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Tema I
Evasão, elisão, fraude, simulação e sonegação fiscal contra a Fazenda Pública 1. Evasão e elisão fiscal.
Distinção; 2. Elisão. Abuso de forma. Interpretação econômica; 3. Direito penal tributário ou direito
tributário penal; 4. Fraude fiscal. Conceito; 5. Simulação e fraude fiscal. Distinção; 6. Sonegação. Conceito.
Elementos diferenciadores; 7. Questões judiciais controvertidas.
Notas de Aula1
tributação do fato em questão. Por isso, a elisão, neste segundo conceito, é sempre ilícita,
pela só razão de afastar a tributação de fatos que seriam tributáveis (mesmo que com
amparo legal). Pode-se mesmo ler o termo “valores” com conotação literalmente
pecuniária: seria algo como a jurisprudência da arrecadação a qualquer custo.
A segunda escola não teve muita adesão, por se revelar mesmo um tanto quanto
radical e infundada. É a terceira escola, a jurisprudência dos interesses, que tomou campo
forte, confrontando a antigamente predominante jurisprudência dos conceitos. Esta
corrente, surgida no direito alemão do século XIX, mede a licitude ou ilicitude de um fato
de acordo com o interesse que o levou a ser praticado, o intuito negocial que o motivou,
podendo a elisão ser abusiva ou não, mesmo se formalmente legal, a depender da casuística
e das intenções do elidente.
Entenda: a adoção da jurisprudência dos interesses revela uma evolução diretamente
decorrente do pós-positivismo, porque passou-se a buscar a justiça fiscal, mais do que a
mera subsunção legal, apregoada pela jurisprudência dos conceitos, altamente positivista.
Da predominância da jurisprudência dos interesses é que decorreu a interpretação
econômica do fato gerador, que julga os fatos geradores por seus propósitos econômicos, e
não pela mera forma com que estes se apresentam. E isto muda toda a concepção do que é
uma elisão devida ou indevida.
Veja um exemplo: pessoas intentam realizar compra e venda de um imóvel. Esse é
seu interesse, seu intento. Porém, pretendem deixar de pagar o ITBI, e com este intuito
fazem a seguinte operação: constituem uma sociedade de fachada, e integralizam o capital
daquela sociedade justamente com aquele bem que seria vendido (porque na integralização
do capital não incide ITBI); em seguida, transferem as cotas daquela sociedade para os
compradores, que, com isto, se tornam proprietários indiretos da coisa que a eles seria
vendida – sem jamais terem pagado o ITBI.
Veja que esta situação, em se observando a obtusa jurisprudência dos conceitos, foi
perfeitamente legal: é legal constituir uma sociedade; é legal integralizar seu capital com o
bem imóvel; e é legal transferir cotas a quem quer que seja. Se fosse observado o
positivismo cego da jurisprudência dos conceitos, esta situação foi uma elisão
perfeitamente lícita.
Trazendo esta análise à ótica da jurisprudência dos interesses, porém, a situação se
modifica: como o foco é no interesse das partes envolvidas na negociação, fica claro que: o
interesse na constituição da sociedade não era realizar atos de empresa, mas sim permitir a
movimentação do bem imóvel sem a tributação pelo ITBI. É uma elisão, de fato, mas se o
único objetivo daquela negociação toda foi justamente evitar a tributação que seria devida,
trata-se de uma elisão ilícita. Com isto, pode a administração simplesmente desconsiderar
toda esta dinâmica, e com isso fazer incidir o ITBI sobre a transmissão do imóvel, que foi o
que de fato ocorreu.
Repare que o termo “desconsiderar” foi muito bem empregado, porque é
exatamente isto que ocorre: as operações realizadas – a constituição da empresa, a
integralização do capital social, a transferência das cotas – tudo isso continua perfeitamente
vigente, mas é desconsiderado pelo fisco em razão do fundo real que tudo isso acobertou:
uma compra e venda de bem imóvel, passível de ITBI. Nada é anulado: há apenas o
descarte de tudo mais para fins tributários, incidindo o imposto como se simples compra e
venda fosse.
É por tudo isso que há autores que defendem que a distinção entre evasão e elisão
baseada em mero critério temporal não mais faz sentido. A adoção da jurisprudência dos
interesses teria posto fim à validade deste critério temporal. Entretanto, ainda persiste este
critério como orientador claro para definir se há uma ou outra hipótese, elisão ou evasão,
mas o que mudou, concretamente, foi a concepção sobre a elisão: o que outrora era sempre
um ato lícito – toda elisão era permitida e lícita –, agora não é mais assim. Por vezes, a
elisão amparada em atos lícitos será tida por indevida, e não afastará a tributação (como no
exemplo dado há pouco). Ou seja: nem toda elisão é lícita, hoje, pois se os propósitos dos
atos elisivos forem exclusivamente dedicados a afastar a tributação, são atos dados a burlar
o poder de tributar, e por isso ilícitos.
Um outro exemplo, bem contemporâneo, em que se põe em prática esta conduta
elisiva abusiva, é o das incorporações societárias. Quando se dá a incorporação de uma
sociedade por outra, todo o ativo e passivo da incorporada passa ao patrimônio da
incorporadora. Com isso, o passivo da incorporada representará, na declaração anual do
IRPJ da incorporadora, um decréscimo patrimonial, representando um menor lucro, e por
isso o IR a pagar será menor.
Quando esta situação acontecer – uma sociedade incorpora outra somente para esta
finalidade de reduzir a tributação –, o fisco considera uma elisão indevida, e desconsidera
aquele passivo acolhido pela incorporadora, tributando-a sobre o valor integral da renda do
período. E esta desconsideração do passivo, nestes casos, é hoje normativa, constante do
Regulamento Geral do Imposto de Renda.
E veja que a mesma situação se dá ao inverso: se a incorporadora é a sociedade
deficitária, ao final da operação haverá uma renda positiva, mas menor do que o seria se a
incorporadora fosse a sociedade lucrativa (porque a vedação ao aproveitamento do passivo
é normativa, como dito). Seria tributável o ativo adquirido pela incorporadora, menos o seu
passivo – novamente revelando elisão indevida. Por isso, é igualmente desconsiderado o
passivo, nesta incorporação inversa, por conta da jurisprudência dos interesses.
Assim, sendo a incorporação, direta ou às avessas, dedicada unicamente a abater da
base de cálculo o valor do passivo amealhado, a elisão é ilícita, porque o propósito
negocial, o interesse na incorporação, jamais foi o de realmente incorporar a sociedade, e
sim burlar a tributação.
É claro que, se a incorporação for realmente impulsionada por intuito negocial
legítimo, não há elisão indevida. O problema é quando apenas há um só intuito, o de
reduzir a tributação, e para tanto há toda a negociação incomum de incorporação. Imagine-
se, por exemplo, que a incorporada, mesmo deficitária, realmente interessa à incorporadora,
porque a incorporada titulariza um contrato milionário, que poderá ser executado pela
incorporadora: neste caso, há propósito legítimo na operação econômica, e por isso a elisão,
dali decorrente, é perfeitamente válida.
Sobre o tema, veja:
Esta desconsideração dos atos do contribuinte, hoje, ainda padece de uma certa
insegurança jurídica, sobremaneira porque o final do parágrafo único do artigo 116 do
CTN, supra, diz que será operada “observados os procedimentos a serem estabelecidos em
lei ordinária”. Em primeira leitura, poder-se-ia entender que este dispositivo não é auto-
aplicável, dependendo de normas outras para o ser. Ocorre que o melhor entendimento
sobre este teor é de que quis o legislador apontar para o procedimento já existente do
lançamento tributário, em todas as esferas da federação. Assim, a desconsideração dos
negócios jurídicos deve ser feita com todas as garantias que o processo administrativo
tributário contempla, este sendo o alcance da norma mencionada.
Assim, em conclusão, a elisão pode ser lícita ou ilícita, a depender do seu propósito.
A evasão sempre será ilícita, porém.
1.2. Simulação
O plano tributário também padece dos efeitos da simulação, instituto que tem sede
no direito civil. Relembrando, a simulação é relativa quando há um fato praticado, mas
obnubilado pelo simulacro (uma doação que na verdade é uma compra e venda); e é
absoluta, quando não há negócio algum sendo praticado, senão aquele próprio simulado.
Na seara tributária, a simulação absoluta em nada importa, pois é um ato nulo, sem
qualquer propósito comercial, que é naturalmente desconsiderado para efeitos de tributação,
por si só.
Já a simulação relativa envolve a existência de um negócio subjacente, obliterado
pelo simulacro. De acordo com a perspectiva atual, da jurisprudência dos interesses, pode
(e deve) o fisco desconsiderar o negócio simulado, e considerar, para efeitos de tributação,
o real negócio que subjaz àquele simulacro.
Veja que a atuação do fisco não é anulatória: a Fazenda não vai anular o negócio
simulado, e fazer vigente o que fora falseado. O emprego do termo “desconsiderar” é muito
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
A infração foi cometida pela concessionária, não podendo ser imputável qualquer
responsabilidade à substituta tributária. A pena não pode suplantar a pessoa do infrator. Por
isso, a ação anulatória, em relação à Fiat, deve ser julgada procedente, anulando o crédito
tributário contra ela constituído.
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema II
Infrações, sanções e penalidades tributárias 1. Infrações tributárias. 1.1. Natureza jurídica. Violação de um
dever jurídico; 1.2. Objetividade (art. 136 do CTN), 1.3. Responsabilidade (art. 137 do CTN); 1.4. Denúncia
espontânea. 2. Sanções tributárias. 2.1. Conceito; 2.2. Princípio da legalidade; 2.3. Classificação. 2.3.1.
Sanções penais lato sensu. Competência para legislar; 2.3.2. Sanções administrativas. Competência para
legislar. 2.4. Multas moratórias e punitivas. 2.4.1. Privativas de direito. Apreensão, interdição, agravamento,
perda de isenção, sistema especial de fiscalização. 2.5. Natureza administrativa; 2.6. Efeitos. Repressivo.
Intimidatório. Preventivo; 2.7. Limites. Qualitativo (penalidade pecuniária. Direito de defesa administrativa
e judicial). Quantitativo (não confiscatoriedade, CF/88 - artigo 150, IV). Exclusão da antijuridicidade.
Estado de necessidade. Exclusão da punibilidade, artigo 100, parágrafo único do CTN; 2.8. Extinção da
punibilidade. Artigos 156, IV e V, 180, 138 e 106 do CTN; 2.9. Transferência ao sucessor e responsável; 2.10.
Questões judiciais controvertidas. Jurisprudência. Doutrina.
Notas de Aula2
1. Sistemas sancionatórios
A diferença conceitual entre direito tributário penal e penal tributário pode ser
colhida da gramática: na expressão “direito tributário penal”, é substantivo o termo
“tributário”, e adjetivo o termo “penal”, ou seja, é um ramo do direito tributário que trata de
questões referentes a penalidades administrativas. E o contrário idem: é direito penal
tributário aquele ramo do direito penal que se ocupa de questões tributárias, especialmente
os crimes tributários.
As sanções existentes em nosso ordenamento podem ser penais, civis ou
administrativas. A tutela penal reprime condutas mais graves, atentatórias a valores mais
caros à sociedade; a tutela civil, em regra, pretende coibir aviltes de cunho menos severo,
mas igualmente repreensíveis, geralmente tendo por escopo desfazer prejuízos; e a tutela
administrativa tem nuances de tutela penal, destinando-se a valores menos relevantes do
que os penalmente protegidos.
A sanção administrativa se aproxima da penal no seu caráter punitivo, mais forte do
que o cunho compensatório da sanção civil. Ambos os regimes sancionatórios, penal e
administrativo, visam inibir afrontas ao ordenamento cogente, e o que os diferencia é,
primeiramente, a gravidade das infrações, porque o direito penal elege os mais relevantes
valores possíveis para tutelar, e o direito administrativo se concentra em valores de menor
relevância (porém ainda fundamentais). A eleição de relevância é dada exclusivamente ao
legislador, que dirá o que é penalmente relevante, e o que é apenas administrativamente
relevante.
Outra diferença reside na severidade da sanção: se se pretender restringir a liberdade
pessoal do infrator, o único regime sancionatório possível é o penal, porque só esse oferece
o maior espectro de garantias que a incisão demanda – inclusive no que diz à competência
legislativa, privativa da União. Se sanções pecuniárias ou restritivas de direitos forem
suficientes, bastará a adesão pelo legislador ao regime sancionatório administrativo, mais
flexível quanto às garantias, e quanto à sua instituição, eis que compete a qualquer ente
tributante legislar sobre sanções administrativas.
Da punição administrativa advém uma relação jurídica diferente da relação jurídica
tributária arrecadatória. Nesta, há o sujeito passivo que é devedor tributário, e o fisco,
credor tributário, calcada no poder-dever estatal de tributar. A multa, por seu turno, não
integra a mesma relação tributária original: havendo descumprimento de qualquer aspecto
naquela que faça incidir multa, surge uma nova relação jurídica, secundária, entre as
mesmas partes, mas com outro objeto: não há cobrança de tributo, e sim exigência de uma
obrigação decorrente de uma sanção.
2
Aula ministrada pelo professor Antonio Henrique Correa da Silva, em 25/3/2010.
É fato que caminharão juntas, podendo ter o mesmo desfecho, mas isto não altera o
fato de serem relações jurídicas diversas, de natureza e objeto diversos. Se houver uma
remissão do tributo, a relação original se extingue, e com ela se extingue a secundária – a
relação sancionatória terá fim, por sua acessoriedade. Mas podem ter destinos diversos,
também: havendo anistia da multa, apenas a relação secundária em que esta era exigida se
extingue, restando íntegra a relação jurídica tributária original.
A relação sancionatória pode surgir tanto da obrigação principal, de pagar o tributo,
quanto da acessória, de fazer prestações em relação à administração tributária – os deveres
instrumentais. Qualquer descumprimento de norma tributária pode ensejar sanção
administrativa, se assim elegeu a administração.
As multas são moratórias quando decorrem do inadimplemento do tributo, do
descumprimento da obrigação principal, e são acessórias ao crédito tributário – este se
extinguindo, se extinguem junto. As multas punitivas, por seu turno, são aquelas
decorrentes do descumprimento de deveres instrumentais, e são independentes do crédito
tributário, pois só se vinculam à obrigação acessória, em nada pertinente, esta própria, ao
crédito tributário (que pode sequer existir, como se dá quando uma entidade imune, por
exemplo, deixa de cumprir escrituração obrigatória, sendo por isso multada).
Característica fundamental das sanções tributárias, de qualquer sorte, é a sua
objetividade. Ao contrário da responsabilidade penal, que é sempre calcada em dolo ou
culpa, jamais sendo objetiva, a responsabilidade administrativa tributária independe de
demonstração de dolo ou culpa, como se vê no artigo 136 do CTN:
Há quem diga que poderia ser alegado, como defesa contra uma sanção tributária,
algum fortuito que levou à infração da legislação tributária. Por exemplo, o atraso no
pagamento de um tributo por conta de algum fortuito excluiria a punibilidade do infrator.
Esta orientação não tem qualquer guarida jurisdicional, eis que, como se disse, o sistema
sancionatório administrativo não oferece as mesmas garantias que o penal, e a objetividade
na responsabilidade, regra geral, é uma das diferenças mais marcantes.
O artigo 137 do CTN, no entanto, relativiza esta objetividade, criando casos em que
há responsabilidade pessoal do agente por dolo ou culpa. Tais são as hipóteses:
São sanções políticas aquelas sanções administrativas que não têm cunho
pecuniário, patrimonial – ou seja, são sanções diversas das multas. São políticas as sanções
restritivas de direitos, tais como: apreensão de bens; interdição de estabelecimento;
agravamento de sanção; perda de isenção; sistema especial de fiscalização, etc.
A discussão sobre estas sanções não pecuniárias é sobre sua validade: muito se
critica sua existência, reputando-as inconstitucionais, mas a verdade é que são regularmente
aplicadas no direito tributário penal. Há algumas destas sanções políticas, porém, que já
foram declaradas inconstitucionais pelo STF: a interdição do estabelecimento, por exemplo,
não pode ser procedida pela mera infração tributária, eis que viola a via normal de cobrança
dos créditos tributários, sendo um meio oblíquo de coerção para o pagamento do tributo,
que deve ser exigido em execução fiscal. Veja a súmula 70 do STF:
É claro que a apreensão ainda será cabível quando a motivação for a defesa
nacional, como quando há contrabando: a apreensão dos bens contrabandeados, na
aduaneira, é perfeitamente justificável – sedo imposta tanto esta sanção política
administrativa quanto a penal, pois é fato típico. É claro que neste caso não haverá
cobrança do tributo, pois a importação é vedada.
No descaminho, outrossim, haverá multa, apreensão e sanção penal, e haverá
também cobrança do tributo, porque a importação era possível. Veja que o tratamento acaba
sendo pior do que o dispensado ao contrabando.
A regra geral, em verdade, é que não se pode impor restrições de direitos por conta
de infrações tributárias cometidas. A maioria destas medidas será inconstitucional. Até
mesmo a cassação de uma isenção por infração tributária pode ser ilegal, e só será tolerada
esta cassação se a infração for justamente a falta do preenchimento de alguma condição
para haver a isenção. Se a infração for desconexa à isenção, cassá-la é uma ofensa ao
sistema constitucional.
O agravamento de sanção é uma medida geralmente cabível, e tem lugar quando há
reincidência na infração tributária.
Outra medida admissível, outra sanção política cabível, é o sistema especial de
fiscalização: quando o sujeito passivo é infrator constatado de normas tributárias, é
perfeitamente justificável que haja um regime mais firme de fiscalização sobre seus atos,
porque ele evidencia maior tendência a infringir as normas tributárias. É uma sanção
política perfeitamente razoável.
As sanções administrativas, todas elas, têm efeitos similares às sanções penais. Têm
efeito repressivo, visando dar uma resposta proporcional ao infrator, por sua infração, por
sua violação ao ordenamento jurídico tributário. Têm também um efeito intimidatório, que
visa a convencer aqueles que não cometeram a infração a não cometê-la, e àqueles que a
cometeram, que não reincidam. E têm efeito educativo, preventivo, visando a criar uma
cultura fiscal de cumprimento espontâneo e correto dos deveres tributários.
“Art. 100. São normas complementares das leis, dos tratados e das convenções
internacionais e dos decretos:
I - os atos normativos expedidos pelas autoridades administrativas;
II - as decisões dos órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa, a
que a lei atribua eficácia normativa;
III - as práticas reiteradamente observadas pelas autoridades administrativas;
IV - os convênios que entre si celebrem a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios.
Parágrafo único. A observância das normas referidas neste artigo exclui a
imposição de penalidades, a cobrança de juros de mora e a atualização do valor
monetário da base de cálculo do tributo.”
O caso é de uma infração for cometida com esteio em uma norma legal, editada pelo
próprio fisco, ou seja, o fisco emite norma ilegal, ato administrativo contrário à lei, e este é
observado pelo sujeito passivo, incidindo em infração à lei tal qual o próprio ato normativo
incidiu. É claro que, neste caso, não pode o sujeito passivo ser punido, pois foi a própria
conduta do fisco que levou-o a praticar a infração.
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
“Art. 132. A pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação
ou incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até à
data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou
incorporadas.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se aos casos de extinção de pessoas
jurídicas de direito privado, quando a exploração da respectiva atividade seja
continuada por qualquer sócio remanescente, ou seu espólio, sob a mesma ou outra
razão social, ou sob firma individual.”
Veja que o dispositivo fala em “tributos”, o que não se confunde com penalidades.
O fato de haver expressa menção somente aos tributos excluiria do alcance deste
dispositivo as penalidades: a sucessão impõe a transferência dos tributos, mas não das
penalidades, em atenção à literalidade do dispositivo e ao princípio da pessoalidade da
pena, que só pode atingir o próprio infrator, e não seu sucessor. Este é o entendimento
clássico, hoje superado.
Em uma segunda fase jurisprudencial, surgiu corrente diversa da exposta, mais
antiga: o STJ entendia que havia, sim, a transmissibilidade da sanção ao sucessor, mas
apenas das multas moratórias, porque são essencialmente vinculadas aos tributos, e com
estes seguem, indissociáveis, para a responsabilidade do sucessor. As multas punitivas,
decorrentes de um não fazer ou fazer errôneo, por seu turno, não se transferem ao sucessor,
porque estas sim são desvinculadas do tributo em si.
Desde 2005, porém, a jurisprudência do STJ entrou em um novo momento, que
perdura: as multas, moratórias ou punitivas, são sanções de natureza pecuniária,
patrimonial, e com isso se incorporam imediatamente ao patrimônio do sucessor universal,
como é o caso da sucessão por incorporação. Destarte, hoje, opera-se a transmissibilidade
de todas as multas ao sucessor tributário, sucessor universal do patrimônio, do ativo e
passivo global do sucedido.
Sendo assim, transmitem-se as sanções ao patrimônio da incorporadora, não
havendo qualquer forma de elisão de tais penalidades, quando da incorporação. As sanções
administrativas não se limitam pela pessoalidade da pena, como ocorre no direito penal.
A respeito, veja os REsp. 32.967 e 613.605, representando a evolução
jurisprudencial:
“REsp 32967 / RS. RECURSO ESPECIAL. Relatora Ministra ELIANA
CALMON. Órgão Julgador - SEGUNDA TURMA. Data do Julgamento:
22/02/2000. Data da Publicação/Fonte: DJ 20/03/2000 p. 59.
Ementa: TRIBUTÁRIO - RESPONSABILIDADE DO SUCESSOR - MULTA
MORATÓRIA - ART. 132 DO CTN.
1. Doutrinariamente, discutível a elisão da multa punitiva da responsabilidade do
sucessor. 2. Sem discrepância jurisprudencial, impõe-se ao sucessor a multa
moratória. 3. Recurso conhecido, mas improvido.”
Questão 3
Resposta à Questão 3
Se a norma municipal impuser este dever, a sua quebra trata-se de uma infração a
dever instrumental, e por isso perfeitamente sancionável no regime sancionatório
administrativo, através da multa punitiva. Veja os artigos 81 e 85, IV e VI, do Código
Tributário Municipal do Rio de Janeiro, Lei 691/84:
“Art. 81 - Os titulares de direitos reais sobre imóveis, ao apresentarem seus títulos
para registro no Registro de Imóveis, entregarão, concomitantemente,
requerimento preenchido e assinado, em modelo e número de vias estabelecidos
pelo Poder Executivo, a fim de possibilitar a mudança do nome do titular da
inscrição imobiliária.
Parágrafo único - Na hipótese de promessa de venda ou de cessão de imóveis a
transferência de nome aludirá a tal circunstância, mediante a aposição da palavra
"promitente", por extenso ou abreviada, ao nome do respectivo titular.”
Destarte, a penalidade deve constar de lei formal, mas a infração pode ser definida
em atos complementares.
Tema III
Notas de Aula3
3
Aula ministrada pelo professor José Maria de Castro Panoeiro, em 29/3/2010.
“Deve-se ter presente que o princípio da liberdade não conduz à anarquia, mas a
uma liberdade a que corresponde uma responsabilidade comunitária.”
Veja que se diz que a fraude é regra, mas não imprescindível, porque há crimes
tributários que são de mera retenção, como se vê no artigo 2º, II, da Lei 8.13790:
No crime de sonegação de imposto, o mero ato de não pagar não é crime; é crime o
fato de praticar alguma fraude com o escopo de não pagar o tributo, e efetivamente não
pagá-lo por conta da fraude.
O conceito de fraude tributária é bem apresentado no artigo 72 da Lei 4.502/64:
“Art . 72. Fraude é tôda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar,
total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária
principal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais, de modo a
reduzir o montante do imposto devido a evitar ou diferir o seu pagamento.”
“Estelionato
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio,
induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer
outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
(...)”
“Falsidade ideológica
Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia
constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser
escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre
fato juridicamente relevante:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, se o documento é público, e reclusão
de um a três anos, e multa, se o documento é particular.
Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime
prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de
registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.”
“Contrabando ou descaminho
Art. 334 Importar ou exportar mercadoria proibida ou iludir, no todo ou em parte, o
pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo
de mercadoria:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.”
Veja o crime de sonegação fiscal que foi apresentado pela Lei 4.729/65:
Tratava-se de crime formal, como se vê. Hoje, com a tipificação da sonegação fiscal
trazida pelo artigo 1º da Lei 8.137/90 (que revogou tacitamente o artigo supra), este crime
passou a ser material, ao menos nas hipóteses deste artigo 1º, há pouco transcrito.
Tecnicamente, é melhor se falar em crime de lesão, porque faticamente o dinheiro que seria
para pagar o tributo não se moveu: estava em poder do sujeito passivo fraudador, e ali
ficou. Não há modificação no plano dos fatos, mas há lesão.
Sobre a revogação, veja:
A Lei 10.522/02, no artigo 20, apresenta o seguinte valor para a execução fiscal
federal ser interessante:
“Art. 20. Serão arquivados, sem baixa na distribuição, mediante requerimento do
Procurador da Fazenda Nacional, os autos das execuções fiscais de débitos
inscritos como Dívida Ativa da União pela Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional ou por ela cobrados, de valor consolidado igual ou inferior a R$
10.000,00 (dez mil reais).
§ 1º Os autos de execução a que se refere este artigo serão reativados quando os
valores dos débitos ultrapassarem os limites indicados. Lei 10.522/2002.
(...)”
O fato de não compensar ao Poder Público buscar seus débitos por meio de
execução fiscal traduz a insignificância da lesão?
O STJ entendia que, na verdade, o limite de dez mil reais não deve ser observado,
porque como se vê ali a execução não é realizada até que se atinja este limite, e não
cancelada de vez. Para que o débito seja definitivamente irrelevante ao fisco, ele não pode
superar cem reais, como se vê no artigo 18, § 1º, da mesma Lei:
“Art. 18. Ficam dispensados a constituição de créditos da Fazenda Nacional, a
inscrição como Dívida Ativa da União, o ajuizamento da respectiva execução
fiscal, bem assim cancelados o lançamento e a inscrição, relativamente:
(...)
§ 1º Ficam cancelados os débitos inscritos em Dívida Ativa da União, de valor
consolidado igual ou inferior a R$ 100,00 (cem reais).
(...)”
Sendo assim, é esse montante de cem reais que o STJ sempre entendeu
insignificante, e não o valor da execução fiscal, de dez mil reais. Veja o julgado abaixo:
A posição tradicional do STJ, acima exposta, foi recentemente superada pelo STF,
porém. Passou esta Corte a entender que se o montante não desperta interesse na seara
administrativo-tributária, não poderia despertar interesse repressivo penal, e por isso o valor
realmente determinante da insignificância seria, de fato, o de dez mil reais, do artigo 20 da
Lei 10.522/02, supra. Atendendo a este entendimento do STF, o STJ passou a acompanhar
tal posição. Veja abaixo uma compilação de julgados que exprimem esta dinâmica:
princípio da insignificância quando o valor não seja exigível para o Fisco, devendo
cada caso ser analisado conforme suas peculiaridades. Vencido o Min. Marco
Aurélio, que indeferia o writ ao fundamento de que, no que tange ao patrimônio
privado, não se chegaria a assentar o crime de bagatela quando a res alcançasse o
valor de R$ 10.000,00, não sendo coerente, destarte, decidir-se em sentido
contrário quando se visasse proteger a coisa pública. Asseverou, ademais, ser
relutante em admitir essa fixação jurídica criada pela jurisprudência, na medida em
que tal preceito não se encontraria em dispositivo normativo algum. HC 96661/PR,
rel. Min. Cármen Lúcia, 23.6.2009. (HC-96661).”
Veja uma peculiaridade: se o valor do tributo sonegado for de oito mil reais, mas a
multa incidente é de mais sete mil reais, haverá execução pelo total, de quinze mil reais.
Haverá, neste caso, a aplicação do princípio da insignificância?
Para o STF, não se aplica: o valor é relevante, pois supera dez mil reais, e haverá
execução fiscal, e há crime. Ocorre que é um critério errado, porque o valor da sonegação,
em si, foi inferior ao montante considerado insignificante, somente sendo acrescido de
valores decorrentes de penalidades administrativas. Contudo, tem sido aplicado este
critério.
Vale traçar uma síntese de toda esta dinâmica da insignificância nos crimes
tributários: o STF passou a entender que o valor da execução fiscal é o paradigma de ultima
ratio para a insignificância, ou seja, os dez mil reais. O HC 96.661 é o paradigma que
melhor exprime esta postura, acima transcrito. O STJ passou a acompanhar este critério,
como se vê no REsp. 1.112.748, supra. E repare que o STF leva em conta o montante total
do débito (tributo sonegado somado a multas e encargos), e não apenas o valor do tributo
efetivamente sonegado, o que é uma incoerência.
Outra questão sobre a insignificância em crimes tributários é se a reiteração
criminosa pode ser utilizada com vistas a afastar a aplicação do princípio. A jurisprudência
do STF é sólida: a insignificância é aferida exclusivamente com base em critérios objetivos
e isolados em cada conduta criminosa, não podendo ser medida pela análise de
antecedentes ou culpabilidade, sob pena de se criar hipótese de atenção ao impossível
direito penal do autor. Debalde, o STJ já aplicou este critério errôneo, de forma a afastar a
aplicação do princípio, como se vê nos julgados abaixo:
II. Nos delitos de descaminho, embora o pequeno valor do débito tributário seja
condição necessária para permitir a aplicação do princípio da insignificância, o
mesmo pode ser afastado se o agente se mostrar um criminoso habitual em delitos
da espécie.
III. O comportamento do réu, voltado para a prática de reiterada da mesma conduta
criminosa, impede a aplicação do princípio da insignificância. Precedentes.
(...)
VII. Ordem denegada.”
implicaria falta de justa causa para ação penal pelo crime de descaminho. Ademais,
aduziu-se que a existência de procedimento criminal — arquivado — por fatos
similares não se mostraria suficiente para afastar o aludido princípio, tendo em
vista o caráter objetivo da regra estabelecida por esta Corte para o efeito de se
reconhecer o delito de bagatela. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos
Britto que desproviam o recurso por considerar a repetição da prática delituosa,
ressaltando que o paciente já fora beneficiado antes pelo instituto da
insignificância pelo mesmo crime. Alguns precedentes citados: HC 96374/PR (DJE
de 23.4.2009); HC 96309/RS (DJE de 24.4.2009); RE 514531/RS (DJE de
6.3.2009). RHC 96545/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 16.6.2009. (RHC-
96545).”
admitida, e não se confunde com a denúncia geral, que imputa a todos indistintamente a
participação no crime, por vezes sem qualquer vínculo fático – claramente inadmissível.
Para o STF e o STJ, a denúncia genérica é aquela que Pacelli denomina de denúncia
geral, confundindo os conceitos. Anteriormente, admitiam a denúncia genérica (geral),
apresentada com imputação indiscriminada de todos que constassem do contrato social,
porque este documento era subscrito por eles e contra eles fazia presumir atuação em todas
as atividades da sociedade, inclusive as criminosas.
Ocorre que, por óbvio, há sócios que não tinham, faticamente, absolutamente
nenhuma atuação no crime societário, e mesmo assim era denunciado – configurando
responsabilização penal objetiva, impensável. Com base nisso, a denúncia contra todos do
contrato social passou a ser inadmitida, pelo STF, pelo que a demonstração do vínculo de
fato do agente com o crime precisa ser demonstrada – não basta ser sócio para ser réu no
processo criminal. A prova do vínculo fático se dá por documentos por eles assinados,
cheques emitidos, etc.
Veja a posição atual do STF e do STJ:
Casos Concretos
Questão 1
estrangeiras que vendia sem cobertura fiscal durante o exercício financeiro de 2003. A
supressão do tributo atingiu o montante de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais),
valores atualizados. Instaurado o competente inquérito policial, foi apurado que dos 7
(sete) sócios que a empresa possuía - todos com poderes de administração pelo Contrato
Social - apenas dois (MANOEL E JOAQUIM) tinham acesso à documentação fiscal e
tinham ciência do inadimplemento fiscal. Denunciado todos os 7 (sete) sócios, o juízo
recebeu a denúncia e, em suas defesas, MANUEL E JOAQUIM sustentam que o valor das
contribuições não recolhidas não causou um prejuízo de monta na arrecadação fiscal e
que não atuaram com o dolo de sonegar o tributo, porquanto escrituraram, nos livros da
empresa, de forma regular, a entrada das mercadorias estrangeiras no estoque o que
descaracterizaria a fraude fiscal. Os demais acusados, além de reiterarem tais alegações,
sustentaram, ainda, que somente estão sendo processados por suas posições de sócios, o
que acarretaria situações de responsabilidades penal objetiva. Chamado a decidir a
questão, como se posicionaria?
Resposta à Questão 1
“HC 23291 / SP. HABEAS CORPUS. Relator Ministro GILSON DIPP. Órgão
Julgador - QUINTA TURMA. Data do Julgamento: 17/12/2002. Data da
Publicação/Fonte: DJ 24/03/2003 p. 249.
Ementa: CRIMINAL. HC. DESCAMINHO. CRIME CONTRA A ORDEM
TRIBUTÁRIA. IMPORTAÇÃO DE GUARDA-CHUVAS COM SUPRESSÃO
DE TRIBUTOS INCIDENTES. OMISSÃO DE INFORMAÇÃO E FRAUDE À
FISCALIZAÇÃO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INÉPCIA DA
DENÚNCIA. FALHAS NÃO-VISLUMBRADAS. POSSIBILIDADE DE
DENÚNCIA GENÉRICA. INQUÉRITO POLICIAL. PRESCINDIBILIDADE.
AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO-EVIDENCIADA DE PLANO. ORDEM
DENEGADA.
Eventual inépcia da denúncia só pode ser acolhida quando demonstrada inequívoca
deficiência a impedir a compreensão da acusação, em flagrante prejuízo à defesa
dos acusados, ou na ocorrência de qualquer das falhas apontadas no art. 43 do CPP
– o que não se vislumbra in casu. Tratando-se de crimes de autoria coletiva, de
difícil individualização da conduta de cada participante, admite-se a denúncia de
forma mais ou menos genérica, por interpretação pretoriana do art. 41 do CPP.
Precedentes. O inquérito policial não é imprescindível para o início da ação penal
por denúncia ou queixa, se tais peças vierem embasadas em outros elementos que
demonstrem a materialidade e indiquem a autoria. A falta de justa causa para a
ação penal só pode ser reconhecida quando, de pronto, sem a necessidade de
exame valorativo do conjunto fático ou probatório, evidenciar-se a atipicidade do
fato, a ausência de indícios a fundamentarem a acusação ou, ainda, a extinção da
punibilidade, hipóteses não verificadas in casu. Ordem denegada.”
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema IV
Crimes Contra a Ordem Tributária II 1. Norma penal em branco; 2. Conflito de leis no tempo; 3. Conflito de
leis no espaço; 4. Abolitio criminis; 5. Novatio legis in pejus; 6. Novatio legis in melius; 7. Conflito aparente
de normas; 8. Princípios; 9. Questões judiciais controvertidas. Jurisprudência. Doutrina.
Notas de Aula4
O artigo 1º da Lei 8.137/90 diz que é crime contra a ordem tributária suprimir ou
reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório. Estes conceitos, elementos
normativos do tipo, identificam o crime como norma penal em branco, que precisa de
complementação pelo CTN ou pela CRFB (sendo, no caso, norma penal em branco
homóloga heterovitelina). Não se trata de um tipo aberto, que demanda interpretação, e sim
complemento normativo. O tipo é norma penal em branco.
A elementar tributo configura elemento normativo do tipo, buscando seu
complemento em outras normas jurídicas. Isto gera problemas quando se está diante de
conflito de normas penais no tempo. Vejamos.
Alterada uma alíquota para zero, ou criada uma isenção sobre um tributo que fora
sonegado, desaparecerá o crime? Não há abolitio criminis porque as normas de
quantificação ou isenção de tributos são temporárias, e a alteração do complemento
temporário não representa alteração na concepção estatal de que a conduta é criminosa.
Entenda: a lei tributária, quando complementa a norma penal, assume caráter temporário,
de forma que a modificação da alíquota em nada interfere na tipicidade de um fato anterior.
A lei penal aplica-se ao fato praticado durante a sua vigência; neste sentido, torna-se
relevante a identificação da lei vigente ao tempo da conduta, o prazo de recolhimento do
tributo e ainda a eventual existência de causas de extinção da punibilidade pelo pagamento.
Concluindo: a eventual modificação das alíquotas dos tributos que têm caráter
extrafiscal (II, IE, IPI e IOF), ou mesmo a não renovação de contribuições temporárias
(CPMF), não induzem à retroatividade benéfica descriminalizando a conduta.
É da lei tributária que se extrai a hipótese de incidência, o sujeito passivo da
obrigação, bem como o momento do recolhimento do tributo, aspectos que são relevantes
em termos de responsabilidade penal.
4
Aula ministrada pelo professor José Maria de Castro Panoeiro, em 29/3/2010.
“Art. 15. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos
nos arts. 1º e 2º da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e no art. 95 da Lei no
8.212, de 24 de julho de 1991, durante o período em que a pessoa jurídica
relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no Refis, desde que
a inclusão no referido Programa tenha ocorrido antes do recebimento da denúncia
criminal.
§ 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão
punitiva.
§ 2º O disposto neste artigo aplica-se, também:
I – a programas de recuperação fiscal instituídos pelos Estados, pelo Distrito
Federal e pelos Municípios, que adotem, no que couber, normas estabelecidas
nesta Lei;
II – aos parcelamentos referidos nos arts. 12 e 13.
§ 3º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa
jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos
oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios, que tiverem sido
objeto de concessão de parcelamento antes do recebimento da denúncia criminal.”
“Art. 68. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos
nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e
337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal,
limitada a suspensão aos débitos que tiverem sido objeto de concessão de
parcelamento, enquanto não forem rescindidos os parcelamentos de que tratam os
arts. 1º a 3º desta Lei, observado o disposto no art. 69 desta Lei.
Parágrafo único. A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão
da pretensão punitiva.”
Veja que há extinções pelo parcelamento, outras pelo pagamento, umas antes da
denúncia, outras a qualquer tempo. É claro que a lei que permite o pagamento a qualquer
tempo vai sempre retroagir ou ultragir, eis que é lex mitior. As causas de extinção da
punibilidade que mais favorecerem aos réus são sempre retroativas ou ultrativas.
Quanto à tipicidade, porém, no que diz respeito aos tributos e suas condutas, vale
sempre a lei vigente à época do fato. Havendo a revogação de um tipo penal, mas
subsistindo a conduta em outro tipo penal residual (como exemplo, se o roubo fosse
revogado, a conduta ainda incidiria em furto). Neste caso, se houve condenação pelo crime
revogado, a condenação subsiste, mas qualquer benesse na pena ou no tratamento jurídico
daquele crime será devida ao condenado.
Repare que neste caso não há abolitio criminis, pois a perspectiva adequada para a
abolitio induz que esta somente será reconhecida quando a conduta, como um todo, não
seja mais punida no ordenamento jurídico.
A tentativa, para a doutrina, é possível, mas é bastante difícil de se cogitar, eis que,
não havendo a prática dos verbos nucleares do tipo tributário, todos os atos anteriores são
irrelevantes penais, em regra.
“Crime continuado
Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou
mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de
execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como
continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou
a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).”
Por serem crimes tão peculiares, o requisito temporal da continuidade delitiva, nos
crimes tributários, varia conforme o tributo. Para o STF, em tributos de recolhimento
mensal, é possível um intervalo de até três meses entre as condutas, continuando a ser
reconhecidas como continuidade delitiva.
Veja a posição do STF:
“Sonegação Fiscal: Crime Continuado e Intervalo Temporal – 1
A Turma, por maioria, deferiu, em parte, habeas corpus em que denunciado por
suposta sonegação de tributo de recolhimento mensal (Lei 8.137/90, artigos 1º, I e
II; e 11) pleiteava a reunião de todas as ações penais contra ele instauradas, ao
Aquele que sonega imposto de renda (tributo anual) pode alegar continuidade
delitiva? A resposta é positiva. Veja o seguinte julgado do TRF da Quarta Região:
“TRF4, ACR 1999.04.01.132128-0,Sétima Turma, Relator Vladimir Passos de
Freitas, DJ 19/06/2002.
EMENTA: PENAL. SONEGAÇÃO FISCAL. ART. 1º, INC. I, DA LEI Nº
8.137/90. NULIDADE DO PROCESSO. PERÍCIA CONTÁBIL. DOSIMETRIA
DA PENA. CONTINUIDADE DELITIVA. 1. A nulidade de um processo é ato
extremo, só ocorrendo quando houver demonstração inequívoca de prejuízo
concreto e efetivo ao acusado. 2. É dispensável a prova pericial quando os
documentos necessárias para a formação do juízo de convicção, encontram-se
presentes nos autos. 3. Consuma-se o crime de omissão e prestação de declarações
falsas à autoridade fazendária, quando o agente assim age com o evidente intuito
de suprimir ou reduzir o pagamento do imposto de renda. 4. Se o crime consiste
em omitir rendimentos ou prestar declarações à autoridade fazendária com vistas a
suprimir ou reduzir o pagamento, é possível considerá-lo continuado para fins de
cálculo da pena, mesmo que entre as declarações tenha se passado um ano, pois é
exatamente este o prazo para a prática de tal ato.”
3.2. Sonegação de dois tributos em um só ato
Uma única conduta que leve ao não recolhimento de tributos estaduais e federais
configura crime único ou mais de um delito?
Para Hugo de Brito Machado, em casuística sobre a qual se manifestou, ao proceder
na conduta de sonegação, o agente intentava a conduta global de “sonegar tributos”, não
fracionando, em sua mente, mais de um objeto do tipo (“sonegar ICMS” e “sonegar IPI”).
Esta tese não foi acatada. O entendimento jurisprudencial é de que, com uma só
conduta – a nota fria, por exemplo – praticou dois crimes de sonegação, um para cada
tributo, havendo concurso formal claro. Veja:
“Estelionato
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio,
induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer
outro meio fraudulento:
(...)” (grifo nosso)
“Art. 3° Constitui crime funcional contra a ordem tributária, além dos previstos no
Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal (Título XI,
Capítulo I):
I - extraviar livro oficial, processo fiscal ou qualquer documento, de que tenha a
guarda em razão da função; sonegá-lo, ou inutilizá-lo, total ou parcialmente,
acarretando pagamento indevido ou inexato de tributo ou contribuição social;
II - exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente,
ainda que fora da função ou antes de iniciar seu exercício, mas em razão dela,
vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem, para deixar de lançar ou
cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los parcialmente. Pena - reclusão,
de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.
III - patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração
fazendária, valendo-se da qualidade de funcionário público. Pena - reclusão, de 1
(um) a 4 (quatro) anos, e multa.”
“Concussão
Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da
função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:
Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.
(...)”
“Corrupção passiva
Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente,
ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem
indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº
10.763, de 12.11.2003)
(...)”
“Advocacia administrativa
Art. 321 - Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a
administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário:
Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.
Parágrafo único - Se o interesse é ilegítimo:
Pena - detenção, de três meses a um ano, além da multa.”
periciado e declarado diferente dos padrões utilizados, à época, por tal órgão. No
caso concreto, trata-se de inquérito instaurado para apurar o suposto
enriquecimento ilícito do paciente no exercício do cargo de juiz, culminando em
auto de infração pela não-declaração de rendimentos tributáveis, que fora
impugnado mediante apresentação de declaração retificadora. Pretende-se, na
espécie, o trancamento da ação penal instaurada contra o paciente, sob a alegação
de: a) falta de justa causa, por carência de base empírica da denúncia; b) ausência
de interesse jurídico para instauração da ação penal pela suposta prática
do crime autônomo de uso de documento falso, porquanto a conduta descrita
caracterizaria o crime de sonegação fiscal e c) ocorrência de extinção da
punibilidade quanto ao crimecontra a ordem tributária, já que efetuado o
pagamento do tributo. O Min. Gilmar Mendes, relator, afastando a primeira
alegação e considerando a absorção do crime de falso pelo crime tributário,
proferiu voto no sentido de deferir o writ, por ausência de justa causa para o
prosseguimento da ação penal pela prática do crime autônomo de falsidade, tal
como descrito no art. 304 c/c o art. 297 do CP e, em face do pagamento do tributo,
declarou extinta a punibilidade quanto ao crime tributário previsto no art. 2º, I, da
Lei 8.137/90, no que foi acompanhado pela Ministra Ellen Gracie. O Min. Gilmar
Mendes, ressaltou, em seu voto, que, embora o suposto falso tenha sido praticado
depois de lavrado o auto de infração, o princípio da consunção deve ser aplicado
sempre que houver um tipo penal mais abrangente, o qual absorve um outro delito
e que, na hipótese, o falso constitui etapa para o mencionado crime de
sonegação. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min.
Carlos Velloso. HC 83115/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 23.3.2004. (HC-83115).”
Se o falso que permitiu a sonegação foi praticado no contrato social, é claro que não
se exaure seu potencial lesivo quando da sonegação. Por isso, se o falso for assim praticado,
não será absorvido pelo crime tributário. Veja:
Casos Concretos
Questão 1
Atento aos princípios que regem a sucessão de leis penais no tempo, analisar:
a) se houve, durante o período, abolitio criminis atingindo a conduta praticada por
JOÃO;
b) caso contrário, qual a capitulação da conduta que deverá ser atribuída a
JOÃO?
Resposta à Questão 1
Parte das condutas tem subsunção na Lei 4.729/65 e o restante na Lei 8.137/90.
Aquelas não foram objeto de abolitio, eram crimes formais e ainda na nova lei existe um
delito formal equivalente (artigo 2º, I). Contudo, são colhidas por prescrição sendo aplicada
a pena da nova lei com a majorante da continuidade. Ver julgados mencionados:
“HC 41819 / SP. HABEAS CORPUS. Relator Ministro GILSON DIPP. Órgão
Julgador - QUINTA TURMA. Data do Julgamento: 21/06/2005. Data da
Publicação/Fonte: DJ 01/07/2005 p. 584.
Ementa: CRIMINAL. HC. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ART. 1º,
INCISOS II E IV, DA LEI N.º 8.137/90. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
LEI 10.684/03. PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO. COMPROVAÇÃO.
EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRINCÍPIO DA RETROATIVIDADE DA
LEI PENAL MAIS BENÉFICA. ORDEM CONCEDIDA.
Hipótese na qual os pacientes foram denunciados pela suposta prática do crime
previsto no art. 1º, incisos II e IV, c/c art. 11, ambos da Lei n.º 8.137/90.
Comprovado o pagamento integral do débito tributário, incide, à hipótese dos
autos, o § 2º do art. 9º da Lei n.º 10.684/2003. Tratando-se de norma penal mais
benéfica, deve retroagir aos fatos anteriores à sua vigência, de acordo com o art.
5o, inciso XL, da Constituição Federal. Precedentes do STF e desta Corte. Deve
ser cassado o acórdão impugnado, determinando-se o trancamento da ação penal
instaurada contra os pacientes, tendo em vista a extinção de suas punibilidades.
VI. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator.”
Questão 2
Resposta à Questão 2
Estão prescritos os fatos praticados sob a égide da Lei 4.729/65. Para os demais o
prazo de prescrição se dá em doze anos; logo, o processo pode prosseguir (artigo 1º, I, da
Lei 8.137/90 na forma do artigo 71 do CP). Veja o seguinte julgado:
Questão 3
Resposta à Questão 3
Ocorre que há outros aspectos que devem ser abordados, especificamente a questão
do pagamento como causa extintiva da punibilidade por força da Lei 10.684/2003. Como
bem se sabe esta lei autoriza que efetuado o pagamento seja declarada extinta a
punibilidade nos delitos do artigos 1º e 2º da Lei 8.137/90:
“Art. 9º. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos
nos arts. 1º e 2º da Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168A e 337A
do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, durante o
período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes
estiver incluída no regime de parcelamento.
(...)
Tema V
Crimes Contra a Ordem Tributária III Crimes praticados por particulares (artigos 1º, 8º, 11, 15 e 16 da Lei
8.137/1990) 1. Sujeito ativo; 2. Sujeito passivo; 3. Tipo penal objetivo; 4. Tipo penal subjetivo; 5. Objeto
jurídico; 6. Consumação; 7. Concurso de crimes; 8. Pena; 9. Ação penal; 10. Extinção da punibilidade; 11. A
culpabilidade como pressuposto da pena e Suspensão de punibilidade (Lei 9249/96; Lei 10684/2003 e
11491/09); 12. Questões processuais. Questões controvertidas. Jurisprudência. Doutrina.
Notas de Aula5
1. Questões controvertidas
A partir da Lei 9.430/96, então, o crime de sonegação passou a ter sua ação penal
condicionada à representação do fisco?
A resposta é negativa. Isto representaria uma possibilidade de controle político do
crime, porque a persecução só seria iniciada se a esfera administrativa assim o quisesse,
atando as mãos do MP na persecução penal. Por isso, a súmula 609 do STF veio à ordem:
“Súmula 609, STF: É pública incondicionada a ação penal por crime de sonegação
fiscal.”
Esta orientação foi confirmada na ADI 1.571, mas com a seguinte ressalva: o MP
pode promover a ação penal sem representação, mas o final do procedimento
administrativo deve ser aguardado, quer ele culmine em representação ou não. Veja:
5
Aula ministrada pelo professor José Maria de Castro Panoeiro, em 29/3/2010.
Assim, o artigo 83 da Lei 9.430/96, segundo o STF, é norma que se dirige aos
agentes da Fazenda Pública, e não ao MP, que poderá denunciar quando tiver ciência do
lançamento definitivo.
Em que pese esta nora estar um pouco esvaziada pelas outras causas de extinção da
punibilidade dos crimes tributários supervenientemente criadas, ainda é importante definir
o real alcance da expressão “promover o pagamento”: significa iniciar o pagamento,
parcelando, ou quitar totalmente o débito?
Considerando os parcelamentos especiais das Leis 9.964/00, 10.684/03, e
11.948/09, que são deferidos apenas a alguns débitos, e não a todos genericamente, este
dispositivo supra permaneceria em vigor, representando verdadeira norma geral de extinção
da punibilidade por parcelamento.
Nesse diapasão, a expressão “promover o pagamento” sempre foi controvertida na
jurisprudência, para o STJ bastando a obtenção do parcelamento para ser produzido o
efeito:
O STF não entendia assim, asseverando que somente a quitação do débito teria o
condão extintivo:
1.3. Refis
O artigo 1º da Lei 11.941/09 é a sede do Refis mais recente. Veja os pontos mais
relevantes deste dispositivo, extremamente extenso:
“Art. 1º Poderão ser pagos ou parcelados, em até 180 (cento e oitenta) meses, nas
condições desta Lei, os débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal do
Brasil e os débitos para com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, inclusive
o saldo remanescente dos débitos consolidados no Programa de Recuperação
Fiscal – REFIS, de que trata a Lei no 9.964, de 10 de abril de 2000, no
Parcelamento Especial – PAES, de que trata a Lei no 10.684, de 30 de maio de
2003, no Parcelamento Excepcional – PAEX, de que trata a Medida Provisória no
303, de 29 de junho de 2006, no parcelamento previsto no art. 38 da Lei no 8.212,
de 24 de julho de 1991, e no parcelamento previsto no art. 10 da Lei no 10.522, de
19 de julho de 2002, mesmo que tenham sido excluídos dos respectivos programas
e parcelamentos, bem como os débitos decorrentes do aproveitamento indevido de
créditos do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI oriundos da aquisição de
matérias-primas, material de embalagem e produtos intermediários relacionados na
Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI, aprovada
pelo Decreto no 6.006, de 28 de dezembro de 2006, com incidência de alíquota 0
(zero) ou como não-tributados.
§ 1º O disposto neste artigo aplica-se aos créditos constituídos ou não, inscritos ou
não em Dívida Ativa da União, mesmo em fase de execução fiscal já ajuizada,
inclusive os que foram indevidamente aproveitados na apuração do IPI referidos
no caput deste artigo.
§ 2º Para os fins do disposto no caput deste artigo, poderão ser pagas ou parceladas
as dívidas vencidas até 30 de novembro de 2008, de pessoas físicas ou jurídicas,
consolidadas pelo sujeito passivo, com exigibilidade suspensa ou não, inscritas ou
não em dívida ativa, consideradas isoladamente, mesmo em fase de execução fiscal
já ajuizada, ou que tenham sido objeto de parcelamento anterior, não integralmente
quitado, ainda que cancelado por falta de pagamento, assim considerados:
I – os débitos inscritos em Dívida Ativa da União, no âmbito da Procuradoria-
Geral da Fazenda Nacional;
II – os débitos relativos ao aproveitamento indevido de crédito de IPI referido no
caput deste artigo;
“Art. 68. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos
nos arts. 1o e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e
337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal,
limitada a suspensão aos débitos que tiverem sido objeto de concessão de
parcelamento, enquanto não forem rescindidos os parcelamentos de que tratam os
arts. 1o a 3o desta Lei, observado o disposto no art. 69 desta Lei.
Parágrafo único. A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão
da pretensão punitiva.”
outra denúncia por peculato e por quadrilha ou bando, na qual, ao lado de oito
pessoas, fora também a paciente denunciada. O Min. Relator acentuou que a
conduta descrita, se penalmente punível, não há, pela falta de especificidade, de ser
punida como crime contra a ordem tributária. Admitindo-se tenha a paciente tido
em seu poder as quantias recebidas, não tinha ela o dever jurídico de declará-las às
autoridades fazendárias. A admissão implicaria auto-acusação e, também, o contra-
senso de ter por sanado o caráter ilícito do fato uma vez recolhido o tributo. Se
houve ou há crime, não se trata de algum dos definidos na Lei n. 8.137/1990. O
caso não é de suprimir ou reduzir tributo, isso porque não havia tributo exigível; se
houvesse a exigência, estar-se-ia tributando o ilícito e isso, evidentemente, não é
admissível. Com essas considerações, a Turma concedeu a ordem para trancar a
ação penal. HC 55.217-RR, Rel. Min. Nilson Naves, julgado em 20/6/2006.”
O STF é mais coerente, neste aspecto, não acatando a tese “Al Capone” acolhida
pelo STJ acima. Veja:
Mesmo sendo orientação amplamente majoritária, não é pacífica, como se pode ver
no caso abaixo, em que o HC foi concedido por empate na votação (sequer sendo um
precedente objetivamente favorável a esta tese minoritária):
“DESCAMINHO. PAGAMENTO. TRIBUTO. ANTERIORIDADE.
OFERECIMENTO. DENÚNCIA.
As pacientes são acusadas de descaminho em razão de suposta compra de roupas
íntimas pelos Correios. A res foi avaliada em oito mil e cinqüenta e seis dólares
americanos e teria sido comprada por uma amiga numa das tradicionais queimas de
estoque das lojas da cidade norte-americana de Miami. Sendo a impetração do
presente writ anterior à aceitação da proposta de suspensão condicional do
processo, não se configura um óbice à analise do mérito pela Sexta Turma. Para o
deslinde da questão jurídica apresentada no presente remédio heróico, é
imprescindível o cotejo analítico de dois tipos penais: sonegação fiscal e
descaminho. A Min. Relatora entendeu que, no caso, pode-se colher de empréstimo
o espírito normativo da Lei n. 10.684/2003, pois dispõe de idêntica raiz exegética.
Tal diploma deixou suficientemente clara a existência de outros tipos penais de
cariz tributário além daqueles presentes na Lei n. 8.137/1990, destacando
pontualmente no CP os crimes previdenciários, prevendo-se também hipótese de
extinção de punibilidade em razão do prévio pagamento do débito. Assim, pode-se
concluir que o crime de descaminho é intrinsecamente tributário, ou seja, tutela-se
o direito que o Estado tem de instituir e cobrar impostos e contribuições. Portanto,
uma vez certificado que o pagamento do tributo foi operado antes do oferecimento
da denúncia, de rigor é reconhecer-se a falta de utilidade e presteza do emprego do
processo penal. Isso posto, ao se prosseguir o julgamento, após o voto-vista do
Min. Hamilton Carvalhido não conhecendo do pedido de habeas corpus, e o voto
do Min. Paulo Gallotti, no mesmo sentido, verificou-se empate na votação.
Prevalecendo a decisão mais favorável às rés, a Turma conheceu do pedido de
habeas corpus e concedeu a ordem. HC 48.805-SP, Rel. Min. Maria Thereza de
Assis Moura, julgado em 26/6/2007.”
crime por sonegação fiscal, isso implicaria falta de justa causa para a ação penal
em relação ao delito do art. 288, do CP; b) ausência do elemento subjetivo para
consumação do crime de quadrilha, consistente na expressão “para o fim de
cometer crimes”, sob o argumento de que o cometimento desse delito não restaria
caracterizado pelo simples fato de os pacientes estarem na gerência de uma
empresa; c) inépcia da peça acusatória, em face de constar da inicial mera
referência ao art. 288, do CP, desprovida de qualquer descrição da conduta
subsumível à figura típica nele descrita ― v. Informativos 355 e 358. Na sessão de
14.9.2004, a Turma recebera embargos de declaração para renovar o julgamento do
writ. Reiniciado em 19.10.2004, o Min. Eros Grau, relator, reiterando os
fundamentos do seu voto proferido em 3.8.2004, indeferiu o habeas corpus, no que
foi acompanhado pelo Min. Carlos Britto. HC 84223/RS, rel. Min. Eros Grau,
14.8.2007. (HC-84223)”
que se lhe imputa a peça acusatória não chegou a lesar o bem jurídico tutelado,
qual seja, a Administração Pública em seu interesse fiscal.
2. Aplicação do princípio da insignificância como causa supralegal de exclusão da
tipicidade. Precedentes do STJ. 3. Habeas corpus concedido.”
Hoje, embora não seja expresso no tipo penal, da Lei 8.137/90, a jurisprudência
mantém a exigência do dolo especifico, especial fim de agir, para configurar a sonegação.
É, portanto, um delito daqueles chamados crimes de tendência. Veja:
Quanto ao dolo eventual, seria possível no crime de sonegação? Reveja o artigo 1º,
IV, da Lei 8.137/90:
Contudo, é posição estranha, pois se precisa de fraude prévia, não há como não
haver dolo direto neste delito.
Assim, embora haja quem admita sonegação com dolo eventual, é mais adequado o
entendimento de que a sonegação exige dolo direto.
5. Consumação e tentativa
Em tese, os crimes do artigo 1º da Lei 8.137/90 são materiais, e como tais somente
se consumam quando verificado o resultado supressão ou redução do tributo. Por outro lado
prevalece que os crimes do artigo 2º são formais, não se exigindo um resultado
naturalístico.
Quanto à tentativa, prevalece o entendimento de que é possível. Contudo, na
doutrina, surgem duas correntes sobre esta suposta tentativa: para Baltazar, Eisele e
Delmanto, majoritariamente, qualquer tentativa de sonegação seria, na verdade, a
consumação da conduta do artigo 2º, I, da lei em tela. Reveja os dispositivos:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Dois famosos advogados impetram habeas corpus para trancar ação penal
ajuizada pelo MPF em face de contribuinte pela sonegação de IPI. Aduzem, na
impetração, o seguinte:1) o réu foi condenado com base no mesmo documento -"nota fiscal
calçada" -por sonegação de ICMS;2) o bem jurídico é a ordem tributária, sendo
irrelevantes os tributos sonegados, logo há bis in idem;3) caso seja possível a condenação
por dois crimes haveria conexão, de molde a que se deva anular a condenação da
instância estadual, uma vez que a competência federal é absoluta (Súmula 122 do STJ). Na
qualidade de relator, decida sobre a concessão ou não da ordem.
Resposta à Questão 2
Questão 3
operações espúrias, tudo com o claro e primordial intento de lesar o Fisco, não havendo,
evidentemente, processo administrativo-tributário, pelo singelo motivo de que foram
utilizadas fraudes para suprimir ou reduzir o recolhimento de tributos, ficando a
autoridade administrativa completamente alheia à ação delituosa, e sem saber sequer que
houve valores sonegados.
Por isso, impetra JOSEFINA um habeas corpus, pedindo o trancamento da ação
penal, por falta de justa causa, qual seja, a inexistência do valor concreto de seu débito
para com a Fazenda.
Responda, fundamentadamente, atendo-se somente ao que tange ao crime contra a
ordem tributária eventualmente cometido, se o writ deve ser deferido.
Resposta à Questão 3
“HC 50933 / RJ. HABEAS CORPUS. Relatora Ministra LAURITA VAZ. Órgão
Julgador - QUINTA TURMA. Data do Julgamento 17/08/2006. Data da
Publicação/Fonte DJ 02/10/2006 p. 294.
Ementa: HABEAS CORPUS. ADVOGADO. OPERAÇÃO "MONTE ÉDEN".
CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO E CONTRA A ORDEM
TRIBUTÁRIA, QUADRILHA, LAVAGEM DE DINHEIRO, SONEGAÇÃO DE
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA, FALSIDADE IDEOLÓGICA, TRÁFICO
DE INFLUÊNCIA. ARGÜIDA INÉPCIA DA DENÚNCIA. IMPROCEDÊNCIA.
1. A extensa inicial acusatória, que conta com 163 laudas, aponta, essencialmente,
para a participação de liderança do ora Paciente em complexa organização
criminosa, desenvolvida por meio do seu escritório de advocacia, cuja finalidade
precípua seria a de promover a chamada "blindagem patrimonial" a diversos
"clientes", o que se fazia por meio de empresas fictícias no exterior, abertas em
nome de "laranjas", para ocultação, proteção e lavagem de dinheiro.
2. A denúncia descreve, suficientemente, as dezenas de ilícitos em tese perpetrados
pelos agentes denunciados, relacionando-os com um vasto conjunto de provas
constituído principalmente de objetos e documentos apreendidos, interceptações
telefônicas, interrogatórios dos réus, depoimentos das testemunhas etc., em perfeita
consonância com às exigências do art. 41 do CPP, permitindo ao Paciente ter clara
ciência das condutas ilícitas que lhe são imputadas, garantindo-se-lhe o livre
exercício do contraditório e da ampla defesa. Não há falar, assim, em inépcia da
peça acusatória.
3. É verdade que este Superior Tribunal de Justiça tem-se pronunciado no sentido
de aderir à recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, reformulada a
partir do julgamento plenário do HC n.º 81.611/DF, relatado pelo ilustre Ministro
Sepúlveda Pertence, para considerar que não há justa causa para a persecução
penal do crime de sonegação fiscal, quando o suposto crédito tributário ainda
pende de lançamento definitivo, sendo este condição objetiva de punibilidade.
4. Não obstante, considerando as peculiaridades concretas do caso, verifica-se que
a hipótese sob exame em muito se diferencia daquelas outras que inspiraram os
referidos precedentes. De fato, uma coisa é desconstituir o tipo penal quando há
discussão administrativa acerca da própria existência do débito fiscal ou do
quantum devido; outra bem diferente é a configuração, em tese que seja, de crime
contra ordem tributária em que é imputada ao agente a utilização de esquema
fraudulento, como, por exemplo, a falsificação de documentos, utilização de
empresas "fantasmas" ou de "laranjas" em operações espúrias, tudo com o claro e
primordial intento de lesar o Fisco. Nesses casos, evidentemente, não haverá
processo administrativo-tributário, pelo singelo motivo de que foram utilizadas
haver, entre dois ou mais fatos de relevância penal, alguma espécie de liame, de
ligação, seja de natureza subjetiva, no campo das intenções, motivações e de dolo,
seja ainda de natureza objetiva, em referência às circunstâncias de fato, como
sejam, o lugar, o tempo e o modo de execução da conduta delituosa. Em uma
palavra, pode haver entre eles conexão, hipóteses concretas de aproximação entre
um e outro evento, a estabelecer entre eles um ponto de afinidade, de contato ou de
influência na respectiva apuração. No caso dos autos, vislumbro, ao menos, a
existência de liame instrumental entre os fatos mencionados, sem prejuízo de
outros fatores de conexão, subjetivos ou objetivos, a serem porventura constatados
a partir da análise detida dos respectivos autos principais. Com efeito, em um
momento inicial verificou-se o envolvimento entre membros do escritório de
advocacia OLIVEIRA NEVES e integrantes da REDE CHEBABE. Com o evoluir
das investigações foram acrescidos novos dados, que justificaram apuração
autônoma e a propositura de denúncia nos autos originários do presente habeas
corpus. Ou em outras palavras: houve uma intensa investigação, frise-se, não foi
uma investigação pontual, em relação ao grupo Chebabe por fatos relacionadas à
adulteração de combustíveis; sendo certo que com o desenrolar chegou-se a notícia
de que havia uma assistência jurídica prestada para a REDE CHEBABE sob a
forma de blindagem patrimonial e, por fim, intensificadas as apurações constatou-
se que a referida patrimonial não se dava só com o Grupo Chebabe, aplicando-se
também ao próprio escritório. Não se ignora que os fatos não são idênticos e
possuem existência material e punibilidade autônomas (o que é da essência da
conexão, afinal fossem as mesmas as condutas sequer poderíamos falar em
conexão), contudo - e daí advém o liame - há entre eles flagrante ponto em
comum, a saber: pouco importando quais sejam os beneficiados, a
operacionalização do esquema de ocultação patrimonial é imputada ao escritório
de advocacia OLIVEIRA NEVES, sob a direção intelectual do paciente. Daí por
que a atividade instrutória encontra-se amalgamada; em suma, a prova de um fato
influencia na demonstração do outro (art. 76, inciso III do Código de Processo
Penal). Assim, entendo que a apuração conjunta dos referidos acontecimentos,
perante o MM. Juízo da 5ª Vara Criminal da Seção Judiciária do Estado do Rio de
Janeiro, permite uma melhor compreensão de suas dinâmicas, bem como evita
decisões contraditórias. Vê-se, portanto, que estando em jogo a tutela imediata dos
processos em curso, de modo a se assegurar um provimento judicial final o mais
acertado possível, a competência firmada em decorrência da conexão pauta-se em
critério absoluto. Acrescente-se que a competência da autoridade impetrada
decorre ainda da prevenção, firmada nos termos do art. 83 do Código de Processo
Penal, haja vista o referido Juízo ter se antecipado licitamente em relação a
qualquer outro igualmente competente, no conhecimento formal e oficial dos fatos
criminosos objeto de apuração, por ocasião do deferimento das cautelares
retromencionadas (Inquérito Policial nº 2005.51.01503930-0 e medidas cautelares
apensadas). Isto posto, consoante fundamentação acima expendida, rejeito a
argüição preliminarmente aduzida pelo impetrante, e declaro a competência
absoluta do MM. Juízo da 5ª Vara Criminal da Seção Judiciária do Estado do Rio
de Janeiro'.Pelo que infere do acórdão atacado, há evidente conexão entre alguns
dos crimes em apuração cometidos, em tese, por integrantes da 'Rede Chebabe' e
pelo escritório de advocacia liderado pelo ora Paciente. Este, segundo as
investigações preliminares, prestava seus serviços de 'blindagem' patrimonial para
proteção de numerário pertencente à dita organização criminosa. No decorrer das
diligências investigatórias, logrou-se identificar outros 'clientes' da atividade
desenvolvida pelo escritório de advocacia, apontando para a necessidade de uma
persecução criminal distinta. Nesse contexto, caracterizado o liame entre os fatos
em apuração, resta evidenciada a conexão, a recomendar a unificação da
investigação e do processamento judicial dos supostos envolvidos nos crimes O
parecer ministerial da lavra do eminente Procurador Regional da República, em
exercício perante esta Corte, Dr. Paulo Gustavo Gonet corrobora esse
Tema VI
Crimes Contra a Ordem Tributária IV Crimes praticados por particulares (artigos 2º da Lei 8.137/1990)
Crimes praticados por funcionários públicos (artigos 3º, 11 e 12 da Lei 8.137/1990). 1. Sujeito ativo; 2.
Sujeito passivo; 3. Tipo penal objetivo; 4. Tipo penal subjetivo; 5. Objeto jurídico; 6. Consumação; 7.
Concurso de crimes; 8. Pena; 9. Ação penal; 10. Extinção da punibilidade; 11. A culpabilidade como
pressuposto da pena; 12. Crime de Bagatela; 13. Princípio da Insignificância; 14. Questões processuais.
Questões controvertidas. Jurisprudência. Doutrina.
Notas de Aula6
6
Aula ministrada pelo professor José Maria de Castro Panoeiro, em 30/3/2010.
Segundo o STF, se o fisco disser que não há tributo, na casuística, não se pode
denunciar por crime de sonegação. Se o fisco disser que há o tributo, porém, é discutível a
sua existência na seara criminal – ou seja, as instâncias só se vinculam quando da suposta
inexistência do tributo. A PGR recusa esta vinculação de mão única, apenas quando o fisco
diz que não há tributo, reputando-a, corretamente, assistemática.
Debalde as criticas tremendamente pertinentes, a questão está hoje solidificada na
jurisprudência, contando até mesmo com súmula vinculante. Veja:
“Súmula vinculante 24: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária,
previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei no 8.137/90, antes do lançamento
definitivo do tributo.”
telefônicas. O Min. Relator destacou que este Superior Tribunal já decidiu ser
ilegal a interceptação telefônica deferida sem a observância dos requisitos
elencados nos incisos do art. 2º da Lei n. 9.296/1996. No caso, o objeto primordial
das investigações era o suposto crime de apropriação indébita previdenciária e
também estaria sendo praticado o delito de sonegação fiscal, fato que também
motivou a quebra do sigilo telefônico dos investigados. Também, este Superior
Tribunal entende que se tem por ilegal qualquer ato investigatório, dentre os quais
a quebra de sigilo telefônico destinada à colheita de provas acerca de crime contra
a ordem tributária, sem que se tenha notícia da constituição definitiva do crédito
tributário tido por sonegado. HC 128.087-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em
27/10/2009.”
Havendo decadência tributária sem prescrição penal, pode haver persecução penal
nos delitos de sonegação? Seguindo a mesma linha, se não vai haver lançamento, porque
decaído o crédito, não terá como existir crime, e por isso não se pode cogitar de persecução
penal. Veja:
“HC 81321 / SP (STF – 1ªTURMA - Min. CEZAR PELUSO - DJ 15-02-2008).
EMENTA: AÇÃO PENAL. Crime tributário, ou crime contra a ordem tributária.
Art. 1º da Lei nº 8.137/90. Delito material. Tributo. Inscrição mediante auto de
infração. Cancelamento por decisão judicial em mandado de segurança. Crédito
não lançado definitivamente. Falta irremediável de elemento normativo do tipo.
Crime que se não tipificou. Trancamento do processo. HC concedido para esse fim.
Precedentes. Não se tipificando crime tributário sem o lançamento fiscal definitivo,
não se justifica pendência de ação penal, quando foi cancelada, por decisão judicial
em mandado de segurança, a inscrição do suposto débito exigido.”
Estes precedentes tem sofrido uma tímida atenuação do seu rigor, pelo STJ: trata-se
da consideração do fenômeno da blindagem patrimonial. O STJ vem entendendo que em
determinadas hipóteses jamais ocorrerá procedimento fiscal – quando a fraude envolve
empresas fantasmas, documentos falsos e outros expedientes que impedem que a Receita
constitua o tributo. Nestes casos, segundo o STJ, seria mitigado o HC 81.611. Veja:
persecução penal persista com relação aos demais tipos imputados ao paciente na
denúncia.”
A verdade, porém, é que a aplicação deste precedente tem sido bastante inconstante,
como se vê na decisão abaixo:
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Nada obsta que prefeito ou qualquer servidor público seja sujeito ativo de crimes
tributários, especificamente o de apropriação indébita (artigo 168-A) ou ainda o artigo 2º,
II, da Lei 8.137/90, posto que em certas condições equipara-se ao particular (diretor
financeiro de Empresa Pública que retém IR de seus funcionários e não repassa ou
contribuições previdenciárias). A mera mudança no destinatário das contribuições não
desnatura a ocorrência do crime. Veja o julgado:
Questão 2
Acusados pela suposta prática dos delitos previstos no art. 297 do CP e no art. 1º,
I, da Lei 8.137/90 pleiteiam em habeas corpus o trancamento de inquérito policial por
falta de justa causa. No caso, durante o curso de ação de execução fiscal ajuizada contra
determinada empresa, o Ministério Público Federal requerera a instauração de inquérito
para apurar a responsabilidade penal dos pacientes, antigos sócios da empresa, em
alteração do contrato social, reputada fraudulenta pelos atuais sócios. A impetração
sustentava a extinção da punibilidade (Lei 10.684/2003, art. 9º, § 2º), dado que, quando da
instalação do referido inquérito, existia parcelamento do débito tributário, o qual já fora
integralmente pago. Pretende, também, o reconhecimento de que o delito tributário teria
absorvido o de falso, porquanto este seria crime-meio para o cometimento daquele, uma
vez que a conduta investigada seria a de prestar falsa declaração, por intermédio de
simulação de venda de pessoa jurídica devedora de tributos, objetivando a supressão da
dívida. Responda, fundamentadamente, se a ordem deve ser concedida.
Resposta à Questão 2
Questão 3
EURICO e ELUF são sócios da Clínica Santa Efigênia em Volta Redonda cabendo
ao primeiro a gerência da sociedade. Em que pese terem sido descontados, entre os meses
de março e novembro de 2007, os valores correspondentes ao Imposto de Renda devido
por seus funcionários, tais valores não foram repassados à Receita Federal. Em 2008, a
Receita Federal dá início a procedimento administrativo fiscal a partir do cruzamento de
dados das declarações anuais de ajuste dos funcionários com os recolhimentos efetuados
pela empresa. Desse procedimento onde, embora regularmente intimados, os sócios
quedaram-se inertes, foi constituído um crédito no valor de R$ 25.000,00. Do montante R$
18.000,00 (dezoito mil reais) correspondiam ao imposto devido - em média de R$ 2000,00
(dois mil reais) por mês - sendo o restante acréscimos legais (multa, juros, ...).Diante
desses fatos o crédito tributário foi definitivamente constituído em 30/11/2008. Foi então
remetida representação fiscal para fins penais ao Ministério Público Federal para a
apuração de eventual crime. O Procurador da República então oferece denúncia em face
de EURICO pelos fatos ocorridos pugnando pela designação de audiência para
apresentação de proposta de suspensão condicional do processo, firme no sentido de que
seria a medida adequada ao caso concreto. Feita a intimação do denunciado este
atravessa petição com os seguintes argumentos:Não pode ser denunciado uma vez que o
sujeito ativo nos crimes tributários é o contribuinte e sua empresa não é a devedora do
Imposto de Renda Pessoa Física, mas seus funcionários. Ainda que tenha cometido algum
delito a hipótese é de crime único e de menor potencial ofensivo e comporta transação
penal. Assim, ausentes antecedentes, não pode o Ministério Público recusar-se à proposta.
Ainda que o magistrado entenda que houve delito, não se pode desconsiderar que se trata
de hipótese de bagatela. É que para fins de insignificância da conduta não se deve
considerar o montante do tributo, mas os valores que isoladamente deixaram de ser
recolhidos. No caso concreto, todos os valores são inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil
reais), o teto da execução fiscal, que é o referencial de insignificância, sendo pois hipótese
de atipicidade. Diante dos fatos apresentados discorra sobre a capitulação jurídica do
fato, a existência ou não de justificativa para o Procurador da República recusar a
transação penal e, por fim, sobre as alegações da defesa, decidindo, na qualidade de Juiz
Federal, a medida que determinaria na condução do processo. RESPOSTA
OBJETIVAMENTE JUSTIFICADA (MÁXIMO: 20 LINHAS)
Resposta à Questão 3
Nada impede, porém, que o MP entenda que o agente não faz jus ao benefício por
razões de mérito, por exemplo, a reiteração das condutas, o que se deu no caso. Restaria ao
Parquet se pronunciar sobre o cabimento ou não da suspensão condicional do processo,
razão pela qual aquele órgão requereu designação de audiência.
No que diz respeito a insignificância, em que pese precedente isolado no STF sobre
o crime de descaminho, que não é crime tributário, mas crime contra a administração onde
tutelada a política econômica do estado possuindo o tributo caráter extrafiscal, no qual se
entendeu pelo patamar de dez mil reais, o STJ tem posicionamento firme no sentido de que
o valor de insignificância é de cem reais, aquele previsto na Lei 10.522/02 para a extinção
dos créditos.
Isto posto, designo a audiência requerida a fim de que o MP apresente a proposta de
suspensão condicional do processo.
Tema VII
Notas de Aula7
1. Crimes previdenciários
7
Aula ministrada pelo professor José Maria de Castro Panoeiro, em 31/3/2010.
pena de um terço até a metade ou aplicar apenas a de multa. (Incluído pela Lei nº
9.983, de 2000)
§ 4º O valor a que se refere o parágrafo anterior será reajustado nas mesmas datas e
nos mesmos índices do reajuste dos benefícios da previdência social. (Incluído pela
Lei nº 9.983, de 2000).”
Este crime possui uma redação próxima do delito do artigo 1º da Lei 8.137/90. Por
isso, a jurisprudência aplica para tal crime a disciplina dos delitos tributários. Isto significa,
por exemplo que para que haja este delito supra é preciso ter havido processo
administrativo fiscal prévio, à similaridade da súmula vinculante 24, já abordada.
O artigo 337-A conta com uma causa especial de extinção da punibilidade, quando o
agente confessa os débitos antes da ação fiscal (como se vê no § 1º). Assemelha-se à
denúncia espontânea, só que mais benéfica, pois sequer é necessário o pagamento para ter
os efeitos, como se impõe na denúncia. Basta a confissão do débito.
Além disso, o CP prevê possibilidade de o juiz aplicar perdão judicial, se o valor das
contribuições é inferior ao mínimo da execução fiscal destas contribuições – o que hoje está
em patamar de dez mil reais.
Esta questão do perdão judicial pode gerar alguma confusão em relação à aplicação
do princípio da insignificância. Em razão deste § 2º, II, supra, surge real confronto entre o
princípio da insignificância e o perdão judicial. Luis Flávio Gomes defende a aplicação do
princípio da insignificância, enquanto Francisco Dias Teixeira e José Paulo Baltazar
entendem que este dispositivo afasta a insignificância.
Quanto à competência para a persecução deste crime, veja o seguinte julgado:
Tudo o mais que se abordou acerca dos crimes tributários, se aplica para estes
crimes, com a só diferença quanto ao objeto material – lá, são tributos, gênero; aqui, apenas
as contribuições previdenciárias.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Veja o julgado:
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema VIII
Notas de Aula8
8
Aula ministrada pelo professor José Maria de Castro Panoeiro, em 31/3/2010.
“HC 68959 / SC. HABEAS CORPUS. Relatora Ministra LAURITA VAZ. Órgão
Julgador - QUINTA TURMA. Data do Julgamento 26/02/2008. Data da
Publicação/Fonte DJe 24/03/2008.
Ementa: HABEAS CORPUS. CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE
CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. FATOS OCORRIDOS ANTES DA LEI
N.º 9.983/2000. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INEXISTÊNCIA. ABOLITIO
CRIMINIS. NÃO OCORRÊNCIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. A Lei n.º 9.983/00, ao acrescentar o artigo 168-A, § 1º, ao Código Penal,
revogando o art. 95 da Lei n.º 8.212/91, manteve a figura típica anterior no seu
aspecto substancial, logo sua aplicação não configura medida mais gravosa ao
agente.
Já se disse que este crime seria uma espécie de prisão por dívida, mas esta assertiva
não procede. Mesmo se não houver fraude, não se trata de prisão por dívida, apesar de
assim parecer, especialmente diante do regime legal de pagamento, que exclui o crime.
Prevalece, no entanto, a orientação no sentido de que este crime não é modalidade de prisão
por dívida. Veja o HC 78.234, do STJ:
O artigo 15 da Lei 8.212/91 estabelecia que os entes públicos poderiam ser autores
deste crime. Veja:
Ocorre que a lei atual, o CP, não faz a restrição que Lei 8.212/91 fazia, no § 3º do
seu artigo 95, supra, e por isso a jurisprudência do STJ se inverteu completamente.
Assim, os agentes políticos não respondiam pela apropriação indébita
previdenciária, a partir de uma interpretação restritiva do § 3º do artigo 95 da Lei 8.212/91.
Ali, a referência era textual ao “titular de empresa”, não podendo ser estendida a órgãos
públicos. Com a nova redação, do CP, não há mais esta restrição, e por isso o STJ admite
que o prefeito pode responder, como se vê no REsp. 770.167:
“REsp 770167 / PE. RECURSO ESPECIAL. Relator Ministro GILSON DIPP.
Órgão Julgador - QUINTA TURMA. Data do Julgamento 17/08/2006. Data da
Publicação/Fonte DJ 11/09/2006 p. 339.
Ementa: CRIMINAL. RESP. PREFEITO MUNICIPAL. APROPRIAÇÃO
INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. CRIME COMUM.
DOLO GENÉRICO. ANIMUS REM SIBI HABENDI. COMPROVAÇÃO
DESNECESSÁRIA. RECURSO PROVIDO.
I. O delito de apropriação indébita de contribuições previdenciárias, em que o
Prefeito foi denunciado não exige qualidade especial do sujeito ativo, podendo ser
cometido por qualquer pessoa, seja ela agente público ou não.
II. A conduta descrita no tipo penal do art. 168-A do Código Penal é centrada no
verbo "deixar de repassar", sendo desnecessária, para a configuração do delito, a
A apropriação indébita é dolosa, mas não exige dolo específico, especial fim de agir
– há o dolo genérico de não repassar, sem exigência de animus rem sibi habendi. Para José
Baltazar, este tipo penal não configura uma modalidade de efetiva apropriação: o crime
traduz uma espécie de não repasse (o que configura favor fiscal para o empresário), e
quando o legislador quis, ele se utilizou da palavra “apropriar”, como no artigo 5º da Lei
7.492/86:
Veja:
Este crime Luis Flávio Gomes classifica como comissivo de conduta mista: é
comissivo no primeiro momento, quando recolhe a contribuição; e é omissivo em segundo
momento, quando não a repassa. Prevalece, porém, o entendimento de que se trata de crime
omissivo puro, em que pese recente decisão do STF falando em crime omissivo material.
Veja:
financeira, uma vez que a retenção do tributo é presumida, e esta dificuldade, que pode de
fato ocorrer, torna inexigível conduta diversa.
O valor do tributo não repassado é relevante para fins de aferir o princípio da
insignificância, neste crime. Veja:
Vê-se que o STF, neste precedente, contradiz-se, eis que nos crimes tributários
entende ser insignificante justamente este patamar de dez mil reais.
Contudo, para extinção da punibilidade, deve ser considerado o valor do principal,
somado aos acessórios – multa e juros de mora – na forma do § 2º deste artigo 168-A do
CP. E somente o pagamento extingue a punibilidade, e não a penhora, como se pode ver na
parte final do HC 41.618, há pouco transcrito – mas a existência de programas de
parcelamento fiscal acaba por esvaziar a aplicação do regime de pagamento, previsto no
CP.
Na Lei 10.684/03, havia uma discussão sobre a possibilidade de parcelamento de
débitos que caracterizavam o artigo 168-A. O STJ entendia que, embora fosse vedado, se o
parcelamento fosse deferido, produzia efeito penal. Com a Lei 11.941/09, acabou a
restrição, sendo expressamente possível o parcelamento de tais débitos.
2. Estelionato previdenciário
“Súmula 24, STJ: Aplica-se ao crime de estelionato, em que figure como vítima
entidade autárquica da Previdência Social, a qualificadora do § 3º, do art. 171 do
Código Penal.”
“Estelionato
Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio,
induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer
outro meio fraudulento:
Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa.
(...)
§ 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de
entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social
ou beneficência.”
É possível alegar-se a inidoneidade da fraude, neste crime, desde que ele não se
consume, por óbvio – pois se consumado, está claro que a fraude foi suficientemente idônea
para não fazer o crime impossível.
Para Damásio, tomando por base o caráter vitalício do benefício previdenciário, o
crime é considerado instantâneo de efeitos permanentes. O STJ tem acolhido esta tese,
mesmo que ainda haja forte corrente, nesta Corte, de que se trata de crime permanente. Para
Damásio, e para o Ministro Marco Aurélio, este estelionato é instantâneo e de efeito
permanente, se consumando no primeiro recebimento, sendo os demais recebimentos o seu
efeito permanente, mero exaurimento.
Luis Flávio Gomes entende, por seu turno, que há concurso formal entre vários
estelionatos, todos unificados por uma única fraude.
Terceira corrente, de Guilherme Nucci, sustenta que o que se passa é um crime
continuado do beneficiário, ou seja, haveria um delito a cada recebimento mensal, mas com
dolo único de aproveitar-se da situação fraudulenta. Este autor faz uma diferença: aquele
que participa, fornecendo algum documento falso necessário para a fraude, comete crime
instantâneo; aquele beneficiário da fraude, comete crime continuado, mensalmente
renovado.
Prevalecia, como dito, a noção de que se trata de crime permanente, pois a
consumação se protrai no tempo: a continuidade da lesão ao bem jurídico, ao erário, está
nas mãos do criminoso, durante todo o tempo em que permanece recebendo. É a posição
mais técnica, mas hoje tem sido oscilante a jurisprudência, havendo julgados no STJ e STF
de que se trata mesmo de crime instantâneo de efeitos permanentes.
Veja o HC 82.965 do STF:
O STJ ainda pende à corrente mais técnica, de que é crime permanente, e não
instantâneo de efeitos permanentes.
Por fim, o servidor que concede o benefício fraudulento também estaria inserto no
crime de estelionato previdenciário, segundo o STJ. É absurda esta posição, pois está
claramente inserto no peculato, mas existe.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
“HC 67262 / RJ. HABEAS CORPUS. Relatora Ministra LAURITA VAZ. Órgão
Julgador - QUINTA TURMA. Data do Julgamento: 18/12/2007. Data da
Publicação/Fonte: DJ 11/02/2008 p. 1.
Ementa: HABEAS CORPUS. FURTO DE ÁGUA POTÁVEL MEDIANTE
FRAUDE. DENÚNCIA. INÉPCIA NÃO VERIFICADA. CRIME SOCIETÁRIO.
INDIVIDUALIZAÇÃO MINUCIOSA DAS CONDUTAS. DESNECESSIDADE.
1. Nos crimes societários é dispensável a descrição minuciosa e individualizada da
conduta de cada acusado, bastando, para tanto, que a exordial narre a conduta
delituosa de forma a possibilitar o exercício da ampla defesa.
2. Adulterado o hidrômetro, a fim de reduzir o valor do consumo de água da
empresa, tudo indica que os Pacientes, por se tratarem de sócios-gerentes, tinham
conhecimento da manobra fraudulenta, havendo indícios razoáveis de autoria para
a deflagração da ação penal. Precedentes desta Corte.
3. Ordem denegada.”
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema IX
Notas de Aula9
9
Aula ministrada pela professora Cláudia das Graças Mattos de Oliveira Barros, em 5/4/2010.
As três primeiras alterações são efetivamente incidentes sobre crimes; nesta última,
se trata de crime de responsabilidade, cuja natureza, na verdade, é de infração não criminal.
Importante consideração inicial, sobre o estudo deste tema, é que a mesma infração,
a mesma conduta, a mesma transgressão a normas traçadas na Lei de Responsabilidade
Fiscal, LC 101/00, pode gerar responsabilização em três esferas – penal, civil, e
administrativa –, cumulativamente, sem representar qualquer bis in idem. Os artigos 1º a 3º
da Lei 1.079/50 demonstram claramente esta independência entre as instâncias:
“Art. 2º Os crimes definidos nesta lei, ainda quando simplesmente tentados, são
passíveis da pena de perda do cargo, com inabilitação, até cinco anos, para o
exercício de qualquer função pública, imposta pelo Senado Federal nos processos
contra o Presidente da República ou Ministros de Estado, contra os Ministros do
Supremo Tribunal Federal ou contra o Procurador Geral da República.”
“Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário
qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial,
desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das
entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio
particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores
integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei;
II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens,
rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades
mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou
regulamentares aplicáveis à espécie;
III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que
de fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio
de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das
formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie;
IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do
patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ainda a
prestação de serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado;
V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por
preço superior ao de mercado;
VI - realizar operação financeira sem observância das normas legais e
regulamentares ou aceitar garantia insuficiente ou inidônea;
VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das
formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;
VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;
IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou
regulamento;
X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz
respeito à conservação do patrimônio público;
O artigo 339 do CP diz que quem der causa à instauração de investigação policial,
de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de
improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente,
comete este crime. Veja a redação atual e a anterior:
“Denunciação caluniosa
Art. 339. Dar causa a instauração de investigação policial ou de processo judicial
contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente:
Art. 339. Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial,
instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade
Veja que a alteração foi para incluir, como objeto material do delito, as instaurações
de processos investigativos administrativos em geral, inquéritos civis ou ações de
improbidade, pois antes o tipo se resumia ao inquérito policial e ao processo judicial. A
redação atual, porém, precisa ser lida em conjunto com o artigo 19 da Lei 8.429/92, Lei de
Improbidade Administrativa:
“Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade contra agente
público ou terceiro beneficiário, quando o autor da denúncia o sabe inocente.
Pena: detenção de seis a dez meses e multa.
Parágrafo único. Além da sanção penal, o denunciante está sujeito a indenizar o
denunciado pelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado.”
prefeito, em concurso de pessoas: ser prefeito é elementar do crime, e por isso, mesmo
sendo circunstância subjetiva, se comunica aos partícipes.
É claro que a responsabilidade penal do prefeito não está adstrita aos crimes do
artigo 1º, supra. Ele pode incidir em qualquer conduta criminosa do CP, ou de leis
extravagantes. O que existe é uma relação de especialidade deste artigo 1º perante a
legislação penal geral, pois se a mesma conduta descrita ali estiver também descrita no CP,
por exemplo, incidirá neste DL 201/67, eis que especial. Ausente a coincidência, cada tipo
o abarca no seu alcance.
Casos Concretos
Questão 1
Responda fundamentadamente:
De quem é a competência para julgar e processar Prefeito Municipal nos seguintes
casos:
a) Crime de responsabilidade fiscal;
b) Infração político-administrativa;
Resposta à Questão 1
a) Os crimes contra finanças públicas cometidos por prefeito são julgados pelo
Tribunal de Justiça do seu respectivo Estado, na forma do artigo 29, X, da
CRFB:
“Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o
interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara
Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta
Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:
(...)
X - julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça; (Renumerado do inciso
VIII, pela Emenda Constitucional nº 1, de 1992)
(...)”
Questão 2
O Prefeito Municipal de Sarará do Alto nos últimos seis meses de seu mandato
corrigiu, através de Lei Municipal, a tabela de salários dos funcionários municipais,
incorporando os percentuais relativos ao Plano Collor e Plano Bresser. Desta forma, a
folha de pagamentos do Município teve acréscimo médio de cerca de 60% (sessenta por
cento). Responda fundamentadamente:
a) Prefeito Municipal agiu em conformidade com a Lei de Responsabilidade
Fiscal?
b) Considerando a hipótese de a Prefeitura ter recursos em caixa suficientes para
honrar o aumento de despesa durante todo o mandato do próximo Prefeito, o atual
Prefeito poderia ordenar o aumento dos salários?
c) Qual o bem jurídico protegido pela vedação imposta pela Lei de
Responsabilidade Fiscal neste caso concreto?
Resposta à Questão 2
Questão 3
Resposta à Questão 3
“Súmula 246, STF: Comprovado não ter havido fraude, não se configura o crime
de emissão de cheque sem fundos.”
b) A capitulação estaria correta no artigo 359-C, mas este crime ainda não estava
em vigor.
Tema X
Notas de Aula10
10
Aula ministrada pela professora Cláudia das Graças Mattos de Oliveira Barros, em 5/4/2010.
Todos estes crimes, do artigo 359-A ao 359-H do CP, são crimes dolosos e próprios,
somente podendo ser praticados por funcionários públicos configurados como ordenadores
de despesas. Ordenador de despesas é aquela pessoa que, em qualquer âmbito da
administração pública, dá destinação ao erário, de acordo com as leis orçamentárias
respectivas.
No entanto, podem terceiros, não funcionários públicos ou não ordenadores de
despesas, incidir nestes crimes, a qualidade de partícipes ou coautores.
Segundo a maioria da doutrina, estes crimes, todos eles, são formais, dispensando
resultado naturalístico para sua consumação. Não é necessário que haja a lesão ao erário, ao
equilíbrio financeiro-orçamentário, para que haja consumação.
A perda do cargo pode ocorrer como efeito da condenação nestes delitos, na forma
do artigo 92, I, do CP, mas não é efeito automático, como o próprio parágrafo deste mesmo
artigo determina:
Se o crime for cometido pelo prefeito, e ao invés de responder por um dos tipos do
CP, por especialidade, se enquadrar no artigo 1º do DL 201/67, aí o efeito da perda do cargo
é, sim, automático, como determina o § 2º do artigo 1º deste DL 201/67, já transcrito. Se o
prefeito responde na forma do CP, por não incidir a especialidade, o efeito não será
automático.
Os princípios da lesividade e insignificância são invocáveis nestes delitos, como
tem admitido as Cortes Superiores. A doutrina critica esta admissibilidade, porque estes
crimes seriam, a rigor, de perigo, e não formais, porque o dolo do agente aqui não é a
obtenção da lesão ao erário: é dolo de periclitar a organização orçamentária, e o resultado é
justamente a causação deste perigo – pelo que jamais haveria perigo insignificante, carente
de lesividade. É crítica sem peso jurisprudencial, porém.
Vejamos os artigos do CP, pontualmente.
Este crime é modelo dos delitos deste capítulo, sendo a este aplicáveis todas as
classificações enunciadas.
No caput, está prevista a operação de crédito que não tem autorização legal para ser
realizada. No parágrafo único, está prevista a operação que tem autorização legal, mas é
efetuada em desacordo com o que foi autorizado, pelo agente.
Este dispositivo é norma penal em branco, porque os elementos estão em normas
alheias ao tipo. No inciso II, o conceito de “dívida consolidada”, por exemplo, que é dado
pelo direito financeiro: é a dívida a ser paga em período superior a doze meses.
O artigo 359-B deve ser lido em confronto com o 359-F do CP:
“Restos a pagar” é aquilo que vai ser pago no exercício financeiro seguinte, ou seja,
é a dívida não paga a te o último dia do ano civil, do exercício financeiro. Para ser possível
deixar restos a pagar, é necessário que a despesa em questão tenha sido empenhada, ou seja,
reservada a cota do orçamento que suportará esta dívida no próximo exercício. O empenho
é um ato administrativo que reserva o valor necessário ao pagamento futuro daquela
despesa – o valor empenhado só poderá ser usado para pagar aquela despesa, e nada mais,
pois será deduzido do montante total do orçamento, na rubrica respectiva, deixando de estar
disponível.
Assim, se ordenar despesa sem empenho do valor, está o administrador arriscando
com a coisa pública, rompendo o equilíbrio orçamentário, e está incidindo no artigo 359-B,
supra.
Já no crime do artigo 359-F do CP, o valor foi inscrito como restos a pagar, mas não
havendo empenho, o ordenador de despesa deveria tê-lo cancelado – o que não fez. Ao
omitir-se, está incidindo neste delito.
Vê-se que os crimes dos artigos 359-B e 359-F do CP são, respectivamente,
comissivos e omissivos, duas faces da mesma moeda, pelo que a prática de um impede
logicamente que o outro, na mesma conduta, possa ser praticado concomitantemente,
dolosamente. Pode acontecer, porém, de o agente praticar a conduta do 359-B
culposamente – o que não é crime – mas, posteriormente, cometer o delito do artigo 359-F
É claro que se os títulos forem regularmente criados, não há crime. Como é formal,
basta que haja a ordem ou autorização para sua colocação irregular no mercado para que
haja o crime, dispensado qualquer prejuizo material.
Não se confundam estes títulos irregulares com títulos falsos: sendo falsos, o crime
é de estelionato.
Casos Concretos
Questão 1
Respostas fundamentadas.
Resposta à Questão 1
a) Sim: a lei de responsabilidade fiscal proíbe esta antecipação, porque tal conduta
inviabilizaria as futuras administrações. Esta vedação se impõe a qualquer
ordenador de despesas.
b) Trata-se de crime comum, do artigo 1º, XXI, do DL 201/67, e a tentativa é
possível, se o recurso não chega a ser captado – é crime material. O elemento
subjetivo deste tipo é o dolo de captar o recurso antecipadamente.
Questão 2
Resposta à Questão 2
“Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou
deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente
concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou
inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.”
Questão 3
Resposta à Questão 3
“Apn 389 / ES. AÇÃO PENAL. Relator Ministro NILSON NAVES. Órgão
Julgador - CORTE ESPECIAL. Data do Julgamento 15/03/2006. Data da
Publicação/Fonte DJ 21/08/2006.
Ementa: Ação penal originária. Ordenação de despesa não autorizada por lei.
Princípio da irretroatividade (aplicação). Art. 359-D do Cód. Penal (norma penal
em branco). Norma integradora (falta). Crime (não-ocorrência). Denúncia
(rejeição).
1. A lei penal incriminadora não tem efeito retroativo. Assim, porque, à data da
prática dos atos por um dos acusados, não existia lei que tipificasse sua conduta
como crime, nem deveria ter sido oferecida denúncia em relação a ele.
2. O art. 359-D, segundo o qual é crime "ordenar despesa não autorizada por lei",
consiste em norma penal em branco, uma vez que o rol das despesas permitidas e
das não-autorizadas haverá de constar de outros textos legais, entre os quais, por
exemplo, o da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar n° 101/00).
3. Se, na peça acusatória, inexiste referência à norma integradora, falha é a
denúncia.
4. Ademais, quando devidamente explicável a despesa, deslegitima-se a
possibilidade de punição da conduta ao menos no âmbito penal. A inexistência de
autorização de despesa em lei constitui, tão-somente, indício de irregularidade.
Para se criminalizar a conduta, é necessária a existência de lesão não-justificada ao
bem jurídico, isto é, às finanças públicas, o que, no caso, não ocorreu. O fato
narrado evidentemente não constitui crime.
5. Denúncia rejeitada.”