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NEOFASCISMO, MÍDIA E ORGANIZAÇÃO DA CULTURA

Tatiana Poggi
Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em História Social UFF, bolsista CNPq.
tatiana.poggi@gmail.com

Resumo: Nesta comunicação procuro investigar o papel das organizações neofascistas


norte-americanas e particularmente o trabalho de seus intelectuais na organização de
uma dada cultura, pautada pelo autoritarismo, intolerância, racismo e anti-semitismo.
Partirei, então, da análise do pesado investimento dessas organizações na produção de
materiais de mídia e grandes eventos culturais (como encontros nacionais de
confraternização, shows de rock etc) de forma a revelar uma estratégia de luta voltada
para construção de consenso.
Palavras-chave: Neofascismo, EUA, cultura

Há cinco anos atrás, assistindo à televisão, deparei-me com um documentário, ao qual não
pude ficar indiferente. Ao longo das aproximadas duas horas, o filme despertou em mim
perplexidade, fascínio e medo. Era um documentário sobre neofascismo nos EUA, no qual o
apresentador conversava com membros de organizações abertamente racistas e autoritárias, uma
dentre as quais chamou minha atenção.
De nome National Alliance e sediada em Hilsboro, West Virgínia, esta organização, dizia-
se profundamente contrária à violência física direta, alegando que este caminho era não apenas
pouco frutífero como dificultava a difusão dos ideais de “poder branco” nos EUA e no mundo.
Diferentemente do que usualmente se imagina sobre esse tipo de agremiação, a National Alliance
procura investir pesadamente na produção de material de mídia variado (dos clássicos panfletos ao
vídeo-game), apostando muito mais em técnicas contemporâneas de convencimento do que em
práticas truculentas de coerção.
Apesar de defender o autoritarismo como parte de seu projeto de sociedade, os caminhos
para alcançar tal objetivo apontam para construção de consenso. Uma proposta soft e requintada,
que mascara a violência -como se esta não pudesse existir de forma simbólica- e por isso mesmo
muito perigosa. Notei, ainda, uma preocupação em não repetir erros do passado e também muita
clareza quanto aos limites do alcance de sua mensagem no contexto da sociedade democrática
contemporânea. Era preciso encontrar novas estratégias de luta, novos campos. E a aposta da
National Alliance foi a educação e a cultura. A conquista do poder deveria começar pela conquista
do coração e das mentes dos norte-americanos.
Contudo, o que verdadeiramente me chocou não foi exatamente a existência de
organizações com tal caráter, mas a repercussão deste tipo de projeto de sociedade no cenário
político e social dos EUA. Segundo dados do Southern Poverty Law Center, em 2004 existiam 654
“grupos de ódio” ativos no EUA1. Esta informação bem como os curiosos depoimentos dados
pelos membros da organização, primeiramente me deixaram pasma, mas logo depois me fizeram
perceber quão fértil poderia ser esse campo estudo.
Desde o mestrado, venho me debruçando sobre o estudo do neofascismo2 nos EUA, em
especial à peculiar forma de militância da National Alliance. Procurei demonstrar que a National
Alliance é um aparelho privado de hegemonia empenhado na difusão de um projeto neofascista,
investindo fortemente na diretriz educacional como estratégia de luta construção de consenso,
desde seu surgimento em 1974, durante o processo de consolidação do reformismo nos EUA, até
seu pleno desenvolvimento, em um Estado neoliberal.
Mas nem todos os aparelhos neofascistas se organizam e lutam da mesma forma. Apesar de
partilharem descontentamentos, visões de mundo e reivindicações similares, os caminhos e
estratégias defendidas nem sempre são os mesmos. Por essa razão, para o doutorado busquei
ampliar o raio de alcance da pesquisa, desenvolvendo um trabalho de análise e comparação entre a
National Alliance (NA) e outras três organizações neofascistas -Creativity Movement, Aryan
Nations (AN) e White Aryan Resistance (WAR)- buscando compreender a diversidade de
estratégias de ação e mobilização política dentro de um mesmo campo ideológico, o fascismo.
As três organizações escolhidas compartilham da ideologia fascista e, assim como a
National Alliance, produzem materiais de mídia com vias a promover sua visão de mundo. Todas
elas, incluindo a National Alliance, surgiram no período 1970-1980 -décadas ícones da crise do
reformismo nos EUA, construção do neoliberalismo e depauperamento econômico dos setores
subordinados- e, a exceção da White Aryan Resistance fundada por Tom Metzger em 1983,
entraram em franco declínio nos anos 2000, quando seus lideres vieram a falecer.

1
Southern Poverty Law Center. Intelligence Project. Active U.S. hate groups in 2004.
2
O neofascismo, assim como os fascismos observados no entreguerras, é uma resposta a uma crise profunda no
capitalismo, uma resposta à exacerbação das contradições inerentes ao sistema capitalista. Ao autoritarismo, anti-
comunismo, anti-liberalismo, nacionalismo exacerbado e apelo ao espetáculo, somam-se aspectos concernentes ao
tempo e à sociedade específica na qual se insere. São justamente as inquietações desse momento -a crítica à
decadência moral e religiosa, esteios morais de tempos passados, bem como ao Estado interventor, limitador da livre-
iniciativa e às sempre muito custosas políticas de bem-estar- que irão marcar o aspecto novo, contemporâneo, incutido
no neofascismo. No caso norte-americano, possibilita também compreender o papel central desempenhado pelo
racismo, anti-semitismo e anti-comunismo na conformação do neofascismo norte-americano, dado o passado marcado
pela escravidão, apartheid, cotas de imigração e perseguição a comunistas.
Suas lideranças tiveram histórico similar, engajando-se em campanhas (Youth for Wallace)
como a de George Wallace à presidência em 1964 (Pierce, Klassen e Metzger) ou associando-se a
organizações conservadoras como a John Birch Society (Pierce e Metzger), National Youth
Alliance.
Com freqüência, são observadas referências religiosas. William Pierce, líder na National
Alliance, criou o Cosmotheism, conjunto de crenças espirituais racistas, de base não cristã. De
fundo filosófico bastante parecido, o Creativity Movement/Alliance foi fundado em 1973 por Ben
Klassen como Church of the Creator e apesar da mudança formal de nomenclatura, o sistema de
crença -Creativity- se manteve central, promovendo a necessidade de sobrevivência e expansão da
raça branca. Em sua página eletrônica é possível ver o chamado a ação para uma militância tanto
política quanto religiosa, num conflito caracterizado como “guerra santa racial” (Racial Holy War)
ou simplesmente RaHoWa, como diz o grito de guerra. A versão racista do cristianismo vai se
fazer presente na Aryan Nations, fundada por Richard Butler em meados da década de 1970, sendo
profundamente influenciada pela Christian Identity. Este sistema de crenças atualmente adotado
por diversas organizações neofascistas afirma que os europeus brancos descendem do povo
israelita mencionado na Bíblia; Adão e Eva foram os primeiros brancos; os Judeus são
descendentes de Caim e os demais não-brancos descendentes de raças pré-adâmicas desprovidas
de alma.
É perceptível, ainda, o incentivo ao estreitamento dos laços entre os aparelhos
supremacistas nacionais e internacionais. O internacionalismo não apenas da causa, mas também
de organização é uma marca do movimento. O ideal aparece romance O lema “White Pride World
Wide” se materializará em contatos estabelecidos com organizações principalmente na Alemanha,
Áustria, Suíça, Suécia, Canadá etc.
Há, contudo, um elemento diferenciador central entre as organizações estudadas. Enquanto
a National Alliance e o Creativity Movement renegam práticas de violência física direta, apostando
em estratégias políticas que passam pela arena da educação e da construção de consenso, a Aryan
Nations e a White Aryan Resistance promovem e incentivam abertamente a prática da violência
física. Nelas formaram-se braços paramilitares, compostos de jovens skinheads, que
freqüentemente externalizam suas angústias e raiva em atos de violência brutal contra negros,
imigrantes etc. Por essa razão, nesta comunicação dirigirei maior atenção às duas primeiras
organizações.
De modo geral a pesquisa vem discutir a dimensão e o papel da ideologia fascista na
sociedade norte-americana, buscando entender tanto o fenômeno social quanto a ideologia sob a
perspectiva classista do materialismo dialético, particularmente no Estado ampliado gramsciano. O
neofascismo, expressão contemporânea do fascismo, é, então, trabalhado como uma construção em
meio a todo o processo de luta de classes que perpassa o século XX.
Com respeito a tais conflitos, atento especialmente para o uso das novas tecnologias e da
mídia como campos de disputa, novos canais para a difusão de visões de mundo, mobilização de
massa e organização de movimento, além de angariar fundos. A análise dos materiais de mídia
produzidos pelas organizações (artigos, panfletos, programas de rádio e televisão, pequenos filmes,
entrevistas, romances etc.) visa perceber, em meio à qualidade variada da documentação, o projeto
político defendido pelas organizações estudadas. Presto especial atenção ao conteúdo ideológico
presente nos materiais, às implicações deste ser transmitido por canais de mídia variados e,
finalmente, às características que conferem peculiaridade ao projeto de cada organização.
O neofascismo aparece nos países centrais enquanto um dos possíveis produtos da
sociedade capitalista contemporânea, suas organizações se desenvolvem em Estados de
conformação político-econômica neoliberal e se proliferam de modo espetacular, engrossando suas
fileiras de adeptos com os desesperançosos setores subordinados em decorrência da crise do
reformismo norte-americano a partir dos fins da década de 1970.
Acredito que o crescimento espetacular de organizações neofascistas nos EUA, bem como
a construção do neoliberalismo nesse país, são frutos de dois fatores conjugados: a reação às
políticas inclusivas e conquistas no campo dos direitos civis, e o avanço gradativo do processo de
precarização da qualidade de vida, fruto da crise geral do reformismo. O padrão de dominação
estável rompido é o do capitalismo reformado pela intervenção estatal ou regulação, pela adoção
em diferentes níveis de políticas de bem-estar e pelo maior acesso por parte dos setores sociais
subordinados ao mercado de consumo e à participação política. Vai ruindo uma dada forma
funcionamento e reprodução do modo de produção capitalista da vida3, a reformista ou fordista-
keynesiana, e concomitantemente, constrói-se uma outra forma de funcionamento e reprodução do
modo de produção capitalista da vida, a neoliberal. “Este programa consiste em, de um lado, tornar

3
Acredito que Marx quando falava em “modo de produção” não se limitava à idéia da produção econômica, mas da
produção e reprodução da vida social e como tal, pensar a vida, pensar o homem enquanto ser social significa pensar
em relações de poder e padrões de dominação; organização política; formas de pensar, de sonhar e de se expressar
culturalmente; além claro da produção econômica.
o mundo o mais livre possível para o deslocamento de capital e mercadorias, e, de outro, destruir
as proteções aos trabalhadores duramente conquistadas...”(BRENNER, 1999.p.10-11)
Às portas de 1990 os EUA traziam na bagagem um déficit público e privado astronômico,
uma economia demasiadamente exposta a ondas especulativas, falência por endividamento de
inúmeras empresas e queda dramática na qualidade de vida. Concomitantemente, esta é a década
do definitivo rompimento com os pressupostos do reformismo e consolidação do neoliberalismo
nos EUA pelas mãos nada menos que do Partido Democrata. Os dois grandes e tradicionais
partidos norte-americanos, não mais divergem fundamentalmente, mas, ao contrário, afinam-se
com a proposta neoliberal, significando a hegemonia de um projeto congruente com os interesses
do capital monetário e do capital ligado à indústria e ao comércio transnacionais.
Assim, discursos que enfatizassem as crises econômica e moral, a perda de status social e a
incompetência e traição governamental nos âmbitos interno e externo tornaram-se demasiadamente
atraentes para setores da sociedade (particularmente setores médios) que, mais do que nunca,
sentiam-se desnorteados. Imersos em um contexto de insegurança e ameaçados por mudanças que
não lhes favoreciam, frações dos setores médios e das classes dominadas tenderam a estereotipar
seus medos na figura do “outro”. Este, visto como inimigo, destituído da moral implícita do “ser
americano” e desrespeitador do credo instituído pelos pais fundadores, acabaria por legitimar
desde sentimentos de rejeição até práticas racistas e xenófobas. O Partido Democrata e seu
característico reformismo, por sua vez, não mais estariam a serviço ou prezariam pela segurança
do “verdadeiro” americano, do “americano médio”. Ao contrário, seus projetos estariam muito
mais comprometidos com as causas dos humanistas seculares imorais e dos setores ditos
“parasitários” da sociedade, mais especificamente negros e imigrantes latinos, apresentados como
pouco empenhados com as coisas do trabalho e basicamente interessados em viver dos programas
do Estado.
Objetivamente, o elemento desencadeador de tantas angústias fora essencialmente o
sentimento irreal, mas ainda aterrorizante de deslocamento do sonho americano, o medo da queda,
primeiramente pelo processo de reformas que atingiu seu ápice em 1960 e 1970, contemplando
grupos sociais desprivilegiados e finalmente pelo empobrecimento vivenciado por diversos setores
sociais.
É nos setores médios que se encontram os participantes mais assíduos da reação
conservadora. São eles quem encherão as fileiras de agências e aparelhos privados, sensíveis às
propostas de movimentos sociais de cunho patriarcal-moralista (movimento anti-gay, anti-
feminista, anti-aborto), do neoliberalismo moral e do neofascismo, ainda que verdadeiramente se
beneficiem muito pouco das mesmas. O processo de precarização da qualidade de vida aliado à
reação às políticas inclusivas acabaram levando partes dos setores médios e outras frações da
classe dominada, já atraídos por alternativas políticas autoritárias, profundamente anti-
democráticas e por vezes abertamente racistas, a se engajarem em organizações neofascistas.
E muitos grupos neofascistas procuram externalizar suas críticas, ressentimentos e
reivindicações apostando em formas nada tradicionais de fazer política, apostando na cultura.
Algumas estratégias de luta, como a disputa político partidária, foram deixadas de lado; outras,
como passeatas e grandes comícios públicos, reconfiguradas. Mas, o mais marcante é justamente o
investimento pesado na produção de material de mídia variado, a aposta em editoras, gravadoras
(Resistance Records), redes de rádio e televisão próprias, além do trabalho de base feito nas
escolas de ensino fundamental.
Pioneiro nesse movimento foi o Liberty Lobby (1957-2001), primeira expressão do
neofascismo nos EUA, transcendendo o mero racismo, anti-comunismo e autoritarismo, ao insuflar
o patriotismo via mito do renascimento racial nacionalista e construir críticas moralistas e às
políticas reformistas. O Liberty Lobby investiu na produção de diversos materiais de mídia com o
intuito de conscientizar e angariar adeptos. O primeiro deles fora o boletim Right, divulgando as
atividades realizadas por diversos aparelhos xenófobos de menor abrangência, seguiram-se
Spotlight e Liberty Letter, este último de circulação sensivelmente maior que os liberais National
Review e Human Events, além de livros, panfletos, boletins on-line e o programa de rádio semanal
Radio Free America (DIAMOND, 1995 p.85 e 153 e BERLET & LYONS, 2000 p.185-194). Além
disso, desenvolveu uma série de institutos afins como o Institute for Historical Review fundado em
1979, o Populist Party em 1984 e a organização paramilitar Nationbal Youth Alliance, fruto das
organizações da campanha presidencial de George Wallace (1968), viria a se tornar a National
Alliance, uma das mais importantes organizações neofascistas nos anos 90 (BERLET, LYONS,
2000 p.189).
A National Alliance, fundada em 1974, surgira de um racha da Nationbal Youth Alliance,
abandonando de vez a investida no campo político partidário para apostar na militância de base. Já
em 1974, os primeiros membros da organização puseram-se a distribuir panfletos e folhetos pelas
ruas de Washington. Um ano depois, começaram a produzir e vender dois pequenos periódicos na
forma de tablóide, intitulados Attack! e o ainda tímido National Vanguard, o qual num futuro não
muito distante se tornaria a revista mais importante da National Alliance. Ao final desta mesma
década, a organização adentra o ramo editorial (Resistance Books), publicando e distribuindo
periódicos e livros, como o The Turner Diaries, romance de Pierce muito popular entre
neofascistas e que inspirou o atentado de Oklahoma City em 1995.
Basicamente, os esforços de divulgação da National Alliance até o princípio da década de
1990 se concentraram na produção e distribuição de material impresso, escrito e/ou ilustrado4.
Apenas a partir dessa década em diante irá a organização se voltar para a produção e divulgação de
mídia em formato áudio e áudio-visual. O programa American Dissident Voices começou a ir ao ar
em 1991 e desde então é transmitido semanalmente em rádios comerciais AM e FM.5 Longas e
curtas foram produzidos, dentre os quais destaco “America is a changing country” e “A White
World”. O líder, William Pierce, participou ainda diversas vezes do programa de televisão Race
and Reason produzido pela WAR e veiculado em canais de TV à cabo nos EUA e Canadá.
Apesar do investimento em mídia para difusão do projeto, a National Alliance não deixou
de desenvolver trabalho de militância direta. Com freqüência membros da organização visitam
escolas de ensino fundamental para conversar com os alunos sobre os problemas da sociedade
contemporânea, aproveitando para divulgar o jogo de vídeo-game “neo-nazi doom” e distribuir
revistas em quadrinhos produzidos pela organização.
O Creativity Movement busca investir mais fortemente na religião, Creativity, podendo ser
considerada uma organização político-religiosa. Todas as suas lideranças são ‘reverendos’,
coordenam igrejas locais, promovendo sermões e procuram dialogar principalmente com igrejas
neopentecostais como a Igreja Universal. São dos diálogos e conflitos com adeptos de outras
crenças cristãs que procuram ganhar base apoio.

4
Este primeiro conjunto de documentos produzido em meados dos anos 1970, contendo elementos de expressão
cultural e política, é fruto de uma época, produto representante de um dado contexto. Um contexto conturbado, de
conquistas por parte do reformismo, principalmente no campo das liberdades civis e da diversidade social, mas
também de riquíssimas articulações políticas em torno de novos projetos para a sociedade norte-americana por parte
dos diversos setores da oposição. Um contexto de inacreditáveis avanços tecnológicos, mas também preocupante em
termos de relações de trabalho cada vez mais flexíveis. Mas são também produtores, contribuintes importantes para a
conformação desse mesmo contexto, posto que refletem, dialogam e participam da construção dessa mesma época.
Fração representante da oposição, a National Alliance não tardou em expressar e materializar suas críticas à ordem
corrente e seu projeto alternativo de sociedade em seus materiais de mídia.
5
A análise dos materiais de áudio levará em consideração não somente o conteúdo, mas igualmente a maneira como a
linguagem é empregada. A análise do discurso implica em estar sensível às ênfases, às hesitações e aos silêncios. Além
disso, o discurso não ocorre em um vácuo social e, quando empregado, sempre desvenda posições e visões de mundo.
Os reverendos são ainda os principais autores dos livros da organização e coordenam os
sermões transmitidos por rádio. A Rahowa Radio, transmite regularmente programas dos
reverendos Ben Klassen e Matt Hale. O Creativity Movement produz desde a década de 1980 os
periódicos Racial Loyalty e Struggle, facilmente adquiridos na pagina eletrônica da organização
sem custo algum.
O neofascismo, enquanto expressão política, é ao mesmo tempo complexo e perigoso.
Complexo porque expressa, por detrás de uma visão autoritária e discriminatória do mundo,
descontentamentos legítimos acerca da queda de qualidade de vida nos EUA. Perigoso porque
canaliza os medos e as esperanças de certo grupo de pessoas para uma alternativa política que só
conduz ao aumento da discriminação, a desigualdade e a opressão, dificultando mais ainda o
diálogo e as relações humanas na sociedade norte-americana. (BERLET, LYONS, 2000: 345)
Fascistas são uma realidade, ainda que desagradável de se admitir. E eles estão entre nós.
Não usam mais capuzes brancos, nem engomados uniformes verdes. Não carregam mais cruzes em
chamas, nem marcham em perfeitas formações. Os cavaleiros e soldados do passado se foram;
hoje são homens de aparência modesta e gentil que lutam em aparelhos de hegemonia na sociedade
civil. Seu trunfo é exatamente em tentar ganhar pelas pontas, pouco a pouco naturalizando o
preconceito e a exclusão, naturalizando a opção por medidas de força, difundindo sua visão de
mundo, um projeto político, sem sequer “falar de política”. É assim, pela cultura, quase sem
querer, que o neofascismo bate à nossa porta. Cabe a nós dizer: “Eu não abro, não”.

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