica obrigado a: celebrarão, com os fornecedores não nacionais, os
I divulgar, sem ônus adicional, as correções contratos de cessão de direitos ou licença, nos termos
de eventuais erros; desta lei.
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Parágrafo único. A aprovação pelos órgãos Art. 31. Nos casos de transferência de
competentes do Poder Executivo, dos atos e tecnologia de programas de computador, será
contratos relativos à comercialização de programas obrigatória, inclusive para fins de pagamento e
de computador de origem externa, é condição prévia dedutibilidade da respectiva remuneração, e demais
e essencial para: efeitos previstos nesta lei, a averbação do contrato no
a) possibilitar o cadastramento do programa; Instituto Nacional de Propriedade Industrial INPI.
b) permitir a dedutibilidade fiscal, respeitadas Parágrafo único. Para averbação de que trata
as normas previstas na legislação específica; este artigo, além da inexistência de capacitação
c) possibilitar a remessa ao exterior dos tecnológica nacional, fica obrigatório o fornecimento,
montantes devidos, de acordo com esta lei e demais por parte do fornecedor ao receptor de tecnologia, da
disposições legais aplicáveis. documentação completa, em especial do códigofonte
Art. 29. A aprovação e a averbação serão comentado, memorial descritivo, especificações
concedidas aos atos e contratos, relativos a programa funcionais e internas, diagramas, fluxogramas e
de origem externa, que estabelecerem remuneração outros dados técnicos necessários à absorção da
do autor, cessionário residente ou domiciliado no tecnologia.
exterior, a preço certo por cópia e respectiva Art. 32. As pessoas jurídicas poderão deduzir,
documentação técnica, que não exceda o valor médio até o dobro, como despesa operacional, para efeito
mundial praticado na distribuição do mesmo produto, de apuração do lucro tributável pelo Imposto de
não sendo permitido pagamento calculado em função Renda e Proventos de Qualquer Natureza, os gastos
de produção, receita ou lucro do cessionário ou do realizados com a aquisição de programas de
usuário. computador, quando forem os primeiros usuários
1º Excluemse da permissão deste artigo as destes, desde que os programas se enquadrem como
empresas não nacionais, a elas assegurada, em de relevante interesse, observado o disposto nos arts.
decorrência da comercialização regulada pelo art. 12 15 e 19 da Lei nº 7.232, de 29 de outubro de 1984.
desta lei, a remessa de divisas previstas nas § 1º Paralelamente, como forma de incentivo,
disposições e nos limites da Lei nº 4.131, de 3 de a utilização de programas de computador
setembro de 1962, e legislação posterior. desenvolvidos no País por empresas privadas
2º A nota fiscal emitida pelo titular dos nacionais será levada em conta para efeito da
correspondentes direitos ou seus representantes concessão dos incentivos previstos no art. 13 da Lei
legais, que comprove a comercialização de nº 7.232, de 29 de outubro de 1984, bem como de
programas de computador de origem externa, será o financiamentos com recursos públicos.
suficiente para possibilitar os pagamentos previstos § 2º Os órgãos e entidades da Administração
no caput deste artigo. Pública Direta ou Indireta, Fundações, instituídas ou
TÍTULO VI mantidas pelo Poder Público e as demais entidades
Art. 30. Será permitida a importação ou o darão preferência, em igualdade de condições, na
internamento, conforme o caso, de cópia única de utilização de programas de computador
programa de computador, destinado à utilização desenvolvidos no País por empresas privadas
exclusiva pelo usuário final, (Vetado).
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nacionais, de conformidade com o que estabelece o crime previsto no art. 35 desta lei, serão precedidas
art. 11 da Lei nº 7.232, de 29 de outubro de 1984. de vistoria, podendo o juiz ordenar a apreensão das
§ 3º A participação do Estado na cópias produzidas ou comercializadas com violação
comercialização de programas de computador de direito de autor, suas versões e derivações, em
obedecerá ao disposto no inciso II do art. 2º da Lei nº poder do infrator ou de quem as esteja expondo,
7.232, de 29 de outubro de 1984. mantendo em depósito, reproduzindo ou
Art. 33. As ações de nulidade do registro ou comercializando.
do cadastramento, que correrão em segredo de Art. 39. Independentemente da ação penal, o
justiça, poderão ser propostas por qualquer prejudicado poderá intentar ação para proibir ao
interessado ou pela União Federal. infrator a prática do ato incriminado, com a cominação
Art. 34. A nulidade do registro constitui de pena pecuniária para o caso de transgressão do
matéria de defesa nas ações cíveis ou criminais, preceito (art. 287 do Código de Processo Civil).
relativas à violação dos direitos de autor de programa 1º A ação de abstenção de prática de ato
de computador. poderá ser cumulada com a de perdas e danos pelos
TÍTULO VII prejuízos decorrentes da infração.
Pena Detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) em segredo de justiça.
anos e multa. 3º Nos procedimentos cíveis, as medidas
Art. 37. Importar, expor, manter em depósito, disposto no parágrafo único do art. 38 desta lei.
para fins de comercialização, programas de 4º O juiz poderá conceder medida liminar,
computador de origem externa não cadastrados: proibindo ao infrator a prática do ato incriminado, nos
Parágrafo único. O disposto neste artigo não 5º Será responsabilizado por perdas e danos
Art. 38. A ação penal, no crime previsto no Civil.
art. 35, (Vetado) desta lei, é promovida mediante TÍTULO VIII
queixa, salvo quando praticado em prejuízo da União, Das Prescrições
Estado, Distrito Federal, Município, autarquia, Art. 40. Prescreve em 5 (cinco) anos a ação
empresa pública, sociedade de economia mista ou civil por ofensa a direitos patrimoniais do autor.
fundação sob supervisão ministerial. Art. 41. Prescrevem, igualmente em 5 (cinco)
Parágrafo único. A ação penal e as anos, as ações fundadas em inadimplemento das
diligências preliminares de busca e apreensão, no obrigações decorrentes, contado o prazo da data:
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a) que constitui o termo final de validade Parágrafo único. O Poder Executivo
técnica de versão posta em comércio; regulamentará esta lei no prazo de 120 (cento e vinte)
b) da cessação da garantia, no caso de dias, a contar da data de sua publicação.
programas de computador desenvolvidos e Art. 43. Revogamse as disposições em
elaborados por encomenda; contrário.
c) da licença de uso de programas de
computador. Brasília, 18 de dezembro de 1987; 166º da
TÍTULO IX Independência e 99º da República.
Das Disposições Finais JOSÉ SARNEY
Art. 42. Esta lei entra em vigor na data de sua Luiz Henrique da Silveira
publicação.
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8.4. Documento IV (Decreto de 29 de outubro de 2003)
DECRETO DE 29 DE OUTUBRO DE 2003229
Institui Comitês Técnicos do Comitê Executivo do Governo Eletrônico e dá
outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da
atribuição que lhe confere o art. 84, inciso VI, alínea Art. 2o Os Comitês Técnicos serão
"a", da Constituição, compostos por representantes de órgãos e entidades
da administração pública federal, indicados pelos
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entidades públicas, de empresas privadas ou de
organizações da sociedade civil. Art. 3o Este Decreto entra em vigor na data
§ 5o O SecretárioExecutivo do Comitê de sua publicação. Brasília, 29 de outubro de 2003;
Executivo do Governo Eletrônico supervisionará os 182o da Independência e 115o da República.
trabalhos dos Comitês Técnicos, inclusive por meio
da convocação dos seus coordenadores para LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
participação em reuniões periódicas de Guido Mantega
acompanhamento.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 151
8.5. Documento V (Creative Commons Licença de AtribuiçãoUso Não
Comercial 2.5 Brasil)
AtribuiçãoUso NãoComercial 2.5 Brasil
Você pode:
• copiar, distribuir, exibir e executar a obra
• criar obras derivadas
Sob as seguintes condições:
Atribuição . Você deve dar crédito ao autor original, da
forma especificada pelo autor ou licenciante.
Uso NãoComercial. Você não pode utilizar esta obra
com finalidades comerciais.
• Para cada novo uso ou distribuição, você deve deixar claro para outros
os termos da licença desta obra.
• Qualquer uma destas condições podem ser renunciadas, desde que
Você obtenha permissão do autor.
Qualquer direito de uso legítimo (ou "fair use") concedido por lei, ou
qualquer outro direito protegido pela legislação local, não são em hipótese
alguma afetados pelo disposto acima.
Este é um sumário para leigos da Licença Jurídica (na íntegra)
[http://creativecommons.org/licenses/bync/2.5/br/legalcode].
Termo de exoneração de responsabilidade
[http://creativecommons.org/licenses/disclaimerpopup?lang=ptbr]
31/08/2006 20060830_rbns.odt 152
8.6. Documento VI (The Open Source Definition230)
Introduction
Open source doesn't just mean access to the source code. The distribution terms of opensource
software must comply with the following criteria:
1. Free Redistribution
The license shall not restrict any party from selling or giving away the software as a component of an
aggregate software distribution containing programs from several different sources. The license shall not
require a royalty or other fee for such sale.
2. Source Code
The program must include source code, and must allow distribution in source code as well as compiled
form. Where some form of a product is not distributed with source code, there must be a wellpublicized means
of obtaining the source code for no more than a reasonable reproduction cost preferably, downloading via the
Internet without charge. The source code must be the preferred form in which a programmer would modify the
program. Deliberately obfuscated source code is not allowed. Intermediate forms such as the output of a
preprocessor or translator are not allowed.
3. Derived Works
The license must allow modifications and derived works, and must allow them to be distributed under
the same terms as the license of the original software.
4. Integrity of The Author's Source Code
The license may restrict sourcecode from being distributed in modified form only if the license allows
the distribution of "patch files" with the source code for the purpose of modifying the program at build time. The
license must explicitly permit distribution of software built from modified source code. The license may require
derived works to carry a different name or version number from the original software.
5. No Discrimination Against Persons or Groups
The license must not discriminate against any person or group of persons.
6. No Discrimination Against Fields of Endeavor
The license must not restrict anyone from making use of the program in a specific field of endeavor. For
example, it may not restrict the program from being used in a business, or from being used for genetic
research.
7. Distribution of License
230
http://www.opensource.org/docs/definition_plain.php
31/08/2006 20060830_rbns.odt 153
The rights attached to the program must apply to all to whom the program is redistributed without the
need for execution of an additional license by those parties.
8. License Must Not Be Specific to a Product
The rights attached to the program must not depend on the program's being part of a particular
software distribution. If the program is extracted from that distribution and used or distributed within the terms
of the program's license, all parties to whom the program is redistributed should have the same rights as those
that are granted in conjunction with the original software distribution.
9. License Must Not Restrict Other Software
The license must not place restrictions on other software that is distributed along with the licensed
software. For example, the license must not insist that all other programs distributed on the same medium must
be opensource software.
10. License Must Be TechnologyNeutral
No provision of the license may be predicated on any individual technology or style of interface.
31/08/2006 20060830_rbns.odt 154