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totalmente que, se as mulheres soubessem Os livros, como tecnologia, escapam ao
como se comportar, haveria menos estupros impresso. [... ] A poesia escapa ao impresso,
(Gabriela Rohrbacker Medeiros Longo; Ka- como sempre, já que ela circula oralmente e
ren Wellen da Silva Beltrame; Maria Regina de outros modos, mesmo em tempos de he-
Momesso; Sandra SsuYung Chen). gemonia do papel. Alguma forma de poesia
A relação teórico-metodológica entre as ocupou, além do papel, os CDs, os pendrives,
comunidades de leitores e as suas práticas os ambientes web. Ocorre que algumas ou-
letradas, também, constituiu-se em questão A ecologia da mídias associa de forma tanto complexa quanto Fabiane Verardi Burlamaque tras formas de poesia não cabem no papel
primordial para entendermos que as cultu- ou ficam desconfortáveis lá, daí serem cria-
ras juvenis devem ser trazidas para a sala de
transformadora as tecnologias de informação e comunicação (TICs) a Miguel Rettenmaier (Orgs.) das para o áudio, para o vídeo, para a web ou
toda e qualquer forma de expressão e de manutenção de protocolos,
aula e integradas a recursos metodológicos para instalações de museus (Ana Elisa Ribei-
digitais e impressos variados, pois, dentro
desse contexto, os jovens apropriam-se e
valores e práticas das distintas e variáveis comunidades culturais. A
nova ecologia viabilizada pelas TICs incorpora uma nova forma de vi-
Novas leituras ro e Carla Viana Coscarelli).
O alcance imenso que possuem as redes
produzem sentidos por meio de atividades
de que participam, ativa e dialogicamente,
ver, em ambientes expandidos, em relações ubíquas, desestabilizan- do mundo sociais, em comparação aos blogues profis-
sionais ou aos sítios especializados em que
tes de noções precisas de tempo e de espaço. Na sociedade mediatiza-
como autores, comentaristas, consumidores, os sujeitos escrevem seus trabalhos, não pas-
críticos, espectadores, leitores, revisores, tra- da e midiatizada, novas questões surgem, novas articulações se fazem sa despercebido. Muitas vezes observamos
dutores etc. (Diógenes Buenos Aires de Car- promessa e hipótese, já que o próprio presente se projeta para o futu- que quando uma das pessoas analisadas
valho, Priscila da Conceição Viégas). ro. A mediação, nessa sociedade, conduz à pluralidade de signos, de publicava uma resenha de livro, texto críti-
co etc., compartilhava-os prontamente nas
Novas leituras
do mundo
A literatura na ecologia
das mídias
Apoio
© 2016 dos autores
Cultura Acadêmica
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www.culturaacademica.com.br
feu@editora.unesp.br
B974n
Formato: ebook
Requisitos do sistema:
Modo de acesso: world wide web
ISBN: 978-85-7983-837-8 (recurso eletrônico)
Apresentação.......................................................................................7
Fabiane Verardi Burlamaque, Miguel Rettenmaier
4 A Skoob (books ao contrário) é uma rede social colaborativa brasileira para lei-
tores, lançada em janeiro de 2009 pelo desenvolvedor Lindenberg Moreira. Por
envolver um grupo de pessoas interconectadas no ciberespaço, com interesses
comuns – a leitura –, assume características de comunidade virtual. Através
de cadastro, é possível listar o que os leitores estão lendo, o que já leram, o
que pretendem ler, o que estão relendo e quais leituras foram abandonadas,
formando assim uma “estante” virtual. A Skoob permite acompanhar lança-
mentos, participar de promoções, recomendar e trocar livros, formar grupos
de discussão sobre autores e obras, postar comentários sobre o que é lido, entre
outras inúmeras ações desencadeadas pelas possibilidades de interação ofere-
cidas aos leitores conectados em rede. A Skoob já disponibilizou aos usuários
um aplicativo para smartphones, tem hoje mais de 2 milhões e 300 mil usuários
e mais de 80 milhões de livros cadastrados.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 17
Numa rápida lida dos posts dos leitores, percebemos que mui-
tos dos comentários repisam interpretações canônicas da obra ma-
chadiana, reproduzindo aspectos similares à crítica acadêmica. Essa
observação preliminar conduz à hipótese de que a existência de uma
comunidade de leitores, reunida em uma plataforma digital, não de-
termina necessariamente mudanças nos modos de ler os textos lite-
rários, pois é afetada pelo tipo de apreciação das obras no contexto
escolar ou acadêmico onde ela é difundida. Assim, cabe avaliar os
possíveis efeitos dessa doxa sobre os parâmetros utilizados pelos lei-
tores para opinar sobre os romances machadianos, observando-se
possíveis homologias entre as resenhas dos leitores e a crítica macha-
diana produzida em contexto acadêmico. Segundo Pierre Bourdieu
(2013), a concepção escolar sobre o cânone é significativa para a re-
produção dos padrões de gosto, embora devamos evitar determinis-
mos, pois é complexa a trama de condições que formam o gosto de
cada um, e não se pode afirmar que, sob as mesmas condições, um
grupo de pessoas desenvolverá as mesmas preferências. A identifi-
cação de homologias entre a opinião dos leitores e os parâmetros de
leitura da crítica acadêmica vale aqui como hipótese exploratória da
recepção contemporânea do mais canônico dos escritores brasileiros,
tomada sob a influência de um padrão social de gosto e valor.
Para fazermos essa análise, é preciso contrastar as resenhas dos
leitores com estudos críticos especializados sobre Machado de As-
sis, considerados referências balizadoras da recepção do autor, con-
forme explicitamos na seção a seguir, sobre a constituição do corpus
e a metodologia de análise, a partir da ferramenta Iramuteq. Desse
modo, esperamos contrastar dois espaços e duas comunidades de
leitores, estudando o fenômeno da leitura a partir do lugar onde ela
se manifesta: de um lado, o espaço virtual da comunidade de leito-
res denominada Skoob, a partir de manifestações que acontecem na
forma de “resenhas” (as postagens críticas dos leitores da comuni-
dade); de outro, o espaço da crítica acadêmica, materializada na for-
ma de livros, publicados por editoras reconhecidas e assinados por
expoentes da crítica literária brasileira, presentes nos programas de
disciplinas ensinadas na universidade.
20 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
6 Antes de ser importado pelo Iramuteq, um corpus textual deve ser submetido
a alguns procedimentos de codificação, explicitados no Tutorial, a fim de que
esse software proceda à análise, sem que resulte em erro.
24 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
Por estar morto, Brás Cubas não está mais atado às con-
venções e hipocrisias da sociedade e, assim, pode falar sobre si
mesmo e sobre os outros com a isenção de quem nada mais tem
a perder.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 27
Referências bibliográficas
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pleta. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v. III.
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ponível em: <http://www.iramuteq.org/documentation/fichiers/
tutoriel-en-portugais>. Acesso em: 9 dez. 2015.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 43
pressar, gente que tem ideia sobre tudo, que são superorgulhosos
com as próprias opiniões” (CARVALHO, [201-]). É através desse
retrato que ele faz uma crítica à reprodução indiscriminada da in-
dústria da informação, desenhada pela personagem – um sabe-tudo
que sempre tem algo a dizer sobre qualquer coisa.
Esse sujeito em questão é um brasileiro, estudante de chinês de-
tido pela Polícia Federal durante procedimentos de embarque para
Pequim, cuja voz é colocada em perspectiva. O romance se estrutu-
ra de maneira semelhante a um falso diálogo, uma conversa em que
a voz de um dos interlocutores é omitida – isto é, acompanhamos
sempre somente um ponto de vista, não sabemos ao certo o que “o
outro” diz, e não sabemos nem se, de fato, alguém diz algo. As inú-
meras interrupções de uma voz onisciente, que tece comentários ao
longo do texto, sobre a posição e a percepção do estudante de chi-
nês, são outra característica constante no emaranhado de vozes que
permeiam o romance, ou seja, além de apresentar um protagonista
cheio de convicções, oriundas das mais questionáveis fontes e pla-
taformas online, propaga-se, também, ao longo do enredo, a voz de
um narrador intrometido e sabe-tudo, que parafraseia, a seu modo,
a fala dos outros, como um ventríloquo. Somos colocados, assim,
em desconfiança frente à história, fazendo com que reconheçamos
o estudante como um sujeito paranoico – paranoico e com déficit de
atenção, já que as mudanças de assunto e a fragmentação do discur-
so colaboram para a construção de uma narrativa polifônica incoe-
rente, típica do ciberespaço, entre pessoas que deslizam, copiam e
colam, arremedam, imitam, sempre à superfície.
Hoje, não há um setor da vida humana que não esteja mediado
e permeado por tecnologias digitais. Com uma perspectiva a par-
tir do que Santaella (2013) propõe, de que as práticas realizadas no
ciberespaço têm influenciado as formas de produção e recepção de
textos, compreendemos que pensamentos e modos de dizer hodier-
nos são afetados pelas tecnologias. Dentre as evidências sobre as
interposições das modalidades de escrita típicas da cultura digital
em formas culturais, relacionamos aqui os estudos vinculados ao
projeto Vozes da Cultura Contemporânea: ficção em primeira pessoa,
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 47
coordenado pela Profª Dr. Ana Cláudia Munari, que tem por obje-
tivo refletir sobre mentalidades e tendências da ficção atual, centra-
lizando a atenção no narrador.
Os interesses deste projeto partiram da percepção da tendên-
cia da escrita em primeira pessoa em narrativas contemporâneas.
Observamos, assim, a influência das novas tecnologias de comu-
nicação em práticas culturais (neste caso, a ficção literária) e bus-
camos perceber a convergência de linguagens e modos de dizer de
sujeitos, vozes e culturas, que se imiscuem na escritura romanesca,
principalmente na elaboração dos narradores, que se mesclam entre
o protagonismo – como personagens –, a escritura – na consciência
sobre o ato da escrita – e a própria autoria – através do uso de bio-
grafemas, caso da autoficcção. Corroboramos, assim, a ideia de que
também o gênero romance tem sofrido influência das modalidades
de expressão típicas da cultura digital – a escrita em primeira pes-
soa em blogues e redes sociais e outras formas de comunicação que
permitem o debate e o compartilhamento de conteúdos produzidos
a partir de um “eu” (a selfie, por exemplo).
Percebemos que o gênero mostrou-se empático à influência de
novas mentalidades na escrita, assim como o escritor e mesmo o lei-
tor, cujas práticas de hiperleitura alteram sua navegação pelo papel.
O próprio autor de Reprodução discute sobre sua escolha de escre-
ver em primeira pessoa: “acho que criei uma espécie de camada, um
filtro que mostra que tenho um entendimento daquela realidade,
um entendimento mais mediado, não imediato” (CARVALHO,
[201-]). E é sobre isto, a narração e o discurso típicos da era da con-
vergência, que abordaremos neste trabalho.
que acabam por não ser elucidados nas próprias obras. A literatura
do autor acaba por acentuar o lado ficcional da vida ao criar ten-
sões entre “índices de realidade no limite da representação e as ver-
sões narrativas produzidas ao longo da investigação do narrador”
(Schøllhammer, 2009, p.130).
Mais um, menos um, pra mim tanto faz. Mas vou dar minha
opinião assim mesmo. É meu direito de cidadão. Estamos numa
democracia. (2013, p.33).
uma sala sem janelas” (2013, p.74, grifo nosso). Neste instante, o
protagonista, o narrador e o leitor compartilham o mesmo ponto de
vista, obrigando-se a imaginar o que estaria acontecendo do outro
lado da parede através das indicações do protagonista. No entanto,
aquilo que chega ao leitor é ainda mediado pelo narrador, que está
junto do estudante que ouve o diálogo da sala ao lado. Embora haja
uma representação direta da conversa que acontece do outro lado
da parede, o protagonista somente consegue escutar um dos inter-
locutores. Esse interlocutor, por sua vez, às vezes repete o que lhe
foi dito, ou seja, também faz uma mediação. Aquilo que chega ao
leitor, portanto, é parcial e uma reprodução, às vezes duplicada. A
fim de concretizar os diálogos, apresentados de maneira fracionada,
em todo coerente, todos sentem necessidade de reproduzir a cena.
Considerações finais
Bernardo Carvalho, autor de dez romances e já agraciado com
os prêmios Portugal Telecom e Jabuti, é paradigmático como repre-
sentante de algumas das tendências da literatura contemporânea. A
análise da escritura de Reprodução leva-nos, sobretudo, a uma das
mais pertinentes, que está no uso da forma como conteúdo signi-
ficativo e que, ao representar a própria questão da narração, evoca
a metaficção. Nesse mesmo sentido, a escritura traz à tona esse es-
critor irônico, que, como um articulador do jogo, somente pode ser
percebido nas entrelinhas com a participação do leitor, que desven-
da os sentidos da forma.
Reprodução, assim, reproduz a realidade de seu contexto de pro-
dução, através da figuração de uma personagem que representa o
sujeito contemporâneo em um de seus aspectos mais característi-
cos. A reprodução também está na ação e no discurso desse pro-
tagonista, que age não por convicção, mas pelo impulso de seguir
uma conduta que advém da massificação dos comportamentos. A
narrativa pela qual ele conduz o leitor é produto de seu ponto de
vista parcial, de fragmentos que se misturam ao discurso das outras
personagens e do narrador. Nessa confusão de vozes, não sabemos
quem repete o quê – se há paráfrases, citações, cortes, ou mesmo
um ventriloquismo, ventriloquismo este que nos coloca novamente
nas mãos do autor, então manipulando os bonecos que reproduzem
sua voz. Por fim, há a personagem, a chinesa, que, embora fale a
língua do futuro e possa vir a ser uma excelente turista, acaba por
reproduzir o próprio padrão do qual deseja se afastar. A obra, nesse
sentido, nos diz que não há como escapar da realidade – somos re-
sultado de reproduções.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 65
Referências bibliográficas
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FRIEDMAN, Norman. O ponto de vista na ficção. Trad. Fábio Fonseca
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Disponível em: <http://www.usp.br/revistausp/53/15-norman-2.
pdf>. Acesso em: 15 dez. 2015.
66 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
Estes livros na verdade foram escritos para serem lidos em papel, seja
de jornal ou de livro, o que interfere sobremaneira na sua composição
(linearidade, organização, composição gráfica). Assim, é natural que
muitas pessoas digam que ler na tela de um computador (ou mesmo
de um tablet) é incomparavelmente pior do que ler em um livro im-
presso. Por este motivo os chamamos de livros digitalizados.
Chamar de livro digital uma versão em PDF de um romance
concebido para ser impresso seria como chamarmos de cinema um
teatro filmado. Sabemos bem que cinema não é o teatro filmado,
tem outra lógica, outra linguagem, outra estética, outras possibili-
dades e limitações. Exatamente por isso, há mais de cem anos cine-
ma e teatro convivem, sem o cinema ter acabado com o teatro, como
muitos acreditavam.
A literatura digital, portanto, é aquela nascida no meio digital,
um objeto digital de primeira geração criado pelo uso de um com-
putador e (geralmente) lido em uma tela. Uma comissão da Ele-
tronic Literature Organization (ELO) define-a, em poucas linhas,
como “obra com um aspecto literário importante que aproveita as
capacidades e contextos fornecidos por um computador indepen-
dente ou em rede”.7
Para Katherine Hayles, coordenadora da ELO, como a literatu-
ra digital é normalmente criada e executada em um contexto de rede
e meios de comunicação digital programáveis,
11
Disponível em <http://www.samirmesquita.com.br/doispalitos.html>.
Acesso em: 14 ago. 2016.
12
Disponível em <http://www.mauropaz.com.br/desfocado/menu.swf>.
Acesso em: 10 jan. 2010.
76 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
13
Disponível em: <http://www.hiperconto.com.br/estudoemvermelho/>.
Acesso em: 14 ago. 2016.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 77
Considerações finais
Naturalmente, o lançamento do Movimento Literatura Digital
sem badalação da mídia, sem qualquer tipo de apoio governamen-
tal, sem estar vinculado a nenhuma entidade ou instituição formal
e feito por um grupo de escritores desconhecidos do sul do país im-
pede que ele se propague na velocidade que gostaríamos – e talvez
até mesmo que a iniciativa merecesse. Professores de literatura e
língua portuguesa continuam levando seus alunos para o laborató-
rio de informática para baixar PDFs de obras clássicas no Domí-
nio Público, escritores continuam jogando milhares e milhares de
textos na Amazon depois de constatar a dificuldade de publicar em
papel, autoridades continuam criticando as novas tecnologias por
não incentivar a leitura e o setor livreiro ainda pressiona o governo
para que compre mais e mais livros para as bibliotecas.
Ainda assim, sabíamos que aos poucos o termo “literatura di-
gital” geraria buscas espontâneas no Google, que aos poucos o site
do Movimento e os sites dos nossos próprios projetos atrairiam a
atenção de professores, pesquisadores e de livros didáticos, e assim
já sentimos uma sensível melhora no número de acessos ao ende-
reço <literaturadigital.com.br> e de pedidos de informação para
entrevistas ou trabalhos acadêmicos. Segundo dados do Google
Analytics, por exemplo, o site saltou de uma média de 683 acessos
84 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
mensais nos primeiros seis meses de 2013 para 1.229 acessos men-
sais nos primeiros seis meses de 2016.
Já no que tange à produção e catalogação de obras, temos pou-
quíssimas novidades e nenhuma produção própria do grupo depois
do primeiro ano. Os motivos são vários, da falta de um modelo de
negócios que remunere os criadores à dificuldade de divulgação
para públicos maiores, mas não nos cabe aqui aprofundar essas
questões. Ainda assim, podemos destacar alguns autores que es-
pontaneamente entraram em contato para que catalogássemos suas
obras, como Leilah Lin, Bruna Paiva, Marcos Cecilio, Rodrigo Al-
ves e Roberto Tostes.20
Por fim, peço escusas mais uma vez por este texto talvez pouco
acadêmico. O objetivo principal na verdade foi documentar o que
fizemos até aqui; fazer um chamado para aqueles que produzem li-
teratura digital enviarem seus trabalhos para nosso catálogo; incen-
tivar autores, designers e programadores a pensar em novas formas
de produzir literatura; e pedir que pesquisadores, estudantes e pro-
fessores enviem para nós seus artigos e projetos de literatura digi-
tal que porventura tenham encontrado e não estejam ainda por nós
catalogados. Mais do que uma iniciativa individual, o Movimento
Literatura Digital em particular, e a literatura digital em geral, são
uma construção necessariamente colaborativa. E assim, temos cer-
teza, contribuiremos para que a literatura exista seja na pedra, no
papel, no espaço ou no ciberespaço.
Referências bibliográficas
CAPPARELLI, Sérgio; GRUSZYNSKI, Ana Cláudia; KMOHAN, Gil-
berto. Poesia visual, hipertexto e ciberpoesia. FAMECOS, n.13, p. 68-
82, 2000.
CARRIÈRE, Jean-Claude; ECO, Umberto. Não contem com o fim do li-
vro. Trad. André Telles. Rio de Janeiro: Record, 2010.
Uma média de 20% das respostas dos discentes mostra que, ain-
da hoje, a situação de Besita se repete, e a mulher agredida isola-se
para não ser maltrada ainda mais.
Da literatura à realidade
Passados dois séculos, nas redes sociais a discursivização do ho-
mem e da mulher parece não ter mudado de lugar: as expressões
linguísticas são outras, mas o discurso sexista continua o mesmo.
De acordo com as pesquisas realizadas pelo Ipea/SIPS entre
maio e junho de 2013 em todo o Brasil, mais de 42,7% concordam
que as mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem
ser atacadas e mais de 35,3% concordam totalmente que, se as mu-
lheres soubessem como se comportar, haveria menos estupros.
Esta pesquisa comprova que ainda hoje vivemos em uma so-
ciedade machista, além disso, as mulheres ainda são julgadas pelo
modo de vestir e agir. Uma mulher ao usar roupa curta, ainda no
século XXI, apesar de todas as leis, está sujeita a se expor a comen-
tários pejorativos e expressões de baixo calão, dizendo que ela está
“pedindo” ou que ela é uma “gostosa” e até mesmo comentários
como “ela se veste assim porque quer ser estuprada”.
Como exemplo podemos citar o caso do estupro coletivo ocorri-
do no Rio de Janeiro, em maio de 2016. Uma jovem menor de idade
foi dopada e violentada por 30 homens. A adolescente teria ido até a
casa do namorado com quem se relacionava, e este a dopou. Quan-
do acordou, disse que estava nua com 33 homens armados.
Um dos estupradores publicou no seu perfil do Twitter: “Estado
do Rio de Janeiro inaugura o novo túnel para passagem do trem
bala do marreta” e, em seguida publicou o vídeo minutos depois da
jovem sendo supostamente dopada e abusada de pelo menos 30 ho-
mens. Nas imagens, a garota ainda estava despida e com suas partes
102 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
Considerações finais
A leitura obrigatória de livros de literatura para o vestibular
pode ser uma fonte de promoção de uma educação que forme ci-
dadãos éticos, indivíduos cuja interação criativa com a informação
leve-os não apenas a construir conhecimento, mas também uma
postura perante a sociedade acerca da temática posta em questão,
no caso a violência sexual. O pensamento crítico pode ser uma tare-
fa colaborativa e não competitiva, pois ao interpretar, analisar dis-
cursivamente, pode-se promover a resolução de problemas desde a
esfera pessoal até a social.
No romance analisado observou-se que já no século XIX discur-
sivamente (o silêncio também é considerado um tipo de discurso) já
existia uma cultura que estabelecia o papel do homem como viril e
superior a mulher, e a mulher era colocada como uma figura con-
traditória por um lado a mulher doce, resignada e submissa e por
outro como sedutora: um “peixão” a ser pescado, metaforicamente,
a serpente que seduz o homem e o deixa fascinado, a ponto de co-
meter “estripulias”, mesmo que estas culminem na violência que
pode resultar na morte da mulher.
O sexismo é presente na língua, tanto por meio das expressões
que usamos como dos discursos que fazemos podendo incitar a vio-
lência. É necessária uma educação linguística, mas para tanto é pre-
ciso aprender a ler, compreender e interpretar os discursos que nos
cercam, os quais constroem nossa realidade.
104 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
Referências bibliográficas
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NOVAS LEITURAS DO MUNDO 105
Referências bibliográficas
ANTONIO, Jorge Luiz. Poesia eletrônica: negociações com os processos
digitais. São Paulo; Belo Horizonte: Veredas e Cenários, 2008.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 123
fazer com que a literatura não seja substituída por outro prazer
qualquer é o “prazer estético”.
Essa resposta desmistifica algumas conceituações até então es-
tudadas, pois, no tocante à formação de leitores, são arrazoados o
prazer e a liberdade da leitura sem inicialmente haver uma preo-
cupação com o amadurecimento desse leitor, que também deve ser
analisado. Por isso, antes de entregá-lo ao seu bel prazer, deman-
da que este seja orientado que a leitura é bem mais que um prazer
de passatempo ou uma atividade para preencher horários vazios,
ela precisa ser “o encontro com um universo de beleza, propician-
do um prazer estético, que encanta quem descobre seus enigmas,
sua lógica, seu jogo” (RITER, 2009, p.53). Somente a partir deste
entendimento, o leitor poderá dar asas à liberdade, e quem poderá
auxiliá-lo será a escola.
nos, pois sabemos que fora dos limites das salas de aula, eles es-
tão conectados por mensagens de texto/voz e por vídeos que os
integram às produções de mídias, e estas, por sua vez, pretendem
alcançar dois objetivos: proporcionar um espaço crítico por meio
da produção de vídeos didáticos e experimentar possibilidades co-
municativas propostas pelas mídias digitais. Desse modo, a uma
comunidade de leitores foi designada uma proposta didática que
envolveu o vídeo de bolso como ferramenta para o fandom; a seguir
mostramos as suas etapas.
A pré-leitura ocorreu por meio de palavras/expressões que fo-
ram dispostas no quadro e que tinham relação direta com o enredo
dos textos. Do conto “Memória de livros” (João Ubaldo Ribeiro)
foram ordenadas as palavras/expressões: orgulhosa capital de Ser-
gipe, novidades tecnológicas, Luís de Camões, maquiavélica, D. Qui-
xote. De “Zap” (Moacyr Scliar) dispusemos: pretensão fantasiosa,
televisão, zap, rosto atormentado, velho roqueiro. Das palavras/ex-
pressões selecionadas, pedimos para que os leitores deduzissem os
temas. De início eles não conseguiram associá-las aos temas, en-
tão pleiteamos que eles dissessem o que significavam as palavras
em destaque. Os leitores desconheciam, por exemplo, que Luís de
Camões e D. Quixote eram respectivamente autor e obra literária.
As demais respostas foram bem variadas, sendo algumas bem in-
comuns, como foi o caso da explicação para a palavra maquiavélica,
em que um dos leitores disse que achava que era um “caminhão
cheio de maquiagem”. Em relação a “Zap”, chamou atenção o fato
de a maioria dos leitores o associar à mídia social WhatsApp, já que
popularmente este é chamado de zap ou zap-zap – nesse momento,
a leitora-guia aproveitou para elucidar que a palavra deriva de zap-
ping, termo em língua inglesa que corresponde ao ato de utilizar o
controle remoto para trocar constantemente entre canais de TV, e,
também, para explicar a respeito de outras palavras/expressões que
eles desconheciam.
Na etapa de leitura-descoberta, aconteceu a leitura do conto
“Memória de livros” e a exibição de um fantrailer de “Zap”, uma
adaptação do conto produzida pelos estudantes Matheus Paz (edi-
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 137
pai, que abandonou a mãe dele logo depois do seu nascimento. Por
alguns minutos, o personagem escuta aquela entrevista, a mulher
faz perguntas embaraçosas relacionadas ao filho do roqueiro, ele
não responde, preferindo dedilhar as cordas da guitarra, e pela falta
de respostas explícitas, eis que o controle remoto é acionado e zap.
Durante a pós-leitura, dialogamos acerca da diferença entre re-
des e mídias sociais,6 para então propor o fandom – produzir um
vídeo gravado a partir de uma roda de conversa sobre o tema “A
relação das redes/mídias sociais e a literatura”. Sublinhamos que
o vídeo de bolso #falaleitor foi gravado na Fanac – evento carateri-
zado pela exposição das “Atividades dos Fãs”, a palavra deriva da
expressão Fannish Activities, abreviadamente Fanac –, e os leitores
do Clube foram os interlocutores desse fandom. Na ocasião, eles
aproveitaram a presença dos alunos convidados para perguntar o
que achavam da relação entre as redes/mídias sociais e a literatura.
A partir daí, ocorreu um debate, no qual leitores e público con-
vidado sentiram-se à vontade para expor suas afirmações. Sobre
essa questão, constatamos que as opiniões sobre o assunto são di-
vididas, pois uns compartilham a ideia que as redes sociais ajudam
na leitura pela agilidade e pela quantidade de materiais que podem
ser encontrados, enquanto outros acreditam que atrapalha, devido
à possibilidade de conexão a várias informações ao mesmo tempo,
fazendo com que se perca a concentração durante a leitura. Outro
pensamento levantado foi a respeito da atitude de muitos jovens co-
Considerações Finais
A Geração Z, à qual os sujeitos da pesquisa pertencem, encontra-
-se persuadida pela velocidade e conectada a um mundo virtual e tec-
nológico; então, foi importante a este estudo investigar como a escola
tem ignorado novas práticas de leitura literária e temas que agradam
aos adolescentes. Nessa análise, foi significativo perceber que as novas
leituras de mundo necessitam estar inseridas na escola, e que alunos,
professores e mediadores da leitura reconhecem a convergência de mí-
dias e a pluralidade de manifestações artísticas nos estudos literários.
A relação teórico-metodológica entre as comunidades de leitores
e as suas práticas letradas, também, constituiu-se em questão pri-
mordial para entendermos que as culturas juvenis devem ser trazidas
para a sala de aula e integradas a recursos metodológicos digitais e im-
pressos variados, pois, dentro desse contexto, os jovens apropriam-se
e produzem sentidos por meio de atividades de que participam, ativa
e dialogicamente, como autores, comentaristas, consumidores, críti-
cos, espectadores, leitores, revisores, tradutores etc.
Desse modo, as comunidades e redes sociais contribuem na tra-
jetória da formação do leitor juvenil, quando partimos do princí-
pio de que estas auxiliam no letramento literário desse grupo, tal
qual ocorre nas produções de fandoms, ferramenta utilizada nesta
pesquisa, que nos propiciou conhecer essa abordagem performática
como um sistema interativo e multifacetado qualificado a “letrar”
o jovem leitor através do compartilhamento de leituras literárias.
Acreditamos, portanto, que são fundamentais a produção e a
crítica dessas ecologias das mídias integradas à leitura literária, a
fim de que a escola ou espaços similares ampliem o diálogo entre as
linguagens e as novas leituras, visando abordagens metodológicas
sólidas e práticas que contribuam na autoconstituição de produções
estéticas inovadoras.
Referências bibliográficas
AUXILIO, Thais de; MARTINO, Luis Mauro Sá; MARQUES, Ânge-
la Cristina Salgueiro. Formas específicas de produção cultural dos fãs
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 143
3 Corrêa (2016) apresenta uma discussão sobre livros ilustrados e livros com
ilustração a fim de analisar livros da escritora mineira Angela Lago.
152 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
é pelas histórias que ela conta ou reconta. Nem pela sua imitação de
animais, que me faz rir muito. O que eu gosto são das roupas da mi-
nha tia.” Assim, a roupa entra na história justamente como laço entre
tia e sobrinha, como fato de admiração e espelhamento da criança no
adulto. Mais uma vez, temos a roupa como fator de diferença, de es-
tranheza no mundo, pois a forma como tia Lúcia se veste não remete
à beleza padronizada ou a uma elegância socialmente aceita: “Mamãe
acha que ela se veste muito mal. Papai tenta disfarçar o riso, mas qua-
se nunca consegue. Tia Lúcia não liga. Começa a rir junto também.”
Assim, tia Lúcia atrai a menina justamente por ser diferente, pela au-
toconfiança em se mostrar ao mundo, sem medo da estranheza. Tia
Lúcia representa aquilo que justamente a menina deseja ser.
Vale observar que, nos títulos citados, a estranheza aparece em
destaque: a estranheza de mundo, o mal-estar, o vazio, o desconfor-
to da criança ou do jovem diante da vida. A roupa (dela ou do outro)
ou o vestir-se de outra forma se mostra, de alguma forma, se não a
solução para esse vazio, ao menos o caminho para amenizar essa an-
gústia inexplicável que todo ser humano sente, em alguma medida.
A narrativa continua e, além de admirar o estilo da tia, a me-
nina gosta também de brincar em seu armário, vestindo e experi-
mentando. Todas as roupas se tornam então brinquedos novos e
coloridos, uma porta para a fantasia infantil, na qual ela mergulha
intensamente: “Eu fico horas brincando lá dentro!”. Mais uma vez,
a roupa surge associada à diversão, nos remetendo à ideia de que,
quando manipulada com intencionalidade, como manifestação de
uma identidade, de uma criação de si e do outro que habita em nós,
se torna então uma expressão do lúdico.
A ruptura se dá justamente pela mudança nas roupas: da tia, que
de repente passa a vestir somente roupa preta, e nas do tio, que já
não são mais vistas em seu armário. A morte chega ao universo in-
fantil então com delicadeza e sutileza: “Um dia pedi para ir na casa
da titia e mamãe disse que não era um bom dia. Como assim? Sem-
pre era um bom dia pra visitar tia Lúcia!”. Logo que chega, a sur-
presa: “Assim que chegamos, levei o maior susto. Tia Lúcia usava
um vestido todo preto e sem graça, por isso ela parecia tão triste...”.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 161
Considerações finais
Pode-se afirmar que alguns dos títulos se esforçam por não apre-
sentar demarcações de gênero; no entanto, de forma geral a ênfase é
dada na menina, público leitor ou personagem, o que pode ser mo-
tivado, em parte, por questões mercadológicas, mas também por
razões históricas e sociais.
Em sua maioria, com exceções já observadas, as imagens são
pouco transgressoras e, assim, não desafiam o letramento visual da
criança, deixando de propor novas estéticas. A pouca interatividade
também é um fator a ser assinalado, seja textual ou gráfica.
Apesar da inquestionável qualidade literária e estética das obras
analisadas, elas obedecem ainda a uma proposta tradicional de lei-
tura e, exceto pelo título Vestida para espantar gente na rua, não há
convite para ir além do texto e participar da obra. Não por acaso
a autora deste é a mais jovem do grupo e seu caminho de escrita
partiu do externo – um blogue – para o literário. Nascida, portanto,
já na era da conectividade e da interatividade, na qual as múltiplas
linguagens e os multiletramentos se mostram mais espontâneos.
O conjunto das obras aqui apresentadas coloca em cena a moda
que transcende consumo, tendências, frivolidades e padroniza-
ções, termos do senso comum amplamente associados ao sistema
da moda. Trata-se de uma abordagem crítica e necessária, conside-
rando-se que os meios de comunicação em massa veiculam apenas
a moda consumo, a moda padrão de beleza, a moda globalizada; a
162 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
Referências bibliográficas
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ROCHA, Eliandro. Vestido de brincar. São Paulo: Pulo do Gato, 2015.
Provocações juvenis ao senso
comum: Whatever, de Leonardo
Brasiliense
Thiago Alves Valente1
‘tanto faz’, ‘não dá nada’, ‘que seja’. Assim como há alguns anos
tivemos a Geração Coca-Cola, parece que agora estamos vendo aí
uma Geração Whatever”, finalizando com ênfase à reação que essa
observação lhe causa: “o que me preocupa” (VALENTE, 2016).
Para o bem da qualidade literária e da formação do leitor, a obra,
porém, surpreende a despeito dos paratextos que, como o leitor
pode conferir, pouco refletem o trabalho realizado por Brasiliense.
Criativo e perspicaz, o texto literário rompe com expectativas muito
prováveis a respeito de livros para jovens, sejam elas advindas das
ondas incessantes de best-sellers que buscam lugar ao sol no gosto
dos adolescentes, sejam aquelas marcadas pela ideia de “facilita-
ção” da leitura para um público hipoteticamente menos exigente.
Os dez textos que compõem Whatever podem ser compreen-
didos como “partes”, “capítulos” ou “contos” – como é registrado
na contracapa –, um recurso estético que evidencia a fragmentação
da vida contemporânea (pós-moderna? Brasileiramente pós-moder-
na?) na voz de um narrador que conduz todas as narrativas. Como
ponto de partida para algumas reflexões sobre a produção literária
juvenil e o jovem leitor contemporâneo, os elementos da narrativa
merecem atenção por certo movimento de negaceio e falsa negati-
va que surgem como aspectos da construção dos sentidos do texto.
Para isso, embora tomado em sua articulação com os demais, “Vi-
ração”, narrativa que abre a sequência das narrativas de Whatever,
ocupa o centro desta reflexão.
O leitor abre o livro e começa a ler a história contada por João
Pedro. A informalidade e a retificação do modo de narrar fisgam a
atenção do jovem que tende a se identificar com o narrador, noto-
riamente também “jovem” pela forma de narrar: “No início era um
barulho muito forte.” (BRASILIENSE, 2007, p.9). Logo em segui-
da, a voz narrativa nega a expressão usada, pois poderia tanto ser
relacionada ao relato de uma voz ainda infantil – “no início”, algo
como “era uma vez”, quanto a um contexto escolar, pois a expres-
são é típica e corriqueira em redações de alunos que, via de regra,
querem começar narrativas pelo “início” – “Não, não foi assim.”
(ibidem).
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 167
[...] A solidão talvez seja a outra face de uma prática que exi-
ge ao leitor a circunstância não apenas de si, como leitor, mas a
circunstância que o texto propõe, como artístico. Não se trata
de inventar ou propor um coprodutor no sentido mais super-
ficial do termo – um leitor que interaja com o texto literário
com a mesma habilidade e com os mesmos reflexos motores de
um jogador de videogames. Não se trata de fazer do leitor um
indivíduo de corpo plugado e de mente imersa; não se trata de
imaginar um coautor no sentido tradicional da autoria que en-
volva um parceiro de composição. Trata-se de desenvolver ou
mesmo permitir que haja contemplação na tela de algo que já
foi “feito”, o texto literário, e de se aceitar que a atitude leitora
também transgrida e mesmo “modifique” o já “feito”. (RET-
TENMAIER, 2011, p.144).
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 171
ta rapidamente tudo o que fora posto ao leitor. Este, por sua vez,
é convidado, numa aparente contradição, a se aproximar de João
Pedro pelo viés da negação – os elementos, os fatos, as dimensões
da vida que faltam ao protagonista podem ser os pontos de contato
com o jovem que folheia o livro: “Se o meu sofrimento, a minha
incompletude, a minha pequenez, a minha castração me forem re-
velados pelo Outro, também faltoso, posso fazer alguma coisa com
isso.” (FRANÇA, 2010, p.19).
A aparente crueza da voz narrativa desmonta o senso comum ali-
mentado por idealizações e projeções aventurescas, heroicas, ativas
frente às maiores intempéries. Usando o termo de França (2010),
a simbolização desse mundo juvenil é duramente atingida para que
de seus escombros, isto é, da ruptura de expectativa do leitor, sur-
jam novas provocações nos outros textos de Whatever. Concebido
como “remédio”, refletir ou pensar o mundo ao redor, sem hesitar
na leitura irônica, se realiza por meio do “veneno”, compreender
que a angústia posta ao jovem pela sociedade pós-moderna está no
vazio, no lugar subjetivo preenchido supostamente pelos arranjos
burocráticos dos mecanismos sociais:
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A transmidialidade na
constituição das sagas
fantásticas
Fabiane Verardi Burlamaque1
Pedro Afonso Barth2
Os leitores e a transmidialidade
A transmidialidade é esperada e almejada pelos leitores, sobre-
tudo para os fãs de sagas fantásticas. Assim, com muita naturalida-
de, filmes são adaptados como livros, videogames são transformados
em livros, quadrinhos viram séries de televisão e assim por diante.
Martos Núñez e Martos García, a partir dos pressupostos teóricos
de Henry Jenkins, consideram que transmidialidade “acarreta a per-
tença a vários meios ou suportes, de modo que uma mesma história
ou narrativa seja contada através de diferentes plataformas comuni-
cativas” (MARTOS NÚÑEZ; MARTOS GARCÍA, 2013, p.70).
Para compreender a relação entre transmidialidade e sagas,
é importante recorrer ao conceito de narrativa transmidiática de
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 179
[...] abriu espaço para que fossem criados muitos jogos de tabu-
leiro, RPG e jogos de cartas baseados na série, todos elaborados
186 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
Referências bibliográficas
ABRAHAM, Daniel; PATTERSON, Tommy. HQ A guerra dos tronos.
São Paulo: Planeta, 2012. v. 1.
CORSO, Diana Lichtenstein; CORSO, Mário. A psicnálise na Terra do
Nunca: ensaios sobre a fantasia. Porto Alegre: Penso, 2011.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 193
àqueles que virão depois de nós; para que o trabalho dos séculos
anteriores não se tornem inúteis para os séculos seguintes; para
que nossos sobrinhos, mais educados, tornem-se ao mesmo
tempo mais virtuosos & para não morramos sem merecer bem o
respeito do gênero humano.7
perceber com certo grau de confiança que muito do que foi previsto
ainda não se fez, como a melhor qualidade da comunicação (escrita
ou por imagens), ou que o postulado de maior seletividade de fontes
a criticar já existia antes do mundo digital (ou em rede) – o acesso
às fontes talvez fosse mais difícil, mas o número de textos tratados
também era menor.
Com os termos reading speed e understanding, em artigos publi-
cados em periódicos entre 2013 e 2014, a busca no sistema Science
Direct (Elsevier) resulta em 85 textos, que tratam de variáveis como
familiaridade ou não com termos, sistemas de escrita (orientais e
ocidentais), tablets, dislexias, bilinguismos, distúrbios de cognição,
faixa etária. Não foi possível encontrar algum estudo que demons-
tre que a velocidade de leitura aumentou com o advento da internet;
há um texto bastante interessante a tratar da influência da velocida-
de de leitura e extensão de linha em tela (DYSON, HASELGRO-
VE, 2001), algo que se percebe no caso concreto do limite de até
140 caracteres para cada mensagem no Twitter; por outro lado, os
corretores automáticos por modelo de ocorrência (até contextual)
predizem o que se quer escrever, mas há aqueles que usam sim de
acrônimos ou abreviaturas codificadas e significativas para parce-
la menor dos usuários. A tecnologia começa a oferecer modelos de
alteração da leitura, de maneira a facilitá-la, trazendo para o leitor
a melhor capacidade de interação com o texto, quer dizer, não que
tenha o leitor se tornado diferente com o aparato tecnológico, mas
as modalidades de transformação do texto (organizado desde antes
por linhas com sinais gráficos com marcas de sentido como ponto e
vírgula) possíveis pela tecnologia podem gerar um leitor melhor ou
mais rápido.16
As bibliotecas, como depositárias de tudo o que se publica e que
se pode comprar, veem-se claro às voltas com a questão do espa-
ço de armazenamento, tão complicado quanto o de orçamento de
compra de títulos novos, renovação de periódicos (aparentemen-
te esse item começa a desaparecer do horizonte de preocupações)
16
Disponível em: <http://www.pcworld.com/article/2105960/spritz-text-
-streaming-app-increases-reading-speed.html>.
210 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
17 Bexar County Digital Library (San Antonio, Texas). Disponível em: <http://
bexarbibliotech.org>.
18 Em mais que 2% em média no orçamento das bibliotecas norte-americanas.
Disponível em: <http://lj.libraryjournal.com/ 2012/02/library-services/
book-buying-survey-2012-book-circ-takes-a-hit/>.
19 Disponível em: <http://abibliotecaderaquel.blogfolha.uol.com.br/2012/07/11/
cresce-numero-de-titulos-caem-tiragens-de-livros-no-brasil/>.
20 Disponível em: <http://www.bowker.com/news/2014/Traditional-Print-
-Book-Production-Dipped-Slightly-in-2013.html>.
21 Disponível em: <http://cultura.estadao.com.br/blogs/babel/faturamento-
-com-venda-de-e-book-cresce-225-no-brasil-mas-mercado-editorial-conti-
nua-em-crise/>.
22 Disponível em: <http://www.mm.uni-koeln.de/team-loebbecke-publica-
tions-conf-proceedings/Conf-142-2010-The EmergenceOfeBooks.pdf>.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 211
25 Apocalipse 1:8.
214 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
26
Disponível em: <http://www.theguardian.com/books/booksblog/2014/
mar/31/paper-vs-digital-reading-debate-ebooks-tim-waterstone>.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 215
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NOVAS LEITURAS DO MUNDO 219
Introdução
No fragmento 14 de La société du spectacle, Guy Debord afirma
que “Dans le spectacle, image de l’économie régnante, le but n’est
rien, le développement est tout. Le spectacle ne veut en venir à rien
d’autre qu’à lui-même.”3 Independentemente de o espetáculo (e,
em decorrência, a autopromoção) dos sujeitos analisados neste tra-
balho possuir algum outro objetivo além dele próprio, o juízo de
Debord não é, de modo algum, negligenciável no que se refere à
república das letras: nela, a moeda de troca do jogo em que, por
vezes, se converte a valoração pessoal é a autoexposição, valoração
que, diga-se de passagem, toma o lugar da valorização da obra lite-
rária, escamoteada sobre pretextos variados, mas que conduzem,
com alguma frequência, a um tudo é válido, tudo é bom tácito. Em
outras palavras, não importa nesses casos a qualidade estabelecida
(ou não) a partir de algum exercício de leitura e de valorização, o
que importa é a exposição da obra e, mais importante ainda, aquela
que lhe segue, a do próprio escritor. A internet, por seu lado, po-
tencializa as possibilidades de exposição (antes travada em jornais
e revistas acadêmicas) e constitui prolífico solo para uma produção
massiva de imagens públicas de si.
Todavia, é inegável que há algo de apocalíptico (para retomar
o termo tão bem utilizado por Umberto Eco) no que diz Debord
em sua obra. De fato, ele e outros que lhe seguiram nos levam a
perguntar se realmente as previsões se confirmaram e se a web,
com toda sua potência comunicadora, é plataforma de um mer-
cado de aparências sem precedentes que, também alimentado (e
grande parte significado) pelo próprio mercado econômico, se so-
brepõe à produção de conhecimento. Se nossas relações são me-
diadas e medidas por valores monetários, e a exposição também
possui valor inestimável para a esfera econômica, de que maneira
os intelectuais de letras podem se integrar a um mercado fundado
em tais interesses? Vale esclarecer aqui que a expressão intelectuais
das letras diz respeito não apenas a críticos e teóricos, mas também
a escritores. Essas duas classes, no século XIX, estavam separadas
por diferentes lógicas de inserção no mercado dos bens culturais.
Os escritores rapidamente perceberam a importância de se expo-
rem à visão do grande público: de Alexandre Dumas e sua fábrica
de folhetins que empregava escritores fantasmas como Auguste
Maquet, a esforços propagandísticos como o de Aluísio Azevedo,
colocando um pequeno anúncio do lançamento de seu romance O
homem, dentro de um pastel de confeitaria. Já no que diz respeito
a críticos e teóricos (estes a partir do século XX), a consciência
e, até mesmo mais do que a consciência, a utilização das lógicas
de um mercado de produtos culturais demorou muito mais a apa-
recer. No que diz respeito ao meio impresso, os trabalhos desses
intelectuais circularam e ainda circulam de maneira restrita, rele-
gados parcialmente às universidades ou a seus entornos (eventos e
publicações acadêmicas). De outro lado, ainda dentro da tradição
impressa, a academia tem tentado outras instâncias de dissemina-
ção e, consequentemente, de consagração intelectual, vinculadas
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 223
Métodos
Nossas pesquisas pautaram-se, a princípio, na observação e
anotação das estratégias utilizadas pelos sujeitos pesquisados, ao
exporem suas personas nos variados espaços acima mencionados e
que, por simplicidade, podemos chamar de redes sociais, como vem
sendo feito já há algum tempo. Uma das bases teóricas, para isso,
está em observar esses fenômenos todos a partir de uma perspecti-
va enunciativo-discursiva da linguagem, tal como se depreende da
obra de Bakhtin. Como “cada esfera conhece seus gêneros, apro-
priados à sua especificidade, aos quais correspondem determinados
estilos” (BAKHTIN, 1997, p.284), é de suma importância conhe-
224 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
cipar de uma pesquisa sobre sua atuação. Parece que, para a maio-
ria deles, não vale o “falem de mim”, importa apenas o “eu mesmo
falo de mim”. Duas possibilidades de explicação para essa aparente
incongruência poderão ser verificadas ao longo deste trabalho. A
primeira delas remete a alguma superficialidade no trato com as
redes sociais, ou mesmo uma incompreensão das lógicas que as re-
gem, uma vez que, nelas, o “falam de mim” é muito mais impor-
tante, tanto qualitativa quanto quantitativamente, do que o “falo de
mim”. Outra possível explicação, decorrente em parte da primeira,
é que se busca, assim, manter o máximo controle do que “falam de
mim”, tentando impedir uma autonomia maior por parte de quem
se dispõe a analisar criticamente suas personas.
Um exemplo
Antonio Marcos Pereira é professor do Instituto de Letras
na Universidade Federal da Bahia e mantém uma página principal
no endereço <www.antoniomarcospereira.com>.7 Nela encontra-
mos referências às redes sociais em que ele está presente, embora
uma parte delas esteja desatualizada. As redes das quais partici-
pa são Orkut,8 Formspring,9 Academia,10 Diaspora,11 Quora,12
Twitter,13 Facebook,14 Instagram,15 SoundCloud16 e Tumblr.17
de manhã, fazendo o café ou, como hoje, indo pro trabalho, penso
em César Aira. Imagino se ele já está escrevendo àquela hora, se
ele está em casa ou comendo uma medialuna em um café onde ele
costuma ir em Flores. Imagino se o que ele está escrevendo naquele
momento será lido por mim daqui a alguns anos e se vou gostar
do livro. Será, por exemplo, que ele já se deu conta do enorme
potencial narrativo das máscaras balinesas, e de toda a tradição
literária, dramática e musical balinesa, com seus mil artifícios e
soluções de circularidade? O poder da coincidência, a coincidência
como Força Motriz do Universo, o Acaso como algo respeitável o
suficiente para conduzir nossas vidas, a Sorte ou o Azar como fe-
nômenos idênticos. Um homem se distrai dirigindo, outro se distrai
atravessando a rua; uma mulher pensa em um homem distante,
um homem próximo a observa; um menino entra num prédio aban-
donado com dois amigos, é uma gráfica, está cheio de máquinas
velhas e tem muita poeira; uma coisa furtiva que você só vê pelo
canto do olho se move pra trás de uma máquina. O café chega
quente, está bom: é bom tomar café na padaria quieta de manhã.19
Se, às vezes, algum contato seu da rede social comenta algo refe-
rente ao seu trabalho, Antonio Marcos Pereira o retuita:
Referências bibliográficas
BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. In: . Estética
da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p. 279-326.
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nas: Editora da Unicamp, 2014.
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veloppement de l’informatique. Paris: Galilée, 1998.
Orgulho e preconceito:
uma mirada sistêmica sobre
a publicação e a circulação
da literatura contemporânea
em tempos de acomodação
tecnológica
Ana Elisa Ribeiro1
Carla Viana Coscarelli2
Um episódio de estranhamento
A escritora brasileira Henriqueta Lisboa manteve intensa cor-
respondência com o irmão mais velho, José Carlos Lisboa, que era
professor na cidade do Rio de Janeiro, no século XX. Em carta da-
tada de 30 de junho de 1973, a poeta espantava-se com uma norma
dos Correios para o envio de cartas, conforme fielmente transcrito:
Um método contemporâneo
Já tecemos considerações sobre o “sistema de mídias” atual,
inspiradas em Briggs e Burke (2004). Com o objetivo de pensar as
relações entre o impresso e o digital na produção literária atual, o
instrumento mais apropriado nos pareceu a entrevista breve com
autores, editores, leitores e outros produtores contemporâneos.
Nada melhor do que a experiência prática rotineira de quem vive os
tempos atuais e se consagra escritor, editor ou leitor – às vezes todos
em um – para nos dizer deste momento de reacomodações, em que
a paisagem comunicacional se diversifica, mas também se hibridiza
em alto grau.
Partindo dessas considerações, enviamos algumas perguntas
abertas a dez informantes, via inbox do Facebook ou e-mail, em
julho de 2016, solicitando que nos respondessem com presteza.
Oito deles responderam a tempo. São todos autores e/ou edito-
res e/ou leitores conectados com a produção literária atualíssima,
ainda talvez distante da legitimação ou da canonização, das listas
de livros escolares, mas prestes a isso, em vários casos. Poetas,
contistas, romancistas premiados, publicados por grandes edito-
ras, experts em multimídia, usuários de variados suportes e plata-
formas, todos sabem bem pensar sobre o que fazem.
As respostas vieram logo, na forma de textos, links e exemplos
que não nos deixam à míngua na reflexão sobre o fazer literário em
tempos de hibridismos analógico-digitais, conforme veremos mais
adiante. É importante lembrar que somente os autores de hoje po-
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 249
6 Os depoimentos foram coletados por meio digital, com base em quatro per-
guntas-provocações que enviamos a eles.
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 251
Não sou leitor de ebooks. Não gosto de ler ebooks, não te-
nho paciência nem estímulo para ebooks. Neles não posso es-
crever, e escrever-lendo é imprescindível para mim. Também
não posso tocar as páginas, manipulá-las com os dedos, não
posso esparramar ebooks pela cama. Então não dá. Por outro
lado, leio jornais em telas e tablets, leio pequenos artigos, no-
tas, comentários, textos curtos. Tenho uma tendência a querer
imprimir as coisas de que gosto, mas a leitura descartável e rá-
pida faço sem maiores tristezas no suporte eletrônico. (Marcílio
França Castro)
Considerações finais
Os livros, como tecnologia, escapam ao impresso. É importante
lembrar, no entanto, que o impresso não foi sempre a tecnologia
hegemônica do livro (embora o formato de códice, sim, como já
afirmava Roger Chartier, em 2001). A poesia escapa ao impresso,
como sempre, já que ela circula oralmente e de outros modos, mes-
mo em tempos de hegemonia do papel. Alguma forma de poesia
ocupou, além do papel, os CDs, os pendrives, os ambientes web.
Ocorre que algumas outras formas de poesia não cabem no papel
ou ficam desconfortáveis lá, daí serem criadas para o áudio, para o
vídeo, para a web ou para instalações de museus.
A forma hegemônica da literatura pode ter sido o livro impres-
so. Ao menos é a impressão que temos hoje, nascidos e criados na
NOVAS LEITURAS DO MUNDO 267
Referências bibliográficas
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Clássicos e games:
relendo o múltiplo
Lucas Hessel1
Miguel Rettenmaier2
Não há povo e não há homem que possa viver sem ela, isto é,
sem a possibilidade de entrar em contato com alguma espécie de
fabulação. Assim como todos sonham todas as noites, ninguém
é capaz de passar vinte e quatro horas sem alguns momentos
de entrega ao universo fabulado. O sonho assegura durante o
sono a presença indispensável desse universo, independente-
mente de nossa vontade. [...] Portanto, assim como não pode
haver equilíbrio psíquico sem o sonho durante o sonho, talvez
não haja equilíbrio social sem a literatura. (CANDIDO, 2004,
p. 174-75).
Essa visão, com certa dicção eufórica por parte do crítico na for-
ma como concebe a literatura em um sentido iluminista e em uma
semântica prescritiva, tem lugar em um certo contexto histórico no
qual, vencido o arbítrio, a sociedade brasileira se reorganizava, nos
anos 1980, na constituição de valores que amparassem a consoli-
dação da democracia recente no país. Havia a necessidade de que
se garantissem os diretos das pessoas, sobretudo o de expressão e
de informação, ao mesmo tempo revalorizando as humanidades,
fortemente atingidas pela referência desenvolvimentista da ditadu-
ra cívico-militar. A visão de Candido, contudo, talvez não tenha
pecado tanto ao reivindicar o dito “direito à literatura”, quanto ao
imaginar superadas as concepções que respaldaram anos de repres-
são. O estudioso da literatura via mudanças na fraseologia da classe
dominante e das outras classes, a essa associada:
Algumas flutuações
A relação em que se pode perceber um problema comum en-
tre dois textos escritos pode articular, obviamente, o contato en-
tre produções em linguagens diversas. No caso específico de uma
“situação imaginária de um encontro além-túmulo” (BAKHTIN,
1992, p.354) um diálogo entre mortos pode ser visto em uma acep-
ção mais ampla em outro suporte, em outra manifestação. E agora
tratamos de algo que não deveria estar previsto em uma reflexão
tradicional sobre clássicos literários. Pois há um game que chama
um clássico, ao tematizar a violência da guerra e do ser humano –
SpecOps: The Line.
o Capitão deduz que a única saída para todo aquele terror está em
poder do Coronel Konrad. Tendo-o conhecido de uma missão an-
terior, Walker afirma que o Coronel, que não se sabe onde pode es-
tar, deve estar lutando contra diversos fatores para manter Dubai o
mais segura possível. Walker está completamente enganado e não
faz a menor ideia disso. Tal engano o leva a sucessivas derrotas, até
o quase próprio aniquilamento.
O jogo, em uma referência contrária usual dos demais games,
que acenam com possibilidades de vitória, não apresenta necessa-
riamente um triunfo final. Quando o gamer alcança um dos múl-
tiplos finais de SpecOps: The Line, e o protagonista da narrativa,
Cap. Martin Walker, é resgatado aos pés da Torre Kalifa, o mais
alto edifício de Dubai e quartel-general das forças que ele, à frente
de seu pelotão, combateu até seu extermínio, se dá um diálogo que
nos remete a outros diálogos da literatura. O oficial da missão de
resgate, que encontra o capitão Walker ferido e com sérios proble-
mas ligados a uma profunda desordem emocional, questiona o mi-
litar sobre como ele sobreviveu à toda a destruição ocorrida em sua
missão. O capitão da Força Delta, olhando pela janela do Humvee
(veículo de combate que os leva para fora de Dubai), redargui com
outra pergunta: “Quem disse que sobrevivi?”.
O enredo do game é estruturado de modo a confundir Walker
e, consequentemente, o jogador que o controla. Acreditando fa-
zer parte também de um grupo de resgate a civis em situação de
emergência, Walker toma ações e opções que vão se revelando,
da maneira mais chocante possível, grandes erros. E acreditando
que pode ajudar toda aquela gente, Walker conduz à morte de
civis, às atrocidades de um conflito em que a injustiça e mesmo
a desproporcionalidade de reações armadas retiram qualquer
traço de civilidade da ideia inicial de resgate. O personagem,
portanto, vai passando por uma grande transformação em sua
forma de ver a guerra e a si mesmo, de tal forma que, ao final
da narrativa, ao encontrar, depois de cruzar o inferno da guerra,
o Coronel Konrad, a nada disso parece ter superado com vida,
já que ambos parecem dialogar como criaturas já mortas. Nesse
282 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
Referências bibliográficas
BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec,
2004.
. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
CANDIDO, A. Vários escritos. Rio de Janeiro: Ouro sobre o azul; São
Paulo: Duas Cidades, 2004.
284 FABIANE VERARDI BURLAMAQUE • MIGUEL RETTENMAIER (ORGS.)
EQUIPE DE REALIZAÇÃO
Coordenação Geral
Kalima Editores
Fabiane Verardi Burlamaque • Miguel Rettenmaier (Orgs.)
totalmente que, se as mulheres soubessem Os livros, como tecnologia, escapam ao
como se comportar, haveria menos estupros impresso. [... ] A poesia escapa ao impresso,
(Gabriela Rohrbacker Medeiros Longo; Ka- como sempre, já que ela circula oralmente e
ren Wellen da Silva Beltrame; Maria Regina de outros modos, mesmo em tempos de he-
Momesso; Sandra SsuYung Chen). gemonia do papel. Alguma forma de poesia
A relação teórico-metodológica entre as ocupou, além do papel, os CDs, os pendrives,
comunidades de leitores e as suas práticas os ambientes web. Ocorre que algumas ou-
letradas, também, constituiu-se em questão A ecologia da mídias associa de forma tanto complexa quanto Fabiane Verardi Burlamaque tras formas de poesia não cabem no papel
primordial para entendermos que as cultu- ou ficam desconfortáveis lá, daí serem cria-
ras juvenis devem ser trazidas para a sala de
transformadora as tecnologias de informação e comunicação (TICs) a Miguel Rettenmaier (Orgs.) das para o áudio, para o vídeo, para a web ou
toda e qualquer forma de expressão e de manutenção de protocolos,
aula e integradas a recursos metodológicos para instalações de museus (Ana Elisa Ribei-
digitais e impressos variados, pois, dentro
desse contexto, os jovens apropriam-se e
valores e práticas das distintas e variáveis comunidades culturais. A
nova ecologia viabilizada pelas TICs incorpora uma nova forma de vi-
Novas leituras ro e Carla Viana Coscarelli).
O alcance imenso que possuem as redes
produzem sentidos por meio de atividades
de que participam, ativa e dialogicamente,
ver, em ambientes expandidos, em relações ubíquas, desestabilizan- do mundo sociais, em comparação aos blogues profis-
sionais ou aos sítios especializados em que
tes de noções precisas de tempo e de espaço. Na sociedade mediatiza-
como autores, comentaristas, consumidores, os sujeitos escrevem seus trabalhos, não pas-
críticos, espectadores, leitores, revisores, tra- da e midiatizada, novas questões surgem, novas articulações se fazem sa despercebido. Muitas vezes observamos
dutores etc. (Diógenes Buenos Aires de Car- promessa e hipótese, já que o próprio presente se projeta para o futu- que quando uma das pessoas analisadas
valho, Priscila da Conceição Viégas). ro. A mediação, nessa sociedade, conduz à pluralidade de signos, de publicava uma resenha de livro, texto críti-
co etc., compartilhava-os prontamente nas