You are on page 1of 12

MODIGLIANI E SUA “ESTADIA NO INFERNO”

(Modigliani e Rimbaud: “Vagabundos Iluminados”

Professor: Samuel Jose Gilbert de Jesus

Aluno: Diego El Khouri Sousa

Artes Visuais – Licenciatura

História da Arte: Das Vanguardas Artísticas à contemporaneidade


Boêmio da noite

no portão enferrujado.

Morcego dormindo.

Fanny Dupré

"Ó meus irmãos contrários que guardais nas vossas pupilas/ A noite infusa e o seu
horror"

Paul Éluard

O mito de Amedeo Clemente Modigliani (Livorno, 12 de julho de 1884 —


Paris, 24 de janeiro de 1920), "essa imagem tardiamente romântica, no protótipo
do dândi sem teto nem lei, do artista maldito", esconde uma sabedoria
técnica e cultura extremamente profunda que se revelou nas pinturas (formada
basicamente de retratos), esculturas e desenhos — traços de um
experimentalismo vanguardista que se embriagava tanto na filosofia nietzschiana
quanto na obra poética de nomes como Charles Baudelaire e Lautréamont,
mas que transparecia de forma sutil numa "elegância aristocrática tão
singular" e sobretudo compreensível. Embora sua vida fosse agitada pela
boemia desvairada, paixões arrebatadoras, descaso da crítica e do
público em relação a sua obra (com raras exceções, como, por exemplo, o
médico e colecionador de artes Paul Alexandre que foi por anos o
único admirador), seu trabalho revela pureza formal e calma. Expandiu de
forma decisiva seu olhar pictórico ainda na adolescência, quando este, vítima
de tifo e tuberculose, passou por várias cidades italianas com a mãe,
Eugenia, que empenhada na cura do filho, esteve em Nápoles, Capri, Amalfi,
Roma, Florença e Veneza, frequentando museus e igrejas do passado
artístico, principalmente do Renascimento, a pedido de Modigliani.

A sombra do maldito emaranhado em pedregulhos "sócio-existenciais". Um


pária, herege, outsider no candelabro aceso da poesia. Sua obra, fina,
contundente como chama que queima, dentro de uma pureza e coesão
de cores e formas, emerge solta, alongada, elegante — experiência que
transparece devido seus estudos na escultura (a arte que considerava
a mais nobre de todas). Baseado nas cariátides, que são "figuras femininas
esculpidas servindo como um suporte de arquitetura tomando o lugar de uma
coluna ou um pilar de sustentação com um entablamento na cabeça", cujo
significado é "moças de Karyai", uma antiga cidade do Peloponeso, suas
esculturas, assumem caráter alongado , que seria logo em seguida, o pilar
da pintura do italiano Amadeo Modigliani.

Como Van Gogh, Modigliani teve uma vida extremamente difícil e


conturbada. Não gozou de prestígio algum, muito menos de reconhecimento
em vida. Mudou-se para Paris atrás de inspiração e efervescência cultural. A
imagem maculada do artista em ruínas à beira da miséria. O louco anacrônico
bom bebedor de vinho no dínamo apaixonante de quem se entrega à vida
mesmo diante das vicissitudes. "Delirium Tremens Diante do Paraíso". Os
inframundos de Dante Alighieri. "Uma existência atribulada, atormentada pela
saúde comprometida desde a infância, e interrompida pela tuberculosa aos
35 anos. A desmedida atração pelo haxixe, pelo álcool e pelas mulheres.
A indiferença quase total da crítica e do mercado por sua pintura enquanto
era vivo, desfeita já no dia seguinte à sua morte, pela atenção arrebatada dos
colecionadores. O abandono forçado da escultura, modalidade expressiva
que ele privilegiava acima de todas as demais. O suicídio, dois dias após a
morte do artista, de sua jovem companheira, grávida de nove meses, e com
uma filha de pouco mais de um ano. Por outro lado, uma obra
perfeitamente concluída, que, no espaço de 15 anos, amadureceu com
enorme rigor e uma fidelidade absoluta aos próprios princípios."

No início, influenciado pelo "pai da pintura moderna" Paul Cézanne, sua


pintura se embebedou também da arte africana e da Oceania. "Modi", pode não
ter sido um artista engajado, mas mesmo assim sua arte contém toques
dramáticos e existenciais. Durante a primavera de 1913, o artista na sua última
temporada em Livorno, produziu algumas obras e mostrou aos amigos.
Ignorantes sobre o sentido da palavra vanguarda, recomendaram ao Modigliani
que jogasse suas obras nos canais da cidade. Tomado de fúria, que era um dos
traços de sua personalidade, realmente jogou as esculturas nos canais. Era
uma alma envolta em chamas e intensidade. Um "vagabundo iluminado".

Outro grande "décadent" que ultrapassou e rompeu as barreiras


vigentes de sua época, tanto no campo artístico como comportamental foi
o poeta francês Jean-Nicolas Arthur Rimbaud (Charleville, 20 de outubro de
1854 — Marselha, 10 de novembro de 1891) . Outro "vagabundo iluminado "
como diria Jack Kerouac, o escritor da beat generation , movimento
artístico da década de 40 e 50 do século XX, que influenciaria grandes
manifestações culturais como o festival Woodstock, a contracultura e os
revoltados de Maio de 1968 em Paris. Rimbaud foi um "místico em estado
selvagem". Segundo o poeta Tristan Tzara, para o autor de "Une Saison
en Enfer" (Uma estadia no Inferno), "o absurdo torna-se um valor poético
como a dor e o amor. Aprofundando-se o absurdo do mundo, uma inaudita
clareza surge infinitamente mais luminosa. Lautréamont, Mallarmé e
Saint-Pol-Roux nos ensinaram que é necessário penar longamente até essa
clareza chegue à consciência. Esta não se ensina. Cada um deve
descobri-la nas profundezas de seu ser com todos os riscos que sua aventura
comporte, em esferas em que o perigo torna-se imenso. Tal foi para Gerard
de Nerval, nos confins da loucura, a lição de sua procura de um absoluto. Tal é o
preço da razão, ao sair do túnel para encontrar a recompensa na
sabedoria e na luz."

Rimbaud admirava desde muito cedo os poemas de Verlaine,


principalmente seus "Poèmes Saturniens". Decide então criar o seu mais
fantástico poema: "O Barco Embriagado". Isola-se no campo perto do velho
moinho; cabelos revoltos, rebeldes como o vento, o bardo, o sopro que
ondula cabelo e roupa no mesmo ritmo da água do rio; o olhar turvo,
embriagado, observando o fundo prismático entre os reflexos dourados do
sol. Nessa paisagem surge o poema. Verlaine, com entusiasmo recebe seus
versos e este mostra aos seus amigos. Poucos dias depois, Rimbaud
recebe uma carta com os seguintes dizeres, " Venha, grande alma
querida, o chamamos, estamos a sua espera". Em anexo um vale postal
com um valor recolhido entre os parnasianos que cobriria os gastos da
viagem. Sua vida foi uma intensa "fuga". A face real da modernidade.
Não é atoa que o poeta de Charleville dizia que "é preciso ser absolutamente
moderno". Ultrapassar barreiras. "As portas da percepção". As flores silvestres
em clísteres de êxtase. Rimbaud morreu com 37 anos de idade. Viveu apenas 2
anos a mais que Rimbaud. Ambos morreram jovens. Ao passo que os
versos do poeta eram incendiários, delirantes, subversivos, a pintura do
Modigliani era suave, pura, elegante. A singularidade deles está no fato do
apego em retratar os desajeitados, os párias, marginais e excluídos da
sociedade. Nos dois casos, saíram de sua terra natal afim de chegarem à
cidade de Paris encontrar aprendizado, inspiração, experiências, conexão com a
grande arte que estava pulsante naquela região. Rimbaud se aventurou no
verso livre, que ainda não era aceito na academia. Modigliani rompeu com a
forma tradicional da figura humana num processo consciente de ruptura. O
bardo francês se reunia num banquete chamado "vilões-Gentis-Homens"
fornecido pelos parnasianos; local esse que transcorria mergulhado de absinto,
ópio e haxixe. "Modi”, numa alusão à palavra “maudit” (maldito) era adepto
costumaz de álcool, haxixe, ópio e cocaína. Ambos causavam espanto,
choque perante a sociedade ainda tão provinciana daquela época. Ambos
viveram períodos de guerra. Rimbaud viu de perto a Comuna de Paris ( o
primeiro governo operário da história, fundado em 1871 na capital francesa por
ocasião da resistência popular ante a invasão por parte do Reino da Prússia).
Amadeo no meio do caos da Primeira Guerra Mundial (que começou em 28
de julho de 1914 e durou até 11 de novembro de 1918). O poeta chegou certa
vez a sofrer de febre tifóide devido a inflamação nas paredes do estômago
causada pelo atrito da costela contra o abdômen por excesso de caminhar a pé.
Modi contraiu tuberculose aos 16 anos de idade. Essas almas rebentas,
"forçados mártires" das imagens obsoletas da consciência, criadores de
linguagens e formas, reafirma Tristan Tzara: é preciso penar muito para
chegar à essência das artes.

Título: Paul Alexandre sobre fundo verde

Técnica: óleo sobre tela


Dimensões: 100 x 81 cm

Ano:1909

Localização: Museu de Arte Fuji, Tóquio, Japão

Título: Jeanne Hébuterne Sentada com o braço sobre o espaldar

Técnica: óleo sobre tela

Dimensões: 100 x 65 cm

Ano:1918
Localização: Norton Simon Museum, Pasadena, EUA
Título: Mulher com gravata preta

Técnica: óleo sobre tela

Dimensões: 165,4 x 50, cm

Ano:1917

Localização: Galerias Fujikawa, Tóquio

Título: Nu deitado (Nu vermelho)

Técnica: óleo sobre tela

Dimensões: 60 x 92
Ano:1917

Localização: Coleção Mattioli, Milão, Itália


Título: Cabeça de Mulher

Técnica: óleo sobre tela

Dimensões: 58 x 12 x 16 cm

Ano:1912

Localização: Musée National d 'Art Moderne, Paris

You might also like