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Nesse contexto, entende-se que a relação entre academia e escola é de que o saber escolar
recebe os conteúdos produzidos pelo saber acadêmico e os ajusta para o nível de crianças e
jovens. Considerando o ensino de história de suma importância para o indivíduo sair do senso
comum e desenvolver um pensamento crítico, foram analisados dois livros didáticos e uma
apostila.
O primeiro livro analisado foi História, Sociedade e Cidadania (BOULOS, 2009), atendendo
aos alunos de sexto ano do ensino fundamental da rede pública. O livro se estrutura de forma
simples, com dois capítulos, totalizando 20 páginas dedicadas ao ensino de Grécia Antiga. Este,
consta sempre uma sinóptica introdução em cada um dos capítulos. O livro possui uma
linguagem básica, que facilita a interação aluno-texto.
De mesma maneira que o supracitado, o segundo livro utilizado História para o Ensino Médio
(VICENTINO, 2007), também é estruturado em 2 capítulos, porém conta com 17 páginas.
Voltado a alunos de terceiro ano da rede pública, o livro não apresenta tópicos em excesso,
dando espaço para textos longos. Apresenta uma linguagem mais próxima a seu público alvo.
Dessa forma, elencou-se nove tópicos considerados relevantes no ensino de Grécia Antiga
nesses livros. Além disso, se faz presente também uma comparação dos livros com textos
acadêmicos. Foram utilizados os livros Grécia e Roma de Pedro Paulo Funari; Grécia
Primitiva: Idade do Bronze e Idade Arcaica de Moses Finley e A Grécia Arcaica de Homero a
Ésquilo de Claude Mossé. Estes, conduziram o trabalho a um contraste de ideias entre o que
é apresentado aos alunos de fundamental e médio (público e privado) e o voltado na sua
maioridade ao público de ensino superior.
Portanto, o presente trabalho teve por objetivo analisar os livros e apostila citados tendo por
ideal entender e a apontar as diferenças entre eles e como elas influenciam no ensino de história
antiga nas escolas. Procurou-se entender o diálogo que ocorre entre academia e escola, e até
que ponto ela recebe o conhecimento da academia e de que forma ajusta ao nível direcionado
e não apenas o suprime.
Fontes
Partindo-se do pressuposto de que o livro de ensino fundamental possui uma base mais
introdutória da história antiga, por ser direcionado a alunos de sexto ano, utiliza-se recursos
como imagens, fábulas e ilustrações. Como resultado, o mecanismo visual permite ao aluno
maior visibilidade e discernimento do texto apresentado, como também a quebra de um ritmo
cansativo de leitura. Porém, no que se refere ao estudo das fontes no livro, mesmo trazendo-as
em imagens junto aos textos, não agregam de forma significativa o texto,
A exemplo disso, (BOULOS JUNIOR, 2009) destaca em lugares extras ao texto principal
a existência dos poemas Illíada e Odisséia como responsáveis por grande parte do que se
conhece sobre gregos entre os séculos XII e VIII a.C. Porém, apenas com um objetivo de narrar
a história, sem desenvolver o conhecimento sobre os gregos que os poemas trazem. Dessa
forma, há uma abordagem apenas ilustrativa e limitada, perdendo a oportunidade de evidenciar
aos alunos a importância e o potencial de documentos encontrados para a formação de
conhecimento sobre a antiguidade.
históricos que antecederam a sua produção, as metodologias adotadas para a suas intepretações
e problematizações em cima de quem as transcreveu.
Assim sendo, conclui-se uma maior preocupação do material voltado a ensino fundamental
e médio na repassagem do conteúdo em si produzido, diferentemente dos textos acadêmicos,
que demonstram maior amplitude de conteúdo em relação as fontes.
Periodização
É interessante salientar que ambos os livros de terceiro ano indicam as divisões da história
grega. Entretanto, nenhum dos dois desenvolve o conteúdo a partir das divisões e sim, por
importância que o tópico abordado tem atualmente. Dessa forma, a introdução do estudo de
Grécia nestes dois livros inicia com temáticas como política e economia.
Ademais, em referência ao livro Grécia e Roma de Pedro Paulo Funari “há também, no
final do livro, uma cronologia, que poderá ser bastante útil aos leitores em seus estudos. Este
livro é, assim um convite a repensar as civilizações grega e romana” (FUNARI, 2001, p.12).
Portanto, as divisões não sendo amplamente citadas no decorrer do livro, o uso de linhas do
tempo para melhor entendimento da cronologia grega é presente também, em textos voltados
ao público acadêmico.
Além disso, outro aspecto muito importante analisado foi o emprego de termos para
caracterizar relações entre indivíduos, sistemas desenvolvidos por eles à luz de valores que
pertencem a outra época. (SOUSA, FERREIRA, 2017) destaca que o desenvolvimento do
comércio marítimo na Grécia, provocou o surgimento de classes sociais, entretanto
periodizações. Enquanto o livro para alunos do fundamental traz poucos detalhes sobre estas
divisões, há uma maior preocupação nos livros de terceiro ano no informe das mesmas.
Ilhas
A Grécia Antiga localizava-se no sudeste da Europa e era composta por três áreas distintas:
uma parte formada por ilhas no Mar Egeu, outra ligada à Europa Balcânica e outra dentro do
próprio continente europeu. No que concerne as ilhas,
As ilhas e qualquer importância que possam ter exercido, não são citadas de maneira
relevante em nenhum deles. (SOUSA, FERREIRA, 2017) trata a ilha de Creta como detentora
e pioneira no desenvolvimento de uma economia baseada no uso da cerâmica e da metalurgia.
Contudo,
A passo que você expõe esta ideia ao aluno, é necessário também informar referência de
tempo e espaço a qual ocorreu. A noção histórica e os demais conceitos de tempo, por exigir
um grau maior de abstração, e por ser necessariamente já trabalhadas com pré-adolescentes,
deve ser muito mais cuidadosamente elaborada para permitir sua assimilação, mas partindo
sempre da concepção concreta de tempo que o educando tem como premissa para as
extrapolações posteriores (ZAMBONI, 1984).
Atenas e Esparta
(FUNARI, 2001, p.27) em uma breve introdução sobre a cidades gregas, menciona Esparta
e Atenas como as mais conhecidas e de diferentes organizações políticas. Indubitavelmente, os
textos voltados a público escolar focam na abordagem destas cidades-estado e suas
peculiaridades. Sendo assim, entende-se que por terem essa exclusividade no estudo de Grécia
Antiga passam a ideia de superioridade as outras.
É importante salientar que esta é uma conclusão equivocada. Atenas e Esparta foram sim,
importantes no desenvolvimento de vários aspectos culturais, porém correspondiam as
necessidades da época. Estas, retomando Funari se apresentam como as mais conhecidas e não
como principais.
Cultura
Considerando a cultura grega como grande desenvolvedora de áreas como filosofia, artes
plásticas, arquitetura e teatro, entende-se a dedicação dos livros didáticos na abordagem destas
questões. Os três materiais analisados fornecem a maior parte de suas páginas do ensino de
Grécia, a sua cultura. Provavelmente, por serem questões de maior facilidade de aproximação
a realidade do aluno.
A cultura grega no livro do ensino fundamental possui páginas direcionas somente para os
jogos olímpicos. No intuito de se aproximar os jogos atuais são feitas muitas comparações entre
pinturas da época e fotografias de atletas atuais praticando esportes que, na visão do autor,
seriam semelhantes. Os deuses também são trazidos em suas representações de estátuas, e a
sua forma de cultuar a religião e crenças são bem apresentadas.
Outro aspecto da cultura que tem grande atenção do autor é a criação do teatro. As
esculturas e artes gregas são citadas minimamente, mostrando que o objetivo do autor ao falar
de cultura é demonstrar sua influência até a atualidade. Também há proposta de atividades aos
alunos, [...] "Assim, como na Grécia antiga, no Brasil atual também há busca pelo corpo
atlético, bonito e saudável. Mas, ao mesmo tempo, pesquisas recentes indicam que 30% das
crianças estão acima do peso e entre 10% e 15% são obesas. Porque será que isso vem
acontecendo?" (BOULOS, 2009, p. 32)
Dessa forma, o recuso utilizado pelo autor é citar uma ideia desacertada sobre os gregos,
nessa busca pela aproximação aos temas atuais. Nesta análise, levanta-se a questão de até que
ponto essa aproximação que o autor procura fazer contribui para o pensamento crítico do aluno
e não só, o leva a conclusões erradas.
O livro Grécia e Roma de Pedro Paulo Funari aborda tópicos como A vida na Grécia
Antiga, como também, vida privada, sexualidade na antiguidade, religião, mitos e arte grega.
Apesar de ser um livro bem didático, com uma linguagem acessível, Funari não tenta
exorbitantemente a aproximação dos elementos culturais antigos com atuais. Nesse contexto
os tópicos citados são apresentados de forma concisa, possibilitando o leitor a compreensão
dos elementos da cultura antiga.
Posição da mulher
A história das mulheres vem ganhando visibilidade nos temas atuais, refletindo no
ensino dos livros didáticos. Porém, se trata de uma abordagem relativamente recente.
Primeiramente, a posição da mulher nos livros analisados é rasa e pouco acrescenta no estudo
do aluno. Em geral, há uma breve explicação da sua função na sociedade (não excedendo os
deveres de esposa e mãe) logo dando espaço apenas o entendimento de que não eram
consideradas cidadãs.
Em detrimento aos livros didáticos, Pedro Paulo Funari aborda uma quantidade de
informações muito mais enriquecedoras sobre a posição das mulheres na Grécia.
Filosofia
A filosofia enquanto disciplina é recente e ficou longe dos componentes escolares por
muito tempo. Portanto, os livros didáticos ainda não apresentam certo padrão ou adequação no
ensino de filosofia grega. A filosofia no livro do ensino fundamental é apresentada de forma
breve, com questões de lógica para falar de Aristóteles e questões de autoconhecimento para
falar de Sócrates, da mesma maneira que o de ensino médio público.
A apostila não traz elementos da filosofia no conteúdo. O sistema Ari de Sá de ensino conta
com um livro a parte sobre a explicação da filosofia e todos os aspectos relacionados a Grécia,
logo, não se faz necessário a abordagem também na apostila. Textos de cunho acadêmico,
Levantam-se questões de como nasceu essa ciência, como era o pensamento dos filósofos,
como separam razão, religião e mitologia, cita alegoria da caverna e amor platônico de Platão,
usa poesias de Aristóteles, constituindo-se um livro excelente na explicação da filosofia.
Considerações finais
Pelo exposto, infere-se que em vários aspectos os livros didáticos analisados deixam a
desejar no ensino da Grécia Antiga. Questões como especificidade da leitura, o público que é
direcionado, a metodologia e bases teóricas que o autor utiliza e maneira como o professor
conduz a aula utilizando esse material como fonte para o estudo da história, refletem de forma
direta em como o aluno recebe esta informação.
Dessa forma, nota-se o papel fundamental do professor para estimular a problematização e
estimulação do pensamento crítico do aluno dentro da sala de aula. Há maior necessidade de
diálogo entre academia e escola, para que os livros didáticos não sejam apenas instrumentos de
memorização, mas levar a compreensão do assunto tratado.
REFERÊNCIAS BILIOGRÁFICAS
ZAMBONI, ERNESTA. Desenvolvimento das noções de tempo e espaço na criança. In:
Cadernos CEDES, nº. 10.São Paulo: Cortez Editora, 1984.
SALLES, André Mendes. O livro didático como objeto e fonte de pesquisa histórica e
ducacional. Revista Semina (UPF). Passo Fundo/RS, v.10, 2011.
SOUSA, Carlos David Costa; VALE, Isac Ferreira do. Energia Pré-Universitário. Fortaleza:
Sistema Ari de Sá, 2017.
VICENTINO, Claúdio; DORIGO, Gianpaolo. História para o Ensino Médio. São Paulo:
Scipione, 2007.
BOULOS JUNIOR, Alfredo. História, Sociedade e Cidadania. São Paulo: Ftd, 2009
FUNARI, Pedro Paulo. Grécia e Roma. 5. ed. São Paulo: Contexto, 2001.
FINLEY, Moses. Grécia Primitiva: Idade do Bronze e Idade Arcaica. São Paulo: Livraria
Martins Fontes, 1990. Tradução de Wilson Vaccari.
MOSSE, Claude. A Grécia Arcaica de Homero a Ésquilo. 70. ed. Lisboa: Du Seuil, 1984.
Tradução de Emanuel Lourenço Godinho.