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Espírito e natureza

na teologia de Jürgen Moltmann

Josias da Costa Júnior

Resumo

Este artigo destaca a importância e o desafio que a


pneumatologia e a ecologia têm para a teologia de
Jürgen Moltmann. Os objetivos são: pensar uma teo-
logia ecológica, destacar o papel central do Espírito e
propor um novo eixo hermenêutico.

Palavras-chave

Ecologia – pneumatologia – hermenêutica.

Professor no Centro Universitário


Metodista Bennett (Teologia
e História). Mestre em Ciências
da Religião (UMESP) e doutorado
em Teologia (PUC-Rio).
josiasdacosta@gmail.com
Spirit and Nature in the Theology
of Jürgen Moltmann

Josias da Costa

Abstract

This article points out the importance and the chal-


lenge that pneumatology and ecology have for the
theology of Jürgen Moltmann. The goals here are to
think of an ecological theology, to point out the cen-
tral role of the Spirit and to propose a new herme-
neutic axis.

Keywords

Ecology, Pneumatology, Hermeneutics

Josias da Silva is an ordained


Baptist pastor, a professor at
Centro Universitário Metodista
Bennett (Theology and History),
a master in Religious Sciences
(UMESP) and a Doctor’s Degree
student at (PUC-Rio).
Electronic address:
josiasdacosta@gmail.com
Espíritu y naturaleza
en la teología de Jürgen moltmann

Josias da Costa

Resumen

Este artículo destaca la importancia y el desafío que


la pneumatología y la ecología tienen para la teología
de Jürgen Moltmann. Los objetivos son: pensar en
una teología ecológica, destacar el papel central del
Espíritu y proponer un nuevo eje hermenéutico.

Palabras clave

Ecología – pneumatología – hermenéutica.

Josias da Costa es pastor


Bautista ordenado, profesor en
el Centro Universitario Metodista
Bennett (Teología e Historia).
Máster en Ciencias de la Religión
(UMESP) y doctorado en Teología
(PUC-Rio). Correo electrónico:
josiasdacosta@gmail.com
Considerações iniciais Na perspectiva colocada no parágra-
fo acima, a teologia ecológica deve ser
teologia reagente, isto é, deve reagir
Pensar teologicamente, no contexto
perante todas e quaisquer concepções
da atual crise ambiental, está no centro
de Deus e do seu relacionamento com o
das atenções de Jürgen Moltmann. A te-
mundo que, de algum modo, contribuam
mática ecológica não deve ficar restri- com o fortalecimento da idéia do ser hu-
ta aos círculos dos debates acadêmicos, mano dominador. Assim, essa teologia
pois é uma questão e tarefa de todas as deve atentar para o grito e o gemido de
pessoas. Nesse sentido, é um tema rele- dor do mundo (Romanos 8.22) por causa
vante para as práticas cristãs nos espaços das constantes agressões que sofre. Em
religiosos e para além deles. A articula- Moltmann, essa crítica dirige-se ao proje-
ção entre teologia e ecologia pode ter al- to moderno de desenvolvimento. O pro-
cance em variados setores pastorais, e é gresso acompanhado do empobrecimento
possível se levantar questões sobre como de muitos, em particular dos países em
sensibilizar e desenvolver uma vida cristã desenvolvimento, denuncia os limites e o
com consciência e sentido de preservação fracasso desse projeto que resulta na cri-
do meio ambiente. se ecológica que experimentamos.2 Nesse
sentido, a teologia ecológica identifica a
Outro aspecto de grande relevância
origem da crise ecológica, que para Molt-
para o trabalho teológico atual é a relei-
mann, é provocada pela civilização téc-
tura do Espírito Santo na teologia e na
nico-científica do Ocidente. Na verdade,
prática das comunidades de fé. Dessa for-
as razões dessa crise são bastante co-
ma, podemos ter na teologia de Jürgen nhecidas nesse processo de expansão da
Moltmann uma fundamentação teórica civilização tecnológica:3 desmatamentos,
adequada para reflexão dessa natureza e fim de espécies vegetais e animais, enve-
a construção de uma teologia ecológica, nenamento do ar e do solo, iniciando um
articulando pneumatologia e ecologia. processo de desertificação. Não se tra-
ta de uma crise passageira, mas de um
processo lento e catastrófico que assola
Teologia ecológica a humanidade. Assim Moltmann afirma:
em Jürgen Moltmann “a assim chamada ‘crise ecológica’ não é
uma crise passageira, mas, ao que tudo
indica, o princípio de uma luta pela vida e
Para Moltmann, a teologia tem apenas
morte da criação nesta Terra.”4
um problema: Deus.1 Portanto, teologia
ecológica, para ele, é a afirmação de um Essa destruição da natureza, que gera
universo conceitual teórico complexo que a crise ecológica na qual estamos inse-
busca saber sobre Deus e superar concei- ridos, tem origem nas sociedades indus-
tos que pensam Deus a partir de catego- triais e há uma dupla responsabilidade,
rias de poder. Moltmann busca múltiplas pois foi provocada tanto pelo cristianismo
relações e entrelaçamento dos seres e da
presença de Deus no mundo na elabora- 2
A questão da origem da chamada crise ecológica já
ção teológica. foi satisfatoriamente discutida por muitos autores,
acrescentamos apenas que em nosso autor a crise
ecológica é tratada inicialmente em God in creation,
p. 20-52; ver também MOLTMANN, Jürgen. A vinda de
1
Sobre isso a sua declaração é apaixonada: “a teologia, Deus, p. 231.
no seu cerne, tem apenas um problema: Deus. Deus 3
Cf. MOLTMANN, Jürgen. God in creation. A new the-
é a paixão, o tormento e o prazer dos teólogos [e teó- ology of creation and the Spirit of God. Mineapolis:
logas]”. MOLTMANN, Jürgen. Experiências de reflexão Fortress Press, 1990, p. 20-52.
teológica. Caminhos e formas da teologia cristã. São 4
MOLTMANN, Jürgen. A vinda de Deus. Por uma pneu-
Leopoldo, 2004, p. 31. matologia integral. Petrópolis: Vozes, 1998, p. 229.

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quanto pelas ciências da natureza. Con- ocidental, então, se moveu no interior de
forme Moltmann expressa: um eixo hermenêutico eclesiológico-cris-
tológico. Uma interpretação teológica que
A nossa situação atual é determinada
contemple um novo eixo hermenêutico,
pela crise ecológica de toda a nossa
civilização científica e tecnológica, e que deve emergir do diálogo com os mo-
pelo esgotamento da natureza através vimentos do Espírito (das práticas cristãs)
do ser humano. Essa crise é mortal, e e da realidade ecológica atual, é o que se
não somente para os seres humanos. exige. Chamamos esse eixo de pneumato-
Por muito tempo já significou a mor-
te de outros seres vivos e para o am-
lógico-ecológico.
biente natural também. A menos que Há em nosso continente um espetacu-
haja uma inversão radical na orienta- lar avanço do movimento carismático e do
ção fundamental de nossas sociedades
humanas, e a menos que sejamos bem
pentecostalismo, e não faltam interpreta-
sucedidos em caminhos alternativos ções com mediações da sociologia e antro-
para um modo de viver e lidar com ou- pologia.7 Essas articulações sócio-antro-
tros seres vivos e com a natureza, esta pológicas nos conduzem a interpretações
crise vai acabar em uma indiscriminada
que associam superprodução simbólica
catástrofe.5
como compensação da real carência eco-
nômica na vida das pessoas crentes. A te-
Em outra obra, Moltmann ressalta
ologia se valeu muito dessa mediação para
que essa crise também resulta da fra-
articular o seu discurso, como ato segundo
gilidade humana e não humana.6 Nesse
dessas leituras sócio-antropológicas.8 Des-
sentido, a teologia ecológica tem a tare-
sa forma, ela não teve condições de fazer
fa de rever conceitos da imagem do ser
uma leitura teológica desses novos mo-
humano da crença na criação tradicional
vimentos, e perceber sua dinâmica, a ri-
e da imagem do ser humano da ciência
queza simbólica ali presente e as imagens
natural moderna.
de Deus que dali emergem. No entanto,
foram esses movimentos do Espírito que
deflagraram transformações significativas
A emergência na teologia cristã,9 sobretudo na América
de um eixo hermenêutico Latina. O fato é que a teologia seguiu o
pneumatológico-ecológico rastro dessas interpretações sócio-antro-
pológicas e repetiu a ênfase na eclesio-
logia e na cristologia, como mostram as
Os movimentos atuais do Espírito são
grandes obras que foram produzidas na e
tão desafiadores para a teologia quanto
para a América Latina.10 Tanto a eclesio-
a atual realidade ecológica. Diante disso,
não é possível atender a esses desafios
atuais utilizando uma hermenêutica de 7
Entre as literaturas existentes destacamos MARIA-
NO, Ricardo. Neopentecostais: sociologia do novo
tipo normativa. Supomos que uma centra- pentecostalismo no Brasil. São Paulo: Loyola, 1999;
lidade do Espírito Santo na teologia cristã CAMPOS, Leonildo Silveira. Teatro, templo e mercado.
Organização e marketing de um empreendimento ne-
atual implica mudança no modo de elabo- opentecostal. Petrópolis/São Paulo/São Bernardo do
rar o método teológico e de ler os temas campo: Vozes/Simpósio/UMESP, 1997.
8
Sobre isso GUTIÉRREZ, Gustavo. Teologia da liberta-
clássicos da teologia, como a eclesiologia ção. Petrópolis: Vozes, 1979; BOFF, Clodovis. Teologia
e a cristologia, que ocupam o lugar central e prática. Teologia do político e suas mediações. Petró-
polis: Vozes, 1978.
na hermenêutica normativa. A teologia 9
Em MOLTMANN, Jürgen. O Espírito da vida, p. 16,
lemos a seguinte constatação: “com o ingresso das
igrejas ortodoxas em 1961 e o ingresso, mais tarde,
de algumas igrejas pentecostais no movimento ecu-
5
MOLTMANN, Jürgen. God in creation, p. 20. mênico, é nestes dois terrenos que estão ocorrendo
6
MOLTMANN, Jürgen. A fonte da vida. O Espírito Santo os avanços na pneumatologia.”
e a teologia da vida. São Paulo: Loyola, 2002, p. 107- 10
Apenas para lembrar algumas dessas grandes produ-
127. ções teológicas que surgiram: SOBRINO, Jon. Jesu-

Revista Caminhando v. 13, n. 22, jul-dez 2008 81


logia quanto a cristologia foram determi- acerca do antropocentrismo que grassa na
nantes também para o rico e criativo fazer teologia ocidental. Esses questionamentos
teológico latino-americano. também apontam para a necessidade da
Ora, privilegiar a cristologia e a ecle- hermenêutica pneumatológica-ecológica
siologia na teologia do nosso continente, como tentativa de melhor articular teolo-
significa dizer que houve grande preocu- gicamente essas questões.
pação em dialogar com a herança teológi-
ca em que prevaleceu o viés hermenêutico
cristologia-eclesiologia na reflexão teoló- Espírito e natureza
gica libertadora. Dessa forma, as grandes em Jürgen Moltmann
inovações da teologia latino-americana se
deram dentro desse eixo. Não obstante a
Tanto a teologia protestante quanto a
contribuição que a Teologia da Libertação
teologia católica privilegiaram a cristolo-
ofereceu e ainda nos oferece, devemos fa-
gia. No lado protestante, Karl Barth inter-
zer essas constatações críticas quanto aos
preta a obra do Espírito Santo como con-
seus limites.
firmação subjetiva da revelação de Jesus
Dialogar com a pneumatologia obje- Cristo, que é o lado objetivo da mesma re-
tivando uma imagem do Espírito Santo velação. Na teologia católica, por sua vez,
plausível para a realidade da América Lati- o Espírito Santo, como tema de reflexão
na é a alternativa para ampliarmos os ho- teológica, continuou fora dos inúmeros ar-
rizontes da teologia em geral e latino-ame- tigos que foram produzidos depois do Va-
ricana em particular. Para José Comblin, o ticano II. Um ensaio de David Tracy é bom
cristianismo, quando abordado pelo ângulo exemplo dessa centralidade na figura de
da práxis, deve necessariamente condu- Jesus no processo de revelação e compre-
zir ao Espírito, pois é ele quem conduz à ensão de Deus. Ele indica que o Espírito
ação.11 Por isso, ele afirma: “o Espírito nos Santo é dispensável porque todo proces-
é enviado para nos fazer agir.”12 Todavia, so de revelação se concentra nas funções
a ênfase de Comblin está sobre a ação eclesiásticas.13 Portanto, enquanto no pro-
concreta do Espírito na história da humani- testantismo o risco é de uma redução do
dade, a fim de transformá-la, e cujo povo Espírito Santo ao íntimo do indivíduo, no
pobre da América Latina é o sujeito dessa catolicismo o risco é de que a instituição fi-
transformação. Nesse sentido, é pertinen- que no centro,14 em detrimento dos dons.
te questionar criticamente se o projeto de Em sua obra Der Geist des Lebens (O
libertação deve se limitar ao ser humano. Espírito da vida), Jürgen Moltmann empre-
Dito com outras palavras: a natureza tam- ende uma pneumatologia trinitária a par-
bém não deve ser incluída nesse projeto de tir da experiência e da teologia do Espírito
libertação, posto que o mundo moderno a Santo. Partir da experiência significa ultra-
destrói sem medida? Ou ainda, os limites passar os limites da teologia da igreja, que
da ação do Espírito Santo se esgotam no é a “teologia dos pastores e dos padres”,15
ser humano? Essas perguntas podem en- ou seja, é a teologia da revelação. Partir
sejar, no contexto da emergência da pro-
blemática ecológica atual, uma discussão
13
TRACY, David. Tratado da compreensão de Deus. In.:
FIORENZA, Francis/GALVIN, John. Teologia sistemáti-
ca. Perspectivas católico-romanas. Vol. I e II, p. 183-
cristo libertador. Lectura histórico teológica de Jesús 184.
de Nazaret. UCA Editores, San Salvador, 1991; BOFF, 14
Para Geffré, “a teologia católica procurou superar um
Leonardo. Igreja: carisma e poder. Ensaio de eclesio- eclesiocentrismo estreito no sentido de um cristocen-
logia militante. 3ed. Petrópolis: Vozes, 1982. trismo cada vez mais afirmado.” GEFRÉ, Claude. Crer
11
Cf. COMBLIN, José. O tempo da ação, p. 22. e interpretar, p. 155.
12
Ibid., p. 53. 15
Cf. MOLTMANN, Jürgen. O Espírito da vida, p. 29.

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da experiência significa fazer “teologia de ser relacionada com a vida eterna e com a
leigos,”16 e isso implica privilegiar e ampliar cura nesta vida oprimida, doente e pobre.
os espaços onde a vida se faz e refaz, se Com isso, a salvação não deve significar
produz e reproduz, que significa estender instâncias separadas entre além e aquém.
os espaços de comunhão com o Espírito. Assim Moltmann escreve:
A pneumatologia moltmanniana se
‘Além’ e ‘aquém’ não mais são níveis di-
mostra atual e vai além dos métodos que ferentes do ser na terra e no céu, mas
circunscrevem a ação do Espírito nos li- diferentes épocas do mundo do único
mitantes espaços eclesiásticos, porquanto processo de redenção. Os tempos pre-
sente e futuro estão imbricados um no
enfatizam a relação pneumatologia-ecle-
outro pericoreticamente como antecipa-
siologia (como no caso de Yves Congar), ção e plenificação.20
ou os que entendem a ação do Espírito
apenas como uma confirmação totalmente Para Moltmann, conforme suas pala-
subjetiva do processo revelador objetivo vras supracitadas, a busca de Gutiérrez
de Jesus, na medida em que sublinharam por um pensamento total não foi suficien-
a relação subserviente pneumatologia- temente total, na medida em que celebrou
cristologia (como é o caso de Karl Barth). o antropocentrismo europeu. Parece-nos
O modo como Moltmann articula sua que Moltmann está correto em sua afirma-
teologia é dialogal, pois se vale de fontes ção, pois segundo escreve o autor de Teo-
católicas e protestantes. Isto lhe permite logia da Libertação: “o homem é o resumo
maior abrangência temática, e faz com que e o centro da obra criadora, e é chamado
ele esteja atento aos problemas sociais, ét- a prolongá-la por meio do trabalho (cf.
nicos, políticos e ecológicos17 em seu fazer Gên. 1,28).”21 Essas palavras de Gutiérrez
teológico. Aqui é ocasião para afirmar que estão muito alinhadas ao espírito moder-
ele está em sintonia com os temas que es- no antropocêntrico, que tem o ser huma-
tão na ordem do dia da agenda mundial, no como centro de todos os processos de
tornando sua teologia um importante ins- transformação de si mesmo e do mundo.
trumento crítico da moderna sociedade hu- Moltmann observa que quando Gutiérrez
mana, tecnologicamente “cientifizada”. escreveu sua obra clássica, já não era
mais correta uma reflexão que aceitava
Outro aspecto que devemos mencio-
esse tipo de antropocentrismo. Sobre isso,
nar, para afirmarmos a urgência da her-
escreve-nos Moltmann:
menêutica pneumatológica-ecológica, está
ligado à problemática ecológica. Gustavo A dimensão das catástrofes ecológicas
Gutiérrez em sua Teologia da Libertação, havia dado início, já naquela época, a
parte de uma idéia de unidade de história. um processo de mudança do modo de
pensar antropocêntrico para o ecoló-
Não há, portanto, diferença entre história gico. Ao lado da espoliação econômica
do mundo e história da salvação, pois “há e da alienação racista, a rapinagem e
uma só história. História cristofinalizada,”18 a depredação industrial da natureza
constituem uma opressão, contra a qual
afirma Gutiérrez. Essa unidade histórica é
deve voltar-se um processo total de li-
a história da salvação do mundo, segun- bertação, caso ele deva resultar em li-
do interpreta Moltmann.19 A salvação deve berdade em favor de outros e não numa
liberdade à custa deles. 22

16
MOLTMANN, Jürgen. O Espírito da vida, p.29.
17
Cf. MOLTMANN, Jürgen. God in creation, p. 23-24. lógica, p. 205.
Nesta obra ele considera o “Espírito Santo como a for- 20
MOLTMANN, Jürgen. Experiências de reflexão teológi-
ça e a vida de toda a criação.” ca, p. 205.
18
GUTIÉRREZ, Gustavo. Teologia da libertação, p. 129. 21
GUTIÉRREZ, Gustavo. Op. Cit., p. 135.
19
Cf. MOLTMANN, Jürgen. Experiências de reflexão teo- 22
MOLTMANN, Jürgen. Experiências de reflexão teológi-

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Essa migração do antropocentrismo ao Essa observação assume seu grau de
ecológico não ocorreu com muita rapidez importância quando afirma que diante
em nosso continente. Na teologia latino- desses problemas relacionados à destrui-
americana, portanto, a questão ecológica ção ambiental, a América Latina tem uma
contribuição a dar. A história dos primeiros
foi assunto que não fez parte da pauta de
habitantes do nosso continente revela uma
sua agenda de reflexão, como se a exis-
herança de relação de respeito à natureza
tência da dura realidade ecológica fosse
que precisa ser resgatada, aponta Molt-
ignorada, mesmo que houvesse Juan Luiz mann. Portanto, as questões ecológicas, de
Segundo como exceção, pois incorporou, modo muito particular na América Latina,
ainda que parcialmente, colocações do estão ligadas à questão da continuidade e
pesquisador norte-americano Gregory Ba- da qualidade da vida, particularmente dos
teson, o ecologista da mente.23 A Teolo- seres mais frágeis e das pessoas mais po-
gia da Libertação, como crítica da teologia bres em suas precárias condições de vida.
clássica, assimilou também os seus limites
antropocêntricos e assim não incorporou
as interpelações que a realidade ecológica
Considerações finais
já fazia na década de 1970.
Nesta breve reflexão, apontamos para
A teologia latino-americana não deve
uma teologia pensada desde o eixo herme-
se esquivar da problemática ecológica, nêutico pneumatológico-ecológico, pois en-
como se isso não fizesse parte de nossa tendemos que o sentido cristão de mundo e
realidade, sugerindo ser problema apenas de Deus é (re)interpretado e (re)elaborado
de países do chamado Primeiro Mundo. mais adequadamente, quando visto no con-
Entretanto, vai observar Moltmann: texto da emergência ecológica, por meio de
uma (re)leitura do Espírito na teologia e tam-
A América Latina é uma região de ca- bém na prática das comunidades de fé. Nes-
tástrofes ecológicas. Uma importante
contribuição da América Latina em vis-
se sentido, a teologia de Jürgen Moltmann,
ta dos problemas da humanidade com a a partir do viés pneumatológico-ecológico,
destruição do meio ambiente é respeitar tem condições de oferecer fundamentos
a antiga compreensão indígena da natu- para articulação de um discurso teológico
reza e renová-la para a atualidade. 24
relevante para a realidade presente.

ca, p. 205.
23
Sobre o ecológico no pensamento de Juan Luiz Segun-
do ver, KERBER, Guillermo. O ecológico e a teologia la-
tino-americana. Articulações e desafios. Porto Alegre:
Sulina, 2006, p. 113-129.
24
MOLTMANN, Jürgen. Experiências de reflexão teológi-
ca, p. 205-206.

84 Josias da COSTA JÚNIOR, Espírito e natureza na teologia de Jürgen Moltmann

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