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Márcio Abraham

Ricardo Bonacorci

São Paulo 2011


Copyright© 2011 por Setec Editora
Todos os direitos dessa edição são reservados à Setec Qualitas Consulto-
ria e Editora Ltda. É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer
forma ou por qualquer meio, desta obra, sem a prévia autorização da edi-
tora. A violação dos direitos da editora (lei número 9.610/98) é crime es-
tabelecido pelo artigo 184 do Código Penal. Depósito legal na Biblioteca
Nacional conforme decreto 1.825, de 20 de dezembro de 1907.

Produção Editorial: Setec Editora


Direção Editorial: Jeannette Galbinski
Assistente Editorial: Iris Pereira de Morais
Revisão: Patrícia Sanchez, Mariana Zambon e Sandra Scapin
Capa: Adilson Ap. Barbosa
Projeto Gráfico e Diagramação: Kaeru Comunicação

2ª edição: 2011

Abraham, Márcio & Bonacorci, Ricardo.


Explosão da Inovação: Aprenda e Inove de Forma Explosiva / Márcio
Abraham e Ricardo Bonacorci – São Paulo: Setec Editora, 2011.
194 p.: il.

ISBN: 978-85-63093-17-2

1. Inovação 2. Administração 3. Criatividade 4. Gestão Empresarial. I.


Abraham, Márcio II. Bonacorci, Ricardo III. Título IV. Título: Aprenda e
Inove de Forma Explosiva

2011
Impresso no Brasil/ Printed in Brazil

Todos os direitos reservados à Setec Qualitas Consultoria e Editora Ltda.


Avenida Lavandisca, 741 – conjunto 45 – Moema
São Paulo, SP – CEP: 04515-011
Site: www.setecnet.com.br
E-mail: setec@setecnet.com.br
Agradecimento

Escrever um livro com coautores é um excelente exercício


de interação e trabalho em equipe. Foram inúmeras reuniões,
pesquisas, reflexões, discussões, apresentações e revisões até a
conclusão deste trabalho, também fruto de nossas crenças e de
nossa experiência. Contudo, não nos enganamos em acreditar
que os méritos são apenas dos dois autores. O livro Explosão
da Inovação contou com a preciosa contribuição e o incansável
apoio de várias organizações e de seus profissionais, decisivos
para a conclusão dessa obra.
Agradecemos primeiramente à equipe do Departamento
Nacional da Unidade de Inovação e Tecnologia do SENAI, em
especial ao seu Gerente Executivo, Orlando Clapp Filho, e ao
Gerente de Inovação Tecnológica, Marcelo Oliveira Gaspar de
Carvalho, que nos concederam o patrocínio para a realização
da primeira edição do livro. Foi um prazer ter compartilhado
com vocês nossos estudos e nossas ideias. Sentimos muito or-
gulho de ter participado, a convite do SENAI, dos vários even-
tos de divulgação dessa obra, em diversas regiões do Brasil.
Um agradecimento especial à Gerdau, que nos apoiou
nesta segunda edição do livro, permitindo que o modelo seja
difundido ainda mais pelo país. Esperamos que todos os seus
colaboradores incorporem e apliquem os conceitos do Explo-
são da Inovação, contribuindo ainda mais para o futuro dessa
empresa centenária e inovadora.
Agradecemos também à Editora EPSE, nossa parceira
em uma infinidade de projetos realizados nos últimos quinze
anos, que contribuiu diretamente para a publicação da primei-
ra edição do livro. Fernando Banas e Marisa Bernal, o nosso
muito obrigado pela recomendação e pela confiança que depo-
sitaram em nós.
Não podemos nos esquecer dos profissionais do Setec
Consulting Group, que também contribuíram significativamen-
te para a validação do modelo e para o desenvolvimento do
livro. Foram dezenas de pessoas que colaboraram em todos os
sentidos, contando sempre com o apoio da Diretora Jeannette
Galbinski.
Também enviamos um obrigado especial aos clientes do
Setec Consulting Group pelas experiências compartilhadas
nos projetos de consultoria e a todas as empresas inovadoras
que nos serviram de inspiração para os exemplos práticos co-
mentados nesta obra.
Por fim, agradecemos carinhosamente às pessoas queri-
das, que compreenderam nossa ausência e nos deram suporte
para que pudéssemos escrever este livro.

Márcio Abraham e Ricardo Bonacorci


PREFÁCIO

Uma das maiores discussões acerca da Inovação trata de


como as pessoas encaram e compreendem o tema. Muitas ve-
zes, o verbo inovar é utilizado no dia a dia para retratar uma
nova ideia colocada em prática. Alguns chegam a usar até mes-
mo o termo “patente” de maneira informal.
Há alguns anos, resolvemos fazer um piquenique com ex-
colegas de escola. Uma amiga trouxe uma sacola e disse com
essas palavras: “Tive uma ideia inovadora! Vejam essa patente
que eu criei! Antes de sair de casa, aqueci essa bolsa térmi-
ca no forno micro-ondas e coloquei na sacola. Com isso, pude
manter a comida aquecida por muito mais tempo. Gostaram
da ideia?”. Lembrei-me imediatamente da “bolsa térmica para
tratamento quimioterápico”, produto que desenvolvi no curso
de Engenharia de Produção da POLI-USP, no ano de 1986, e
que me fez ganhar na época o “Prêmio Trol de Melhor Projeto
do Produto”, no curso ministrado pelo Prof. Floriano Conrado
do Amaral Gurgel. O objetivo da bolsa era prevenir a queda de
cabelo gerada pela aplicação do tratamento de quimioterapia,
utilizado no combate ao câncer.
Sinceramente, eu nunca tinha visto uma aplicação como
aquela proposta pela minha amiga para uma bolsa térmica.
Não sei se outras pessoas tiveram essa ideia antes ou se ela já
havia visto alguma aplicação similar. O fato é que ela estava
feliz com sua ideia colocada em prática e com os bons resul-
tados obtidos. Contudo, um amigo meu naquele momento riu
bastante da situação e arrematou: “Não torture o conceito de
Inovação com uma ideia medíocre! Inovar é muito mais do que
isso!”. O que eu realmente me lembro é de que tivemos com-
bustível suficiente para discutir o conceito de Inovação e sua
abrangência até o final do piquenique. O curioso é que aquele
dia me deixou com uma grande sensação de que, em termos
de Inovação, sua aplicação era muito mais relevante do que a
própria discussão.
Passados alguns anos, resolvi retornar ao Departamento
de Engenharia de Produção da Escola Politécnica, dessa vez
como aluno de doutoramento e como Professor da discipli-
na de Projeto do Produto, dividindo a turma com o Professor
Floriano. Naquele momento o prêmio já havia sido extinto e
criamos um novo prêmio com o apoio de outro patrocinador.
Dessa vez passaria a se chamar “Prêmio Procter & Gamble de
Projeto do Produto”. Dessa forma, centenas de alunos foram
desafiados a criar e a desenvolver o seu potencial empreen-
dedor, passando a entender a dimensão da Inovação. O que
procurávamos reforçar é que uma grande ideia pode vir de um
problema simples, mas temos que estar sempre atentos para
aquelas demandas que não são atendidas em sua totalidade e
para o fato de que, infelizmente, algumas visões mais puristas
sobre o que é inovar podem tolher a criatividade e, consequen-
temente, a própria Inovação.

Márcio Abraham
SUMÁRIO

Capítulo 1 | A Inovação e as Necessidades Mutáveis . . . . . . 11


1.1 A Satisfação do Cliente como Peça Fundamental
da Inovação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
1.2 Uma Proposta Realmente Inovadora . . . . . . . . . . . . . . 16
1.3 Definições Teóricas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
1.4 Exemplos e Benefícios da Inovação . . . . . . . . . . . . . . . 24
Capítulo 2 | Modelo da Explosão da Inovação . . . . . . . . . . . . 29
2.1 Iniciação ao Modelo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
2.2 Modelo da Explosão da Inovação . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
Capítulo 3 | O Ambiente Externo como Comburente
da Inovação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
3.1 O Ambiente Externo como Base da Inovação . . . . . . 39
3.2 O Papel do Ambiente Externo na Explosão
da Inovação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
3.3 Tipos de Ambientes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
3.4 Os Elementos do Ambiente Externo – CRIARE . . . 52
3.4.1 Competição . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
3.4.2 Recursos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
3.4.3 Instabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64
3.4.4 Acesso à Informação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
3.4.5 Ruptura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
3.4.6 Evolução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76
3.5 Relação entre os Elementos e os Tipos de
Ambiente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
Capítulo 4 | A Capacidade Interna como Combustível
da Inovação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
4.1 A Capacidade Interna como Motor da Inovação . . . . 87
4.2 O Papel da Capacidade Interna na Explosão
da Inovação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
4.3 Tipos de Empresas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93
4.4 Os Elementos da Capacidade Interna – MACCS . . . 100
4.4.1 Motivação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103
4.4.2 Autonomia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108
4.4.3 Conhecimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114
4.4.4 Capital . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121
4.4.5 Sistema . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125
4.5 Relação entre os Elementos e os Tipos
de Empresas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131
Capítulo 5 | A Ideia Criativa como Faísca da Inovação . . . 135
5.1 A Ideia Criativa como Geradora da Inovação . . . . . . 137
5.2 O Papel da Ideia Criativa na Explosão da
Inovação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 141
5.3 Tipos de Ideias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 143
5.4 Os Elementos da Ideia Criativa – SETEC . . . . . . . . . 147
5.4.1 Sentidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 150
5.4.2 Equipe . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 155
5.4.3 Transpiração . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 159
5.4.4 Estalo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163
5.4.5 Confiança . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 167
5.5 Relação entre os Elementos e os Tipos de Ideias . . . 172
Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 177
Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 186
Capítulo 1

A Inovação e as Necessidades Mutáveis

11
Explosão da Inovação

O conceito de Inovação é amplo e possui muitas defi-


nições. O objetivo deste capítulo é discutir esse conceito sob
duas óticas principais. A primeira delas está focada na dinâ-
mica entre necessidades mutáveis dos clientes, satisfação dos
clientes, diferenciais competitivos e Inovação. A segunda traz
as dimensões da Inovação subdivididas em quatro quadran-
tes relacionados ao nível de mudança esperado pela Inovação
(incremental ou radical) e ao grau de impacto de quem será
afetado diretamente (cliente interno ou cliente externo). Por
fim, são tratados os diversos benefícios da Inovação e alguns
exemplos práticos de casos associados à Inovação.

1.1 A Satisfação do Cliente como


Peça Fundamental da Inovação

O ambiente de negócios enfrentado pelas empresas vem


se modificando a uma velocidade jamais vista. Novos produ-
tos surgem, associados a novas demandas que se modificam
de forma frenética. A busca permanente pela satisfação e pelo
encantamento dos clientes pode se resumir em uma simples e
interessante equação:

Equação da Satisfação do Cliente

o que oferecemos
satisfação do cliente =
o que o cliente espera

Se o resultado dessa equação for igual a 1, significa que


os clientes estarão satisfeitos porque oferecemos exatamente
aquilo que eles esperavam. Se o resultado da divisão for me-
nor do que 1, demonstra que não atendemos exatamente suas
expectativas. Por fim, se o número obtido for superior a 1, te-

12
A Inovação e as Necessidades Mutáveis

remos uma rara situação em que as expectativas dos clientes


foram superadas, gerando algum tipo de encantamento.
O grande problema dessa equação está na velocidade
com que numerador (o que oferecemos) e denominador (o que
o cliente espera) se modificam. Se, em algum momento, ofere-
cemos, mais do que o cliente espera, essa razão pode ser supe-
rior a 1. Porém, imediatamente após esse momento, o denomi-
nador se altera e aquele diferencial passa a se tornar uma nova
expectativa.
Vamos a um exemplo prático. Um casal de jovens está
muito empolgado com o início do namoro. Digamos que am-
bos estejam, de fato, apaixonados. Com o intuito de surpreen-
der a namorada ao final do primeiro mês, o namorado decide
comprar-lhe um presente. Sai do trabalho e dirige-se imedia-
tamente ao shopping center mais próximo. Vagando ansio-
samente entre as lojas, depara com aquele que seria, em sua
opinião, o presente ideal para aquela ocasião. Um lindo colar
de diamantes o atrai de forma sedutora para uma das vitrines.
Num impulso, adentra a loja de forma determinada e decide
adquirir o objeto, que seria a comprovação da dimensão de seu
encantamento pela moça. Parcela o pagamento do produto em
12 vezes e sai da loja triunfante, com a certeza de ter feito a
escolha certa para a sua querida paixão. No momento da entre-
ga, ela abre a embalagem e sorri, ao mesmo tempo assustada e
radiante, diante daquela joia.
Voltemos à nossa análise. Certamente, nessa situação, a
qualidade percebida pelo cliente (no caso, a namorada) foi mui-
to superior à sua expectativa, gerando encantamento. Sob o
ponto de vista matemático, o resultado da fórmula apresentada
seria muito superior a 1. Contudo, o problema está na mudan-
ça dos valores. A partir daquele momento, o denominador (o
que o cliente espera) subiu radicalmente; afinal, a expectativa
para os próximos presentes será alta. De forma até inconscien-

13
Explosão da Inovação

te, a jovem garota deve ter pensado: “Se eu ganhei um presente


desses com um mês de namoro, o que posso esperar quando
comemorarmos o primeiro ano?”. Como dificilmente o jovem
conseguirá manter esse nível de presentes, em algum momento
ele gerará frustração em sua namorada, não conseguindo aten-
der às suas expectativas básicas, as quais ele mesmo alimentou.
Dessa história podemos tirar duas lições importantes. A
primeira está relacionada à dinâmica das expectativas. A ten-
dência do denominador é sempre aumentar! Isso faz com que
tenhamos que melhorar continuamente. A metáfora mais na-
tural seria considerar que estamos subindo uma escada rolante
que desce: se não nos mexermos, desceremos com a escada. A
segunda lição demonstra que aquilo que oferecemos aos nos-
sos clientes deve ser necessariamente sustentável. Em outras
palavras, não adianta superar significativamente a expectativa
dos nossos clientes se isso não puder ser mantido com o tempo.
Uma forma diferente de compreender o conceito de Ino-
vação é entender que temos que melhorar permanentemente
para satisfazer as demandas crescentes de nossos clientes, e
isso requer Inovação. Afinal, para melhorar temos que fazer
algo novo e melhor do que fazíamos. O numerador depende es-
sencialmente de nós, porque é aquilo que oferecemos. Em con-
trapartida, o denominador pode depender tanto de nós quanto
de nossos concorrentes. A questão é que não somos os únicos
a oferecer um diferencial. A mesma linha de raciocínio se apli-
caria ao nosso negócio se os nossos concorrentes estivessem
oferecendo algo a mais. Em resumo, aquilo que oferecermos
não será sempre suficiente. Pense nisso! Vivemos num ambien-
te em constante mutação. O sucesso de hoje não garante o bom
resultado de amanhã.
Se os seus concorrentes não puderem oferecer o mesmo
que você oferece, de forma sustentável, naturalmente a satisfa-
ção dos clientes quanto aos produtos e serviços oferecidos por

14
A Inovação e as Necessidades Mutáveis

eles será menor. Para isso, eles também terão que inovar siste-
maticamente. Certamente, devemos analisar Inovação sob essa
ótica. O que fazemos de diferente que fará com que, num de-
terminado instante, nosso cliente receba algo melhor e mude
sua expectativa?
Vamos discutir esses conceitos à luz de um novo exemplo
prático. Roberto, um homem de aproximadamente 40 anos, de-
cide presentear o seu filho de 10 anos com um violão. Afinal,
ele sempre acreditou que conhecer música e saber tocar um
instrumento poderia ajudar muito no desenvolvimento social
e artístico do menino Ronaldo. Consideremos dois cenários:
Cenário 1 - Roberto entra em duas lojas parecidas que
lhe oferecem exatamente o mesmo produto. Ambos os vende-
dores o tratam bem, apresentam exatamente o mesmo preço
e dizem que se houver uma proposta melhor no mercado eles
certamente vão cobrir, porque não são de perder negócio.
Cenário 2 - Roberto entra na primeira loja com as ca-
racterísticas acima. Depois, entra em outra loja em que o ven-
dedor, além de oferecer o produto nas mesmas condições da
outra loja, também lhe oferece um mês de aulas gratuitas de
violão.
No primeiro cenário, Roberto terá que optar por uma loja
com base em algum critério subjetivo. Por exemplo, pode ter
gostado mais do primeiro vendedor, ou pelo fato de já estar na
segunda loja, comprar o produto naquele momento, evitando
retornar à primeira. Por fim, poderia tentar negociar algum
desconto que justificasse a sua decisão. No segundo cenário,
pelo mesmo preço, uma loja lhe ofereceu algo a mais. Em ter-
mos da fórmula da satisfação do cliente, a segunda loja ofereceu
mais que a primeira e, com esse diferencial, deveria incentivar
uma decisão de compra em seu favor.
De forma prática, no momento em que a segunda loja
apresenta a promoção que inclui as aulas de violão, a expec-

15
Explosão da Inovação

tativa dos clientes do mercado aumenta e a primeira loja terá


como consequência um decréscimo da sua qualidade. Para
compensar esse desequilíbrio, poderá acompanhar a mesma
ideia que foi criada pela segunda loja ou terá que gerar outro
tipo de diferencial.
Em suma, as empresas, o cliente e o produto são os mes-
mos, mas os valores atribuídos ao numerador (o que oferece-
mos) e ao denominador (o que o cliente espera) possuem uma
dinâmica própria e são alterados sistematicamente. Podemos
até mesmo dizer que a segunda empresa teve uma ideia inova-
dora e que a primeira terá que mudar algo caso queira compe-
tir e conquistar a satisfação do cliente.
Basicamente, essa primeira empresa terá dois caminhos
a seguir: copiar ou inovar. Se decidir fazer exatamente o que
a outra fez, estará modificando o que é oferecido por ela, mas
não de forma inovadora. Se buscar uma nova alternativa que
supere a expectativa do cliente num primeiro momento para
que, depois, esta seja modificada permanentemente, estará efe-
tivamente inovando.
Mudando novamente a perspectiva, a cópia será uma al-
ternativa viável em curto prazo somente se aquilo que foi ofe-
recido pelo concorrente for possível e fácil de copiar, o que
pode dar uma noção da dimensão das inovações que podem ser
desenvolvidas.

1.2 Uma Proposta Realmente Inovadora

Cham Kim e Mauborgne, especialistas do Insead de Fon-


tainebleau, propuseram uma análise interessante em seu livro
A Estratégia do Oceano Azul. Para eles, um mercado pode ser
formado por dois tipos de oceano: um azul e outro vermelho.
O oceano vermelho oferece uma competição tão acirrada que

16
A Inovação e as Necessidades Mutáveis

as águas se tornam sangrentas, reduzindo, consequentemente,


as expectativas de melhores resultados às empresas que nele
navegam. A principal referência é o próprio concorrente. O
oceano azul, em contrapartida, é constituído por mercados in-
tocados e por oportunidades de crescimento altamente ren-
táveis. As águas são amplas, profundas e inexploradas. Neste
caso, é preciso criar demanda, em vez de disputá-la com a con-
corrência.
Criar um diferencial competitivo pode significar oferecer
ao cliente algo que ele jamais imaginou ou que estava procuran-
do há tempos, sem encontrar. Quando uma empresa inova, ofe-
recendo soluções inéditas aos clientes, ela muda completamente
a dinâmica das relações de expectativa e satisfação, ingressa de-
finitivamente num oceano azul e, sabendo trabalhar adequada-
mente, poderá colher muitos benefícios desse processo.
Vejamos o próprio exemplo deste livro. O que ele possui
de inovador? Se tivermos que considerar que todos os livros
que são lançados possuem um novo conteúdo, este, a princípio,
não possui nenhum grande diferencial. É verdade que os au-
tores que aqui escrevem podem retrucar: “Epa! Mas e o con-
ceito de Inovação que estamos apresentando? Ele é, sim, ino-
vador. Esse conceito é fruto de nossas pesquisas e estudos de
vários anos e não possui nenhuma metodologia parecida com
ela em nenhum lugar do mundo!”. Isso é verdade. Mas a razão
de existência de um livro de negócios é exatamente transmitir
novos conceitos. Onde está a Inovação, portanto?
No entanto, agora, os autores, com um sorrisinho no can-
to da boca, esclarecem: “Mas esse não é um livro isolado. Junto
com essa obra é possível adquirir o Jogo Explosão da Inovação.
Com ele, você poderá exercitar os conceitos aprendidos e pro-
pagá-los de forma mais divertida e prática para outras pessoas”.
Agora o cenário mudou radicalmente. Um livro que vem
acompanhado de um jogo? Que história é essa? Isso eu nunca

17
Explosão da Inovação

tinha visto. Na verdade, nem tinha imaginado que era possí-


vel. Se eu gostar do conceito de Inovação aqui proposto, posso
apresentar ao meu chefe esse modelo através da dinâmica do
jogo. Além disso, para treinar minha equipe não farei um trei-
namento com velhas técnicas e com uso do PowerPoint. Pos-
so, em vez disso, simplesmente jogar com eles. Provavelmente,
permanecerão atentos por mais tempo e assimilarão mais con-
ceitos do que em um treinamento convencional. Hummm, gos-
tei disso... Quando o cliente ou o consumidor pensam assim, é
sinal de que a Inovação aconteceu.

1.3 Definições Teóricas

Para melhor compreender os diversos significados que


o termo Inovação assume, convém analisar, inicialmente, sua
etimologia a partir da origem no latim: innovatio, que significa
“renovação”. O prefixo in assume valor de ingresso, movimen-
to de introduzir algo, que, no termo innovatio significa intro-
duzir novidade, fazer algo novo, fazer algo como não era feito
antes.
Um ponto importante para esclarecimento é a análise da
diferença entre “Inovação” e “invenção”. Invenção está associa-
da a pioneirismo e se caracteriza como a primeira ocorrência
de uma ideia de um novo produto ou processo. Inovação é a
aplicação prática de uma invenção, seja com objetivo social ou
financeiro. Se um produto foi criado, até mesmo patenteado,
significa que houve uma invenção.
Um exemplo bastante interessante é o uso da fibra de
coco na indústria automotiva brasileira. Apesar de ainda cus-
tar mais caro do que as espumas de poliuretano, por ter um
processo artesanal, há várias vantagens em seu uso: não gera
impacto ambiental, pode ser mais confortável e ocupa menos

18
A Inovação e as Necessidades Mutáveis

espaço. Como o futuro da indústria automotiva está associado


a carros menores, menos poluentes e mais confortáveis, po-
derá ser uma excelente matéria-prima alternativa. Contudo, a
invenção tornou-se efetivamente Inovação em 1994, quando a
Mercedez-Benz do Brasil utilizou a fibra de coco nos encostos
de cabeça de seus caminhões. Não fosse a aplicação prática, o
seu uso teria se limitado apenas à invenção. Como os custos
ainda terão que ser reduzidos para que essa fibra natural seja
competitiva, certamente as inovações incrementais farão a di-
ferença entre o sucesso e o fracasso dessa matéria-prima no
futuro.
Quando pedimos exemplos sobre Inovação, muitas pes-
soas lembram imediatamente do iPod, objeto de desejo de mui-
tas crianças e adultos. O que tem esse produto de tão especial,
se antes dele já havia vários tocadores de MP3 no mercado? O
que tornou o iPod uma referência em Inovação não foi apenas
o seu uso, mas uma combinação de design diferenciado, elegân-
cia, ergonomia, facilidade de uso e a criação das lojas virtuais
iTunes e Apps Store, que vendem músicas, filmes e diversos
aplicativos on-line, com alguns simples toques de dedo.
O caso do iPod ilustra objetivamente que para inovar é
importante considerar uma combinação de produtos e proces-
sos que permitam o sucesso de uma nova ideia e seu impacto
na sociedade. Essa discussão nos remete a outra reflexão. Al-
guns profissionais defendem o uso da Inovação somente para
mudanças radicais, enquanto outros consideram pertinente a
extensão do uso para mudanças incrementais. Entendemos
que, apesar dos focos, abordagens e resultados serem distin-
tos em cada situação, o conceito de Inovação pode ser aplicado
aos dois casos. Aliás, a abordagem seletiva e purista, focada
apenas nas mudanças radicais, pode trazer danos irreversí-
veis para aqueles que não conseguiram enxergar o poder e o
potencial das mudanças residuais. A somatória de várias pe-

19
Explosão da Inovação

quenas mudanças residuais pode se transformar numa mudan-


ça radical para um negócio. Portanto, os gestores não devem
esperar que a Inovação seja imposta, mas devem desenvolver
um portfólio de possibilidades inovadoras, da incremental à
mais radical.
Quando tratamos de satisfação dos clientes, precisamos
avaliar quem são eles. Toda organização possui clientes ex-
ternos e internos. Os clientes e os consumidores externos são
impactados diretamente tanto pelos produtos entregues pela
empresa quanto por alguns processos, e os clientes internos
são impactados somente pelos processos da empresa. Sob o
ponto de vista de gestão de processos, aqueles que afetam os
clientes externos são considerados COP (do inglês, Customer
Oriented Processes – processos orientados ao cliente) e me-
recem atenção especial. Processos COP impactam o grau de
satisfação do cliente externo com os serviços e os produtos
que resultam de suas transformações. Os clientes internos
acabam representando, de uma forma ou de outra, a visão do
próprio negócio. Afinal, se o processo de produção é impactado
positivamente pelo processo de compras, essa melhoria trará
benefícios para o negócio. Essa análise pode, até mesmo, ser
estendida ao processo de gestão empresarial, que determinará
o planejamento estratégico da empresa, gerando impactos em
todos os demais processos da organização.
Os níveis de mudanças e os impactos gerados determi-
nam dois importantes aspectos da Inovação e podem ser ava-
liados na matriz das Dimensões da Inovação, apresentada a se-
guir, com exemplos para cada situação.

20
A Inovação e as Necessidades Mutáveis

Dimensões da Inovação
MUDANÇA

Incremental Radical
nos negócios
Instalação de
Melhoria
um processo de
contínua dos
manufatura com
processos
tecnologia
internos
inovadora
IMPACTO
nos clientes

desenvolvimento lançamento de
Externos

de um novo um produto
produto para revolucionário e
uma linha inexistente no
existente mercado

Fonte: PADOVANI & ABRAHAM (abril de 2007)

No primeiro quadrante, vemos a interface entre impacto


nos negócios e mudança incremental. Em geral, essas melho-
rias estão relacionadas à otimização dos processos internos de
uma organização, focando redução de desperdícios, redução de
custos e melhoria de qualidade. O fato de ser residual e ter
um foco interno não quer dizer que não possa haver Inovação.
Tanto é verdade que conhecemos várias empresas em que há
a figura clássica do funcionário “Professor Pardal”, aquele su-
jeito da manutenção ou do processo produtivo que encontra
soluções inovadoras para tudo. Estamos certos de que existem
milhares de soluções brilhantes escondidas nos corredores das
empresas brasileiras e que, infelizmente, ficam restritas ao am-
biente de trabalho.

21
Explosão da Inovação

No segundo quadrante (linha superior, à direita), apresen-


tamos a interface entre mudança radical e impacto nos negó-
cios, sem afetar de forma direta os clientes externos. Quem já
participou da implementação de novas tecnologias de processo
em uma empresa pode dimensionar a relevância dessa Inovação.
Não necessariamente a nova tecnologia implementada é pionei-
ra no mundo, mas para uma empresa implantar uma grande
mudança sem ter referências anteriores é extremamente desa-
fiante. Um caso comum dessa situação são os muitos inventores
que tentam vender suas ideias para as empresas, a fim de que
possam se tornar Inovação de fato. Dependendo da relevância
da mudança para a empresa, chamamos de “CONTROL-ALT-
DEL”, aquelas três teclas do computador que quando pressio-
nadas em conjunto, fazem com que a máquina seja reiniciada.
Algumas empresas são obrigadas a mudar toda a sua estrutura
organizacional em virtude de tais inovações.
O terceiro quadrante (linha inferior, à esquerda) está
mais focado nos produtos fornecidos pela empresa, já que tem
impacto direto nos clientes externos. Se tais inovações não
fossem tão relevantes, não veríamos tantos modelos e versões
gerados para um mesmo produto ou para uma linha de produ-
tos. Há centenas de exemplos de inovações que ocorrem nos
produtos eletroeletrônicos e nos automóveis, mas que repre-
sentam uma parcela pequena do produto em si. Em muitos ca-
sos, novos produtos acabam gerando novas necessidades para
outros produtos. Se hoje há veículos com conexão Bluetooth
ou com acesso a tocadores de MP3 é porque essas demandas
surgiram. Apesar de relevantes, tais inovações são considera-
das apenas incrementais, mas a somatória de pequenos incre-
mentos pode gerar uma mudança significativa na percepção
dos clientes. Quando um aparelho de telefone celular apresen-
ta várias pequenas inovações, a percepção dos clientes é de que
estamos falando de um produto inovador.

22
A Inovação e as Necessidades Mutáveis

Já tratamos anteriormente da possibilidade que os con-


correntes têm de copiar um produto, em vez de inovar. Certa-
mente, quanto mais radical for a Inovação, menor será a pro-
babilidade de um concorrente copiá-la. Em certos casos, anos
de investimento em pesquisa e desenvolvimento são necessá-
rios para que uma empresa recupere o terreno perdido como
consequência de ideias inovadoras de seus concorrentes. Nas
situações mais graves, algumas nem chegam a se recuperar e
acabam sucumbindo às inovações do mercado.
Um exemplo de empresa brasileira que quebrou por cau-
sa da Inovação dos concorrentes é a Brosol. Líder de mercado
na venda de carburadores, a Brosol não conseguiu combater
o ataque do novo produto concorrente, a injeção eletrônica.
Quando se deu conta de que o fim dos carburadores estava
próximo, já era tarde demais. Numa tentativa de se manter
no mercado fornecedor da indústria automobilística, comprou
outras empresas, com o objetivo de mudar o foco do negócio
para mecanismos de portas, mas isso não foi suficiente para
evitar a falência.
Por fim, o quarto quadrante é aquele que gera menos dú-
vidas conceituais. Não há questionamentos sobre as inovações
radicais que impactam diretamente os clientes externos de uma
empresa. Há empresas centenárias que vivem de uma grande
Inovação original. Xerox e Coca-Cola são ótimos exemplos de
empresas que nasceram com produtos que são sua referência
até hoje. Um ponto que merece destaque é que a Inovação não
necessariamente está restrita ao produto em si. O caso das
Havaianas é interessante, porque o produto original, básico e
orientado para a classe C, sofreu algumas modificações concei-
tuais de cores e estampas, porém sua estratégia de marketing
que buscou atingir as camadas mais ricas da população e alçou
o produto ao mercado internacional acabou sendo o grande
caso de Inovação.

23
Explosão da Inovação

1.4 Exemplos e Benefícios da Inovação

Um caso interessante de Inovação de produto é o da Red


Bull, bebida energética criada pelo austríaco Dietrich Mates-
chitz. O curioso foi o processo de Inovação do produto, que
ocorreu na década de 1980. Ex-executivo de uma multinacio-
nal alemã na Tailândia, Mateschitz viajava frequentemente
entre a Europa e a Ásia e sofria dos problemas de jet lag. Esse
problema fisiológico ocorre como consequência de viagens
através de vários fusos horários, o que se tornou comum com
os voos a jato, e daí o nome em inglês (jet, jato; lag, diferença de
horário). Desta forma, após uma viagem que passe por vários
fusos horários a pessoa se sente como se o seu relógio bioló-
gico não estivesse no mesmo do horário do local, o que gera
alterações no ritmo cardíaco e problemas de insônia. Em uma
dessas viagens, Mateschitz foi aconselhado a tomar um tônico
chamado Krating Daeng, produzido na própria Tailândia. Não
gostou do sabor, mas ficou entusiasmado com o poder revigo-
rante da bebida. Após algumas adaptações, Mateschitz lançou
um novo produto chamado de Red Bull, que foi um fracasso
no início, mas que depois mostrou seu poder de mercado, com
bilhões de unidades vendidas anualmente.
Há vários casos de empresas que são referências em Ino-
vação. A 3M é considerada uma das empresas mais inovadoras
do mundo. Foram centenas de invenções como o Post-it, a fita
adesiva Scotch, o protetor de tecido Scotchgard e as esponjas
de cozinha Scotch-Brite. Essa imagem de empresa inovadora
é tão forte que a 3M oferece seminários de Inovação orien-
tados para empresários, executivos, professores, estudantes e
consumidores, com o objetivo de compartilhar conhecimento
e experiências.
Outro caso de empresa focada em Inovação é a Procter
& Gamble, reconhecida por deter marcas globais poderosas

24
A Inovação e as Necessidades Mutáveis

como Gillette, Duracell e Hipoglós, e que tem exemplos de


produtos inovadores, como as batatas Pringles. Na Procter &
Gamble, a forma de inovar não se restringe apenas ao lança-
mento de novos produtos, mas estende-se à melhoria de seus
processos. Um exemplo de Inovação no marketing é o uso da
tecnologia LVA (layered voice analysis - análise de voz em ca-
madas), desenvolvida pela empresa israelense Nemesysco, que
permite analisar o tom emocional dos consumidores entrevis-
tados em suas pesquisas.
Essa iniciativa, porém, não se restringe a grandes or-
ganizações. Na verdade, todas as empresas, independente de
seu porte, devem inovar. Em geral, esse é o caminho natural
para que as empresas cresçam. Um dos maiores provedores de
serviços de comércio eletrônico no Brasil, o grupo Buscapé,
nasceu em 1999 com poucos recursos e uma grande ideia. No
início, teve que superar a desconfiança dos consumidores com
relação à publicidade pela Internet e, para atrair clientes no
primeiro ano, a taxa de clique não era cobrada. Em setembro
de 2009, a Naspers Limited adquiriu mais de 90% das ações do
grupo BuscaPé por US$ 342 milhões. Um excelente resultado
para quem inovou e teve visão, persistência e gestão.
Os casos mais difundidos são o de pequenas empresas
cujo princípio de criação fundamentou-se em algum tipo de
Inovação. Se, por exemplo, uma grande ideia for gerada por
uma pessoa ou um grupo de pessoas e demandar algum tipo
de investimento ou conhecimento de mercado, associar-se a
uma incubadora pode ser uma boa opção. Uma incubadora de
empresas é uma entidade que oferece condições e facilidades
necessárias para que uma nova empresa sobreviva, cresça e se
desenvolva, principalmente nos três primeiros anos de vida,
período em que se observa o maior número de fechamentos e
falências de novos negócios. As incubadoras oferecem infra-
estrutura física e serviços compartilhados para micros e pe-

25
Explosão da Inovação

quenas empresas em sua fase inicial, além de orientação na


gestão empresarial, considerando aspectos técnicos, contábeis
e comerciais.
A Inovação pode ser entendida como um processo. Para
que uma empresa possa tratá-la como estratégia empresarial
e obter dela os ganhos desejados, a alta direção deve entender
sua relevância e estar altamente comprometida. Pelas mudan-
ças e incertezas associadas a esse processo, sempre há riscos
envolvidos e a empresa precisa estar disposta a assumi-los.
Independente do quadrante do qual estivermos tratando,
o essencial é lembrar que a Inovação está associada à aplicação
bem-sucedida de uma nova ideia, podendo ser de processos, de
produtos, tecnológica, de negócios, de estratégia, entre outras
formas. Não podemos nos esquecer de que a Inovação deverá
sempre gerar algum impacto significativo nos negócios ou nos
clientes.
São muitos os benefícios gerados pelas inovações. Elas
são essenciais porque permitem que as empresas, oferecendo
diferenciais para os seus clientes, aumentem a receita, reduzam
custos, atuem em novos mercados, desenvolvam novas parce-
rias, gerem plataformas para outras inovações e aumentem o
valor de suas marcas. Não raro se observam situações em que
os impactos gerados se estende a outros níveis, chegando aos
próprios parceiros ou até mesmo às regiões onde as inovações
foram geradas.
As parcerias realizam papel essencial na Inovação. O de-
senvolvimento de um novo produto se faz, por exemplo, com
a participação de fornecedores, distribuidores, laboratórios,
institutos de pesquisa e várias outras entidades que precisam
acompanhar esse movimento e acreditar nele. Numa pesquisa
realizada pela empresa de consultoria Monitor com especialis-
tas em Inovação sobre as grandes ideias lançadas por empre-
sas nacionais nos últimos anos, o Ecosport foi um dos eleitos,

26
A Inovação e as Necessidades Mutáveis

acompanhado de outros produtos, como as aeronaves 170/190


da Embraer, o sistema bicombustível lançado pela Volkswa-
gen e a água de coco em caixinha desenvolvida pela One, en-
tre outros produtos. A principal justificativa para a escolha
do Ecosport foi o fato de ter sido o primeiro carro no estilo
off-road lançado no país com preço mais acessível que o dos
modelos importados. Sem dúvida, é uma boa explicação para
sua escolha, mas não teria sido o sucesso de vendas que foi sem
a implantação muito bem-sucedida do condomínio industrial
da Ford em Camaçari, um caso de sucesso que teve de contar
com vários fornecedores que apostaram no projeto Amazon,
liderado por Luc de Ferran.

27
Capítulo 2

Modelo da Explosão da Inovação

29
Explosão da Inovação

Recentemente surgiram muitas definições de Inovação


e explicações de como ela ocorre. Porém, ela é normalmente
citada como sendo um tipo de estratégia que as companhias
utilizam para agregar valor ao seu produto, marca, processo
ou negócio. No capítulo anterior foi apresentada a matriz das
Dimensões da Inovação.
Mas, afinal, por que uma Inovação acontece? Por que al-
gumas empresas conseguem ser mais inovadoras do que ou-
tras? O que faz determinada organização desenvolver mais
produtos revolucionários do que suas concorrentes?
São essas e outras perguntas que se pretende responder
a partir desse capítulo. Elas serão respondidas por meio da
apresentação de um modelo desenvolvido segundo a experiên-
cia, o trabalho e os estudos dos autores desta obra na área de
Inovação. Esse modelo se chama Explosão da Inovação e ex-
plica os mecanismos que permitem o surgimento de produtos,
serviços, modelos de negócios e processos inovadores.

2.1 Iniciação ao Modelo

A Inovação sempre ocorre a partir da geração de uma


boa ideia, e há várias associações possíveis para esse fato. Um
caso clássico que podemos mencionar é o grito de “Eureka” do
sábio grego Arquimedes, um dos primeiros casos de insight re-
gistrados na história ou do momento da geração de uma ideia.
Conta-se que o rei de Siracusa encomendou a um ourives uma
coroa de ouro maciço. Desconfiado de que o ourives pudesse
estar enganando-o, ele pediu a Arquimedes que descobrisse se
a coroa era somente de ouro. Então de acordo com a lenda,
Arquimedes estava em sua banheira entretido com o problema,
quando, de repente, em razão de um lampejo súbito, passou a
correr nu pela cidade gritando “Eureka, Eureka!”, que, em gre-

30
MODELO DA EXPLOSÃO DA INOVAÇÃO

go, significa “Descobri, Descobri!”. Realmente, naquele mo-


mento o sábio havia descoberto a Lei de Arquimedes: “Todo
o corpo mergulhado num líquido está sujeito a uma força de
direção vertical (impulsão), de sentido de baixo para cima, e
cuja grandeza é igual ao peso do volume de líquido deslocado”.
Com essa conclusão, poderia avaliar se a coroa do rei fora feita
de ouro maciço ou não. E, por fim, concluiu que o rei havia sido
enganado.
Essa antiga história ajuda a reforçar a importância do lam-
pejo criativo. Além da palavra “Eureka”, outra representação
comumente associada à geração de uma boa ideia é uma lâm-
pada acesa. Essa associação se deve ao fato de que novas ideias
iluminam, trazem luz para as pessoas ou para os negócios.
Entende-se que a Inovação acontece a partir da geração
de uma boa ideia. A solução encontrada é, assim, apenas uma
parte da Inovação. Na verdade, é a primeira etapa, o pontapé
inicial. Para se criar algo inovador é necessário trabalhar essa
ideia até conseguir chegar à condição de Inovação de fato.
Na analogia com a luz, se uma boa ideia é representa-
da pela lâmpada, a Inovação deve ser descrita como um vul-
cão. Todo vulcão em erupção apresenta grande quantidade de
magma e provoca muito barulho e trepidação nos arredores.
O poder da Inovação é muito similar. Se ela ocorrer, terá a in-
tensidade e a magnitude de uma erupção. Mas se não ocorrer,
será simplesmente um vulcão adormecido com o potencial de,
quem sabe um dia, provocar uma explosão.
Esse paralelo entre Inovação e vulcão nos remete ime-
diatamente ao conceito de explosão. Nela, a luz por si só é
importante e necessária, mas não suficiente. A combustão, uma
reação química exotérmica (que libera calor), é a geradora da
explosão. Essa reação se dá pela combinação de três compo-
nentes que agem de forma complementar: comburente, com-
bustível e calor.

31
Explosão da Inovação

Os Componentes de uma Explosão

Combustível

Comburente Calor

Uma explosão só é possível pela combinação desses três


elementos:
• O combustível é o que fornece a energia para a queima
e é o elemento que entra, de fato, em combustão; pode ser ga-
solina, madeira, papel, pano, tinta ou alguns metais.
• O comburente é todo elemento que, associado quimica-
mente ao combustível, pode fazê-lo entrar em combustão; em
outras palavras, é a substância que reage quimicamente com o
combustível, sendo o oxigênio o mais comum dos comburen-
tes. A clássica experiência escolar em que se coloca um copo
com a boca para baixo sobre uma vela mostra a importância do
comburente, porque, depois de algum tempo, a vela se apaga
por falta de oxigênio. Outros possíveis comburentes são o clo-
ro, o bromo ou o enxofre.
• O calor é o elemento necessário para iniciar a reação
entre combustível e comburente; pode ser uma faísca ou uma
chama, sempre associadas à temperatura de ignição, ou seja,

32
MODELO DA EXPLOSÃO DA INOVAÇÃO

aquela acima da qual um combustível pode queimar.


Esses três elementos combinados (combustível, combu-
rente e calor) são chamados de O Triângulo do Fogo.

Fórmula da Explosão

E o que isso tem a ver com Inovação? Para ocorrer um


processo inovador são necessários também três elementos:
ambiente inovador, que age como o comburente, alimentando e
permitindo que a Inovação ocorra; capacidade interna da empre-
sa, que age como o combustível, propagando a reação; e ideia
inovadora que age como a faísca, dando início ao processo.

2.2 Modelo da Explosão da Inovação

Nesse modelo, a Inovação acontece de forma similar à


combustão. Ela possui três elementos que precisam estar jun-
tos para que a reação aconteça: o Ambiente Externo, a Capa-
cidade Interna e a Ideia Criativa. Na ausência de um deles, o
processo não se inicia ou é encerrado no momento em que o
elemento necessário à sua continuidade não está presente. A
intensidade e o impacto do processo também estão estritamen-
te ligados à quantidade de cada um dos componentes presentes
na reação.

33
Explosão da Inovação

Três Elementos da Explosão da Inovação

Combustível

Capacidade
Interna

ambiente Ideia
Inovador Criativa

Comburente Calor

Por causa da grande semelhança entre o processo de


Inovação e o da explosão/combustão, o nome do modelo foi
estabelecido como Explosão da Inovação. Esse nome ajuda a
reforçar o conceito e a nortear o seu embasamento teórico.
O primeiro componente do modelo é o Ambiente Exter-
no, o qual tem um papel parecido com o comburente na com-
bustão. Afinal, sua função é alimentar e permitir que a Inova-
ção ocorra, assim como o comburente alimenta o fogo aceso
permite a explosão e alimenta o fogo aceso. O Ambiente esti-
mula a Inovação por meio das influências externas e das mu-
danças ocasionadas nele. Quando essas mudanças impactam
diretamente a vida e a condição das pessoas e das empresas, es-
tas são instigadas a mudar. Quando o ambiente se torna hostil,
perigoso e problemático, os agentes que vivem nele passam a
procurar formas alternativas de viver dentro dele, e é essa bus-
ca que força o aparecimento de novidades. Assim, é a influência
do meio externo que possibilita o surgimento da Inovação.

34
MODELO DA EXPLOSÃO DA INOVAÇÃO

O segundo elemento é a Capacidade Interna. Ela faz o


papel do combustível na reação explosiva, pois age como pro-
pagadora da reação. É o combustível que fornece a energia ne-
cessária e que, de fato, é queimado durante a combustão. Em
outras palavras, a Capacidade Interna é a energia que o indivi-
duo ou a instituição necessita despender para que a Inovação
ocorra. Além disso, o esforço, o envolvimento, a dedicação e a
competência presentes internamente é que serão usados para
desenvolver a solução proposta para resolver os problemas im-
postos pelo Ambiente Externo. Assim, pode-se concluir que
é a capacidade das pessoas e das organizações que promovem
as condições necessárias para a superação das limitações e dos
desafios a elas impostos.
O terceiro e último componente do modelo da Explosão
da Inovação é a Ideia Criativa, que atua como o calor da com-
bustão, dando início à reação através de uma faísca ou de uma
fagulha. A ideia é a solução inusitada e não convencional para
solucionar determinado problema. Por possuir características
conceituais e abstratas (afinal é apenas uma ideia), ela precisa
ser desenvolvida e trabalhada (pela capacidade interna) para se
tornar de fato uma Inovação.
Em resumo, segundo o modelo da Explosão da Inovação,
a ideia criativa surge como reação natural de uma pessoa ou
empresa diante de determinada dificuldade ou da hostilidade
imposta pelo ambiente externo. A partir dessa ideia, a capaci-
dade interna fornecerá a energia para a propagação da solução,
transformando-a em algo concreto e viável. A força e a inten-
sidade desse processo são diretamente proporcionais à quan-
tidade e intensidade dos três elementos do conjunto. Assim,
quanto mais criativa for a ideia, mais adverso for o ambiente e
maior for a capacidade inovadora da instituição, maiores serão
as chances do surgimento da Inovação.

35
Explosão da Inovação

Os próximos três capítulos apresentarão de forma de-


talhada cada um dos elementos da Explosão da Inovação. O
Capítulo 3 trata das influências dos fatores ambientais no
estímulo à Inovação e é intitulado “Ambiente Externo como
Comburente da Inovação”. O Capítulo 4 aborda a capacida-
de organizacional de promover as mudanças necessárias e se
chama “Capacidade Interna como Combustível da Inovação”.
O Capítulo 5, “Ideia Criativa como Faísca da Inovação”, fecha
a explicação da metodologia ao tratar da geração de soluções
inusitadas e não convencionais.

36
Capítulo 3

O Ambiente Externo
como Comburente da Inovação

37
Explosão da Inovação

Quando se fala em Inovação, em capacidade de gerar, de-


senvolver e promover produtos e serviços inovadores, primei-
ramente pensa-se quase que apenas, no poder e na capacidade
de as empresas ou instituições se reinventarem no poder cria-
tivo de seus funcionários e na genialidade de um profissional
para “ver o que ninguém viu”. Os méritos da Inovação são qua-
se que exclusivos da empresa, da unidade de negócio, do em-
presário, do executivo ou da equipe que a concebeu. Segundo
essa linha de pensamento, a geração da Inovação deve-se tão
somente a criatividade humana, à ideia genial ou ao poder de
pesquisa e desenvolvimento de uma equipe de profissionais.
Mas será mesmo que esses pressupostos são válidos? A
Inovação surge a partir do homem, do seu poder criativo e da
sua capacidade transformadora? Uma empresa é mais inova-
dora do que outra simplesmente pela sua superior capacidade
cultural (cultura organizacional), técnica (habilidade profissio-
nal dos seus funcionários), mercadológica (de vendas e marke-
ting) ou de previsão do mercado (compreensão das necessida-
des e desejos dos clientes)?
A resposta tradicional para todas essas perguntas é
“sim”. Esse é o senso comum. De acordo com essa concep-
ção, as empresas e os indivíduos são os únicos responsáveis
pela geração da Inovação. Essa ideia está tão disseminada que
o modelo mais utilizado pelas empresas para a promoção da
Inovação é totalmente fundamentado nessa crença. Segundo o
modelo de Hansen & Birkinshaw, também conhecido como Fu-
nil da Inovação, as empresas precisam gerar o maior número
de ideias possíveis, depois devem selecionar as melhores e, por
fim, desenvolver as mais pertinentes. Segundo o modelo, quem
tiver maior capacidade para filtrar, selecionar e desenvolver as
ideias inovadoras é quem inova mais.
Porém, considerando esse pressuposto como verdadeiro,
por que, então, algumas pessoas inovam mais em determina-

38
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

dos momentos do que em outros? Por que pequenas empresas,


recém-chegadas ao mercado, sem qualquer experiência e co-
nhecimento, conseguem superar grandes e experientes empre-
sas no quesito Inovação? Será mesmo que tudo na Inovação
pode ser explicado apenas pela capacidade dos participantes
do processo criativo?

3.1 O Ambiente Externo como Base da Inovação

Na verdade, o processo de Inovação começa pela influência


externa e não pela capacidade interna da indústria em desen-
volver algo inovador. A Inovação surge a partir de uma reação
natural de uma empresa, de uma instituição ou de uma pessoa a
fatores ambientais. Ninguém inova porque quer ou porque gos-
ta, mas porque é preciso ou é levado a isso. É uma reação natural
a um fato ou a uma ocorrência do ambiente externo. Assim, em
um primeiro momento, a Inovação está mais ligada ao poder de
reação aos fatores ambientais do que à criatividade ou à ideia
inspiradora do indivíduo ou da organização.
O que levou, afinal, os europeus, no final da Idade Média,
a se aventurarem em grandes expedições marítimas? A curio-
sidade, o apreço pela aventura, ou a necessidade de provar
novas teorias em relação ao mundo físico? Nenhuma dessas
alternativas. Os europeus se lançaram ao mar para encontrar
uma nova rota para o comércio com as Índias. Os turcos, no
final do século XV, tomaram a cidade de Constantinopla, blo-
queando a rota terrestre que servia para a intermediação do
comércio, deixando os europeus sem opção. Ou encontravam
outra rota ou teriam que pagar elevados tributos aos turcos, o
que inviabilizaria o comércio de especiarias com o Oriente. A
solução foi se aventurar pelos mares para encontrar uma rota
marítima. Para isso, desenvolveram grandes naus e aprimo-

39
Explosão da Inovação

raram os instrumentos de navegação. Assim, a Inovação (rota


marítima, navios e modelo de navegação) surgiu a partir de
uma reação a um fator ambiental: o fechamento da rota terres-
tre pelos turcos.
A mesma explicação pode ser dada para a Revolução
Francesa. Por que no final do século XVIII os franceses se opu-
seram ao poder real? Para promover a liberdade, a igualdade e
a fraternidade? Para promover a divisão do poder que estava
nas mãos de um único homem? É curioso perceber que pou-
co mais de um ano após o início da Revolução, a França era
governada pela ditadura de Napoleão Bonaparte (onde estão a
liberdade e a divisão de poderes?), lançava-se em guerras con-
tra os vizinhos (onde está a fraternidade?) e a divisão de classes
continuava tão acentuada como antes (onde está a igualdade?).
A principal explicação para a revolta dos camponeses em 1789
foi a situação econômica em que o país se encontrava. Nova-
mente, o ambiente suscitou os acontecimentos humanos. Os
anos precedentes à Revolução foram marcados por inundações
e secas que afetaram a produção de alimentos nas fazendas.
Naquela época, dos 26 milhões de franceses, 20 milhões viviam
no campo em condições de vida extremamente precárias. Parte
dos camponeses ainda estava sob o regime de servidão. Com
a destruição da lavoura, os preços dos alimentos subiram ex-
cessivamente (somente os nobres poderiam comprá-los), mui-
tos proprietários rurais foram à falência e, como conseqüência,
os camponeses invadiram os castelos, executando famílias in-
teiras de nobres. Mais uma vez, fatores externos provocaram
mudanças no comportamento humano que geraram inovações
na sociedade, na política e na economia.
Uma das maiores invenções humanas foi o modo de pro-
duzir o fogo. Por que um ancestral nosso juntou um montinho
de mato seco, friccionou dois pedaços de madeira que esquen-
taram rapidamente, queimando-os com seu calor e produzindo

40
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

o fogo? Por que ele era muito inteligente e conseguiu prever


os diferentes usos futuros para o fogo? Ou por que ficou pes-
quisando várias técnicas para produzi-lo? O principal motivo
é que o ambiente era extremamente hostil. O homem era, ao
mesmo tempo, caça e caçador. À noite, no meio da escuridão,
ele estava suscetível à investida dos seus predadores. Ao efe-
tuar uma caça, era obrigado a consumir rapidamente a carne,
se não ela apodrecia ou seu cheiro chamava a atenção de outros
animais caçadores. E o frio limitava sua atuação. A descoberta
de como gerar e manipular o fogo aconteceu como uma forma
de auxiliar o homem em seu aquecimento, no cozer, na ilumi-
nação e na sua proteção, dando-lhe uma importante vantagem
sobre os outros animais. Se o ambiente não fosse tão hostil e
o fogo não fosse uma ferramenta importante para solucionar
muitas dessas dificuldades, possivelmente o homem não busca-
ria formas para produzi-lo.
A Inovação acontece pelas mãos do homem, mas é ori-
ginada pelas causas naturais, situacionais ou ambientais. Não
é muito bonito falar isso, afinal, todos nós gostamos de nos
colocar como “centros geradores de uma ideia ou de uma Ino-
vação”, mas estas surgem fundamentalmente como reações a
fatos do ambiente. Quando o ambiente não pede nenhuma mu-
dança de atitude, de comportamento ou de ferramenta, muito
provavelmente a Inovação não acontecerá. Compreender a di-
nâmica do ambiente, sua influência e suas consequências é o
primeiro passo para entender o processo inovador.
Não está sendo dito aqui que a capacidade interna da em-
presa ou da instituição não seja importante para a produção da
Inovação. Ela é e será tratada mais adiante no Capítulo 4 – “A
Capacidade Interna como Combustível da Inovação”. O que
se está dizendo é que a capacidade interna não é a única ex-
plicação para o processo inovador, apesar de tradicionalmente
acharmos que sim. E, além disso, não é ela que origina o pro-

41
Explosão da Inovação

cesso de Inovação, mas sim os fatores ambientais.


Aqui surge a primeira grande ruptura no processo de de-
senvolvimento da Inovação trabalhado segundo o modelo da
Explosão da Inovação apresentado neste livro. Enquanto no
modelo tradicional a capacidade da organização ou do indiví-
duo é que são a base para o surgimento da Inovação, no novo
modelo é a influência do meio externo que possibilita o apare-
cimento da Inovação.
Segundo a crença anterior, quanto mais capacitada, com
maior conhecimento e mais criativa for uma empresa, mais
inovadora ela será. Nela, a Inovação acontece simplesmente
pela capacidade da empresa ser criativa, ser inovadora e de-
senvolver novos produtos e serviços que, até então, não exis-
tiam. O estopim do processo acontece no indivíduo (empresa
ou pessoa).
Porém, no modelo da Explosão da Inovação, é a carac-
terística do ambiente que forma a base para o surgimento da
Inovação. Quanto mais hostil e desafiador for um ambiente,
maior a chance de seus participantes recorrerem à Inovação
para prosperar ou para simplesmente sobreviver. Esse tipo de
ambiente costuma ser turbulento, escasso em recursos, com
grande avanço tecnológico, de processos e ideias, com grandes
rupturas, com elevada competitividade e com grande quanti-
dade de informações disponíveis. A Inovação só acontece por-
que o ambiente suscita seu aparecimento.
É importante perceber que não se está dizendo que o am-
biente por si só é capaz de promover a Inovação. Não é o ambien-
te que gera a Inovação. Apenas pessoas, empresas, instituições,
grupos de pessoas, organizações e governos são capazes de tal
feito. Mas o pontapé inicial, a mola incentivadora, a origem do
processo, assim como os motivos e as causas, vêm do ambien-
te. É pela reação ao estímulo do ambiente que o homem age.
A Inovação surge da junção do ambiente com seus problemas,

42
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

da ideia criativa para resolvê-los e da capacidade interna do


homem em colocar essa ideia em prática. Só é possível desen-
volver uma ideia criativa após ela ter sido gerada. E só é pos-
sível conceber a ideia criativa se existir um problema em uma
situação ou em um cenário.
Veja o caso da Petrobras. Nele, é possível constatar que o
ambiente no qual a empresa estava inserida foi determinante
para a geração da Inovação. Em outubro de 1953, o presidente
Getúlio Vargas fundava a Petróleo do Brasil S.A., a Petrobras.
Uma estatal com a missão de desenvolver a atividade do setor
de petróleo no Brasil. Ao longo de sua história, a empresa cres-
ceu sistematicamente, tornando-se líder mundial na produção
em águas profundas e uma das maiores empresas do mundo.
Afinal, como a Petrobras se tornou uma das grandes em-
presas do setor de petróleo e líder mundial na produção em
águas profundas? Por que desenvolveu ao longo dos anos uma
tecnologia que permite a coleta e a extração de petróleo em
regiões marítimas com grande profundidade? Por que ela pes-
quisou e desenvolveu essa competência antes de suas outras
concorrentes, a maioria delas muito maiores e com elevado va-
lor em investimento em pesquisa?
Estudando um pouco a história da companhia, é possí-
vel perceber o quanto o ambiente influenciou essa condição.
Com a fundação da empresa, o sonho do governo brasileiro era
torná-la uma grande produtora de petróleo (e, por consequên-
cia, o país também o seria) para diminuir a importação desse
produto. E, para conseguir isso, a empresa se lançou na busca
de novas reservas pelo país. Porém, um estudo realizado em
1960 por um grupo de 14 geólogos estrangeiros apresentava
dados pessimistas sobre as reservas petrolíferas brasileiras. As
reservas em terra eram poucas e limitadas. Somente com elas
seria impossível o país alcançar uma boa escala de produção.
Era recomendado, portanto, buscar petróleo no mar. A reper-

43
Explosão da Inovação

cussão do relatório foi tão negativa que o geólogo responsável


pelo estudo foi acusado de estar a serviço das multinacionais
estrangeiras.
Porém, o caminho para o aumento da produção do petró-
leo no país estava claro. Em 1964, a Petrobras contratou em-
presas estrangeiras para estudos da extração em água. Quatro
anos depois foi feita a primeira descoberta de petróleo no mar.
O futuro da empresa estava no mar. A limitação proporcionada
pelo ambiente uma vez que o combustível era escasso em terra,
obrigou a empresa a orientar as suas pesquisas nessa direção.
O Centro de Pesquisa e Desenvolvimento (Cenpes), criado em
1963, focava seus estudos em prospecção, perfuração e ex-
tração de petróleo no mar. O Cenpes se tornou, ao longo dos
anos, o centro tecnológico que desenvolveu os processos de
exploração e produção em águas profundas para a Petrobras.
A produção marítima começou de fato em 1973. Em 1974,
foi descoberto o primeiro campo na bacia de Campos, a mega-
bacia que tem hoje aproximadamente 100 mil quilômetros e
concentra a maior parte da produção brasileira. A produção de
petróleo nessa bacia começou em 1977, com a tecnologia de-
senvolvida pelos pesquisadores da Petrobras para a extração a
300 metros de profundidade. No final da década de 1970, 34%
da produção da empresa já era feita no mar.
Ao longo das décadas de 1980 e 1990 foram sendo des-
cobertos novos campos na bacia de Campos, muitos em águas
profundas. Em 1986, a empresa já conseguia perfurar poços a
1.200 metros de profundidade e em 2000 já produzia a 1.877
metros. Em 2003, a empresa passou a operar um campo de
2.691 metros de profundidade e em 2004 bateu o recorde bra-
sileiro ao perfurar um poço de 6.915 metros além do fundo do
mar.
Atualmente, a produção no mar é responsável por apro-
ximadamente 90% da produção nacional de petróleo. A pesqui-

44
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

sa e a produção da Petrobras em águas profundas não devem


parar nos próximos anos. Entre 2007 e 2008, foram descober-
tas novas reservas de petróleo em profundidades superiores a
7 mil metros. Trata-se de uma camada chamada de pré-sal que
deve, no mínimo, dobrar a reserva de petróleo do país.
Assim, a posição invejável que a Petrobras alcançou de
ser a líder mundial em produção de petróleo em águas pro-
fundas é fruto de uma reação da empresa a uma situação do
ambiente. É claro que a posição alcançada também se deve ao
trabalho, às pesquisas e à competência adquirida ao longo dos
anos, mas esse esforço todo foi provocado por uma reação ao
ambiente. Se não fossem os fatores externos (escassez de pe-
tróleo em terra), a empresa, provavelmente, não teria atingido
a posição de liderança em que se encontra hoje.

3.2 O Papel do Ambiente Externo na Explosão da Inovação

O ambiente externo faz o papel do comburente na reação


da Explosão da Inovação. Comburente é a substância que, em
uma combustão, estando no meio externo, reage quimicamen-
te com o combustível, fazendo o calor se propagar.
Na natureza, o principal comburente é o oxigênio pre-
sente no ar. Quanto maior a quantidade desse gás no meio,
maior será a explosão provocada. Sua ausência, por consequ-
ência, inviabiliza a combustão, mesmo quando existe grande
quantidade de combustível presente e calor abundante.
É comum ler em jornais e revistas que algumas flores-
tas estão sofrendo com grandes queimadas. Apesar de muitos
incêndios terem como causa a atividade humana, outros têm
causas naturais. As florestas são áreas suscetíveis a queimadas
pela grande quantidade de oxigênio presente em seu ar. Esse
gás é proveniente da fotossíntese dos organismos vegetais, que

45
Explosão da Inovação

consomem o gás carbônico do ambiente e expelem oxigênio


para a atmosfera. Com o excesso do comburente, qualquer pe-
quena faísca isolada pode dar origem a grandes incêndios.
Por outro lado, na Lua é quase impossível os astronautas
fazerem uma fogueira para se aquecer, devido à baixa quanti-
dade do gás oxigênio no ar lunar. Sem o comburente, o calor
gerado por uma faísca não pode ser propagado.
O ambiente externo tem para a Inovação o mesmo papel
que o oxigênio tem para a combustão: ser o comburente da
reação. O ambiente externo é quem cria as condições para que
o processo da Explosão da Inovação aconteça. Assim como a
presença ou a ausência do oxigênio permite ou evita a combus-
tão, o ambiente externo pode estimular ou não o surgimento
da Inovação.
Por que o homem viajou para a Lua? Pelo espírito de
aventura, para adquirir novas tecnologias a serem usadas mais
tarde em nossa vida cotidiana ou para ganhar conhecimento
do espaço? Na verdade, nenhuma dessas alternativas. Os nor-
te-americanos desenvolveram o programa Apollo para levar o
homem a Lua antes dos soviéticos como forma de propaganda
política do capitalismo. Era uma maneira de mostrar que o ca-
pitalismo americano era melhor do que o comunismo soviético.
Esse era o período da Guerra Fria, onde as duas potências
duelavam em relação a suas ideologias. E se não houvesse a
Guerra Fria haveria viagem à Lua? Provavelmente, não. Ou
se houvesse não seria em 1969. A viagem aconteceria déca-
das depois. Do início do programa Apollo até a viagem à Lua
se passaram apenas oito anos e foram consumidos cerca de
US$25 bilhões, o equivalente a US$100 bilhões nos dias de hoje.
Valores e prazos muito difíceis de serem aprovados se a missão
não fosse prioritária para o país.
Ao mesmo tempo em que o ambiente leva o homem a
inovar, ele também pode influenciar o homem a não inovar.

46
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

Pode-se ter uma grande ideia criativa e ter toda a capacidade


para desenvolvê-la em algo profundamente inovador, mas se
o ambiente externo não fizer a sua parte, essa Inovação pode
demorar muito tempo para se concretizar ou até mesmo nunca
acontecer. Quem nunca teve uma ideia criativa, mas não a ti-
rou do papel ou da mente? Quase todas as pessoas, em algum
momento da vida, passam por isso. A transformação do pen-
samento para o mundo real precisa sim da influência do am-
biente. Porém, quando há pressão, exigência ou imposição do
ambiente externo as chances de o indivíduo colocar suas ideias
em prática são, com certeza, maiores.

3.3 Os Tipos de Ambientes

Existem, metodologicamente, dois tipos de ambientes:


aquele que estimula a Inovação e aquele não estimula a Inova-
ção. O primeiro é chamado de Ambiente Inovador e o segundo
de Ambiente Não Inovador.

Tipos de Ambientes

ambiente Inovador Estimula à Inovação

x
ambiente não Inovador não estimula à Inovação

Ambiente Inovador é aquele que estimula os participan-


tes ou agentes inseridos nele a mudar. Isso ocorre em função
da existência de problemas ou dos desafios impostos. Aqui o
cenário é de elevada hostilidade, o que força os participantes a
encontrar soluções, geralmente por meio de novas ideias, para
os problemas existentes. A mudança é algo latente, necessário

47
Explosão da Inovação

e forçado. As inovações geradas são frutos do instinto de so-


brevivência e são a maneira encontrada para a superação dos
desafios impostos pelo cenário hostil.
Veja o caso da 3M, em que o Ambiente Inovador influen-
ciou e estimulou a empresa a inovar. A 3M é considerada uma
das empresas mais inovadoras do mundo. Sua capacidade de
criar, produzir e comercializar novos produtos é impressio-
nante. A companhia tem uma meta de pelo menos 30% de sua
receita ser gerada pelos novos produtos criados nos últimos
cinco anos. Essa cultura de devoção à Inovação tem raízes his-
tóricas.
Fundada em 1902, na cidade de Crystak Bay em Minne-
sota, nos Estados Unidos, a empresa nasceu a partir de uma
mina. O plano de negócio era extrair coríndon como abrasivo
para ser vendido aos fabricantes de rebolos de esmeril.
Porém, o destino pregou uma peça nos cinco sócios da
3M: a péssima qualidade do produto que era retirado da mina
inviabilizava sua venda. Não se encontrava comprador dispos-
to a adquirir o produto. A empresa passou por sérias dificul-
dades nos primeiros anos e esteve a ponto de falir. Contudo,
para superar esse problema, seus proprietários e os funcioná-
rios encontraram uma solução. A saída era ela mesma produzir
alguns produtos a partir da matéria-prima extraída da mina.
Escolheu-se a lixa e os rebolos de esmeril. Dessa forma, a 3M
saiu da mineração e passou a ser uma empresa de materiais
abrasivos. Foi a primeira grande mudança imposta (pelo am-
biente) na companhia.
A mudança feita naquele momento deu-se, portanto, mui-
to mais por desespero da companhia e necessidade de resolução
de uma situação limite do que por vontade própria ou gosto pela
Inovação. Ou a empresa mudava ou morria. A situação imposta
pelo ambiente (mina com matéria-prima de baixa qualidade e
ausência de compradores) foi determinante para suas escolhas.

48
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

Após se transformar em uma empresa de materiais abra-


sivos, os problemas persistiam. Já com quase dez anos de exis-
tência, a 3M ainda sofria com a baixa qualidade de seus pro-
dutos (afinal, o coríndon usado ainda era de baixa qualidade)
e com a acirrada concorrência que jogava as margens dos pro-
dutos para baixo. Não haveria saída se ela não investisse na
melhoria da qualidade da matéria-prima extraída da sua mina.
Por causa disso, a empresa criou seu primeiro laboratório para
o estudo de novos materiais e da melhoria dos existentes. Per-
ceba que, assim como no exemplo da Petrobras, a criação de
um centro de pesquisa aconteceu para resolver um problema
ou uma dificuldade imposta pelo ambiente à companhia norte-
americana.
Após meses de pesquisa com um mineral artificial, a 3M
lançou seu primeiro produto com sucesso: um novo abrasivo
de tela que trouxe, depois de mais de dez anos, o primeiro lu-
cro para a empresa. O sucesso do novo produto permitiu que
a empresa crescesse nos anos seguintes e se livrasse do risco
de falência. Novos produtos de sucesso foram criados pelo la-
boratório de pesquisa e a 3M se consolidou no mercado de
abrasivos. Porém, por mais criativo que o laboratório fosse, as
possibilidades de uso para as lixas e os rebolos de esmeril fi-
cavam cada vez mais limitadas. Não havia muito que crescer
nesse mercado, e o crescimento da empresa, por consequência,
começou a diminuir.
Para evitar os apuros que marcaram o início da sua histó-
ria, a 3M passou, no início dos anos 1920, a investir em produ-
tos que não fossem lixas. Passou a produzir inicialmente ceras
para carros e, depois, fitas adesivas. O sucesso da fita crepe,
em 1924, fez com que a diversificação para fora do mercado de
materiais abrasivos fosse instituída. Assim, a companhia foi, ao
longo dos anos, diversificando cada vez mais seu portfólio de
produtos. Mesmo mantendo essa força inovadora ao longo das

49
Explosão da Inovação

décadas seguintes, é possível perceber que o que moveu a 3M


para a mudança e para a busca constante pela Inovação foram
as condições do ambiente.
É um equívoco pensar que o Ambiente Inovador seja ca-
paz de fazer “todo o serviço”, ou seja, levar as pessoas e em-
presas a inovar. Este pensamento é muito equivocado. O que
ocorre é que o cenário desafiador e problemático estimula seus
agentes a mudar oferecendo duas possibilidades: ou a mudança
ocorre ou passa-se o tempo todo sofrendo e tendo sua sobre-
vivência ameaçada. É esse o ponto central deste capítulo. Não
se está dizendo que o ambiente gera a Inovação. Quem gera a
Inovação é a capacidade interna das empresas e das pessoas.
A 3M não teria inovado se não fosse a capacidade e a compe-
tência das pessoas que nela trabalharam e trabalham. Mas é o
Ambiente Inovador que propicia, através da hostilidade e dos
desafios impostos, o surgimento de motivos para empresas e
pessoas se mobilizarem para a mudança. O Ambiente Inovador
é aquele que apresenta os problemas para serem solucionados.
Se não houver problema, também não haverá, por consequên-
cia, solução (Inovação).
Nesse sentido, o Ambiente Não Inovador é aquele em que
não há estímulos para que os agentes ou participantes mudem.
Nele não há problemas ou desafios a serem superados. O cená-
rio é extremamente amigável, não havendo nenhum incentivo
à mudança. Há um maior esforço para se manter o ambiente
amigável do que para transformá-lo.
Se o ambiente não exige uma mudança de atitude, de
comportamento, de regras, de produtos e serviços e de for-
mas de trabalho, não há motivo para se buscar algo diferen-
te do que existe. Para que gastar tempo, energia e recursos a
fim de promover uma Inovação em um ambiente que não a faz
prioritária nem necessária? Esse esforço, nesse caso, pode até
ser completamente inútil. Afinal, quem garante que a Inova-

50
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

ção trazida nesse contexto é necessária e vai ser aplicada de


fato? Se o ambiente não a requer, para que vamos utilizá-la?
Pode-se até estar gastando energia e recursos que mais tarde
seriam necessários para adequar-se a um novo ambiente que
exija Inovação como forma de adequação aos novos cenários.
Porém, deve-se tomar muito cuidado com as afirmações
dos dois parágrafos anteriores. Ambientes Não Inovadores
existem, mas são muito raros. Estes se tornam cada vez mais
raros, a ponto de se poder dizer que se encontram em extin-
ção. Afinal, qual é o ambiente que não apresenta nenhum tipo
de hostilidade e desafios? Qual ambiente não sofre mudanças
periodicamente?
O mais comum é encontrar empresas e profissionais que
estejam em tamanho estado de comodismo e paralisia que não
percebem que o ambiente à sua volta está em constante mu-
tação. Eles criam uma bolha ao seu redor para se proteger do
que acontece do lado de fora, mas uma hora essa bolha poderá
se romper e eles sofrerão intensamente com a hostilidade ex-
terna. Não podemos confundir agentes ambientais que criam
bolhas artificiais de proteção com Ambientes Não Inovadores.
São coisas diferentes. Os Ambientes Não Inovadores não exi-
gem qualquer tipo de Inovação dos seus participantes. Por ou-
tro lado, os agentes que se escondem ou fogem dos Ambientes
Inovadores, tentando recriar ambientes falsamente estáveis e
amigáveis, terão sérios problemas em um futuro próximo.
É equivocado, porém, imaginar que existam apenas esses
dois tipos de ambientes: o Inovador e o Não Inovador. Perce-
ba o que foi escrito na primeira linha desse tópico: “existem,
metodologicamente, dois tipos de ambientes”. A metodologia é
uma coisa, a vida real é outra. Na prática, há uma infinidade de
cenários distintos, criados a partir desses dois universos, mas
todos eles permeiam esses dois cenários teóricos.

51
Explosão da Inovação

Tipos de Ambientes

Teoria
ambiente ambiente
não Inovador Inovador

Infinitos ambientes
Prática

É quase impossível um ambiente ser 100% Inovador


ou 100% Não Inovador. Normalmente, os ambientes são uma
variação desses dois, estando em algum ponto à direita do
Ambiente Não Inovador e à esquerda do Ambiente Inovador.
Quanto mais perto de um deles, mais características deste e
menos características do outro ele terá.
O que faz um ambiente ser Inovador ou Não Inovador
são determinados elementos que o compõem. No próximo tó-
pico serão apresentados esses elementos.

3.4 Os Elementos do Ambiente Externo – CRIARE

São seis os elementos que influenciam intimamente a


característica do ambiente. Eles são chamados de CRIARE:
Competição, Recursos, Instabilidade, Acesso à Informação, Ruptu-
ra e Evolução. O conjunto e a combinação do CRIARE é que
apontarão se um ambiente é mais propenso ao surgimento de
inovações ou não. Cada um dos fatores é mostrado a seguir:

52
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

Elementos do Ambiente Externo – CRIARE

Competição
Recursos
Instabilidade
Acesso à Informação
Ruptura
Evolução

A Competição refere-se ao nível de rivalidade que deter-


minado ambiente possui. Quando existem fortes competidores
digladiando-se, temos um ambiente de Rivalidade. Do contrá-
rio, quando não existem concorrentes ou eles são muito fracos,
temos um ambiente de Isolamento.
Os Recursos são os elementos usados pelas empresas ou
pessoas para transformar produtos e efetuar transações co-
merciais. Os ambientes com baixa quantidade de recursos são
classificados como Escassos. E aqueles que apresentam grande
quantidade de recursos são classificados como Abundantes.
A Instabilidade refere-se ao grau de incerteza que as mu-
danças provocam em determinado ambiente. Quando ocorrem
muitas mudanças em um pequeno espaço de tempo, gerando
elevada instabilidade, esse ambiente é Turbulento. Quando
ocorrem poucas mudanças, sem afetar o ambiente, ele é consi-
derado Estável.
O Acesso à Informação, por sua vez, é a quantidade, a
qualidade, a disponibilidade e a facilidade com que os dados
presentes no ambiente são resgatados para uso. Quando um
cenário possui grande quantidade de informações, de alta qua-
lidade e de fácil acesso, o classificamos como um ambiente Ir-

53
Explosão da Inovação

restrito. Mas, quando o ambiente possui pouca variedade de


informações, estas são de baixa qualidade e, ainda por cima, de
difícil acesso, dizemos que esse ambiente é Restrito.
A Ruptura refere-se ao grau de intensidade das mudanças
que um ambiente sofre. Quando ocorre uma mudança radical,
séria e sensível, que altera as bases pelas quais determinadas
empresas ou pessoas interagem, estamos falando de um am-
biente de Revolução. Mas, quando as mudanças não provocam
a ruptura das bases em que se opera, trata-se de um ambiente
de Continuidade.
E, por fim, a Evolução é o grau de progresso que um am-
biente está sujeito a sofrer. Quando a tecnologia, os processos
e os pensamentos e/ou ideias evoluem constantemente, o am-
biente é de Progresso. Por outro lado, quando a tecnologia, os
processos e os pensamentos e/ou ideias permanecem os mes-
mos ao longo do tempo, sem sofrer uma evolução, o ambiente
é de Estagnação.
Neste ponto, pode-se ver que cada elemento, isoladamen-
te, pode afetar o ambiente à sua maneira, formando assim ce-
nários distintos pela sua presença ou ausência parcial ou total.

Relação entre os Elementos do CRIARE

Competição
Isolamento Rivalidade
Recursos
abundância Escassez
Instabilidade
Estabilidade Turbulência
Acesso à Informação
Restrito Irrestrito
Ruptura
Continuidade Revolução
Evolução
Estagnação progresso

54
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

Antes de analisar a combinação entre esses elementos,


é importante discutir cada um dos seis fatores individualmen-
te. Esse detalhamento permitirá uma maior compreensão de
como cada um deles interfere na constituição do ambiente.

3.4.1 Competição

A Competição é o grau de disputa que existe em um am-


biente. O confronto entre os competidores tem como finalida-
de a obtenção dos recursos disponíveis, e vence o embate aque-
le concorrente que conquistar mais recursos. A Competição
torna os rivais mais fortes e preparados para os desafios que o
futuro reserva.
É curioso notar, mas a maioria dos clubes de futebol que
foram campeões mundiais tem pelo menos um grande rival
em sua cidade. Muitos de seus principais adversários munici-
pais também conquistaram o título máximo do futebol, como
no caso de Milan e Internazionale (Milão), Independiente e
Racing Club (Avellaneda), Grêmio e Internacional (Porto Ale-
gre), e Real Madrid e Atlético de Madrid (Madrid). Apenas
Borussia Dortmund, Santos e Feyennord não possuem gran-
des rivais na mesma cidade, tendo como principais adversários
times de outros municípios. Com essa constatação, é visível
que a Competição doméstica fortalece os envolvidos para as
disputas internacionais.
A intensidade da disputa entre os participantes está liga-
da diretamente ao nível de Competição. Quando existem em-
bates fortes e constantes entre os oponentes, considera-se que
o ambiente é de Rivalidade. Mas, quando o mercado, o cenário
ou a situação não apresenta nenhum tipo de confronto entre os
oponentes, considera-se como sendo um estado de Isolamento.
Como acontece com todos os outros fatores, dificilmente um

55
Explosão da Inovação

ambiente é definido como de total Rivalidade ou de total Isola-


mento. A Competição varia entre essas duas situações.

Elemento C – Competição

Isolamento Rivalidade

ambiente sem ambiente com ambiente com


competição média competição total competição

ambiente com ambiente com ambiente com


baixíssima média propensão altíssima
propensão à à Inovação propensão à
Inovação Inovação

Quanto maior a Rivalidade em um ambiente (quanto


mais para a direita estiver no eixo Rivalidade/Isolamento),
maior a propensão para os participantes buscarem a Inovação.
Neste caso, a empresa, a organização e o indivíduo estão condi-
cionados e motivados para se superarem e para superar a con-
corrência. Isso ocorre porque a Competição intensa alimenta
a busca incessante pela vitória e pela conquista sobre o outro.
A ideia que norteia aqueles envolvidos pela Rivalidade é
que é sempre preciso melhorar e estar à frente dos outros. A
busca pela vitória inclui a superação dos próprios limites ou a
descoberta de formas mais eficientes e eficazes de fazer o que
já é feito. Quanto mais intensa é a Rivalidade, maior será a
importância dada a cada detalhe do processo. Cada ponto será
observado, e se houver possibilidade de melhoria, ela será feita.
É importante perceber que a rivalidade não tem nenhu-
ma relação com a quantidade de concorrentes,sendo estabele-
cida pela qualidade da Competição. Muitas vezes, ter um ad-

56
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

versário grande e importante torna a rivalidade maior do que


ter vários adversários pequenos. Mas também o fato de haver
poucos competidores pode determinar o nível de Competição
entre os envolvidos.
Todos os anos, nos dias 28, 29 e 30 de junho, é realizado
o Festival Folclórico de Parintins. Trata-se da Festa do Boi,
como é chamada pelo povo amazonense. O evento, considerado
o maior espetáculo da floresta Amazônica, atrai anualmente
100 mil pessoas que lotam o bumbódromo para ver a apresen-
tação dos conjuntos folclóricos inspirados nas lendas de paje-
lanças indígenas de várias tribos e dos costumes caboclos da
região.
O maior atrativo da festa, porém, está na competição en-
tre os dois bois: o Garantido (vermelho) e o Caprichoso (azul).
A essência do festival é a disputa entre as duas agremiações
pela conquista do campeonato. A rivalidade entre os dois bois é
tanta que as torcidas sentam em locais separados da arquiban-
cada, como em um estádio de futebol. Quando o Caprichoso
se apresenta, a torcida do Garantido fica em silêncio. Quando
é a vez do Garantido se apresentar, a torcida do Caprichoso
se silencia. As pessoas no dia a dia se apresentam como sendo
Garantido ou Caprichoso. Muitas não vestem as cores do rival.
Os preparativos e a confecção das alegorias, das fantasias
e das coreografias têm início meses antes do festival. O ensaio
propriamente dito começa com dois meses de antecedência.
Cada boi possui um quartel general em que os preparativos,
a produção dos materiais e os ensaios são feitos. Os turistas,
o público e os participantes que visitam o Boi-Bumbá ficam
impressionados e saem contagiados com as alegorias repre-
sentadas pelos carros alegóricos, com as fantasias, com o sin-
cronismo das danças e com a música.
O curioso é que a rivalidade entre os dois bois é tanta que
quem ganha é a festa. Cada detalhe da fantasia, da coreografia

57
Explosão da Inovação

e das músicas é levado em consideração. Os ensaios são rea-


lizados à exaustão. O nível técnico do evento é tamanho que
os artistas parintinenses são muitas vezes contratados pelas
principais escolas de samba do Rio de Janeiro e de São Paulo
para assessorá-las no Carnaval. Os artistas e os técnicos do
Caprichoso e do Garantido fornecem consultoria sobre fanta-
sia, efeitos visuais dos carros alegóricos e evolução das escolas
de samba na avenida.
Por que as principais escolas de samba do eixo Rio-São
Paulo têm que trazer profissionais do Amazonas, um estado
tão distante, para enriquecer seu Carnaval? A justificativa é
técnica. Os profissionais envolvidos no Festival de Parintins
são de excelente qualidade, muitos sendo considerados os me-
lhores do Brasil em sua área de atuação. A alta qualificação é
uma consequência natural da grande rivalidade. A rivalidade
que existe em Parintins supera em muito a existente entre as
escolas de samba de São Paulo e do Rio de Janeiro. Vencer o
Carnaval é o objetivo de cada escola, mas perdê-lo é algo que
pode acontecer (na verdade, a probabilidade de derrota é maior
que a de vitória, afinal, entre 12 e 16 escolas participam da
disputa). No entanto, sair da festa do Boi-Bumbá derrotado é
algo que será carregado por um ano inteiro. Ver seu principal
e único adversário ostentar a vitória por doze meses é algo
inimaginável e imperdoável para os fãs do Caprichoso e do Ga-
rantido. A vitória é questão de honra, por isso, o apreço pelos
detalhes e a necessidade de se superar e de superar sempre o
concorrente. Nesse contexto, é natural a exigência pela eleva-
da competência dos profissionais envolvidos e pela excelência
no trabalho feito.
Quanto mais isolado for um ambiente (mais para a es-
querda ele estiver no eixo), menor será a propensão para a
Inovação. Isso ocorre porque o desejo de mudança é alimenta-
do pela ameaça que vem do outro, logo, quando uma pessoa ou

58
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

empresa está sozinha, sem sofrer a influência e a pressão dos


outros, ela não se sente ameaçada e não é impelida de mudar.
Para que mudar algo se não há pressão de outro para isso?
Para que alterar as formas como as coisas são feitas se não há
ninguém influenciando a mudança? Não faz sentido provocar
uma mudança se o cenário é de total isolamento. Nesse caso,
a segurança proporcionada pela manutenção do isolamento é
maior do que as oportunidades provenientes da possível alte-
ração.
Antes da privatização ocorrida em julho de 1998, o país
tinha apenas uma empresa de telecomunicações: a Telebrás.
Sendo a única fornecedora do serviço de telecomunicação, a
companhia não tinha muita pressa nem necessidade de inovar
ou de melhorar seus produtos e processos. Eram comuns nes-
se período filas para a obtenção de linhas de telefone fixo e a
pouca disponibilidade de grandes e caros aparelhos de telefone
celular. A regra era: quem tiver interesse nos produtos e ser-
viços de telecomunicações deve esperar e pagar o quanto for
definido pela Telebrás. Nesse cenário, por que a empresa iria
pensar em melhorar e inovar? Não fazia sentido. Os consumi-
dores não iriam trocá-la por outra nem deixariam de utilizá-la.

3.4.2 Recursos

Os Recursos são usados pelas pessoas e pelas organiza-


ções ao longo da transformação dos produtos até a sua comer-
cialização. Podem ser considerados Recursos as matérias-pri-
mas, o dinheiro circulante no mercado, o tempo, a quantidade
de funcionários disponíveis para se fazer determinados traba-
lhos etc.
O Japão é um país habitado por aproximadamente 130
milhões de pessoas distribuídas em um território formado por

59
Explosão da Inovação

3.900 ilhas. Ele pode ser considerado rico em relação a alguns


Recursos e pobre em relação a outros. Pode-se afirmar que o
Japão possui um grande número de pessoas com educação e
conhecimento científico e tecnológico elevados, além de pos-
suir uma grande frota pesqueira. Por outro lado, o país tem
poucas terras para cultivar (apenas 14% do território) e pou-
cos Recursos naturais, como petróleo e minerais.
Quando o ambiente apresenta baixa quantidade de de-
terminado recurso, ele é considerado Escasso. Mas se o tiver
grande quantidade, ele é tido como Abundante. Condições in-
termediárias ficarão situadas ao longo do eixo horizontal da
figura a seguir.

Elemento R – Recursos

abundância Escassez

ambiente com ambiente com uma ambiente com


muitos recursos quantidade de poucos recursos
recursos mediana

ambiente com ambiente com


baixíssima ambiente com altíssima
propensão à média propensão propensão à
Inovação à Inovação Inovação

A quantidade de Recursos disponíveis em um ambiente


afeta diretamente a vida e as ações dos homens inseridos nele.
Ter muito ou pouco de algo condiciona o comportamento hu-
mano de maneira a obtê-lo, conservá-lo e gastá-lo. Toda cul-
tura local é, em grande parte, originada pela característica dos
Recursos da região.

60
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

A percepção disso é muito clara no caso do japão. Qual é


a consequência da falta de terras para o cultivo de alimentos
para abastecer a grande população japonesa? O uso de cada es-
paço do solo precisa ser muito bem aproveitado. Dessa forma,
as propriedades rurais são pequenas e os agricultores usam a
terra com economia, aproveitando cada pequeno espaço. Eles
plantam o máximo possível em cada hectare e utilizam técni-
cas e maquinário bem sofisticados. É incrível, mas mesmo com
todas as limitações de Recursos, o Japão produz mais de dois
terços das frutas, dos vegetais e do arroz consumidos pela sua
população. Além disso, a cultura japonesa prima pelo não des-
perdício de alimentos e pela valorização do trabalho no cam-
po, que é feito por uma pequena parcela da população. É uma
situação muito diferente, por exemplo, da Índia, onde há uma
grande quantidade de terras cultiváveis, quase 50% do territó-
rio indiano. Por consequência, a maioria das famílias indianas
mora e trabalha no campo, onde se pratica uma agricultura
completamente diferente da do Japão, com técnicas e máquinas
muito simples e tendo como base do trabalho a força humana.
A finalidade da produção é essencialmente abastecer a própria
família. Há níveis elevados de desperdício e a produtividade é
baixa.
Assim, quanto mais escasso em Recursos for um ambien-
te (mais para a direita estiver no eixo Escassez/Abundância),
maior a propensão para a Inovação. Isso ocorre porque, em
ambientes de Escassez, a obtenção dos Recursos pela forma
convencional e tradicional não é suficiente. É necessário muito
esforço e formas alternativas para obtê-los. Quando se preten-
de conseguir grandes quantidades de Recursos, os esforços e a
Inovação na forma de consegui-los deve ser redobrada.
A escassez dos Recursos traz um problema grave para
os participantes do ambiente. Como obtê-los? Essa problemá-
tica suscita naturalmente uma solução, a qual, para ser bem-

61
Explosão da Inovação

sucedida, precisa ser inovadora. Quando uma ideia inovadora


é colocada em prática de forma eficiente, quem está inovan-
do consegue muito mais Recursos do que os demais, forçando
quem não inovou e está tendo agora mais dificuldade em obter
Recursos a inovar também. A falta de Recursos induz a uma
competição desenfreada pela Inovação.
Em 1979, com a interrupção da produção e venda do pe-
tróleo iraniano, o mundo passou pelo que ficaria conhecido
como o Segundo Grande Choque do Petróleo. Nesse período, o
preço médio do barril duplicou, passando de aproximadamente
US$ 40 para US$ 80, em preços de hoje. Com isso, um recurso
que era usado intensamente por todos os países, tornou-se ex-
tremamente caro. O governo brasileiro, que importava a maior
parte do petróleo consumido, ficou em uma situação delicada:
o que fazer visto que a demanda desse produto crescia ano a
ano, estimulada pelo crescimento econômico do país? Parar de
comprá-lo significava interromper o crescimento e comprá-lo
significava acumular um grande déficit nas contas externas. A
solução encontrada foi criar um programa de substituição dos
derivados de petróleo por combustíveis feitos à base de álcool
hidratado, o chamado Pró-Álcool. Além de estimular a produ-
ção do novo combustível, o governo obrigou o acréscimo de
uma fração de álcool anidro (entre 1,1% a 25%) no volume de
gasolina pura. O resultado desse programa foi que o país hoje
é o líder mundial na produção de álcool como combustível,
além de ser dono da melhor tecnologia de produção, distribui-
ção e venda do produto. Muito provavelmente, o país não teria
se dedicado tanto à busca de uma solução inovadora (um novo
tipo de combustível) se não fosse a escassez que o ambiente lhe
impôs.
Quanto mais abundante de Recursos for um ambien-
te (mais para a esquerda ele estiver no eixo), menor será sua
propensão para a Inovação. Afinal, para que se preocupar com

62
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

formar alternativas criativas de se obter algo se o acesso ao


que se quer é fácil? Para que se preocupar com a obtenção
dos recursos se eles são fartos no cenário? Nesse caso, ficar
pensando em formas inovadoras pode prejudicar a coleta de
recursos (afinal, é preciso investir tempo e esforços para se
produzir novas ideias).
Um ambiente com grande quantidade de Recursos leva
naturalmente as pessoas e as empresas inseridas nele ao con-
servadorismo. Quem nunca ouviu dizer que “em time que está
ganhando não se mexe!”.
Imagine duas classes de alunos de faculdades distintas. A
primeira é formada por 45 homens e 5 mulheres. A segunda é
exatamente o oposto: 45 mulheres e 5 homens. Se, além de es-
tudar, todos os alunos quiserem encontrar na própria sala uma
pessoa do sexo oposto para namorar, muito provavelmente te-
remos problemas. As duas classes podem formar apenas cinco
casais cada uma. As demais 40 pessoas de cada uma ficarão
sem namorado. Apesar de a situação ser parecida, ser homem
ou mulher em cada uma delas é sensivelmente diferente. Se
você faz parte do sexo minoritário da classe, sua chance de
namorar é altíssima. Há muito mais pretendentes do que con-
correntes, e seu leque de escolhas é muito alto. É você quem
vai escolher seu par. A obtenção de um namorado ou de uma
namorada, nesse caso, não exigirá tanto esforço da sua parte.
Pelo contrário, provavelmente serão os outros que se esforça-
rão para se relacionar com você. Porém, se você fizer parte do
sexo predominante da classe, sua chance diminui consideravel-
mente. Suas opções de escolha são de apenas cinco candidatos
e a concorrência é de 44 pessoas. Muito provavelmente, seu
esforço para conseguir um namorado ou uma namorada vai ser
maior do que no primeiro caso. Para se destacar em relação aos
outros pretendentes você terá que fazer coisas diferentes para
atrair a atenção e usar a criatividade para conquistar um par.

63
Explosão da Inovação

É importante perceber que não se está dizendo que o am-


biente determina a ação do homem. Há uma teoria humana,
chamada Determinismo, que afirma que o homem é essencial-
mente fruto do meio. Não é isso o que estamos apontando. O
que está sendo abordado é que o meio, a partir do excesso ou
da falta de determinados Recursos, influencia de forma signifi-
cativa a vida humana. Ele não determina, mas influencia.

3.4.3 Instabilidade

A Instabilidade refere-se ao grau de turbulência a que


um ambiente está sujeito. Ela é caracterizada pela constância
com que as mudanças ocorrem em um determinado espaço de
tempo.
Um bom modo para se entender a Instabilidade é fazen-
do uma analogia com aviões. Quando eles voam sem balançar
muito (sem mudar muito sua posição vertical ou horizontal),
pode-se dizer que a viagem está tranquila e estável, ou seja,
sem Instabilidade. Porém, se a viagem é caracterizada por
muitas mudanças de altitude e de rumo, diz-se é instável e tur-
bulenta, portanto, com grande Instabilidade.
A Instabilidade não tem relação com a intensidade das
mudanças, mas com a sua frequência. A intensidade da mu-
dança é outro elemento que compõe a formação do ambiente
externo o que recebe o nome de Ruptura, mas isso será visto
mais adiante. Essa é a principal diferença entre Instabilidade e
Ruptura. Enquanto a primeira se refere a um medidor quanti-
tativo das alterações pelas quais um ambiente passa, a segunda
está ligada a indicadores qualitativos. Pode-se, assim, dizer que
um avião caiu (evento brusco e intenso – grande ruptura com
a situação anterior) mesmo tendo feito uma viagem sem apre-
sentar qualquer Instabilidade.

64
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

O mesmo ocorre com as condições meteorológicas. Se


um dia apresentou muitas mudanças no tempo, começando
com sol, depois chuva, mudando para sol de novo e no fim da
tarde outra chuva, afirma-se que o tempo foi instável. Essa
afirmação não faz nenhuma referência à intensidade da chuva
ou do calor provocado pelo sol, mas aponta apenas a grande
quantidade de variações em um período.
Quando o ambiente passa por mudanças constantes, ele
é classificado como Turbulento. Por outro lado, quando o am-
biente externo não muda, apresentando-se constante ao longo
do tempo, ele é classificado como Estável. Porém, dificilmente
um cenário pode ser caracterizado como totalmente instável ou
totalmente estável. Ele normalmente varia no eixo horizontal.

Elemento I – Instabilidade

Estabilidade Turbulência

ambiente ambiente equilibrado ambiente


totalmente entre instabilidade totalmente
estável e estabilidade instável

ambiente com ambiente com ambiente com


baixíssima média propensão altíssima
propensão à à Inovação propensão à
Inovação Inovação

Quanto mais instável for um ambiente (mais para a direi-


ta estiver no eixo Turbulência/Estabilidade), maior a propen-
são para a mudança e, consequentemente, para o surgimento
da Inovação. Isso ocorre porque, em ambientes de Turbulên-
cia, o cenário externo sofre mudanças constantes, o que força

65
Explosão da Inovação

as empresas, as instituições e as pessoas a acompanharem essas


alterações. Mudanças rápidas e constantes provocam o apare-
cimento de muitas oportunidades e de várias ameaças ao status
quo. Nesse caso, é mais perigoso “ficar parado” do que “movi-
mentar-se para a mudança”. A Inovação ocorre naturalmente
quando se é obrigado a tomar decisões sobre qual caminho
seguir entre as várias opções que surgem no horizonte.
Um exemplo disso é o mercado brasileiro de bancos. Esse
mercado sofria até o início da década de 1990 com o alto índice
de inflação e com os vários pacotes econômicos que governo
estabelecia. O cenário era de grande turbulência. A inflação
corroia diariamente o valor da moeda e as regras econômicas
mudavam constantemente. O que fazer para sobreviver nesse
ambiente? Os bancos partiram para a informatização de seu
sistema. Só com um controle automatizado do serviço bancá-
rio seria possível implantar as alterações de regras geradas
pelo governo e atualizar o valor monetário do capital. Nesse
ambiente altamente instável, a Inovação floresceu e o país pas-
sou a ostentar um dos sistemas bancários mais eficientes do
mundo. Com o fim dos altos índices de inflação e dos pacotes
econômicos em 1994, o ambiente tornou-se parcialmente es-
tável. Nesse momento, vários bancos internacionais tentaram
entrar no mercado brasileiro para competir com os bancos na-
cionais, mas não conseguiram. A vantagem competitiva criada
nos tempos de incerteza e de Instabilidade tornou os bancos
brasileiros muito mais competitivos do que aqueles que esta-
vam acostumados a operar em mercados estáveis.
Quanto mais estável for um ambiente (mais para a esquer-
da ele estiver no eixo), menor será a propensão para a mudança.
Isso ocorre porque quando o cenário externo não muda fal-
tam novas oportunidades para se aventurar pelo desconhecido.
Além disso, as ameaças já são velhas conhecidas e participam
desse ambiente. Assim, é mais garantido aplicar as fórmulas de

66
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

negócios que tiveram êxito no passado (e que provavelmente


darão certo novamente – afinal, nada mudou) do que se arriscar
por algo novo e, possivelmente, incerto.
A indústria canavieira é a atividade legal mais antiga do
país, juntamente com a extração de madeira. Em 1517, alguns
anos depois da descoberta do Brasil, os portugueses já haviam
instalado engenhos de açúcar em terras brasileiras. O nome
engenho era atribuído, não apenas à fábrica de açúcar, mas
a toda a estrutura na qual ela funcionava, incluindo a casa-
grande, a senzala, as terras e as plantações. Nas fazendas, a
cana-de-açúcar era plantada, colhida e espremida, e o caldo
era engrossado e solidificado, para depois secar e se purificar o
açúcar. Nesse momento, o açúcar podia ser colocado em caixas
para ser exportado. O tipo de trabalho usado era prioritaria-
mente escravo – inicialmente com os índios e depois com os
negros.
Os anos foram se passando e a indústria canavieira cres-
ceu ao ponto de se tornar o principal setor da economia brasi-
leira. Já em 1560, o açúcar brasileiro era um item importante
no comércio com Portugal e, durante os séculos XVI, XVII
e XVIII, permaneceu como o principal produto da economia
do país. O lento declínio e a perda de importância desse setor
iniciaram-se na segunda metade do século XVIII e aprofunda-
ram-se durante o século XIX, quando o açúcar foi desbancado
pela produção de café.
Ao longo dos anos, o Brasil transformou-se, industriali-
zou-se e tornou-se urbano. Sua economia cresceu e se diver-
sificou, e as leis trabalhistas foram promulgadas, concedendo
direitos aos trabalhadores. Porém, o cenário do qual os produ-
tores de açúcar faziam parte mudou pouco ao longo dos sécu-
los. Sempre que havia alguma turbulência no setor econômico
ou produtivo do país, o governo se colocava à disposição para
conceder subsídios e regalias. A legislação trabalhista nunca

67
Explosão da Inovação

foi aplicada aos trabalhadores do campo, de modo que o am-


biente em que a indústria do açúcar operava não incentivava
a mudança. Era um Ambiente Não Inovador, no qual nada de
relevante aconteceu ao longo de quase cinco séculos.
Assim, na metade da década de 1990, o setor era visto
como um fiel retrato do Brasil arcaico: um sistema econômico
marcado pelo coronelismo e pela exploração do trabalho semi-
escravo, alheio às leis trabalhistas, produtivamente ineficiência
e recebedor de subsídios e regalias governamentais.
Mas por que a indústria de açúcar não se modernizou até
a metade da década de 1990? Porque não precisou! O ambien-
te sempre foi tranquilo e muito amigável com suas empresas.
Quando alguma coisa ameaçava torná-lo um pouco turbulento,
diversas medidas eram tomadas para mantê-lo estável. A natu-
reza dessa situação podou a geração da Inovação. As empresas
dessa indústria mantiveram as práticas, os processos, os ideais e
a forma produtiva de quinhentos anos atrás porque era confor-
tável para elas. Para que mudar se estava tudo como sempre foi?
É verdade que nos últimos anos esse setor modernizou
-se, passou a incorporar novas práticas de gestão e inovou em
seu processo produtivo, mas a explicação dessa mudança foi a
alteração do ambiente externo. A possibilidade do uso do etanol
brasileiro como alternativa mundial de combustível renovável,
o maior interesse de grandes grupos nacionais e internacionais
em ingressar nesse mercado e o fim dos subsídios governamen-
tais tiraram esse mercado do marasmo em que se encontrava.

3.4.4 Acesso à Informação

O Acesso à Informação é a combinação entre qualidade,


variedade e a facilidade com que os dados podem ser resgata-
dos em um determinado ambiente. A informação é importante,

68
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

pois fornece aos agentes do ambiente o conhecimento e a ca-


pacidade necessária para gerar a Inovação. Em uma metáfora
simples, a informação é para o ambiente o que o sangue é para
o corpo humano. O sangue nutre cada célula do corpo com o
alimento necessário para a sua sobrevivência. Sem ele, as célu-
las morrem. Com ele, elas podem desempenhar normalmente
suas funções. A informação, por sua vez, nutre cada um dos
agentes do ambiente com o conhecimento necessário para o
crescimento e a adaptação ao meio externo. Sem ela, os in-
divíduos ficam fracos e despreparados para interagir com o
ambiente, podendo não sobreviver. Com ela, por outro lado,
os indivíduos se tornam mais preparados para lidar com as
adversidades externas.
É interessante perceber a evolução do Acesso à Informa-
ção ao longo dos séculos. Na Idade Média, todo o conhecimen-
to do povo europeu estava disponível em livros, os quais eram
guardados em bibliotecas dentro de mosteiros. Nesse período,
havia dois problemas para disseminação do conhecimento: a
pequena quantidade de livros e a restrição ao seu acesso. As
obras, para serem produzidas, precisavam ser copiadas à mão,
dando origem a novas cópias dessa obra. Além disso, a leitura
e a consulta desses dados eram privilégios dos religiosos, sen-
do vedada sua apresentação à população. Havia até a categoria
de livros proibidos, chamada INDEX, que tinham sua circula-
ção ainda mais limitada dentro do próprio clero. Não é a toa
que a Idade Média é conhecida como a Idade das Trevas do
conhecimento humano.
No ano de 1455, Gutemberg revolucionou o Acesso à In-
formação ao criar a tipografia, tecnologia em que a impressão
no papel se fazia de forma mecanizada. Dessa forma, aumen-
tou-se a quantidade de meios para a propagação da informação,
pois novas cópias de livros eram produzidas de forma muito
mais rápida. Ao longo das décadas, surgiram outros meios de

69
Explosão da Inovação

informação, como jornais e revistas, que disponibilizavam as


notícias mais rapidamente. Pode-se dizer que, nesse período,
a biblioteca saiu de dentro dos mosteiros e foi para dentro das
casas das famílias.
Mais recentemente, com o advento da Internet, a acessi-
bilidade ao conhecimento humano ficou ainda maior. Mediante
alguns cliques é possível consultar dados e informações sobre
aquilo que se deseja, permitindo uma rápida proliferação do
conhecimento.
Quando um ambiente possui grande quantidade de infor-
mações de alta qualidade e de fácil disponibilidade ele é consi-
derado Irrestrito. Porém, se possui pouca quantidade de dados
de baixa qualidade e de difícil disponibilidade, ele é caracteri-
zado como Restrito. Os cenários que apresentam caracterís-
ticas entre essas duas condições são classificados em algum
ponto entre os pólos do eixo a seguir.

Elemento A – Acesso à Informação

Restrito Irrestrito

ambiente com ambiente com ambiente com


informações informações parcialmente informações
inacessíveis disseminadas disseminadas

ambiente com ambiente com ambiente com


baixíssima média propensão altíssima
propensão à à Inovação propensão à
Inovação Inovação

Assim, quanto mais informações estiverem disponíveis


em um ambiente (mais para a direita estiver no eixo Irrestri-

70
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

to/Restrito), maiores serão as chances de surgimento da Ino-


vação. Afinal, em ambientes ricos em dados e notícias os parti-
cipantes têm a possibilidade de aprender e de crescer cultural e
intelectualmente. Esse ganho de conhecimento é fundamental
para a geração de ideias criativas que alimentarão a Inovação
(mais detalhes sobre esse processo serão descritos no Capítulo
5, “A Ideia Criativa como Faísca da Inovação”).
O conhecimento é a mola criadora da Inovação. Nenhum
grande inovador era leigo no assunto em que se destacou. Leo-
nardo da Vinci, Mozart e Michelangelo inovaram nos campos
de atuação nos quais possuíam vasto domínio e conhecimento.
O Economist Intelligence Unit (EIU) publica periodica-
mente um ranking que mede o grau de Inovação entre os paí-
ses do mundo. No relatório divulgado em 2009 com dados de
2008, os países que lideram a lista são aqueles que possuem
melhores níveis de educação e de liberdade de imprensa. O Ja-
pão, a Suíça, a Finlândia, os Estados Unidos e a Suécia são
os líderes e conhecidos pela excelência na educação (Japão),
na produção acadêmica (Estados Unidos) e na pluralidade da
mídia (países nórdicos). Nas últimas posições estão Líbia, An-
gola, Bangladesh, Nigéria e Vietnã, países com baixa liberdade
de imprensa (Líbia) e péssimo sistema educacional (países afri-
canos e aqueles que saíram de longos períodos de guerra civil).
Quanto menos informações estiverem disponíveis em um
ambiente (mais para a esquerda ele estiver no eixo), menores se-
rão as chances de alguma Inovação acontecer. Afinal, como será
possível ter uma ideia criativa que resultará em uma Inovação
sem se conhecer todas as variáveis de determinado assunto?
Apesar do avanço tecnológico e histórico dos meios de
comunicação, o grau de disponibilidade da informação entre as
regiões do planeta ainda é muito distinto. Em países que são
regidos de forma ditatorial, é comum as informações serem
restringidas e filtradas. Em locais em que a religião exerce

71
Explosão da Inovação

grande poder na vida política, cultural e econômica das famí-


lias, muitos dados e notícias são censurados e proibidos. Em
alguns países é vetada a transmissão da educação e do conhe-
cimento para algumas pessoas, segundo sua casta ou sexo. Em
outras, a desatualização tecnológica e a falta de estrutura bá-
sica, como a inexistência de energia elétrica em algumas regi-
ões, dificulta também a transmissão dos dados. É interessante
perceber que em todas as regiões nas quais há algum tipo de
restrição para a circulação da informação e para a assimilação
do conhecimento, há também baixíssimo nível de Inovação e
de riqueza material acumulada.

3.4.5 Ruptura

O conceito de Ruptura está ligado à intensidade das mu-


danças ocorridas no ambiente. E é caracterizado pela força das
transformações ocorridas. A medição de uma Ruptura é feita
pelo impacto gerado ao ambiente. Quando esse impacto é in-
tenso, ele altera sensivelmente a forma como empresas e indi-
víduos se relacionam com o ambiente.
A vida é cheia de fatos que provocam grandes impactos
em nosso dia a dia. Quando o casal tem seu primeiro filho, sua
vida sofre uma considerável mudança. As rotinas, as preocupa-
ções, as necessidades e os desejos da família são transformados
completamente. O mesmo ocorre quando as pessoas se mudam
de casa ou de cidade, mudam de profissão ou perdem o empre-
go, se casam, ou trocam definitivamente o transporte público
pelo carro próprio. Ao mesmo tempo, há vários fatos que ocor-
rem todos os dias e que não têm um impacto tão considerável
no futuro das pessoas: a cor da camisa usada em uma reunião,
a caneta escolhida para assinar um papel, o peso do pãozinho
que foi comprado e mais um capítulo da novela que passou na

72
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

televisão. Esses fatos têm graus de impacto bem menores em


nossa vida se comparadas com os primeiros que foram relacio-
nados no início desse parágrafo.
Assim, a Ruptura tem relação direta com a intensidade
das mudanças e não com a sua frequência ou a sua evolução.
Em outras palavras, uma grande Ruptura pode ser um fato
que aconteceu apenas uma vez e provocou consequências por
um bom tempo na vida do indivíduo ou dos indivíduos rela-
cionados ao fato. Essa é a diferença entre Ruptura e Instabili-
dade, que vimos anteriormente. Já o que diferencia a Ruptura
da Evolução (que será apresentada a seguir) é que, enquanto a
primeira por si só muda completamente o ambiente, a segunda
o altera aos poucos. A Ruptura é uma grande mudança, en-
quanto a Evolução é formada por um conjunto de mudanças
menores.
Quando um fato transforma completamente a condição e
a dinâmica de um ambiente, ele é considerado uma Revolução.
Entretanto, quando o fato não gera nenhum impacto e conse-
quência nos cenários à sua volta, ele é tido como um ambien-
te de Continuidade. Os ambientes intermediários entre essas
duas condições variam entre os dois eixos horizontais.

73
Explosão da Inovação

Elemento R – Ruptura

Continuidade Revolução

ambiente com ambiente com ambiente com


mudanças mudanças de mudanças
insignificantes intensidade média significantes

ambiente com ambiente com ambiente com


baixíssima média propensão altíssima
propensão à à Inovação propensão à
Inovação Inovação

Quanto mais intensa e impactante for a transformação


gerada em um ambiente (quanto mais para a direita estiver
no eixo Revolução/Continuidade), maior a propensão para a
Inovação brotar. A Inovação acontece nesse caso porque as
mudanças provocadas no ambiente alteram completamente a
ordem das coisas. Muito do que era feito anteriormente, tan-
to na forma quanto na intensidade, não pode mais ser feito.
O novo cenário exige adaptação e, para tanto, surgem novas
ideias e pensamentos.
O início da década de 1970 foi traumático para a cidade
de São Paulo, com duas tragédias que marcaram para sem-
pre a história dos paulistanos. Em fevereiro de 1972, o edifí-
cio Andraus pegou fogo, matando 16 pessoas e ferindo 336.
Exatamente dois anos depois, outro edifício, o Joelma, sofreu
também um grave incêndio. O número de vítimas dessa vez foi
maior: 188 mortos e 345 feridos. As imagens de pessoas se ati-
rando do alto dos prédios, fugindo desesperadas das chamas,
de bombeiros sem equipamentos e sem estrutura para comba-
ter um incêndio de tamanhas proporções e de hospitais sem

74
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

preparo para receber tantos pacientes em estado tão grave de


saúde chocaram a opinião pública. Esses acidentes puderam
mostrar para a população da cidade o quanto elas corriam pe-
rigo de vida em prédios e construções sem nenhum sistema de
segurança. A comoção foi tamanha, que, uma semana após o
acidente do Joelma, o então prefeito da cidade, Miguel Colas-
suono, criou decretos municipais instituindo normas de segu-
rança em edifícios. Ao longo dos anos, as normas e os órgãos
municipais de segurança predial foram se aprimorando, e hoje
a cidade corre menos riscos de sofrer incêndios sistemáticos
do que no início da década de 1970. Dessa forma, as tragédias
ocorridas no Andraus e no Joelma foram eventos decisivos para
a mudança da mentalidade coletiva que culminou na maior pre-
ocupação da população e dos órgãos públicos, e na criação de
normas para a segurança em edifícios.
Porém, é importante perceber que uma Ruptura não é ne-
cessariamente um evento ruim. Ela pode ser um evento posi-
tivo também. A descoberta da América, por exemplo, mudou
consideravelmente a forma de os países europeus enxergarem o
mundo e de se organizarem de forma social, política e cultural.
Os exemplos de rupturas no mundo dos negócios são va-
riados. O fim da reserva de mercado foi um divisor de águas
no mercado nacional de informática. O fim da inflação mudou
a forma como as empresas de varejo operavam e trabalhavam.
A privatização do sistema Telebrás mudou radicalmente a for-
ma como o mercado de telecomunicações operava. A criação
da União Europeia alterou a dinâmica de negócios na Euro-
pa e o NAFTA (North American Free Trade Agreement ou
Acordo de Livre Comércio das Américas) permitiu a entrada
dos produtos mexicanos nos mercados norte-americano e ca-
nadense. Cada uma dessas rupturas mudou consideravelmente
o ambiente em que as empresas viviam, forçando-as a inovar
em algum ponto.

75
Explosão da Inovação

Quanto menor for a força de uma mudança no ambiente


(quanto mais para a esquerda ela estiver no eixo), menor será a
chance de a Inovação ocorrer. Isso acontece porque o ambiente
não se alterou. Os agentes inseridos nesse ambiente já estão
adaptados à sua dinâmica e acostumados aos seus problemas;
não são forçados a se adaptar ou a superar os desafios, afinal,
estão familiarizados com eles.
O serviço principal de um posto de gasolina se mantém
igual ao que sempre foi: colocar combustível no tanque dos
veículos. Apesar da criação das lojas de conveniência como
um negócio à parte e da melhoria significativa nos serviços de
atendimento aos clientes, os postos de gasolina mantém ba-
sicamente a mesma lógica de processo, sendo que o procedi-
mento de abastecimento é praticamente o mesmo. Não houve
grandes novidades nas últimas décadas cujo impacto causas-
se mudanças na forma como esse negócio opera. Por certo, o
surgimento de carros elétricos e híbridos gerará mudanças no
perfil e no processo principal dos postos de abastecimento.

3.4.6 Evolução

A Evolução são as mudanças tecnológicas, culturais, de-


mográficas, econômicas, sociais e ambientais que acontecem
em um ambiente ao longo do tempo. Acompanhando essas mu-
danças em uma linha histórica, é possível ver um constante de-
senvolvimento e constatar que elas acontecem sucessivamente
e que seu conjunto é inter-relacionado. Uma mudança é fruto
de outras, por sua vez, origina novas mudanças. O conceito de
Evolução não quer dizer necessariamente melhoria ou enri-
quecimento, mas representa a mudança evolutiva de algo, seja
positiva ou negativa.

76
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

O ser humano como o conhecemos é fruto de várias adap-


tações e mudanças ocorridas ao longo da história. Há milhões
de anos, nossos ancestrais eram quadrúpedes e viviam essen-
cialmente em árvores. À medida que começaram a viver mais
no solo, passaram a ter uma postura mais ereta, tornando-se
bípedes. A vida no solo abriu novas oportunidades e perigos.
Sem a necessidade de usar os membros superiores para an-
dar, passaram a utilizá-los para criar e manusear ferramentas
simples. Com o passar dos milhares de anos, os homens come-
çaram a fabricar instrumentos de pedra e descobriram o uso
do fogo. Os grupos humanos foram crescendo em quantidade.
Com bandos maiores, a linguagem foi se aprimorando. E com
mais ferramentas e maior domínio sobre os outros animais, já
era possível criá-los para prover alimentação. A agricultura
foi desenvolvida e os grupos humanos fixaram-se em regiões
específicas. Agora não havia mais a necessidade de emigrar
constantemente nem de caçar para se alimentar. Dessa forma,
os grupos humanos aumentaram consideravelmente e um sis-
tema de códigos sociais e de comunicação foi criado. Surgem,
então, a escrita e as primeiras civilizações.
Não é possível falar de civilização sem falar de escrita.
Nem é possível entender o surgimento da escrita sem com-
preender que o número de homens vivendo juntos aumenta-
va. Isso era consequência da agricultura, que só foi possível
por causa da criação de instrumentos sofisticados, que, por sua
vez, estava ligada ao fato de a postura do homem ter se torna-
do ereta. Isto, por fim, tem relação com o fato de o ser humano
ter deixado de viver em árvores e passado a andar no chão.
Uma coisa está relacionada à outra. Trata-se de uma linha his-
tórica de mudanças que, em longo prazo, provocaram grandes
transformações.
Veja que há grande diferença, portanto, entre o conceito
de Evolução e de Instabilidade. Evolução tem a ver com um

77
Explosão da Inovação

conjunto de mudanças relacionadas que levam a algum lugar.


Instabilidade tem a ver com mudanças antagônicas que não
necessariamente levam a algum lugar. Na Evolução, é possível
dar dois passos e chegar a um novo lugar. Na Instabilidade, dá-
se um passo para lá e outro para cá, terminam no mesmo lugar
ou próximo de onde se estava.
Quando os elementos tecnológicos e socioculturais mu-
dam sensivelmente surge um ambiente de Progresso. Mas,
quando esses elementos não apresentam mudanças significati-
vas em relação a um determinado passado existe um ambiente
de Estagnação. Como acontecem com os outros elementos que
compõem o ambiente externo, é difícil encontrar um cenário
em que haja 100% de progresso, assim como um que apresente
100% de estagnação. O mais comum é encontrarmos cenários
intermediários entre os eixos horizontais.

Elemento E – Evolução

Estagnação progresso

ambiente sem ambiente em ambiente em


nenhuma uma evolução constante
evolução média evolução

ambiente com ambiente com ambiente com


baixíssima média propensão altíssima
propensão à à Inovação propensão à
Inovação Inovação

Quanto mais mudanças inter-relacionadas acontecerem


em um ambiente (quanto mais para a direita estiver no eixo
Progresso/Estagnação), maiores as chances de a Inovação

78
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

acontecer. Como o ambiente sofreu sucessivas alterações, uma


nova situação se faz presente. Ao viver nessa nova condição, os
participantes precisam primeiro se adaptar e, depois, começar
a utilizar as novidades da forma mais prática e inteligente pos-
sível. Quando isso é feito, o novo passa a interagir com antigos
elementos do ambiente e, a partir desse choque, novos produ-
tos, processos e ideias vão sendo criados por meio da combina-
ção entre o novo e o antigo.
Um exemplo disso é o comércio eletrônico. No final da
década de 1980 e no começo da de 1990, o computador pessoal
passou a ser usado com mais intensidade nos escritórios como
ferramenta de trabalho e em casa como mais um aparelho de
lazer, estudo e entretenimento. Com o surgimento da Internet,
essas máquinas passaram a ser usadas para a comunicação e
para o acesso a conteúdos em páginas chamadas de websites.
Não demorou muito e alguém teve a ideia de vender produtos
pela Internet. Criaram-se websites em que o consumidor podia
escolher alguns produtos e efetuar o pagamento por meio de
cartão de crédito. Com isso, estava criado o comércio eletrôni-
co. Mas, como isso foi possível? Como alguém teve a ideia de
comercializar produtos pelo computador (Internet)? Na ver-
dade, isso foi um passo natural. Se o uso dos computadores
por pessoas não fosse disseminado, não seria possível criar a
Internet. Sem a Internet não seria possível criar websites. Com
a existência dos sites, foi possível criar uma infinidade de uso
para eles: educação, controle de dados e informações, redes de
relacionamento, propaganda institucional, canais de notícias,
formas de comunicação etc. O comércio eletrônico foi apenas
mais um dos usos dos websites. Seu nascimento foi a junção de
uma ideia antiga (loja) com uma nova (Internet). Se perceber-
mos, todas as outras ideias mencionadas antes são ligações de
algo antigo com uma nova ferramenta.

79
Explosão da Inovação

Quanto menos mudanças inter-relacionadas um ambiente


tiver (quanto mais para a esquerda ele estiver no eixo), menor
será a chance de a Inovação acontecer. Isso ocorre porque quan-
do o cenário externo não muda faltam estímulos para se aventu-
rar pelo desconhecido. Essa permanente estagnação do ambien-
te é um empecilho para o surgimento de novas ideias, que, por
sua vez, não poderão entrar em contato com as ideias antigas e
originar as novas, e o ciclo para a Inovação fica obstruído.
A extração de ouro em países da América do Sul e da
África possui, hoje, um processo de coleta de minério exata-
mente igual ao que existia nos séculos anteriores. Na maioria
desses países, não há uma política explícita que normatize essa
atividade. O garimpeiro é um trabalhador simples, sem estudo
e que não possui vínculo empregatício. Os garimpos costumam
funcionar com infraestrutura precária, o que gera graves pro-
blemas sociais. Os procedimentos de segurança e saúde tam-
bém são mínimos, e a perfuração dos túneis é feita normal-
mente de forma rudimentar e sem um sistema adequado de
ventilação. O impacto ambiental provocado pelo uso ilegal de
mercúrio que é liberado nos rios, no solo e no ar é grande.
Visitar um garimpo típico hoje é retroceder algumas dezenas
de anos; essa é uma atividade que ficou parada no tempo. Não
dizemos aqui que uma Inovação não pode ocorrer em um am-
biente Estagnado. O que afirmamos é que a chance disso ocor-
rer é menor. A Inovação, neste caso, é mais difícil e demorada,
afinal, o ambiente Estagnado leva seus participantes a um es-
tado de conforto e de previsibilidade. Todos sabem o que vai e
o que não vai acontecer no ambiente.

80
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

3.5 Relação Entre os Elementos e os Tipos de Ambiente

Até aqui, vimos a análise individual de cada um dos


elementos do ambiente externo, também chamados de
CRIARE. Porém, quando se pretende caracterizar o ambiente
como sendo Inovador ou Não Inovador, não se pode analisá-
los de forma individual, pois eles não agem sozinhos. Os
elementos se relacionam e se influenciam mutuamente uns aos
outros. Um cenário, por exemplo, com recursos escassos pode
levar a alta rivalidade. Um mercado que sofre com rápidos e
constantes progressos pode apresentar turbulências por conta
dessa situação. Em outro caso, o acesso à informação pode ser
restrito como consequência da continuidade histórica.
No tópico anterior, a análise foi feita individualmente por
conta da facilidade pedagógica da explicação, mas o correto é
sempre analisar em conjunto o CRIARE, formado pelos ele-
mentos Competição, Recursos, Instabilidade, Acesso à Infor-
mação, Ruptura e a Evolução.

Relação entre os Elementos do CRIARE

Competição
Isolamento Rivalidade
Recursos
abundância Escassez
Instabilidade
Estabilidade Turbulência
Acesso à Informação
Restrito Irrestrito
Ruptura
Continuidade Revolução
Evolução
Estagnação progresso

Para se chegar a uma conclusão rica e fidedigna dos fa-


tos, é essencial tomar três cuidados. O primeiro é envolver um

81
Explosão da Inovação

conjunto de pessoas que entendam profundamente do cenário


analisado, que possuam uma visão abrangente e histórica de
como ele funciona. O segundo é valer-se da comparação com
outros cenários. Essa relação é o instrumento de balizamento
do nível de cada um dos elementos do CRIARE, o que só se
pode compreender quando se compara com o nível de outras
situações. Para isso é sugerida, muitas vezes, a participação de
pessoas de fora desse mercado para contribuir com análises
mais gerais. O terceiro é sempre contar com pelo menos uma
pessoa que conheça e domine os conceitos do modelo da Ex-
plosão da Inovação.
O tipo de ambiente, portanto, é o resultado da combi-
nação dos seis elementos do CRIARE. Após estudo, análise e
discussão de como os elementos agem e interferem em deter-
minado ambiente, deve-se classificá-los em uma escala de -3
(quando estiver totalmente à esquerda) a +3 (quando estiver
totalmente à direita). Veja o modelo a seguir.

Modelo de Diagnóstico do Ambiente Externo – CRIARE

82
O AMBIENTE EXTERNO COMO COMBURENTE DA INOVAÇÃO

Vamos imaginar que um determinado cenário ou merca-


do foi analisado e a conclusão que se chegou foi que ele conta
com altíssimo grau de rivalidade entre os concorrentes (+3),
quantidade disponível de recursos intermediária (0), alto ní-
vel de turbulência (+2), acesso às informações praticamente
irrestrito (+3), sofreu recentemente uma grande ruptura (+2),
mas é basicamente estagnado (-1). Essas informações devem
ser colocadas na tabela, como mostra a próxima figura.

Diagnóstico CRIARE
(Comburente – Ambiente Externo)

Com essas informações é possível montar o Gráfico do


Comburente, que é do tipo “teia de aranha” ou “radar”. É esse
gráfico que aponta, definitivamente, se o ambiente estudado é
Inovador ou Não Inovador.

83
Explosão da Inovação

Gráfico do Comburente

E R

R I

O ambiente externo é Inovador quando o gráfico apre-


senta uma grande área interna. Se a área interna for pequena,
significa que ele não estimula com tanta intensidade a Inova-
ção. No exemplo em questão, pode-se concluir que há um am-
biente Inovador. É verdade que a parte preenchida não ocupa
todo o espaço reservado para ela, mas ocupa uma parte signi-
ficativa do espaço disponível.
Normalmente, a diferença entre ser Inovador ou Não Ino-
vador está ligada à comparação entre ambientes diferentes. Um
determinado ambiente pode ser mais inovador (com uma área
no Gráfico do Comburente maior) quando comparado a um se-
gundo, mas pode ser menos inovador (com uma área no Gráfico
do Comburente menor) quando comparado a um terceiro.

84
Capítulo 4

A Capacidade Interna
como Combustível da Inovação

85
Explosão da Inovação

No capítulo anterior, vimos que o Ambiente Externo ins-


tiga as pessoas e as empresas a mudar, a procurar algo novo, a
inovar para crescer ou para sobreviver. Porém, o ambiente tem
um poder limitado sobre a promoção da Inovação. Ele pode
instigar, exigir e até forçar as mudanças, mas não realiza dire-
tamente a Inovação. Quem a promove, de fato, são as pessoas,
as equipes e as instituições. São elas que se mobilizam para
transformar seus produtos, serviços, processos e modelos de
negócio com o intuito de ganhar vantagem competitiva e des-
taque no cenário desafiador.
Ter esse poder de transformação é essencial para a con-
cretização da Inovação. Mas por que em alguns casos os in-
divíduos e as organizações conseguem aproveitar o ambiente
inovador ao seu redor e promover grandes mudanças e, em
outras situações, acabam sendo “engolidos” pelas condições
adversas do mundo externo? Há alguma diferença em relação
à habilidade, à postura ou ao comportamento nas duas situa-
ções? O que faz uma empresa ter capacidade de desenvolver a
Inovação e outra não, mesmo quando ambas estão no mesmo
ambiente?
Normalmente, imagina-se que a habilidade de promover
a Inovação está ligada apenas à capacidade de gerar ideias cria-
tivas. Nessa concepção, quanto mais ideias forem criadas, mais
Inovações surgirão. Portanto, se alguém promover a geração
de um grande banco de ideias em sua empresa e conseguir que
todos os funcionários, clientes, consumidores, fornecedores e
parceiros participem ativamente, com certeza conseguirá pro-
dutos e serviços inovadores.
A realidade, porém, não é tão simples assim. A fórmula
“muitas ideias = Inovação” não é necessariamente válida. Há
casos em que é possível inovar com apenas uma ideia e outros
em que várias ideias não produzem nenhuma Inovação.
Isso ocorre pela diferença entre intenção e realização.

86
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Afinal de contas, quantas vezes você teve uma boa ideia, mas
não a colocou em prática ou não soube viabilizá-la? Pense.
Provavelmente, várias vezes. Uma grande ideia criativa é algo
fundamental para a Inovação, mas não é tudo. É necessário
que a pessoa ou a empresa tenha capacidade para “pegar” essa
ideia e torná-la real. Ela precisa transformar algo que está no
plano conceitual, trazendo-o para o mundo concreto. A essa
competência, que pode ser inata ou desenvolvida por pessoas
e empresas, damos o nome de “capacidade interna”. É ela que
desenvolverá a Inovação.

4.1 A Capacidade Interna como Motor da Inovação

A Capacidade Interna é, ao mesmo tempo, o motor e a


base estrutural que leva alguém a promover a Inovação a par-
tir das necessidades impostas pelo mundo externo. Esse motor
é constituído de determinadas características que afetam dire-
tamente o comportamento e as habilidades do agente inova-
dor. E essa base estrutural é formada por sistemas e processos
que condicionam a realização do projeto de Inovação.
Conseguir viabilizar uma ideia não é algo fácil e simples.
Requer muito planejamento, estudo e dedicação. É necessário
aliar as capacidades analíticas, estratégicas e operacionais. Ou
seja, é fundamental haver uma estrutura por trás, dando sus-
tentação e estímulo para a realização do projeto.
Desenvolver uma Inovação é um plano longo, complexo e
arriscado. A análise de um exemplo dado no capítulo anterior,
permite-nos constatar esse fato. Os europeus, no final do sécu-
lo XV, lançaram-se ao mar em grandes expedições em busca de
uma nova rota comercial para as Índias devido ao fechamento
da rota terrestre por Constantinopla. Curiosamente, porém,
não foram as cidades-estados italianas de Gênova e Veneza,

87
Explosão da Inovação

que até então dominavam a tecnologia naval, que se destaca-


ram. O natural seria que elas encontrassem novos caminhos
pelo mar com mais facilidade, mas quem conseguiu, de fato,
promover a Inovação foram dois países até então inexpressi-
vos do continente: Espanha e Portugal. A capacidade desses
dois pequenos estados se mostrou muito superior à dos demais
para a promoção dessa Inovação.
Portugal, quase um século antes de alcançar suas mais
bem-sucedidas campanhas navais, fundou um centro de es-
tudos e pesquisa marítima. Instituída em 1414, a Escola de
Sagres reuniu os melhores cartógrafos, matemáticos, astrôno-
mos, construtores de navios e pilotos da época. Quase todos
vieram de Gênova e Veneza, e foi desse centro de excelência
que saíram as principais tecnologias marítimas portuguesas
que permitiram suas grandes viagens.
Nesse período, Portugal e Espanha eram os únicos esta-
dos europeus com um poder real central. A ambição dos reis
de aumentar suas terras foi decisiva para a empreitada. Além
disso, os dois países contavam com o patrocínio da Igreja Ca-
tólica, a entidade mais rica e poderosa da Idade Média. Era a
Igreja que financiava as expedições marítimas com o objetivo
de conseguir mais adeptos nas novas terras descobertas. Por
fim, havia uma população pobre que enxergava nos salários e,
principalmente, na comissão proveniente da venda da carga
trazida incentivos maiores do que os riscos expostos pela via-
gem em si.
Quando misturamos todos os ingredientes, fica fácil en-
tender o porquê de esses países terem dominado os mares no
início da Idade Moderna. Os reis tinham autonomia para de-
cidir pelos projetos marítimos. A Igreja os patrocinava, ofere-
cendo o capital necessário. Grande parte da população estava
motivada a participar de alguma forma, fosse indo nas viagens
ou esperando os viajantes. Havia sido adquirida competência

88
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

para realizar as viagens e fora criado um sistema econômico e


social em torno delas. Assim, com a combinação desses ele-
mentos (autonomia, capital, motivação, conhecimento e siste-
ma), nada mais natural que a realização das missões marítimas
e a descoberta de novas rotas comerciais para as Índias!
A Capacidade Interna é, portanto, a condição que a em-
presa ou a pessoa tem para estruturar e executar a Inovação.
Ela não acontece por acaso, simplesmente porque alguém quer
ou precisa, mas surge quando existe uma condição ambiental
propícia e quando se tem uma composição interna apropria-
da para gerá-la. Essa estrutura permite o desenvolvimento de
um processo planejado e integrado que resultará em produ-
tos inovadores. Nenhuma Inovação surge por sorte, tampouco
é possível desenvolver várias Inovações de forma sistemática
sem que haja um esqueleto organizacional ou pessoal que leve
a essa situação.
Thomas Edison é considerado um dos maiores invento-
res do final do século XIX e do começo do século XX, junta-
mente com Henry Ford e Graham Bell. Ele criou uma série de
produtos como o gramofone, a lâmpada elétrica, o projetor de
cinema, o fonógrafo, entre outros. Mas, afinal, o que Thomas
Edison tinha de tão especial para inventar tantos produtos re-
volucionários? A resposta correta é a capacidade interna.
Ele tinha uma fábrica exclusiva para desenvolver esses
produtos. Nela, havia pranchetas de trabalho, livros, materiais
elétricos e químicos para serem usados em experiências, ma-
teriais de apoio e ferramentas, entre outros instrumentos. Ele
também contratou um grupo de engenheiros que passavam o
dia pensando em soluções para diversos problemas cotidianos.
Sua equipe era formada por jovens talentosos, profissionais
experientes, e pessoas empreendedoras e motivadas. Nessa
fábrica de invenções, eles podiam trabalhar em grupo e en-
contrar as mais variadas soluções para um mesmo problema.

89
Explosão da Inovação

Eles se preocupavam em desenvolver novos produtos e melho-


rar aqueles já existentes. Também recebiam parte do dinheiro
oriundo da venda de seus inventos.
Pode-se reparar, portanto, que por trás do conjunto de
invenções de Thomas Edison e sua equipe havia uma estrutu-
ra e uma metodologia de trabalho que permitiu o surgimento
desses novos produtos. Eles possuíam um local próprio para o
estudo e para a pesquisa. Havia incentivo ao mérito e partici-
pação nos resultados alcançados provenientes das descobertas.
A equipe de Thomas Edison tinha um processo de trabalho
que se desenvolveu ao longo do tempo. Eles trabalhavam em
equipes integradas e compartilhavam ideias e soluções. Fica
claro que as invenções que desenvolveram vieram, em grande
parte, dessa capacidade interna superior.

4.2 O Papel da Capacidade Interna na


Explosão da Inovação

No modelo da Explosão da Inovação, a capacidade inter-


na age como combustível. Em uma explosão, o combustível,
que pode ser papel, galhos de madeira, álcool, gasolina etc., é o
elemento que faz a faísca reagir com o comburente, propagan-
do-se no ambiente.
O combustível permite que a reação química se propa-
gue, ganhando dimensão. Além disso, ele faz com que o fogo se
mantenha vivo por mais tempo. Quanto mais galhos de madei-
ra estiverem presentes em uma fogueira, mais tempo ela ficará
acesa. E quanto melhor a qualidade do combustível, mais in-
tenso será o fogo. Se os galhos estiverem molhados, por exem-
plo, o fogo não será tão forte. Mas se os galhos estiverem bem
secos, o fogo será mais forte e, muito provavelmente, durará
um tempo maior.

90
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Uma bituca de cigarro jogada dentro de um rio tem pou-


ca chance de resultar em uma explosão ou de se transformar
em fogo. Mas, se a alguns metros dali, outra bituca, muitíssimo
parecida com a primeira, for jogada perto de uma bomba de
um posto de gasolina, o efeito pode ser violento, gerando uma
grande explosão. Afinal, qual a diferença entre os dois casos?
Em ambos, a faísca é a mesma, uma pequena chama. Nas duas
situações, o comburente (oxigênio) também é o mesmo. A dife-
rença está, portanto, no combustível.
No primeiro caso, não há nenhum material que faça a fa-
ísca se propagar. A água do rio evita que isso aconteça, apagan-
do rapidamente o fogo presente na bituca do cigarro. Mas a
gasolina presente na bomba do posto fornece a condição ideal
para a explosão. Além de ser inflamável, a grande quantidade
de gasolina presente normalmente nesse tipo de local permi-
te que a pequena chama se propague com intensidade. Assim,
mesmo havendo uma pequena concentração de fogo, a gran-
de quantidade de material inflamável potencializará a reação e
provocará uma grande explosão.
Esse é o motivo que torna lojas de fogos de artifício, ca-
minhões que transportam álcool e plataformas de extração de
petróleo locais tão perigosos. E este mesmo fato é que torna os
acidentes em corridas de automobilismo mais perigosos quan-
do os carros estão com o tanque cheio. Em 1976, na segunda
volta do Grande Prêmio da Alemanha, o campeão mundial do
ano anterior e líder até então daquele campeonato, Andreas
Nikolaus Lauda, mais conhecido como Niki Lauda, perdeu o
controle da sua Ferrari e bateu no guard-rail, rodando segui-
damente. Como naquela época os carros largavam com todo
o combustível que seria utilizado durante a corrida (não era
permitido o reabastecimento), o tanque de combustível da Fer-
rari estava cheio de gasolina. Por conta disso, o impacto da
batida provocou um grande incêndio. Alguns pilotos conse-

91
Explosão da Inovação

guiram parar e socorrer Lauda. Eles tiraram rapidamente o


campeão de dentro do carro, que estava envolto em labaredas,
e o resgate rápido permitiu que ele não fosse carbonizado. Com
graves queimaduras no rosto, nas mãos e nos braços e a que-
bra de uma clavícula, Niki Lauda precisou passar por vários
tratamentos de reabilitação. Apesar de ficar com a face defor-
mada pelo horrível acidente, o austríaco surpreendeu a todos
com sua rápida recuperação. Já no final daquele mesmo ano
ele voltou às pistas e em 1977, no ano seguinte, foi bicampeão
mundial. Sete anos mais tarde, depois de um período de ina-
tividade, Lauda voltou a ser campeão pela terceira vez, agora
na McLaren. Mesmo assim, o acidente que ele teve no circuito
alemão de Nurburgring poderia ter sido menos grave se não
houvesse tanto combustível em seu carro. Se o mesmo acidente
tivesse ocorrido nas duas últimas voltas, provavelmente o car-
ro do austríaco nem teria se incendiado ou o fogo não teria se
alastrado tanto.
A capacidade interna de uma pessoa, de uma equipe ou
de uma empresa tem a mesma propriedade em relação à Inova-
ção que o combustível tem em relação à reação explosiva. Em
outras palavras, dependendo da capacidade interna, pode-se
promover ou não a Inovação.
É a capacidade interna que permitirá que uma ideia criati-
va seja desenvolvida, transformando-a em produtos e serviços
inovadores. A partir de um ambiente hostil e problemático, são
as pessoas e as organizações que poderão superar as limita-
ções e os desafios a elas impostos. Quando há competência para
transformar e mudar as coisas, a Inovação surge naturalmente.
Mas quando não existe a habilidade para transformar nem al-
terar as coisas ao redor, a Inovação nunca virá, por maior que
seja o esforço.

92
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

4.3 Tipos de Empresas

Há, teoricamente, dois tipos de empresas: as que conse-


guem promover a Inovação e são chamadas de Empresas Ino-
vadoras e as que não conseguem e são chamadas de Empresas
Não Inovadoras.

Tipos de Empresas

Empresa Inovadora promove à Inovação

x
Empresa não Inovadora não promove à Inovação

A Empresa Inovadora é aquela que possui determina-


das características e competências que facilitam a promoção da
Inovação. Algumas de suas habilidades facilitam o processo de
desenvolvimento de projetos, trabalhos e atividades que resul-
tam em produtos, serviços e elementos inovadores. Ela tem ou
desenvolveu a capacidade de aproveitar os estímulos gerados
pelo ambiente externo para, por meio da sua organização e
estrutura, mudar, transformar-se e trazer novidades.
A classificação de empresa inovadora, segundo o Manual
de Oslo, uma das principais fontes bibliográficas mundiais
em relação à Inovação tecnológica, editado pela Organização
para Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OECD), é a
seguinte: “A condição de inovadora de uma empresa pode ser
definida de várias formas. A definição básica de uma empresa
inovadora é a empresa que implementou ao menos uma
Inovação. Uma empresa inovadora de produto ou de processo
é definida como uma empresa que implementou uma Inovação
de produto ou de processo”.

93
Explosão da Inovação

Porém, para nós, empresa inovadora é aquela que tem a


capacidade de promover a Inovação. Para tal, é composta por
funcionários motivados, com grande autonomia de trabalho e
com grande capacidade técnica e intelectual. Inseridas em uma
estrutura aberta e orgânica, as equipes buscam soluções novas
e criativas para os constantes desafios que surgem. A empresa
inovadora possui capital para investir em novas alternativas e,
acima de tudo, consegue inovar.
Na metade da década de 1990, a multinacional Unilever
estava incomodada com o fato de não possuir uma boa par-
ticipação no mercado de sabão em pó na região Nordeste do
Brasil. Com o objetivo de descobrir o que estava acontecendo,
a companhia enviou uma equipe composta por executivos e
sociólogos para investigar os hábitos das consumidoras dessa
região. Após seis meses de imersão na nova realidade, onde os
participantes da equipe puderam viver e acompanhar a rotina
das moradoras, foram descobertos vários motivos para que os
produtos da empresa não fossem comprados.
As mulheres nordestinas achavam as marcas tradicionais
de sabão em pó muito caras para a sua realidade. Por causa
disso, usavam como alternativa mais econômica o sabão em
barra para lavar suas roupas e de sua família. Porém, depois
de lavadas, elas usavam uma pequena quantidade de sabão
em pó Omo para dar um cheiro mais agradável às roupas.
As consumidoras mais pobres, moradoras das regiões rurais,
lavavam suas roupas em rios e açudes distantes de suas casas,
levando o sabão em pó na barra da saia. Para elas, as embalagens
de papelão não eram nada práticas, pois quando colocadas
na beira do rio molhavam e estragavam. A maioria dessas
consumidoras não comprava o produto em supermercados e
em redes de varejo, como as moradoras dos grandes centros
urbanos do país. Elas compravam sistematicamente em
pequenas lojas dos bairros onde moravam, por ser mais perto

94
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

de suas casas e por contarem, às vezes, com um crédito informal


para suas compras.
Em 1996, a Unilever lançou o sabão Ala em uma embala-
gem inovadora. Ele vinha em saquinhos plásticos para atender
aos hábitos das donas de casa de lavar roupa próximo à água.
Além disso, cada unidade continha 200 gramas do produto,
uma quantidade menor para torná-lo mais barato e condi-
zente com o bolso das consumidoras. Era possível comprar o
Ala com uma nota de um real e ainda havia troco. O design da
embalagem também recebeu atenção especial, com prioridade
para cores fortes para chamar a atenção da consumidora no
ponto de venda. A marca Ala, além de ser uma palavra sim-
ples, era escrita com letras grandes para aparecer ainda mais,
facilitando a visualização das consumidoras, que nessa região
do país apresentavam alto grau de analfabetismo. A composi-
ção do produto também foi desenvolvida para que, de forma
econômica, as roupas ficassem ao mesmo tempo brancas e per-
fumadas. O sistema de vendas e a logística da empresa foram
alterados para entregar o produto em locais e em pontos de
venda que até então a Unilever não chegava. Muitos pequenos
estabelecimentos comerciais passaram a ser atendidos direta-
mente e puderam vender o Ala.
O sucesso do novo produto foi imediato. Desenvolvido
de acordo com a necessidade das consumidoras, o Ala tornou-
se a segunda marca com maior venda nessa região, perdendo
apenas para o Omo, marca mais tradicional e líder em todas as
regiões do país, também pertencente à Unilever.
Nesse exemplo, é possível perceber o esforço que a em-
presa fez para conseguir inovar. Ela precisou estudar pro-
fundamente as raízes do problema que enfrentava. Teve que
deslocar uma equipe para tratar especificamente desse tema,
investindo tempo e recursos consideráveis. Incentivou a equi-
pe a apresentar ideias criativas para os desafios impostos e,

95
Explosão da Inovação

a partir dessas ideias, desenvolveu novas soluções para cada


composto mercadológico (produto, preço, praça e comunica-
ção) da nova marca. Fica claro que havia uma metodologia de
trabalho coerente e concisa por trás da Inovação, e é a isso que
chamamos de capacidade interna.
Empresa Não Inovadora é aquela que não possui as ca-
racterísticas e as competências necessárias para desenvolver
uma Inovação. Ela simplesmente tem outras habilidades com-
petitivas, mas não essa em particular, não conseguindo desen-
volver algo novo a partir de ideias criativas levantadas.
Não é porque uma empresa não é inovadora que ela
necessariamente está fadada à morte ou à irrelevância. Existem
várias empresas desse tipo que operam no mercado com
certo êxito. Elas, em geral, possuem outras habilidades que
compensam a inabilidade em desenvolver produtos e serviços
inovadores.
A cidade de São Paulo possui milhares de pizzarias. Em
muitos bairros, é possível encontrar uma em cada esquina.
Porém, as que conseguem promover alguma Inovação para o
mercado são uma minoria. A maioria é apenas seguidora, co-
piando as novidades lançadas pelas outras. A última grande
mudança desse setor foi o uso das máquinas de cartões de cré-
dito e débito nas compras dellivery. Algumas pizzarias perce-
beram que, em muitas ocasiões, os clientes só possuíam formas
de pagamento eletrônico para os pedidos enviados às suas re-
sidências. Por causa disso, seus entregadores passaram a levar
máquinas de cartões sem fio, juntamente com a pizza, para que
o cliente pudesse efetuar o pagamento. Outras implementa-
ram um sistema de pagamento por cartão de crédito direta-
mente pelo telefone. Mas a maioria desses estabelecimentos
comerciais ainda não enxergou essa oportunidade e continua
operando com as formas de pagamento tradicionais: dinheiro
e cheque. Muito provavelmente, algumas só implementarão

96
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

outra modalidade de pagamento quando a maioria do mercado


já estiver oferecendo.
As Empresas Não Inovadoras são tradicionalmente até
mais bem preparadas para operar segundo o status quo presen-
te. Sua estrutura e dinâmica de trabalho estão voltadas para
a realização de tarefas, processos ou produtos já conhecidos.
Como já realizam determinada função há muito tempo, fre-
quentemente apresentam níveis de qualidade e produtividade
superiores. Em muitos casos, essas empresas são extremamen-
te rápidas em copiar as novidades que surgem dos concorren-
tes e conseguem uma relação custo-benefício maior com elas
(não precisaram investir tanto em pesquisa e desenvolvimento,
não correram riscos na fase de teste de mercado, não precisa-
ram perder tempo na evolução e na aceitação do produto, entre
outros fatores).
Não é raro encontrar uma Empresa Não Inovadora que
tenha inovado em determinado período do passado, mas que
tenha perdido essa capacidade no presente. Por isso, é impor-
tante notar que a capacidade interna que se está descrevendo
aqui faz parte do momento atual e não do passado. Uma empre-
sa pode ter sido muito inovadora há algum tempo, promovido
uma série de inovações, mas se tiver perdido essa capacidade,
ela hoje pode ser considerada uma Empresa Não Inovadora.
Quando a Inovação causa muito impacto, quando marca consi-
deravelmente a companhia e quando é muito assimilada cultu-
ralmente dentro da empresa, ela passa a ficar impregnada nas
estruturas e nos valores corporativos dessa empresa. Chega
um ponto da vida dessa organização que a antiga Inovação
poda ou dificulta o surgimento de novas ideias. E, quando isso
acontece, a empresa que era inovadora deixa de ser.
A Kodak é um bom exemplo de quem abraçou seu pas-
sado inovador e tornou-se uma Empresa Não Inovadora. Por
mais de um século, a empresa foi referência mundial em produ-

97
Explosão da Inovação

tos fotográficos. Em seu auge, a Kodak possuía 60 mil funcio-


nários e uma sede com mais de 220 prédios, entre escritórios e
unidades de produção de filmes e papel fotográfico.
A grande Inovação que a companhia fez foi desenvolver
um modelo de negócio ancorado na venda e na revelação dos
filmes fotográficos para o grande público. Até então, a receita
gerada pelas empresas do setor estava na venda de máquinas
para fotógrafos profissionais, aqueles que eram contratados
quando se queria fotografar algo, alguém ou alguma situação.
Com o surgimento de máquinas amadoras, menores e mais
simples, foi possível criar um sistema em que todo mundo, até
mesmo não profissionais, comprasse uma máquina para foto-
grafar todos os momentos que quisesse. Para isso, as pessoas
só precisavam comprar um rolo de filme e, depois de tirada a
foto, contratar o serviço de revelação das imagens.
Nesse cenário, a Kodak foi imbatível. Ela desenvolveu
novas câmeras fotográficas, criou e lançou novos tipos de
rolos de filmes, e oferecia serviços pioneiros de revelação aos
consumidores. Na década de 1980, a companhia dominava
85% do mercado fotográfico dos Estados Unidos, o principal
do mundo. Não é exagero falar que, nessa época, praticamente
o mundo fotografava com máquinas e, principalmente, com
filmes da Kodak.
Mas essa história começou a mudar com o surgimento
das máquinas digitais. Com elas, era possível tirar fotos que
depois eram disponibilizadas diretamente para os computado-
res das pessoas, sem a necessidade dos rolos de filmes. Nesse
novo contexto, a Kodak começou a entrar em decadência. Sem
o faturamento de seus filmes e da revelação deles, a empresa
começou a caminhar para o desaparecimento. Curiosamente, a
tecnologia da fotografia digital foi desenvolvida pela própria
Kodak duas décadas antes de a concorrência fazê-la. Porém,
com receio dos resultados dessa Inovação e querendo preser-

98
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

var seu até então bem-sucedido modelo de negócio, a empresa


abriu mão de inovar.
Quando a decisão se mostrou obviamente equivocada, a
empresa passou a investir nas máquinas digitais. A partir desse
momento, a Kodak precisou de apenas dois anos para assumir
a liderança na venda de máquinas digitais no mercado norte-
americano. Mas o grande problema da empresa permanece: ela
está vendendo máquinas digitais, mas seu modelo de ganhar
dinheiro com os rolos de filmes ainda não foi substituído por
algo melhor. Em resumo, apesar de desenvolver um novo mix
de produtos e serviços, a Kodak ainda não conseguiu se desta-
car com uma grande inovação neste século.
O calcanhar de Aquiles das Empresas Não Inovadoras
está justamente na mudança do cenário. Quando isso ocorre,
por ter suas bases fixadas solidamente em uma determinada
situação, elas muitas vezes não sabem o que fazer. É nesse mo-
mento que a maioria das Empresas Não Inovadoras tende a
falir e desaparecer.
Nesse modelo teórico foram apresentados dois tipos de
empresas: as que têm capacidade de inovar e as que não têm.
Porém, dividir todas as empresas em apenas duas classifica-
ções seria uma atitude simplista. Dificilmente uma empresa é
100% inovadora ou 100% não inovadora. De forma prática,
as companhias estão situadas entre essas duas condições, for-
mando uma infinidade de possibilidades. Elas se posicionam
no eixo de Inovação a partir da capacidade interna de gerá-la.
Quanto maior for essa capacidade, mais próximas de Empresas
Inovadoras elas estarão, e quando menor, mais próximas de
Empresas Não Inovadoras elas ficarão.

99
Explosão da Inovação

Tipos de Empresas

Teoria
Empresa Empresa
não Inovadora Inovadora

Infinitas Empresas
Prática

Porém, quais as características de uma Empresa Inova-


dora? Quais elementos da capacidade interna a fazem inovar?
Quais são as diferenças estruturais e de metodologia de traba-
lho para as Empresas Não Inovadoras?
Essas questões serão respondidas na próxima sessão des-
te capítulo, na qual serão apresentados os elementos que com-
põem a capacidade interna das empresas.

4.4 Os Elementos da Capacidade Interna – MACCS

A Capacidade Interna que uma pessoa, um grupo de in-


divíduos ou uma organização tem para promover a Inovação
está vinculada a cinco elementos, aos quais nos referimos por
MACCS, que reúne as iniciais das palavras Motivação, Autono-
mia, Conhecimento, Capital e Sistema. O resultado da combina-
ção entre esses elementos fornecerá os aspectos culturais que
facilitarão ou dificultarão o desenvolvimento da Inovação. Na
imagem a seguir é possível visualizar os elementos que cons-
tituem o MACCS.

100
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Elementos da Capacidade Interna – MACCS

Motivação
Autonomia
Conhecimento
Capital
Sistema

Motivação é a emoção que impulsiona a ação e a forma de


conduta de indivíduos e grupos. É a razão que leva as pessoas
a um determinado comportamento. Quando existem motivos
e interesses para a pessoa agir, considera-se que ela está
Motivada. Mas quando não há motivação para a realização
de determinada ação, define-se a pessoa como estando
Desmotivada.
Autonomia, por sua vez, é o grau de liberdade conferi-
do às pessoas ou grupos no desenvolver de suas tarefas. Essa
liberdade está ligada às tomadas de decisões que afetam dire-
tamente o resultado do trabalho proposto. Quando se tem to-
tal autonomia no que se está fazendo, considera-se o trabalho
como Independente. E quando não há nenhuma liberdade na
tomada de decisão das tarefas feitas, considera-se o trabalho
como sendo Dependente de alguém ou de outros (aqueles que
efetivamente decidem).
Conhecimento é o conjunto de informações, aptidões e
competências adquiridas ao logo do tempo por pessoas e gru-
pos. É a habilidade de saber, fazer e aprender determinado
tema ou atividade. Quando se tem conhecimento sobre algo
ou sobre alguma coisa, pode-se dizer que há Sabedoria. Porém,

101
Explosão da Inovação

quando não se conhece nada sobre um assunto ou atividade,


considera-se que há Ignorância por parte de quem não sabe.
Capital é somatório de bens e valores que são investidos
em um projeto específico. Ele pode ser um recurso monetário,
humano ou de tempo. Quando uma pessoa ou empresa tem à
sua disposição recursos infinitos, dizemos que o capital é Ili-
mitado. Entretanto, quando ela não dispõe de nenhum recurso
para investimento, dizemos que esse capital é Limitado.
Sistema, por fim, é a forma como a organização se estru-
tura para o desenvolvimento de suas atividades internas. É o
Sistema que define como uma tarefa será distribuída, agrupada
e coordenada. Quando a organização tem um modelo de rede
fluida e flexível, ela tem um sistema Orgânico. Mas quando a
organização é calcada em formas burocráticas de comando e
controle, trata-se de uma empresa com sistema Mecanicista.
A Capacidade Interna de uma empresa é constituída do
conjunto integrado desses cinco elementos e suas respectivas
características. Cada um afeta de alguma forma a organização e
influencia, a seu modo, sua capacidade de promover a Inovação.
Na figura a seguir é possível visualizar cada elemento e
suas características principais.

Relação entre os Elementos do MACCS

Motivação
desmotivado Motivado
Autonomia
dependente Independente
Conhecimento
Ignorância sabedoria
Capital
limitado Ilimitado
Sistema
Mecanicista orgânico

102
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Assim como foi feito com os elementos do Ambiente Ex-


terno, agora serão apresentados os elementos da Capacidade
Interna de forma individual, relacionando-os com o poder de
promoção da Inovação. Depois que cada um for devidamente
descrito e compreendido, eles serão relacionados entre si em
um próximo tópico.

4.4.1 Motivação

A Motivação é o que leva os seres a uma determinada


ação. É o motivo central ou original de um comportamento e o
que condiciona a forma e a intensidade dessa ação.
Na realidade, existem várias teorias e definições sobre
o que é motivação. Pode-se citar Maslow, que desenvolveu a
teoria da hierarquia das necessidades. Nela, as necessidades do
ser humano (Fisiológicas, de Segurança, Sociais, de Autoesti-
ma e de Autorrealização) são divididas e classificadas em uma
pirâmide conforme sua prioridade. Há a teoria de Herzberg,
que aponta dois tipos de fatores que influenciam a motivação:
os Motivacionais (intrínsecos à condição do indivíduo) e os
Higiênicos (relacionados às necessidades básicas). Os fatores
Motivacionais levam à satisfação ou à não satisfação, enquanto
os Higiênicos levam à insatisfação ou à não insatisfação. Para
Chiavenato, a satisfação é fruto do ciclo motivacional (equilí-
brio interno, estímulo ou incentivo, necessidade, tensão, com-
portamento ou ação e satisfação), e para Vroom, o comporta-
mento humano pode ser direcionado por meio de recompensas
e trocas de interesses.
Não é pretensão desta obra analisar cada uma dessas teo-
rias nem definir qual é a melhor. O interesse aqui é de explicar
o que é motivação, a fim de relacioná-la à capacidade interna
de promoção da Inovação. Para tanto, recorremos às definições

103
Explosão da Inovação

de Lewin, que destaca como motivação o conjunto de motivos


que impulsionam a pessoa a agir de certa forma. Esse impulso
vem, ao mesmo tempo, de fatores externos (do ambiente) e de
fatores intrínsecos ao indivíduo (seu raciocínio e seu poder de
cognição). Nesse conceito, um comportamento é causado por
algum motivo particular ou por uma necessidade específica.
Motivação é o desejo, declarado ou não, consciente ou incons-
ciente, por algo.
O grau de motivação está intimamente ligado à intensi-
dade e à quantidade de pretextos psicológicos existentes. Estar
Motivado significa ter motivos reais e contundentes para se
fazer algo, indicando que os estímulos internos condicionarão
o comportamento. Estar Desmotivado, por outro lado, repre-
senta a ausência dessas razões, indicando que não há estímulos
psicológicos suficientes para o incentivo do comportamento.
Esses dois conceitos, porém, são caracterizados por condições
radicalmente opostas: a total existência ou a completa ausên-
cia de uma causa. Na prática, o grau de motivação varia em
uma escala entre essas duas situações.

Elemento M – Motivação

desmotivado Motivado

ausência total presença Existência de


de motivos mediana de muitos motivos
internos motivos internos internos

Capacidade Capacidade Capacidade


baixíssima de mediana de altíssima de
promoção da promoção da promoção da
Inovação Inovação Inovação

104
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Quanto mais motivos se tiver para um comportamento


diferente ou para a mudança de uma ação (quanto mais para a
direita estiver no eixo Motivado/Desmotivado), maior será a
capacidade de promoção da Inovação. A motivação para inovar
é a primeira condição interna para o desenvolvimento de algo
novo. Sem motivação, dificilmente será possível sair do status
quo e procurar algo diferente do que já estiver sendo feito. É a
motivação que leva uma pessoa ou empresa a se esforçar para
inovar.
No ano de 2005, o bilionário britânico Richard Branson,
dono da companhia aérea Virgin Atlantic Airways, iniciou as
operações da Virgin Galactic, empresa de turismo espacial. A
empresa é uma associação com o projetista Burt Rutan, que
desenvolveu o SpaceShipOne, um modelo de aeronave capaz
de levar passageiros ao espaço em viagens regulares com se-
gurança. O primeiro voo comercial está previsto para os pró-
ximos anos. Por enquanto, a companhia está aprimorando sua
aeronave e testando sua operação. Seu planejamento é começar
com voos semanais e chegar, cinco anos depois da primeira
viagem, a um ou dois voos por dia. Porém, mesmo antes do pri-
meiro voo, a Virgin Galactic é um sucesso comercial. Algumas
centenas de pessoas já se inscreveram para comprar o serviço
e pagaram adiantado o valor aproximado de US$ 200 mil cada
uma. Com isso,a empresa pôde levantar recursos financeiros
para subsidiar o início das operações.
Mas, afinal, o que motiva uma empresa de aviação como
a Virgin a lançar-se em um mercado ainda inexistente, que é o
da aviação espacial? O que está por trás da decisão de desen-
volver uma nova empresa com um conceito tão inovador? Para
compreender a motivação de uma empresa é necessário, antes,
interpretar a motivação da pessoa que lidera o negócio.
Richard Branson nasceu na Inglaterra em 1950 e aos
16 anos fundava uma revista chamada Student. Quatro anos

105
Explosão da Inovação

depois, inaugurava uma loja de discos que entregava o produto


pelo correio. Dois anos mais tarde, quando completava 22
anos, Branson abria uma gravadora de música chamada Virgin
Records. E anos mais tarde lançava a Virgin Atlantic Airways,
uma companhia aérea internacional. Nascia, assim, o grupo
Virgin, conglomerado de empresas que atua em setores tão
diferentes como transporte, editoras e desenvolvimento de
softwares. Por isso, Richard Branson pode ser descrito como
um empreendedor nato. Desde o final da adolescência, sua
preocupação era abrir e construir empresas. Dessa forma, não
chega a ser surpreendente o fato de ele decidir abrir mais uma
nova empresa, a Virgin Galactic. Mas por que uma empresa de
aviação espacial? Para entender isso é necessário conhecer um
pouco mais do seu fundador.
Além de ser um empresário, Richard Branson é um aven-
tureiro. Ele sempre gostou da emoção proporcionada por
aventuras pioneiras. Na metade da década de 1980, ele bateu
um recorde ao cruzar o oceano em um barco próprio. Alguns
anos mais tarde, fez o primeiro voo pelo oceano Atlântico em
um balão de ar quente. Na década de 1990, realizou o mesmo
feito, só que dessa vez sobre o oceano Pacífico, saindo do Japão
e chegando ao Canadá.
Branson é um homem que gosta de aventuras no ar, de
desafiar os limites impostos pelo espaço e se dedica a quebrar
recordes e atingir feitos pioneiros. Nada mais natural que um
homem com esse perfil tenha motivação de ser o primeiro ho-
mem a levar comercialmente turistas para o espaço. Na pri-
meira oportunidade que teve, o bilionário inglês fez uma par-
ceria com o projetista Burt Rutan.
Rutan era dono da Scaled Composites, empresa funda-
da especialmente para participar da Ansari X Prize, compe-
tição internacional que tinha como prêmio US$ 10 milhões
para quem construísse a primeira aeronave privada do mundo

106
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

a levar com segurança e de maneira constante pessoas para o


espaço. A companhia de Rutan saiu vitoriosa com o seu mode-
lo SpaceShipOne, que cumpriu em janeiro de 2005 sua missão
com êxito.
Conhecendo um pouco mais as motivações e interesses de
Richard Branson e Burt Rutan, fica evidente por que nenhu-
ma outra empresa de aviação se lançou ainda nesse mercado.
Afinal, é maior a preocupação delas em lucrar em um mercado
tão competitivo quanto o da aviação comercial internacional do
que se lançar em aventuras arriscadas e perigosas. Já no caso
de Branson, essas prioridades são invertidas. Além disso, fica
claro porque a missão técnica da nova empresa ficou nas mãos
de Rutan, a primeira entre mais de 20 empresas a cumprir o
desafio da Ansari X Prize. Agora sua motivação está em provar
que sua aeronave pode voar de forma comercial para o espaço.
Inovar demanda muita dedicação e envolve um risco ele-
vado, por isso não é um processo fácil. É necessário grande
esforço tanto para descobrir uma ideia criativa quanto para
promovê-la em uma Inovação propriamente dita. E é a motiva-
ção que alimenta o corpo e a mente para continuar prosseguin-
do nesse processo difícil e cansativo. Sem ela, muito facilmente
se desistiria no começo ou no meio do caminho. Além disso, é
a motivação que faz as pessoas se aventurarem pelo desconhe-
cido e as leva a correr riscos.
Em uma metáfora simples, pode-se dizer que a motivação
é o vento da Inovação. No mar, é o vento que faz as embarca-
ções à vela navegarem. Quando o vento é forte e constante, a
viagem pode prosseguir, mas ela passa a depender do rumo
que o capitão dá para a embarcação e da capacidade da tri-
pulação e dos equipamentos para aproveitar ao máximo todo
o vento disponível. Quando o vento é inexistente, não adian-
ta ter a melhor rota e os melhores equipamentos e tripulação
possíveis. A embarcação não sairá do lugar ou estará comple-

107
Explosão da Inovação

tamente à mercê das correntes marítimas.


Quanto menos motivação se tem para caminhar na dire-
ção da mudança e do novo (mais para a esquerda ela estiver no
eixo), menores as chances de se promover a Inovação. Nesse
caso, a capacidade interna fica bloqueada pela falta de incenti-
vos internos.
Ambientes de trabalho opressores, com clima ruim e con-
corrência interna depreciativa, tradicionalmente minam a mo-
tivação dos funcionários. Quando uma equipe se encontra nessa
situação de Desmotivação, o trabalho realizado é meramente
burocrático. Ela está lá para ganhar dinheiro e se sujeita a es-
perar as horas passarem. Segundo o conceito da Empresa de
Corpo, Mente e Alma, de Roberto Tranjan, nessa condição, o
funcionário traz o corpo para o trabalho, mas deixa a cabeça e o
coração (alma) na portaria quando entra.
A Desmotivação pode ser gerada também pela existência
de objetivos diferentes entre a empresa e o funcionário. Quan-
do um quer alguma coisa que o outro não prioriza ou não de-
seja, normalmente a consequência a médio e longo prazo é a
Desmotivação.

4.4.2 Autonomia

Autonomia é o grau de liberdade que se tem para execu-


tar uma tarefa. É a possibilidade de você tomar decisões em re-
lação ao seu trabalho sem depender da escolha prévia ou final
de alguém que não esteja participando do processo.
Uma pessoa ou uma equipe com autonomia é aquela que
tem liberdade para planejar, criar, executar as ações propos-
tas, distribuir os recursos humanos, financeiros e de tempo e,
principalmente, se sente responsável pela atividade feita e pelo
resultado final do trabalho.

108
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Assim como a Motivação, a Autonomia tem vários sig-


nificados e definições distintas, que convergem fundamental-
mente para dois pontos: a independência de controles exter-
nos e a ação própria e proposital de alguém ou de um grupo.
Esses dois pontos resumem e simplificam o conceito de
Autonomia. Assim, pode-se dizer que Autonomia é a liberdade
para se fazer algo em que se acredita e que se deseja. Quando
alguém tem grande liberdade de atuação no desenvolvimento
da sua atividade, considera-se que essa pessoa age de forma
Independente. Porém, se tiver baixa liberdade de atuação, com
a necessidade constante de permissão e de auxílio, considera-
se que essa pessoa trabalha de forma Dependente. em relação à
Autonomia, toda atividade apresenta, uma variação entre esses
dois polos.

Elemento A – Autonomia

dependente Independente

Baixo grau Grau médio alto grau


de liberdade de liberdade de liberdade
de ação de ação de ação

Capacidade Capacidade Capacidade


baixíssima de mediana de altíssima de
promoção da promoção da promoção da
Inovação Inovação Inovação

Quanto mais autonomia uma pessoa ou um grupo tive-


rem (quanto mais para a direita estiver no eixo Independente/
Dependente), maior será sua capacidade de inovar. Dar auto-
nomia para alguém é, ao mesmo tempo, respeitar, valorizar e

109
Explosão da Inovação

confiar nele. É respeitar sua capacidade técnica e sua habilida-


de criativa. É valorizar suas opiniões e escolhas. É confiar em
seus propósitos e valores. Uma pessoa com grande autonomia
tem ao mesmo tempo mais motivação e mais possibilidades
para se superar e atingir seus objetivos. É da mistura da moti-
vação para a autossuperação e das opções que são abertas pela
formulação de hipóteses, cenários e ideias novas que surge a
Inovação. Inovação envolve assumir riscos e enfrentar o des-
conhecido.
Na seleção das “25 Empresas Mais Inovadoras do Brasil”
em 2009, segundo pesquisa feita em conjunto pela Fundação
Getúlio Vargas (FGV-Eaesp), pela Fundação Nacional da Qua-
lidade (FNQ) e pelo Great Place To Work (GPTW), e divul-
gada pela Época Negócios, encontra-se uma grande “coinci-
dência”: todas as empresas selecionadas dão grande autonomia
para seus funcionários.

As 25 Empresas Mais Inovadoras do Brasil em 2009


Época Negócios

Fonte: Revista Época Negócios de julho de 2009

A grande vencedora de 2009 desse ranking foi a Chemtech,


empresa carioca de engenharia e software, descrita da seguinte
forma pela Época Negócios:

110
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

“Chemtech, Rio de Janeiro - A competência tecnológica


da Chemtech, somada à política de gestão de pessoas,
a qualifica como um exemplo de Inovação no Brasil. A
empresa, especializada em engenharia e software, investe
em pesquisa, possui canais de comunicação direta com os
funcionários e nutre um ambiente altamente criativo, em
que as pessoas têm liberdade para expressar suas ideias”.

Uma empresa no qual os funcionários têm liberdade para


expressar suas ideias e tomar decisões não é algo pontual nes-
sa lista. Cada uma das empresas possui elevado grau de auto-
nomia para que sua equipe busque as melhores soluções.
A Ticket, criadora do conceito de convênio refeição, in-
centiva seus funcionários a fornecerem ideias em um portal
corporativo para depois disponibilizar os recursos necessários
àqueles que tiverem apresentado as melhores sugestões. Ape-
sar de possuir um Comitê de Desenvolvimento de Negócios
que promove reuniões mensais, o trabalho do dia a dia fica nas
mãos daqueles que tiveram suas ideias selecionadas. Há acom-
panhamento constante do desenvolvimento de cada projeto
pelo Comitê, mas as equipes possuem alto grau de liberdade
na execução dos projetos.
É importante não confundir liberdade com descaso. Não
é porque se dá autonomia para um grupo que os líderes não
devem acompanhá-lo e auxiliá-lo no desenvolvimento de um
projeto. Descaso é deixar a responsabilidade para outro e la-
var as mãos, isentando-se de culpa. Quando isso ocorre, não se
está dando liberdade para o trabalho, mas apenas transferindo
responsabilidades de modo irresponsável. Autonomia requer
comprometimento e acompanhamento.
A unidade brasileira da IBM, multinacional de soluções
de tecnologia da informação, criou várias ferramentas para
promover a pesquisa e a melhoria dos processos dentro da
companhia. Com elas, os funcionários são incentivados a tro-

111
Explosão da Inovação

car ideias e opiniões para o desenvolvimento de seus projetos.


O resultado desse esforço foi o registro de trinta patentes nos
últimos três anos, um número bastante alto, considerando-se
que a empresa teve apenas três patentes registradas em toda a
década de 1990.
A Brasilata, fabricante de embalagens metálicas, a CI&T,
prestadora de serviços de tecnologia de informação, e a Daichi
Sankyo, laboratório farmacêutico, também promoveram uma
série de soluções de estreitamento da comunicação entre seus
funcionários, visando ao maior compartilhamento de ideias.
Com isso, as equipes de trabalho puderam acelerar o desenvol-
vimento de seus projetos e atuar com menor dependência das
outras áreas (normalmente requisitadas para fornecer infor-
mações ou apoio operacional).
Quanto menor for a autonomia dada a uma equipe (mais
para a esquerda ela estiver no eixo), menor é a chance de ela
promover a Inovação necessária. Isso decorre da situação cô-
moda que ela passa a ter, tendo apenas de obedecer ao líder,
que é quem deve fornecer a solução para os problemas e os
desafios surgidos no dia a dia.
Uma pessoa ou equipe que não possui nenhuma autono-
mia está presa a algo ou a alguém. Ela é apenas controlada e
executa meramente o que lhe é designado. Trabalha apenas de
forma operacional, abrindo mão de suas convicções, desejos,
sonhos e propostas. Aquele que não trabalha com liberdade é
dependente de uma segunda pessoa. Seu trabalho é fruto da
coerção e, por isso, é tradicionalmente limitado e pobre. Ele
se acostuma apenas a obedecer e a seguir ordens; desse modo,
não desenvolve seu lado analítico, estratégico e criativo, tão
importantes para se produzir a Inovação.
Na cultura ocidental moderna, o casamento é fruto de
decisão exclusiva do casal. Casa-se, normalmente, com quem,
quando, como e até quando se deseja. Os casamentos arranja-

112
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

dos ou arrumados fazem parte de um passado distante, em que


os indivíduos não tinham autonomia sobre suas vidas. Naquela
época, as crianças tinham suas tarefas limitadas e controladas
pelos pais. A profissão e o trabalho (no caso das mulheres, a
possibilidade de trabalhar) estavam nas mãos do pai. Na socie-
dade patriarcal, fazia-se o que o “homem” decidia. A escolha
do parceiro também era uma prerrogativa dos pais. Casava-
se com quem os pais achassem mais propício ou conveniente.
Após o casamento, o homem passava a conduzir as decisões da
nova família e dava a palavra final sobre a vida da esposa.
Esse arranjo de sociedade, porém, ainda persiste em
várias culturas do mundo, e, apesar do choque de visões tão
antagônicas, é possível comparar esses estilos de vida com a
capacidade de promoção da Inovação dessas sociedades. Toda
sociedade que limita ao máximo a vida dos seus indivíduos, dis-
criminando-os, segregando-os e controlando-os, é incapaz de
trazer, de forma contínua, grandes inovações ao mundo. Pense
em uma região onde as crianças não têm livre-arbítrio, onde as
mulheres são oprimidas e/ou as minorias são discriminadas.
Pensou? Muito provavelmente esse seria um dos lugares mais
incapazes de produzir algo novo, diferente e moderno.
A mesma comparação que se fez para uma sociedade in-
teira é possível fazer para microgrupos. Famílias e empresas
também podem ser comparadas dessa forma. Na lista das 25
Empresas Mais Inovadoras do Brasil, divulgada pela revis-
ta Época, não encontramos empresas que não dão autonomia
para seus colaboradores. Não é possível uma empresa inovar
nos dias de hoje podando a liberdade dos funcionários, forne-
cedores e parceiros. É curioso, mas até mesmo fornecedores e
parceiros estão sendo convidados para participar desse proces-
so. Conhecido como conceito de Inovação Aberta, as empresas
abrem seus projetos de pesquisa, desenvolvimento e melhoria
para que agentes de fora participem e contribuam.

113
Explosão da Inovação

A Cristália, laboratório farmacêutico do interior paulista,


conta com parcerias de universidades no Rio de Janeiro, em
São Paulo, no Amazonas e no Rio Grande do Sul para o desen-
volvimento de suas pesquisas. O C.E.S.A.R., centro de estudos
especializado em serviços de informática do Recife, promove o
uso de redes sociais para compartilhar as ideias de dentro da
companhia com de fora.

4.4.3 Conhecimento

Conhecimento é a ciência de informações, de aquisição


de habilidades e de criação de novas experiências de um indi-
víduo ou grupo sobre determinado assunto ou tema. É, assim,
a assimilação de um dado, o uso de uma aptidão ou a extensão
de uma experiência. Fica mais fácil compreender esse conceito
quando se faz três perguntas do estilo “você sabe?”.
Você sabe quem descobriu o Brasil? Se a resposta for Pedro
Álvares Cabral, você assimilou um dado. Essa a primeira parte
do conceito de conhecimento: a assimilação. É a ciência ou com-
preensão de algo, que pode ser uma notícia ou uma informação.
Mas, você sabe andar de bicicleta? Se responder sim é
porque tem essa habilidade, que veio do conhecimento da for-
ma de pedalar e de se manter ereto no veículo, e, principal-
mente, da aplicação prática da habilidade adquirida. Essa é a
segunda parte da teoria: a aptidão.
E você sabe como eu posso trocar uma lâmpada se não ti-
ver uma escada para usar? Se você encontrar uma nova solução
para esse problema a partir do seu repertório de informações
e experiências, você terá conseguido estender o uso do que foi
aprendido e criado novas possibilidades. Essa é a terceira e
última parte da formação do conhecimento: a criação de algo
nova a partir do repertório já adquirido.

114
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Assim, conhecimento é, ao mesmo tempo, saber, fazer


e aprender. É o domínio da parte teórica e prática de um de-
terminado assunto ou tema. E, em um grau mais elevado, é a
combinação deles com outros assuntos para a criação de mais
informações e habilidades. A geração de conhecimento vem da
capacidade de aprendizado, da prática e do uso estendido de algo.
A excelência e o primor de um trabalho estão intimamen-
te ligados ao conhecimento e à competência dos envolvidos
nele. Não dá para imaginar o trabalho realizado por Michelan-
gelo na Capela Sistina sem vinculá-lo diretamente à habilidade
e ao conhecimento prévio do artista sobre história, pintura,
escultura e anatomia humana. Em 1508, quando foi contra-
tado pelo Papa Julio II para pintar o teto da Capela Sistina, o
artista quase recusou. Ele se achava muito mais um escultor
do que um pintor. Não imaginava que tivesse habilidade e co-
nhecimento suficiente para fazer um bom trabalho. Mas tinha
e o fez. Após se dedicar sozinho por quatro anos, o resultado é
algo esplendoroso. A obra transmite grande harmonia e leve-
za. As imagens parecem saltar das paredes, dando a impressão
de tridimensionalidade. No centro estão retratadas A Criação
do Mundo, A Concepção do Homem, A Expulsão do Paraíso
e O Dilúvio. Nas laterais estão pintados os Profetas, As Sibi-
las e a História de David e Golias. Os personagens retratados
possuem formas e movimentos perfeitos. O que possibilitou
a criação de uma obra tão incrível como essa? A resposta é: o
conhecimento.
Michelangelo, assim como Leonardo da Vinci, era um
grande anatomista. Após conseguir uma autorização especial
do Vaticano para dissecar cadáveres, prática proibida na época,
ele aprendeu tudo sobre os músculos, os tendões e as veias do
corpo humano. Esse estudo de cada parte do corpo foi usado
para a composição das figuras e dos personagens. Além dis-
so, Michelangelo criou uma técnica de pintar de ponta cabeça

115
Explosão da Inovação

(afinal, como poderia pintar um teto?). A forma encontrada


por ele é muito mais natural para os escultores do que para
os pintores. Assim, ele se aproveitou da habilidade e do co-
nhecimento adquiridos em outro campo das artes para pintar.
A aplicação de gesso sobre a área pintada, o tipo de tinta e a
combinação das cores usadas também são frutos das pesquisas
do italiano. E, por fim, a interpretação pessoal para cada fato
bíblico também retrata o nível elevado de conhecimento dessas
passagens históricas.
A obra de Michelangelo revelou-se tão impressionante
que curiosamente, a Igreja Católica permitiu que seu principal
templo exibisse imagens e desenhos com corpos nus e novas
interpretações das cenas bíblicas. Só a genialidade e o conhe-
cimento de um artista dessa magnitude foram capazes de con-
seguir isso.
Quando alguém possui grande conhecimento sobre um
tema e sobre uma variedade de assuntos correlacionados, po-
demos dizer que essa pessoa possui Sabedoria. Porém, quando
possui pouco conhecimento em determinado assunto e nos te-
mas periféricos, considera-se que esse indivíduo sofre de Igno-
rância. As condições intermediárias entre essas duas situações
são apresentadas no eixo horizontal, de forma proporcional à
sua condição.

116
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Elemento C – Conhecimento

Ignorância sabedoria

ausência acúmulo acúmulo


completa de intermediário de grande
conhecimento de conhecimento conhecimento

Capacidade Capacidade Capacidade


baixíssima de mediana de altíssima de
promoção da promoção da promoção da
Inovação Inovação Inovação

Quando se tem mais conhecimento sobre determinado


assunto e quanto mais variado for o repertório de aprendizado
de uma pessoa sobre outros temas (mais para a direita estiver
no eixo Sabedoria/Ignorância), maior é sua capacidade de ino-
var. O conhecimento sobre determinado tema ajuda a pessoa a
procurar as melhores respostas para os desafios impostos pelo
ambiente e fornece aptidão para a implementação das ideias
que surgirem. Ninguém consegue inovar ou trabalhar de for-
ma excelente em algo sobre o qual não tenha o mínimo de
conhecimento. Além disso, adquirir conhecimento de outras
áreas ajuda o indivíduo no momento de ter ideias criativas. A
criatividade, muitas vezes, vem da combinação de informações
de áreas distintas do conhecimento humano.
A Magneti Marelli foi a empresa que desenvolveu o mo-
tor bicombustível em escala industrial. Essa empresa é espe-
cializada na fabricação de sistemas e componentes automoti-
vos. Presente em vários países do mundo e com sede na Itália,
ela é líder em sistemas de injeção eletrônica, amortecedores,
iluminação, painéis de instrumentos e escapamentos. Os pri-

117
Explosão da Inovação

meiros estudos em relação a tecnologia do motor bicombus-


tível datam da década de 80 e no meio da década seguinte já
surgem os primeiros protótipos deste produto. Porém, havia
um sério problema em relação ao sensor que media os tipos de
combustíveis colocados no tanque. Essa peça era muito cara,
o que inviabilizava sua incorporação nos carros comerciais.
Pensando em uma alternativa para baratear essa tecnologia,
a Magneti Marelli iniciou seus estudos a partir deste momen-
to. Conduzidos por uma equipe multidisciplinar formada por
profissionais brasileiros com o apoio de italianos da matriz, as
pesquisas do grupo italiano duraram alguns anos e contaram
com o intercâmbio de informações de muitas filiais do mundo.
Após alguns anos, a unidade brasileira acabou concentrando
todo o know-how dessa tecnologia e pode evoluir nas pesqui-
sas. O resultado final foi a criação de um software que inserido
diretamente no módulo do comando da injeção acaba por eli-
minar a necessidade do antigo sensor. Dessa forma, a nova tec-
nologia se tornava, enfim, viável financeiramente. A inovação
foi fruto da busca incansável pelo conhecimento e pesquisa e
mobilizou vários profissionais. Hoje em dia, a Magneti Marelli
já desenvolveu a tecnologia de multicombustível para motores
para vários tipos de veículos, inclusive para os aeronáuticos.
Conhecimento é fruto de leitura, pesquisa, estudo, práti-
ca de habilidades, observação de relações intra e interpessoais
e ganho sistemático de novas aptidões. E Sabedoria é o nível de
competência alcançado por uma pessoa ou empresa em relação
a determinado tema. A medição desse grau de competência
costuma ser feita por meio da comparação simples com outras
pessoas ou empresas.
A Whirlpool é a líder nacional de eletrodomésticos de
linha branca (refrigeradores, freezers horizontais e verticais, fo-
gões, lavadoras de roupa, secadoras, lava-louças, micro-ondas,
fornos elétricos, condicionadores e depuradores de ar, coifas e

118
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

climatizadores). Ela fabrica os produtos das marcas Brastemp


e Consul e é considerada uma das empresas mais inovadoras
do país. Para isso, a companhia investe anualmente R$ 100
milhões em pesquisa e desenvolvimento. Esse valor é aplicado
no estudo de novos produtos e na melhoria dos já existentes.
Além disso, a companhia possui um programa de seleção e ca-
pacitação de jovens profissionais que busca incorporar em seu
time os melhores estudantes de 36 faculdades de todo o país.
Aliando capacidade técnica elevada e grande esforço em pes-
quisa e desenvolvimento, a Whirlpool é atualmente uma das
líderes em número de patentes requeridas do Brasil.
Perceba o esforço da Whirlpool em aumentar seu conhe-
cimento na área de eletrodomésticos. Possivelmente, nenhuma
outra corporação tenha uma competência tão alta nessa área
como ela. Porém, qual o conhecimento dessa empresa e de seus
funcionários em relação à indústria farmacêutica? Com certe-
za, seu nível de competência nessa área é baixíssimo.
Na verdade, não é necessário conhecer muito de tudo
para inovar. O essencial é ter grande conhecimento sobre o as-
sunto proposto e ter um bom grau de competência sobre temas
variados, que possam ser usados no processo inovador.
Porém, quanto menor for o conhecimento do indivíduo
ou da equipe (mais para a esquerda ele estiver no eixo), menor
será a chance de se promover a Inovação. A falta de competên-
cia em um tema dificulta a análise da situação e a leitura do ce-
nário, limitando as possibilidades de escolhas e empobrecendo
a tomada de decisão.
Neste ponto, é importante abordar o conceito de Inteli-
gência Emocional, criado por Daniel Goleman. Segundo essa
teoria, o homem possui várias inteligências (inteligência múl-
tipla), e cada uma proporciona uma habilidade específica. Esse
conceito veio sobrepor-se à ideia de que a inteligência de uma
pessoa é medida através do raciocínio lógico e de habilidades

119
Explosão da Inovação

matemáticas e espaciais. O professor Howard Gardner com-


plementou a teoria de Goleman, apontando sete centros (ou
tipos) de inteligência: Linguística (capacidade de ler, escrever
e de se comunicar através de palavras), Lógica ou Matemáti-
ca (capacidade de fazer contas e de raciocinar), Musical (ca-
pacidade de perceber o ritmo, o som e a melodia), Visual ou
Espacial (controle da noção de espaço, volume e perspectiva),
Sinestésica (domínio sobre os sentidos do próprio corpo), In-
terpessoal (estabelecer e manter relacionamentos entre as pes-
soas) e Intrapessoal (capacidade de conhecer a si mesmo, suas
emoções e pensamentos).
Em outras palavras, o conhecimento de uma pessoa pode
ser dividido nessas categorias. Pelé foi o melhor jogador de
futebol de todos os tempos. Possuía uma grande inteligência
sinestésica. Ele tinha grande controle dos movimentos do seu
corpo dentro de campo e podia fazer gols e dar passes para
seus companheiros com grande facilidade. Porém, habilida-
de musical não era seu ponto forte. Quem teve grande inte-
ligência musical foi Mozart, compositor que conseguia criar
e tocar músicas de forma sensacional, mas não possuía uma
capacidade interpessoal muito desenvolvida. Por sua vez, um
presidente como Getúlio Vargas teve grande inteligência in-
terpessoal, conseguindo se comunicar e negociar com grande
sucesso, mas sua inteligência lógico/matemática não era muito
desenvolvida – quem teve esse tipo de habilidade foi Newton!
É possível perceber que cada uma das pessoas relacionadas
conseguiu inovar no campo em que tinha habilidade natural e
grande inteligência.

120
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

4.4.4 Capital

Capital pode ser entendido como a riqueza ou os valores


disponíveis para um investimento. É a quantidade de bens que
podem ser aplicados em uma ideia ou projeto, os quais podem
ser tanto financeiros (monetários) quanto humanos (pessoas)
ou de tempo (horas disponíveis). O valor total do capital é uma
soma hipotética dessas três partes.
Tradicionalmente, imagina-se o dinheiro como sendo o
único capital possível de uma empresa, de uma pessoa ou famí-
lia. Ele é importante, mas não é o único. Para algumas pessoas,
ele é o mais difícil de conseguir, mas isso é relativo. Não raro,
encontramos pessoas com muito dinheiro, mas sem tempo para
investi-lo da forma correta. E como se consegue mais tempo?
Difícil precisar. E há, aindam, as pessoas que recebem uma
grande quantia monetária proveniente de heranças ou golpes
de sorte e que não possuem competência para investi-la.
Ter capital é fundamental, pois propicia às empresas in-
vestir em pesquisa e desenvolvimento. É o que permite aos pa-
íses investir na educação e na cultura de seus habitantes. Além
disso, é o que viabiliza o tempo necessário para o ócio criativo
e para os insights.
Quando há excesso de recursos financeiros disponíveis
para se investir em uma ideia, considera-se que a pessoa ou a
instituição como tendo capital Ilimitado. Mas se há baixa quan-
tidade de bens que podem ser alocados no projeto, considera-se
que o indivíduo ou a organização tem capital Limitado. A va-
riação entre a existência do total de capital necessário e a falta
completa dele dá origem a uma infinidade de gradações que
podem ser representadas no eixo horizontal da figura a seguir.

121
Explosão da Inovação

Elemento C – Capital

limitado Ilimitado

ausência de Capital disponibilidade


capital para intermediário para total de capital
investimento investimento para investimento

Capacidade Capacidade Capacidade


baixíssima de mediana de altíssima de
promoção da promoção da promoção da
Inovação Inovação Inovação

Quando se tem elevado capital disponível (mais para a di-


reita estiver no eixo Ilimitado/Limitado), maior é a capacidade
de Inovação. Os bens necessários são fundamentais para o in-
vestimento em projetos de pesquisa e desenvolvimento de no-
vos produtos e serviços. São essenciais para a contratação e a
manutenção de profissionais de excelente competência técnica,
e necessários para a compra de novas tecnologias. Sem esses
elementos todos, dificilmente uma empresa conseguirá inovar.
É importante entender que a existência de grande quan-
tidade de capital disponível não necessariamente traz a Inova-
ção. O capital aumenta a capacidade de a empresa promover
a Inovação, mas não a faz produzi-la automaticamente. Esses
recursos precisam ser bem aplicados e estar condizentes com
uma estratégia coerente da organização. Se não forem bem in-
vestidos e alocados nos melhores projetos, os recursos podem
acabar sendo dissolvidos ao longo do tempo, gerando desper-
dício de tempo, de dinheiro e de esforço humano.
A Red Bull, empresa austríaca que produz e comercializa
bebidas energéticas, tem uma política agressiva de investimen-

122
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

to em marketing. Historicamente, a companhia investe um ter-


ço do seu faturamento em ações de comunicação e publicidade.
Comparado com o valor médio alocado por outras companhias
de outros setores industriais, esse valor é gigantesco. E para
conseguir aplicar essa quantia o departamento de marketing
da empresa está constantemente procurando eventos e ações
criativas para patrocinar e promover.
Um dos eventos mais inovadores criados nos últimos
anos foi o Red Bull Air Race. Trata-se de uma competição entre
aviões, cujos pilotos disputam quem consegue ser mais rápido
em manobras e piruetas no céu. O campeonato (sim, a disputa
se tornou um campeonato mundial) acontece em etapas em
algumas cidades do mundo, entre elas o Rio de Janeiro, e atrai
milhares de pessoas para assistir ao espetáculo ao vivo, além
da atenção da mídia. Para se ter uma ideia, a última etapa reali-
zada no Brasil atraiu aproximadamente um milhão de pessoas
na praia de Botafogo. A competição foi transmitida ao vivo
para todo o país pela Rede Globo e depois foi reprisada pela
SporTV, canal a cabo de esportes. Afinal, não é algo comum as-
sistir a uma corrida de aviões. O retorno de mídia espontânea
que a Red Bull conseguiu com o evento foi gigantesco.
O capital está para a empresa ou para a pessoa assim como
o sangue está para o corpo. É o sangue quem alimenta cada uma
das partes do organismo com os nutrientes necessários à sua so-
brevivência. E é o capital é quem fornece os subsídios necessá-
rios para um projeto se iniciar ou se manter em desenvolvimento.
Porém, quanto menor for o capital disponível (mais para
a direta ele estiver no eixo), menor será a chance de se pro-
mover a Inovação. A falta de recursos monetários, humanos e
de tempo inviabilizam a transformação de ideias criativas em
produtos, serviços e projetos inovadores. Sem capital para in-
vestimento, não há Inovação. Mas em alguns casos, as empre-
sas conseguem promovê-la, mesmo contando com um capital

123
Explosão da Inovação

pequeno. Isso só é possível quando os esforços são potenciali-


zados e a ideia é muito criativa.
Foi o que aconteceu com a companhia Sucos Dell Valle. A
empresa, de origem mexicana, chegou ao Brasil em 1997 com
uma ideia inusitada: comercializar sucos em latas de alumínio.
Até então, para o consumidor brasileiro, latas eram para re-
frigerantes, e sucos eram servidos em copos e feitos na hora,
fossem naturais ou em polpa. Mas o que chama mais a atenção
é que os mexicanos aportaram por aqui sem um grande capital
para investir. Eles não investiram em propaganda nem monta-
ram uma fábrica. Os produtos, no início, eram importados. Seu
escritório era muito simples, com máquinas e equipamentos de
TI muito desatualizados, e a equipe de profissionais contratada
era minúscula.
Com poucos recursos, os executivos da empresa opta-
ram por investir em distribuição. Assim, seus produtos foram
aos poucos chegando a vários pontos de venda da cidade de
São Paulo. Com a boa aceitação, eles passaram a ser vendidos
em outras cidades do estado, e depois em outros estados do
país. Após dois anos de operação e vendo a oportunidade de
crescimento, então a Sucos Dell Valle construiu uma fábrica,
deixando de importar a bebida. A propaganda da empresa era
seu produto no ponto de venda e a divulgação boca a boca dos
seus consumidores. O portfólio de sucos com sabores diferen-
tes dos usuais (não havia os sucos típicos como laranja, uva,
limão etc.) contribuiu para que a empresa não competisse dire-
tamente com os sucos naturais. Há alguns anos, o crescimento
da empresa chamou a atenção da Coca-Cola, e ela foi comprada
pela multinacional norte-americana.
Com esse exemplo, é possível perceber que Inovações
podem ocorrer mesmo que a empresa ou a pessoa possua um
pequeno capital. Mas isso é mais perigoso, além de tornar o
processo mais lento.

124
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

4.4.5 Sistema

O Sistema de uma empresa é o modo como ela se organiza


e se estrutura para o desenvolvimento do seu trabalho. Nele, as
tarefas são distribuídas, agrupadas e coordenadas segundo os
princípios ou regras convencionados pela corporação. São ca-
racterísticas do sistema: o grau de especialização do trabalho,
a departamentalização, a cadeia de comando, a amplitude do
controle, o grau de centralização e a formalização do trabalho.
Grau de especialização é o quanto uma determinada ati-
vidade é subdividida. Quanto maior a quantidade de divisões,
mais especializada é a tarefa. A especialização do trabalho faz
que cada integrante do processo execute exclusivamente uma
parte do serviço. Com isso, aumenta-se a rapidez de cada pro-
cesso, mas o funcionário é alienado em relação às outras partes
e ao todo. Ele passa a se preocupar apenas com a sua pequena
parte, ignorando todo o restante do processo.
Departamentalização é o meio de reunir as atividades que
apresentam maiores ligações entre si e que podem ser coorde-
nadas de forma comum. A departamentalização pode ser por
função (por exemplo, atendimento ao consumidor, pesquisa e
fabricação), por produto (carnes, cereais e lácteos), por região
geográfica (sudeste, sul, nordeste), por processo (fundição,
modelagem, acabamento, inspeção) e por cliente (corporativos
e pessoas físicas).
Cadeia de comando é a linha de autoridade que dirige a
empresa, definindo quem se reporta a quem. Normalmente, ela
segue do topo da organização até o escalão mais baixo. Mas
há casos de chefias múltiplas e de equipes autogerenciadas e
multifuncionais.
Amplitude de controle refere-se ao número de funcioná-
rios que um administrador consegue dirigir com eficiência, e
está associada à quantidade de níveis hierárquicos existentes

125
Explosão da Inovação

na empresa. A presença de muitos níveis na hierarquia ajuda


o líder a coordenar sua equipe (tradicionalmente menor), mas
dificulta o processo de tomada de decisão. Ter poucos níveis
hierárquicos dificulta o líder na coordenação dos funcionários
(a equipe tende a ser maior), mas aumenta a rapidez no pro-
cesso decisório.
Nível de centralização é o quanto uma decisão está con-
centrada em uma única pessoa. Em algumas instituições, o
principal executivo, ou aqueles em posição mais alta, tomam
todas as decisões. Em outras, muitas decisões são tomadas di-
retamente pela equipe envolvida na atividade, dependendo do
grau de centralização da organização.
Formalização refere-se a quanto as atividades e o trabalho
dentro da empresa são padronizados. Quando há muita padro-
nização, os responsáveis têm pouca autonomia para mudá-las
ou adaptá-las. Mas quando não há nenhuma padronização, eles
podem inventar novos processos e procedimentos, adaptando-
os às novas situações e necessidades.
Por que, afinal, um sistema está sendo descrito em seus
detalhes? Porque suas características implicarão sensivelmen-
te na forma como as pessoas da empresa trabalharão. E é essa
forma de trabalho que as tornará mais apta a inovar ou não.
Quando a organização tem um modelo de rede fluida e
flexível, em que o talento do funcionário é valorizado, as equi-
pes são autogeridas, soluções diferenciadas são buscadas e há
baixo grau de hierarquia, trata-se de um sistema Orgânico.
Mas quando a organização é calcada em formas burocráticas
de comando e controle, em que se prioriza a repetibilidade das
ações e a hierarquia exerce grande poder nas relações profis-
sionais, trata-se de um sistema Mecanicista de empresa. Exis-
tem infinitas possibilidades entre essas duas situações tão con-
trárias, que se posicionam em algum ponto do eixo horizontal
na figura a seguir.

126
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

Elemento S – Sistema

Mecanicista orgânico

sistema burocrático, sistema intermediário sistema aberto,


com comando e de burocracia, com rede fluida
controles rígidos comando e controle e flexível

Capacidade Capacidade Capacidade


baixíssima de mediana de altíssima de
promoção da promoção da promoção da
Inovação Inovação Inovação

Quanto mais orgânica for uma empresa (mais para a di-


reita estiver no eixo Orgânico/Mecanicista), maior capaci-
dade de inovar ela tem. A empresa Orgânica é caracterizada
como sendo formada por uma rede flexível. Os profissionais
não são divididos em departamentos fixos ou estanques. Ao
contrário, são agrupados em equipes ou em processos de tra-
balho. Suas atividades não são muito especializadas, o que li-
mita sua responsabilidade para uma pequena parte do proces-
so. Seu trabalho, na verdade, é sistêmico, exigindo habilidades
multifuncionais maiores e provocando, por consequência, um
comprometimento maior em relação ao resultado final. Com
isso, esse grupo passa a se autogerir, não necessitando de um
grande controle externo do trabalho desenvolvido, e os níveis
hierárquicos são tradicionalmente menores. Além disso, como
o mais importante é o resultado final apresentado, não há pa-
dronização ou normatização excessiva das atividades, fato per-
mite aos grupos buscar soluções novas e diversificadas.
Um bom exemplo de trabalho orgânico foi o desenvol-
vido pela equipe da NASA no salvamento da equipe de astro-

127
Explosão da Inovação

nautas da nave Apolo 13, trabalho esse que é retratado com


muita emoção no filme que leva o nome da aeronave, com Tom
Hanks no papel principal. Em 1970, menos de um ano após
o sucesso da Apolo 11, a agência norte-americana fazia sua
terceira viagem tripulada para a Lua. Dois dias após o lança-
mento da aeronave, o tanque de oxigênio explodiu e mandou
para o espaço um lado inteiro do módulo de serviço. A falta
de oxigênio havia sido reparada, mas a respiração continuava
a preocupar, porque os astronautas poderiam morrer sufoca-
dos pelo próprio gás carbônico que expeliam dos pulmões. O
módulo tinha sido planejado para duas pessoas, não três, e os
filtros do módulo lunar Aquarius não eram suficientes. A saída
viável era aproveitar os filtros do módulo de comando, o Odis-
sey, mas teriam que ser adaptados. Foi montada uma equipe em
Houston para resolver essa questão. Para isso, foram forneci-
dos ao grupo de trabalho todos os materiais que os astronau-
tas teriam disponíveis na nave. O grupo se fechou em uma sala
e lá permaneceu até que a solução fosse encontrada.
Após horas de trabalho intenso, o grupo criou um filtro
improvisado com fitas adesivas, papelão e sacos plásticos, de-
nominado “caixa de correio”. A solução encontrada a distância
foi depois transmitida aos astronautas, e após uma série de pro-
cedimentos bem-sucedidos, a tripulação, liderada pelo coman-
dante Jim Lovell, conseguiu conduzir a nave de volta à Terra,
mergulhando no Oceano Pacífico, com todos em segurança.
Nesse caso, é possível perceber todos os elementos de um
sistema orgânico. A equipe foi selecionada para uma atividade
específica e multifuncional, sem uma rígida hierarquia dentro
dela. Os envolvidos tinham total controle do processo e mo-
tivação para superar os desafios, e o líder não precisou ficar
controlando cada passo da equipe, preocupando-se apenas em
fornecer os recursos necessários, ajudar no desenvolvimento
e acompanhar os resultados. Além disso, a equipe de trabalho

128
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

não se limitou a seguir um código de normas e procedimentos


-padrão para executar a atividade.
O trabalho estruturado em forma de redes abertas e fle-
xíveis, no qual os participantes são alocados conforme a neces-
sidade da tarefa, é ideal para a busca de novas soluções e para
o atendimento de demandas específicas. Além disso, quando as
regras não são rígidas e não há burocracia, a equipe tende a
ousar mais e a usar mais a criatividade. Tradicionalmente, as
organizações orgânicas apresentam um nível maior de ousadia e
aprendizado, e os talentos da equipe são mais bem aproveitados.
A empresa orgânica é mais bem preparada para passar
pelas mudanças resultantes do meio ambiente, pois seu proces-
so estrutural e organizacional não é fixo. Por ser flexível, ela
consegue se adaptar melhor às mudanças e reagir rapidamente
às alterações a sua volta.
Quanto mais mecanicista for uma empresa (mais para a
esquerda ela estiver no eixo), menor é a chance de ela pro-
mover a Inovação. A empresa Mecanicista é aquela em que se
estrutura por meio da burocracia. O comando e o controle são
baseados na supervisão completa de cada etapa do trabalho e
os profissionais são divididos em departamentos. O trabalho
possui um grande grau de especialização, o que permite um
maior domínio de cada um pela sua fase. Com isso se criam
mais chances de se promover a repetibilidade rapidamente.
Para tal, há grande padronização em tudo o que é feito. Como
o trabalho desenvolvido é específico, os profissionais precisam
ser especializados naquele assunto ou tema. Apesar de se ga-
nhar rapidez e constância, esse sistema faz com que a pessoa
perca a visão do todo. Como há várias tarefas específicas, exis-
te a necessidade de uma liderança mais presencial e com maior
controle de tudo o que ocorre. Para estruturar o fluxo fo tra-
balho e cada uma de suas fases é preciso uma grande normati-
zação das atividades.

129
Explosão da Inovação

Um exemplo clássico de instituição que se utiliza do sis-


tema mecanicista são as Forças Armadas. Nelas, há uma rígida
estrutura hierárquica e de comando, na qual predominam a
ordem e a disciplina. Numa organização militar, papéis e res-
ponsabilidades são definidos objetivamente e as relações de
superiores e subordinados são muito bem estabelecidas. Ape-
sar de os diversos níveis hierárquicos serem pré-definidos, não
há necessariamente uma unicidade de comando. Por exem-
plo, qualquer sargento de um determinado batalhão poderá
ser responsável por um grupo de soldados ou cabos, nunca o
contrário. Uniformes, patentes e, até mesmo cortes de cabelo
ajudam a caracterizar e a identificar praças e oficiais em seus
respectivos postos e graduações. Em termos gerais, a ciência
militar considera três níveis de atuação ofensiva e defensiva:
estratégico, tático e operacional. Soldados atuam, naturalmen-
te, apenas no nível operacional, enquanto oficiais de alta pa-
tente atuarão no estratégico. Cada atividade, por mais simples
que seja, possui um procedimento claro e normatizado, para
minimizar a variabilidade dos processos. Atividades rotineiras
são repetidas à exaustão, a exemplo dos exercícios de ordem
unida, em que comandados devem obedecer aos comandos do
chefe do pelotão. Nesse ambiente, há muito pouco espaço para
Inovação, ainda mais no nível operacional.
As empresas mecanicistas são mais bem preparadas para
manter a produtividade e o alto desempenho segundo um
determinado status quo. Elas são constituídas para trabalhar
segundo um modelo rígido e fixo, ideais para ambientes que
apresentam pouca ou nenhuma mudança. Mas quando depara-
das com cenários em mutação, elas têm grandes dificuldades
para se adaptar; afinal, não foram constituídas para isso.

130
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

4.5 Relação entre os Elementos e os Tipos de Empresas

Após discutir a composição de cada um dos elementos


da capacidade interna, é possível definir qual é o tipo de em-
presa analisada. Antes, porém, é fundamental citar algo que
já foi abordado no capítulo anterior, ou seja: esses elementos
também se relacionam e se influenciam mutuamente. Assim, o
diagnóstico correto deve ser feito avaliando-os conjuntamen-
te. No tópico anterior, essa análise foi individual, apenas para
explicar mais facilmente cada uma delas.
A combinação dos elementos da capacidade interna, tam-
bém chamados MACCS, que são motivação, autonomia, conhe-
cimento, capital e sistema, vão definir se a empresa é do tipo
Inovadora ou Não Inovadora. A empresa Inovadora possui
grande capacidade interna de promover a Inovação, enquanto
a Não Inovadora tem sérias dificuldades para isso.

Relação entre os Elementos do MACCS

Motivação
desmotivado Motivado
Autonomia
dependente Independente
Conhecimento
Ignorância sabedoria
Capital
limitado Ilimitado
Sistema
Mecanicista orgânico

Para a composição da equipe que vai analisar a empre-


sa, é importante escolher pessoas que conheçam a organiza-
ção, profissionais que tenham familiaridade com o modelo da
Explosão da Inovação e pessoas de outros mercados. Aqueles
que conhecem a empresa fornecerão informações sobre seus

131
Explosão da Inovação

processos, sobre como as atividades são organizadas, sobre a


relação entre os funcionários, sobre a forma como a liderança
age em diversas situações, sobre os produtos e serviços ofere-
cidos etc. Os profissionais que conhecem o modelo ajudarão na
parte metodológica da avaliação, enquanto os que são de ou-
tros mercados auxiliarão no momento de comparar os níveis
dos elementos.
O tipo de empresa é definido pelo resultado final da com-
binação do MACCS. Da mesma forma como foi feita a avalia-
ção dos elementos do ambiente externo, a classificação dos ele-
mentos da capacidade interna deve seguir escala de -3 (quando
estiver totalmente à esquerda) a +3 (quando estiver totalmen-
te à direita). Veja o modelo a seguir.

Modelo de Diagnóstico da Capacidade Interna - MACCS

Motivação
desmotivado Motivado
Autonomia
dependente Independente
Conhecimento
Ignorância sabedoria
Capital
limitado Ilimitado
Sistema
Mecanicista orgânico

Vamos imaginar que uma empresa tenha sido avaliada


segundo o modelo da Explosão da Inovação e que possua a se-
guintes características: tem certa motivação (+1), possui alto
grau de autonomia (+3), conhece profundamente aquilo que

132
A CAPACIDADE INTERNA COMO COMBUSTÍVEL DA INOVAÇÃO

faz (+3), possui baixo capital (-1) e seu sistema de trabalho é


muito mecanicista (-2). Essas informações devem ser coloca-
das na tabela de diagnóstico do MACCS a seguir.

Diagnóstico MACCS
Combustível – Capacidade Interna

Motivação

Autonomia

Conhecimento

Capital

Sistema

O Gráfico do Combustível, do tipo “teia de aranha” ou


“radar”, muito parecido com o Gráfico Comburente apresenta-
do no final do Capítulo 3, é criado a partir dessas informações,
como é mostrado a seguir.

133
Explosão da Inovação

Gráfico do Combustível

s a

C C

A capacidade interna da empresa é retratada pela área


preenchida do gráfico. Quanto maior ela for, maior será a ca-
pacidade da companhia em promover a Inovação, sendo assim
classificada como uma empresa Inovadora. Quanto menor ela
for, menor é a capacidade dessa organização em promover a
Inovação e, portanto, ela será considerada Não Inovadora.
No exemplo acima, percebe-se que essa empresa está em
uma situação intermediária, pois possui uma capacidade inter-
na mediana. Ela tem pontos muito destacáveis (como Autono-
mia e Conhecimento) e outros muito baixos (como Sistema e
Capital). Ou seja, além de atestar a situação atual da compa-
nhia, o modelo da Explosão da Inovação também fornece a
estudantes, executivos e empresários a oportunidade de iden-
tificar os pontos exatos que devem ser trabalhados para a me-
lhora da capacidade interna de promoção da Inovação.

134
Capítulo 5

A Ideia Criativa como Faísca da Inovação

135
Explosão da Inovação

De acordo com os dois capítulos anteriores, se o ambien-


te exigir mudanças de postura, transformações no modelo de
negócio e alterações em relação aos produtos (Capítulo 3) e
houver alguém com a capacidade interna para promovê-las
(Capítulo 4), muito provavelmente a Inovação acontecerá. Po-
rém, o processo inovador não é tão simples assim. Falta ainda
um componente importante, que ainda não foi abordado em
detalhes. É esse componente que fornecerá a solução para o
problema encontrado pela “sacada genial”, que será depois im-
plementada pela pessoa ou pela empresa, resultando na Inova-
ção propriamente dita.
Um Ambiente Inovador fornece uma grande variedade
de problemas para quem está dentro dele, cria uma atmosfera
de hostilidade e perigo, forçando a mudança do status quo. Mas
ele não aponta o caminho a ser seguido nem determina qual é
a melhor resposta para as diversas indagações feitas. Essa é a
demanda que deve vir da pessoa ou da empresa inserida nesse
cenário.
A Empresa Inovadora tem a capacidade para superar es-
ses desafios e a competência para promover as mudanças ne-
cessárias à sua sobrevivência e segurança, condição essa que
vem da sua capacidade interna de transformação. No entanto,
essa competência não tem a propriedade de gerar soluções;
ela simplesmente pega uma solução já definida e a desenvolve,
executando as ações necessárias para transformá-la em Inova-
ções. Porém, a geração da solução em si não vem da capacidade
interna.
O apontamento do caminho da Inovação a ser seguido,
portanto, não é uma característica do ambiente externo nem
da capacidade interna. Estes não possuem competência para
escolher qual é a solução ideal para os desafios impostos, não
estabelecem qual o rumo certo a ser tomado diante de uma
encruzilhada de possibilidades. Mas de onde vem a solução?

136
A Ideia criativa como faísca da inovação

Quem irá apontar o caminho inovador que deverá ser se-


guido é o terceiro integrante do modelo, chamado Ideia Cria-
tiva. Ela é completamente independente do ambiente externo
e da capacidade interna e é quem trará a solução e dirá qual
caminho a Inovação deverá seguir. É ela que tem o poder de
conceber a Inovação. Mas o que é uma Ideia Criativa? Quais
são suas características e a sua importância?

5.1 A Ideia Criativa como Geradora da Inovação

A Ideia Criativa é a solução não convencional encontrada


para superar um desafio ou resolver um problema. Ela possui
uma característica mais conceitual do que prática, sendo mais
abstrata do que concreta. Sua órbita é o mundo das idealiza-
ções e das aspirações e pode ser encarada como um sonho ou
uma projeção futura originada na busca de superação das hos-
tilidades do ambiente.
Toda Inovação começa, necessariamente, com uma Ideia
Criativa. É essa ideia que formará a base e os elementos ino-
vadores que serão desenvolvidos mais tarde. O papel da Ideia
Criativa é gerar a Inovação responsabilizam-se por sua con-
cepção e nascimento. Pode-se dizer que ela é a semente, pois
apenas após sua germinação e seu desenvolvimento (resultado
da capacidade interna) será possível transformá-la efetivamen-
te em uma árvore com frutos inovadores. Em outras palavras,
a Ideia Criativa é representada pela semente e a Inovação pela
árvore que dará os frutos dessa semente.
Em outra metáfora simples, a Ideia Criativa pode ser
representada por um feto na barriga da mãe. Nesse estágio,
todo cuidado é pouco, e é preciso atenção redobrada. Qualquer
descuido pode comprometer a vida do pequeno ser ou trazer
sequelas para toda a sua existência. Para que chegue à fase

137
Explosão da Inovação

adulta, ele precisará nascer, crescer e se desenvolver. O mesmo


ocorre com a Ideia Criativa. Ela ainda não é uma Inovação,
mas tem total condição de, um dia, tornar-se uma. Essa traves-
sia da vida uterina (de ideia) para a vida adulta (de Inovação)
é longa e requer atenção e acompanhamento dos pais (do feto
ou da idéia), desde a gestação, passando pela infância e pela
adolescência.
No começo do século XVIII, o padre português Bartolo-
meu de Gusmão teve uma ideia: criar um balão que flutuasse
no ar. A ideia surgiu da observação de como as bolhas de sa-
bão flutuavam. Ele percebeu que o ar quente de dento delas
era mais leve do que o ar de fora, fazendo com que as bolhas
vagassem pelo ar. Dessa forma, sua ideia era criar um balão de
ar quente que planasse no ar. Ela permaneceu como uma Ideia
Criativa até o dia em que Gusmão desenvolveu um veículo pa-
recido com um balão a ar quente. Em 1709, em uma demons-
tração para o rei D. João VI, seu invento voou a quatro metros
de altura, para a surpresa e a perplexidade dos presentes. Ape-
sar de bem-sucedida, sua criação não despertou interesse de
ninguém, sendo depois abandonada. Somente no final daque-
le século os franceses Étienne e Joseph Montgolfier criaram
um balão nos mesmos moldes do português e entraram para
a história como os inventores oficiais do balão a ar. Naquele
momento, com o interesse do público, a Ideia Criativa original
transformou-se efetivamente em Inovação.
Outro exemplo de Ideia Criativa relacionada ao sonho
humano de voar envolve um brasileiro. Desde a sua infância, o
mineiro, criado no Rio de Janeiro, Alberto Santos Dumont se
interessou por máquinas e grandes aventuras. Com o passar
dos anos, foi desenvolvendo a ideia de criar uma máquina em
que pudesse voar. Depois da morte de seu pai, em 1892, ele re-
cebeu uma considerável herança, tornando-se um dos homens
mais ricos do mundo. Com capital disponível e interesse vol-

138
A Ideia criativa como faísca da inovação

tado para a criação do avião, passou a se dedicar às suas ideias


que, anos mais tarde, resultaram na sua mais famosa invenção.
No começo do século XX, quando já morava na França,
Santos Dumont disse a seguinte frase para aqueles que não
acreditavam em suas ideias: “Haverá hoje, talvez, quem ridicu-
larize minhas previsões sobre o futuro dos aeroplanos. Quem
viver, porém, verá!”. Ele estava certo. Depois de muitos planos,
do desenvolvimento de vários projetos de nave e de dezenas
de testes, que até mesmo colocaram em risco a sua vida, San-
tos Dumont finalmente conseguiu voar. Era setembro de 1906
quando ele conseguiu fazer o 14 Bis voar em Paris. Foi a pri-
meira exibição pública em que uma máquina mais pesada que
o ar levantava voo sem a necessidade de ser catapultada. Nesse
dia, o Pai da Aviação, como é conhecido em muitos países do
mundo, deu um passo fundamental para que sua Ideia Criativa
fosse transformada em uma grande Inovação. A Inovação pro-
priamente dita ocorreu quando a ideia se transformou em uso
efetivo a partir da demanda dos clientes.
As Ideias Criativas surgem da condição humana de ana-
lisar uma situação e propor-lhe alternativas únicas e originais.
Para isso, é necessário estar envolvido com o problema, dedi-
car-se incansavelmente para encontrar as soluções, usar e abu-
sar da criatividade como forma de trabalho, ter persistência em
relação à ideia proposta e não ter nenhum bloqueio criativo ou
algum tipo de censura no processo de geração das ideias.
A criatividade está ligada diretamente à forma como o
cérebro humano trabalha, o que, por sua vez, depende da ma-
neira como a pessoa foi educada e pensa. Tradicionalmente,
os modelos de educação valorizavam a forma racional e lógica
de aprendizado em detrimento da subjetiva e emocional. Em
uma aula típica ou em um curso tradicional, o lado esquerdo
do cérebro humano é muito mais trabalhado do que o direito.
Por meio das palavras e dos números, o professor apresenta o

139
Explosão da Inovação

conteúdo de um determinado assunto, explicando os detalhes


de uma parte dele. O estudo e o aprendizado são feitos normal-
mente pela leitura e pela audição. Assim, acaba-se aprendendo
por meio dos aspectos lógicos e racionais uma fração do tema
abordado. Esse modelo é aplicado na maioria das escolas de
ensino básico e fundamental e na maioria dos cursos de gradu-
ação com perfil técnico, como Engenharia, Matemática, Física
etc. E o outro lado do cérebro, como fica? O lado direito é o
responsável pela parte emocional e subjetiva, que compreende
o entendimento das cores, das imagens e dos sons. É ele que
faz nossas emoções serem ativadas e permite a compreensão
do todo (da relação entre as diferentes partes de um tema e das
relações desse assunto com os demais). Os cursos com perfil
humano, como Música, Artes, Psicologia, Cinema, Publicida-
de, entre outros, estimulam mais o uso do lado direito do cére-
bro dos alunos.

Hemisférios do Cérebro

LADO LADO
ESQUERDO DIREITO
lógico subjetivo
racional Emocional
palavras Imagens
números ritmo
detalhes Geral
vê a parte vê o todo

lado tipicamente lado tipicamente


mais utilizado por mais utilizado por
engenheiros e matemáticos artistas e publicitários

Mas, afinal, que lado do cérebro humano responde pela


criatividade? Normalmente, imagina-se que seja o lado direito,

140
A Ideia criativa como faísca da inovação

mas isso é um equívoco. Estudos científicos comprovam que


são os dois. Somente quando o cérebro trabalha concomitante-
mente com os dois hemisférios, a criatividade é aflorada. Para
ser criativo é necessário, portanto, ser racional e emocional.
Deve-se ser lógico e subjetivo ao mesmo tempo. É preciso fo-
car em um detalhe do tema, sem se esquecer do todo, da visão
sistêmica. É necessário ser especialista no assunto estudado
enquanto se analisa a conexão desse tema com os outros.
Exatamente por essa característica e pela condição físi-
ca do cérebro é que se afirma que a Ideia Criativa é gerada a
partir da combinação do envolvimento emocional da situação
com a necessidade de se pensar no problema de forma racional
e lógica.
Sem uma grande ideia, o desenvolvimento da Inovação
ficará comprometido. Não é possível gerar uma grande e bela
planta se sua semente não for forte e saudável. A Ideia Criati-
va é o DNA da Inovação. Quanto melhor seu código genético,
mais impactantes e intensas serão as transformações resultan-
tes dela.
Pelos motivos mencionados, fica clara a importância de
se estimular ambos os lados do cérebro, independente do curso
que se faça, pertença ele às ciências técnicas ou humanas. Ape-
sar de haver iniciativas nesse sentido, esse tipo de estimulação
do cérebro ainda é um grande desafio para os educadores do
século XXI.

5.2 O Papel da Ideia Criativa na Explosão da Inovação

A Ideia Criativa tem o papel de desencadear a reação no


modelo da Explosão da Inovação. Ou seja, ela age como a cata-
lisadora de todo o processo. Em uma comparação com a com-
bustão tradicional, ela é o calor. É a partir do seu contato com

141
Explosão da Inovação

o combustível que o fogo pode ser propagado, mas isso só é


possível se o comburente mantiver o fogo aceso até sua expan-
são e propagação.
O calor pode ser um fósforo, uma faísca, uma tocha ou
uma chama, que possuem a função de fornecer o calor para o
início da reação. Se a explosão vai acontecer e como vai ocor-
rer, não se sabe. A finalidade da chama e do fogo é dar o ponta-
pé inicial para o processo.
No final de 1994, um grave incêndio aconteceu no Egito,
matando mais de 500 pessoas. Uma grande tempestade com
muita chuva atingiu uma montanhosa cidade egípcia, provo-
cando uma enxurrada. A água desceu pela encosta e invadiu os
trilhos de uma linha férrea, derrubando um trem que carrega-
va combustível, e litros e mais litros de óleo foram derramados.
Apesar do cenário para uma grande tragédia estar ar-
mado, faltava um elemento. Havia grande quantidade de com-
bustível para provocar a explosão e o ambiente continha com-
burente (oxigênio) suficiente para provocar a reação. Mas e o
calor? E a faísca de fogo para iniciar a explosão, onde estava?
Se não houvesse nenhuma partícula contendo calor o incêndio
não ocorreria, por mais material inflamável que houvesse no
ambiente.
Infelizmente, um raio caiu no local naquele momento. De
forma instantânea, a faísca do raio reagiu com o combustível
espalhado no local e o fogo se expandiu rapidamente, incen-
diando dezenas de casas que estavam no caminho. A rapidez
da propagação do fogo não deu chances para que os moradores
daquela região fugissem e centenas deles foram queimados vi-
vos em um triste episódio.
A escolha desse exemplo se deu pela presença do raio.
Um fenômeno natural provocado pela chuva intensa gerou o
calor necessário para o início da explosão. Foi um raio, mas o
mesmo episódio poderia ter sido resultado de um fósforo ati-

142
A Ideia criativa como faísca da inovação

rado ao chão, da queda de um lampião ou mesmo da presença


de uma partícula de fogo originada de uma fricção de dois ma-
teriais sólidos.
A faísca pode ser grande ou pequena. Mesmo pequena,
ela contém calor suficiente para provocar uma grande explo-
são. Isso só acontece porque as partículas de fogo estão com-
primidas e concentradas em pequenos espaços. Um cigarro
aceso carrega o fogo em uma pequena parte do seu “corpo”.
Quanto maior e mais intensa for a faísca, maior será a probabi-
lidade da explosão ocorrer.
A Ideia Criativa tem a mesma particularidade da chama
ou da faísca. É ela quem inicia o processo inovador. Toda Ino-
vação acontece a partir de uma ideia incomum. Quanto mais
criativa for essa solução, maior a chance de a Inovação provo-
cada por ela ser mais impactante e intensa. Pode-se comparar
uma ideia sem criatividade a um cigarro apagado, a um fósforo
sem estar acesso ou a uma tocha encharcada de água. Nenhum
deles provocará o calor necessário para catalisar a reação. A
criatividade é o calor, é a intensidade da chama e a partícula
do fogo.

5.3 Tipos de Ideias

Existem no campo metodológico dois tipos de ideias: as


que possuem elementos novos e originais, que são chamadas de
Ideias Criativas, e as que têm como base os pressupostos e para-
digmas existentes, que são chamadas de Ideias Não Criativas. O
primeiro grupo é formado pelas ideias que têm mais chances de
gerar uma Inovação, enquanto o segundo é constituído por aque-
las que têm pequena possibilidade de prosperar como Inovação.

143
Explosão da Inovação

Tipos de Ideias

Ideia criativa Gera Inovação

x
Ideia não criativa não gera Inovação

A Ideia Criativa é o resultado da capacidade de geração


de soluções novas, inusitadas e não convencionais. Ela é pro-
movida tanto por pessoas quanto por grupos de trabalho.
Segundo o livro Destruição criativa, que compilou as in-
formações geradas em uma pesquisa realizada pela empresa
de consultoria McKinsey, as empresas mais bem-sucedidas dos
últimos anos foram aquelas que melhor promoveram o pensa-
mento divergente. O choque de opiniões antagônicas, diferen-
tes e inusitadas promove a geração de ideias criativas, que por
sua vez, quando trabalhadas e tratadas, alimentam o processo
de desenvolvimento da Inovação.
Desenvolver a criatividade associada a novas habilida-
des de percepção e de raciocínio é de fundamental importância
para a estratégia da organização na realização das mudanças
necessárias. A Ideia Criativa estimula a solução inventiva de
problemas e desafios.
Jornada nas Estrelas (Star Trek) era uma série de televi-
são da década de 1960 que narrava as aventuras dos homens
em suas viagens interplanetárias e seu contato com seres de
outras galáxias. Nessa ficção científica, era possível ver super-
computadores que controlavam tudo, telefones portáteis sen-
do usados corriqueiramente, o homem viajando no espaço e as
pessoas fazendo coisas a partir do clique de um botão.
O que no passado foi previsto sobre o futuro tem muito
a ver com o presente que vivemos hoje. Na década de 1930,
imaginava-se que um dia seria possível duas pessoas se falarem

144
A Ideia criativa como faísca da inovação

e se verem em uma conversa pelo telefone. Atualmente, isso


pode ser feito através do Skype, uma das várias ferramentas
de comunicação que aliam imagem e som. Na década de 1940,
idealizava-se que uma pessoa poderia assistir às imagens pelo
rádio. Há muitos anos existe a televisão, que faz isso. Na dé-
cada de 1950, imaginava-se que no futuro seria possível fazer
compras eletrônicas a partir das imagens geradas pela televi-
são. Atualmente, compras on-line podem ser feitas diretamente
pela internet.
Tudo o que existe hoje surgiu antes na mente de uma
pessoa como uma ideia absurda. Quanto mais absurda, impro-
vável e inventiva é essa ideia, mais criativa ela é. As soluções
criativas são a base da Inovação. Graças a elas o homem con-
segue fugir do convencional e propor novas aplicações para o
seu dia a dia. Dias, semanas, meses, anos, décadas ou séculos
podem passar até elas se concretizarem.
Leonardo da Vinci nasceu e viveu em Florença (Itália)
entre os séculos XV e XVI e foi uma das mentes mais cria-
tivas de toda a história. Além de pintor (pintou a Monalisa,
o quadro mais famoso da história ocidental), também tocava
instrumentos inventados por ele, criava máquinas e objetos, e
era cientista, matemático e mecânico. Foi ele quem inventou o
carro autopropelido (carro de madeira que se movia pela in-
teração de molas com rodas engrenadas), o parafuso-voador
(alguns cientistas consideram-no o protótipo rudimentar dos
helicópteros modernos), o canhão de três canos (modelo mais
rápido, mais leve e com maior poder de fogo), o planador com
asas (um dos vários inventos dele que voavam, esse modelo de
planador tinha asas que batiam), a ponte giratória (ponte feita
com materiais leves e fortes fixados a um sistema de cordas
e polias), as engrenagens para mergulho submarino (traje de
mergulho feito de couro, conectado a um snorkel feito de cana
e com um cinto que flutuava na superfície) e a escrita reversa

145
Explosão da Inovação

(maneira encontrada por Leonardo para enganar os plagiado-


res que olhavam suas anotações e não as entendiam – era ne-
cessário colocá-las na frente do espelho para entendê-las). Mas
de onde surgiu tamanha habilidade para criar tantas coisas?
De sua criatividade. Antes de qualquer coisa, cada invenção de
Da Vinci era um exercício de imaginação e ficção. Depois que
ele criava na sua mente, começava o trabalho de materialização.
Assim, a principal característica da Ideia Criativa é o
seu alto potencial de ser transformada em uma Inovação. A
Ideia Criativa é a chama de uma possível grande Explosão
da Inovação.
A Ideia Não Criativa, por sua vez, é aquela que não traz
nenhum elemento novo ao mundo. Ela simplesmente acom-
panha a tendência natural das coisas e faz um reagrupamento
convencional dos elementos já existentes. Muito dificilmente
será possível utilizá-la para a promoção da Inovação.
Mas por que existem pessoas e empresas mais criativas
do que outras? Por que algumas delas não conseguem, de al-
guma forma, conceber soluções inusitadas para os problemas?
Para a maioria dos especialistas, a criatividade não é uma mera
característica da personalidade ou uma habilidade geral, mas
um comportamento resultante de determinadas característi-
cas pessoais e de habilidades cognitivas. Existem várias des-
crições de comportamentos atrelados a indivíduos criativos,
ou seja, as pessoas e as instituições que não conseguem ser
criativas, provavelmente não possuem as características ou as
habilidades para isso.
Segundo a metodologia aqui apresentada, existem dois
tipos de ideias: as que têm potencial para ser transformadas
em Inovação e são chamadas de Criativas e as que não têm esse
potencial e são chamadas de Não Criativas. Porém, na prática,
existe uma infinidade de outros tipos de ideias que variam
entre essas duas condições. É quase impossível encontrar uma

146
A Ideia criativa como faísca da inovação

ideia totalmente criativa ou uma totalmente não criativa. Assim,


todas se situam em alguma posição do eixo da criatividade.

Tipos de Ideias

Teoria
Ideia Ideia
não criativa criativa

Infinitas Ideias
Prática

Mas, afinal, o que é uma Ideia Criativa? Quais são as ca-


racterísticas que diferem uma Ideia Criativa de uma Ideia Não
Criativa? Quais são os elementos que as compõem? Essas in-
terrogações serão solucionadas a seguir, no próximo tópico.
Nele serão descritas, basicamente, as condições necessárias que
aumentam a chance do surgimento das ideias criativas na men-
te de uma pessoa ou no trabalho de um grupo de profissionais.

5.4 Os Elementos da Ideia Criativa – SETEC

A Ideia Criativa, que dá origem ao processo inovador,


surge a partir de cinco elementos, aos quais nos referimos
por SETEC, que são as iniciais das palavras: Sentidos, Equipe,
Transpiração, Estalo e Confiança. A união entre eles resultará na
condição necessária para a geração da ideia criativa. A imagem
a seguir mostra cada um dos elementos que compõe o SETEC.

147
Explosão da Inovação

Elementos da Ideia Criativa – SETEC

Sentidos
Equipe
Transpiração
Estalo
Confiança

Os Sentidos formam o conjunto de estímulos captados


do ambiente e transmitidos ao cérebro para serem transforma-
dos em sensações e pensamentos. Eles entram no organismo
através dos órgãos do sentido que a pessoa concentra naquela
situação. Quando muitos sentidos estão acionados ao mesmo
tempo, considera-se esse estado como Sinestésico. Mas quando
nenhum sentido está canalizado para o problema em questão,
diz-se que o estado é Anestésico.
A Equipe representa a variedade de características e opi-
niões dos membros participantes de um trabalho. Quanto mais
variado for um grupo, maiores serão as chances de ocorrer
choques de opiniões e de haver divergência. Esse conflito é
extremamente saudável para a criatividade. Grupos formados
por pessoas muito diferentes são classificados com Heterogê-
neos, enquanto aqueles formados por pessoas muito parecidas
são chamados de Homogêneos.
A Transpiração é o tipo de envolvimento dos indivíduos
e das instituições em relação a uma situação, caracterizando a
intensidade do esforço despendida para a resolução de um pro-
blema. Quando há grande comprometimento com o problema
e um grande esforço para a sua resolução, diz-se que existe
Dedicação dos participantes. Por outro lado, quando não há

148
A Ideia criativa como faísca da inovação

comprometimento com a causa e nenhum esforço, mínimo que


seja, para a descoberta de uma solução, o estado em que essas
pessoas se encontram é de Acomodação.
O quarto elemento é o Estalo. Ele é o momento exato em
que a Ideia Criativa surge na mente de uma pessoa ou o instan-
te quando alguém a cita dentro de um grupo de trabalho. Mas,
para a sua geração, é necessário estimular a criatividade de
todas as formas. Quando é possível explorar todos os campos
da criatividade humana sem a preocupação com as convenções
impostas e com as regras estabelecidas, diz-se que houve liber-
dade no processo de trabalho. Mas se as convenções e regras
prevalecerem em relação ao tipo de inventividade, ele será con-
siderado um processo Bloqueado.
E, por fim, depois que a ideia tiver sido gerada, é necessá-
rio acreditar nela. A Confiança, portanto, é o quanto se crê e o
quanto se está disposto a trabalhar por uma ideia. É o esforço
para manter a ideia viva e pulsando. Quanto mais se acredita
e se luta por uma ideia, maior é a Crença nela. Porém, quanto
menos se acredita e se batalha por ela, maior é Descrença em
relação à sua relevância e aplicação.
A Ideia Criativa é um processo resultante do conjunto
desses cinco elementos. Cada um deles afeta de forma específi-
ca a geração da Inovação. Na figura a seguir é possível obser-
var melhor as características inerentes a cada um deles.

149
Explosão da Inovação

Relação entre os Elementos do SETEC

Sentidos
anestésico sinestésico
Equipe
Homogênea Heterogênea
Transpiração
acomodação dedicação
Estalo
Bloqueio liberdade
Confiança
descrença crença

Repetindo o que já foi feito com os elementos do Am-


biente Externo e da Capacidade Interna, é chegada a hora de
conhecer profundamente cada um dos componentes que cons-
tituem a Ideia Criativa.

5.4.1 Sentidos

Os sentidos são a porta de entrada dos estímulos capta-


dos no ambiente. Eles são produzidos em diferentes órgãos
do corpo humano e suas mensagens são levadas até o cérebro,
onde estas são processadas e as sensações são geradas. Quan-
to mais os sentidos estiverem abertos e aguçados para o que
acontece, mais estímulos serão gerados. E quanto mais diver-
sificados forem esses sentidos, mais ricos serão os pensamen-
tos produzidos no cérebro.
O corpo humano possui cinco sentidos fundamentais: o
paladar, que indica os sabores; o olfato, que permite a percep-
ção dos odores; o tato, através do qual é possível sentir o calor
e a textura de outros corpos; a audição, que capta os sons; e
a visão, que permite observar as cores, as formas e os contor-
nos dos objetos. Esses sentidos dispõem órgãos específicos (a

150
A Ideia criativa como faísca da inovação

língua, as fossas nasais, a pele, os ouvidos e os olhos, respecti-


vamente), que transmitem os diferentes estímulos do ambien-
te externo para o cérebro. É o cérebro que vai interpretar as
mensagens que chegam em forma de sensações e que vai de-
terminar as diferentes reações do organismo. Pode-se dizer,
então, que tudo o que uma pessoa pensa e sente depende neces-
sariamente do que seus sentidos captam. Dessa forma, quanto
mais os órgãos dos sentidos trabalham, mais informações são
levadas para o cérebro.
O cantor e compositor Chico Buarque de Holanda pos-
sui um sistema um tanto peculiar de criação de suas músicas
e poemas. Para se inspirar e conseguir material criativo para
suas canções, ele percorre o Rio de Janeiro, cidade onde nasceu
e mora, para coletar informações. Ele anda a pé pelo calçadão
da praia olhando a paisagem, entra em ônibus para ver e ou-
vir as pessoas, visita o mercado municipal para sentir o cheiro
das flores e das frutas, pega o trem na Central do Brasil para
vivenciar o aperto que os trabalhadores passam no fim do dia,
toma um café em um bar para descansar, assiste a um jogo
no Maracanã para sentir a emoção da torcida, e janta em um
restaurante para degustar o sabor da comida. Ou seja, ele faz
exatamente as mesmas coisas que qualquer pessoa faz cotidia-
namente. Mas faz diferente: faz com todos os sentidos aflora-
dos, captando cada detalhe que acontece à sua volta, diferente
das pessoas que não estão preocupadas em seu dia a dia com
essas particularidades. Com isso, suas músicas apresentam um
lado poético, criativo, humano e sentimental, que são sua mar-
ca. Veja um exemplo de uma de suas letras, Cotidiano, de 1971.

151
Explosão da Inovação

Cotidiano
Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã

Todo dia ela diz que é pra eu me cuidar


E essas coisas que diz toda mulher
Diz que está me esperando pro jantar
E me beija com a boca de café (...)
Chico Buarque de Holanda

Pode-se reparar nos detalhes da letra, como ela passa


sensações de diferentes órgãos do sentido. “Me sacode”: ela
simplesmente não o acorda, mas, de forma tátil, o faz acor-
dar de maneira intensa, provavelmente com as mãos ou com o
próprio corpo. “Me sorri”: um gesto simpático percebido pelo
olhar. “E me beija com a boca de hortelã”: um gesto que é cap-
tado de forma intensa pelo paladar e pelo olfato. “Todo dia ela
diz que é pra eu me cuidar”: nesse momento é a audição que
desperta para o primeiro plano. Ou seja, nos cinco primeiros
versos, o artista transmite a emoção do relacionamento com a
sua amada captada pelos cinco diferentes órgãos dos sentidos.
Assim, há uma relação direta entre o grau de uso dos
sentidos e o tipo de ideia produzida. Quando todos os sentidos
humanos estão sendo estimulados ao mesmo tempo, classifi-
camos essa situação como Sinestésica. Mas quando nenhum
sentido está “ligado” ou concentrado em determinada ação,
classificamos essa condição como Anestésica. Todas as outras
circunstâncias variam entre essas duas posições, ficando mais
perto da Sinestésica quanto maior o número de sentidos es-
timulados e mais próximo da Anestésica se forem poucos os
sentidos envolvidos.

152
A Ideia criativa como faísca da inovação

Elemento S – Sentido

anestésico sinestésico

ausência dos Uso intermediário todos os sentidos


sentidos na captação dos sentidos na usados na captação
de estímulos captação de estímulos de estímulos

Ideias com Ideias com mediana Ideias com


baixíssima probabilidade altíssima
probabilidade de de gerar Inovação probabilidade de
gerar Inovação gerar Inovação

Quanto mais sentidos forem captados pelos órgãos do


corpo humano, (quanto mais para a direita estiver no eixo
Sinestésico/Anestésico), maior será o fluxo de estímulos
direcionados ao cérebro e, por consequência, maior será sua
capacidade de produzir ideias criativas.
Esse fato é uma consequência natural do processo “ma-
téria-prima / qualidade do produto”. Quanto melhor for a
matéria-prima (estímulos), maior será a qualidade do produ-
to formado por elas (ideia). As Ideias Criativas são origina-
das na mente daqueles que captam intensamente as diferentes
informações que vêm do ambiente. As sensações que o corpo
recebe e os pensamentos gerados no cérebro são o alimento
das ideias. Quanto mais ricos e variados forem os ingredientes,
melhor será a receita final.
As Ideias são geradas a todo instante dentro do cérebro.
Porém, pensamentos com doses de criatividade são mais raros.
Como já foi visto anteriormente, eles acontecem quando os dois
lados do cérebro passam a trabalhar em conjunto. Mas, para
isso, é necessário estimular a parte lógico-racional e a parte

153
Explosão da Inovação

subjetivo-emocional. E essa integração ocorre quando todos


os órgãos dos sentidos estão “abertos”, alimentando o sistema
nervoso central com uma enxurrada de estímulos e percepções.
Uma forma de demonstrar esse efeito e ensinar o poder
dos sentidos para a criatividade humana é o Brainstorming
dos Cinco Sentidos. A reunião de Brainstorming é a técnica de
geração de ideias mais comum, utilizada mundialmente por
várias empresas para a produção de uma grande quantidade
de ideias. Nela, um problema é apresentado e cada um dos
participantes é incentivado a fornecer ideias livremente, sem
a obrigação de provar sua viabilidade e lógica. Normalmente,
as sugestões mais originais, criativas e viáveis são depois
selecionadas para o desenvolvimento de projetos de Inovação.
Porém, o Brainstorming dos Cinco Sentidos, criado pelo Setec
Consulting Group, uma das principais empresas de consultoria
e treinamento da América Latina, permite que os participantes
sintam as sensações geradas pelos estímulos e possam
transformá-las em ideias criativas. Nesse aperfeiçoamento
da técnica de geração de ideias, cada sentido é, inicialmente,
estimulado de modo individual: primeiro o paladar, depois o
olfato, em seguida o tato, na sequência a audição, e por último
a visão. Em um segundo momento, os sentidos começam
a ser cruzados entre si, até que na última etapa todos são
estimulados ao mesmo tempo. Os participantes vão tendo a
sensação de que começam a sofrer uma overdose de estímulos
novos a cada nova fase. Em cada uma dessas etapas, é necessário
que os participantes deem ideias e sugestões para o problema
previamente apresentado. Assim, ao final da atividade, que
dura de 4 ou 8 horas, os profissionais, com seus sentidos
mais aguçados, conseguem naturalmente contribuir com um
conjunto mais variado e rico de ideias.
Quanto menos sentidos forem estimulados pelo organis-
mo (quanto mais para a esquerda estiver no eixo), menor será

154
A Ideia criativa como faísca da inovação

o fluxo de estímulos enviados ao cérebro e menor será a capa-


cidade do sistema nervoso central de produzir ideias criativas.
Pode-se comparar a variedade de estímulos com a varie-
dade de cores de que um pintor dispõe para criar um quadro.
Se ele dispuser de apenas uma ou duas cores, muito provavel-
mente sua obra ficará prejudicada. O pintor, nessas condições,
precisará se esforçar muito, para fazer uma pintura próxima à
que faria se dispusesse todas as cores. Dificilmente o quadro
monocromático ou com poucas cores ficará tão belo quanto
aquele totalmente colorido. E é essa a principal analogia com
os sentidos: criar com apenas um sentido é trazer ideias mono-
cromáticas para o mundo.

5.4.2 Equipe

A equipe é formada pelas pessoas que participam do


processo de geração das ideias e tem a responsabilidade de
promover as diversas soluções para determinado problema. Da
mesma maneira que a equipe é formada por pessoas, as pessoas
são constituídas de características, particularidades e opiniões.
Ao integrar um grupo, esse conjunto de características
individuais é somado e passa a compor a personalidade
do coletivo. Assim sendo, a equipe pode possuir grande
quantidade de características e opiniões diferentes ou uma
grande quantidade de elementos similares.
Tradicionalmente, equipes com muitas diferenças ten-
dem a ter mais conflitos e choques de opiniões provocados exa-
tamente pelo contraste de valores e conceitos. Grupos mais
parecidos tendem a concordar com determinadas posições,
afinal, todos ou a maioria partilham de uma mesma opinião
individualmente.
Quando a pluralidade dos membros de uma equipe é gran-

155
Explosão da Inovação

de, classifica-se esse grupo como sendo Heterogêneo, e quanto


maior for a semelhança entre os participantes, mais Homogê-
neo ele é. Todas as demais definições se situam entre essas duas
posições e entram em algum ponto do eixo horizontal.

Elemento E – Equipe

Homogêneo Heterogêneo

Grupo com Grupo com Grupo com


características características e características e
e opiniões opinões mediamente opiniões muito
muito parecidas diferentes diferentes

Ideias com Ideias com mediana Ideias com


baixíssima probabilidade altíssima
probabilidade de de gerar Inovação probabilidade de
gerar Inovação gerar Inovação

Quanto mais diferenças houver entre os membros de


uma equipe (mais para a direita estiver no eixo Heterogêneo/
Homogêneo), maior é a chance de conseguirem extrair ideias
criativas. A criatividade é originada dos choques de pensamen-
tos e visões distintas dos integrantes do grupo.
As equipes heterogêneas estão mais bem preparadas para
resolver problemas, pois possuem diferentes conceitos, enten-
dimentos, habilidades e competências. Dessa forma, a atividade
torna-se mais completa e a equipe consegue resolver o problema
de forma global, apresentando soluções mais ricas e variadas.
É impossível imaginar, por exemplo, a riqueza do legado
artístico deixado pelos Beatles sem se lembrar da variedade
de personalidades e habilidades de cada um dos integrantes
do quarteto. Muito provavelmente, a banda tenha se torna-

156
A Ideia criativa como faísca da inovação

do a mais importante da história exatamente pelas diferenças


pessoais e artísticas tão acentuadas entre John Lennon, Paul
McCartney, George Harrison e Ringo Star.
As músicas dos Beatles, grupo formado em 1956, em
Liverpool, Inglaterra, fizeram sucesso pelo seu estilo revo-
lucionário, pelas letras marcantes e pelos efeitos de guitarra
na sonoridade das melodias. As músicas e o som do quarteto
representavam seus anseios, frustrações e desejos. Através da
música, cada um dos integrantes podia canalizar suas opiniões
e pensamentos. Ao mesmo tempo em que cada um liberava sua
criatividade em canções próprias, eles também se ajudavam,
melhorando as músicas dos outros. Ou seja, apesar de cada um
fazer sua própria música, com estilo e característica próprios,
a música dos Beatles tinha a assinatura de todos.
Lennon explorava seu talento poético e fazia canções
mais densas e agressivas, sob influência do blues mais ener-
gético. Suas músicas mostravam uma grande inquietude, com
lirismo e ironia. Ele era o líder natural do grupo. Sua persona-
lidade era expansiva e carismática, mas muitas vezes mostrava
seu lado atormentado e complexado. Era o mais passional de
todos, sendo o coração da banda. Ele se preocupava com as
questões filosóficas da vida e da humanidade. Juntamente com
McCartney, era o principal letrista e poeta do grupo.
McCartney, sob influência da música teatral, compôs
obras com grande variedade na instrumentação. Além de ser
compositor e intérprete, também toca inúmeros instrumentos,
como baixo e bateria. Paul era o mais romântico dos Beatles,
suas músicas falavam essencialmente dos relacionamentos e
eram bem humoradas e melódicas. Porém, ele tinha uma per-
sonalidade forte e era o único que se opunha à liderança natu-
ral de Lennon.
George Harrison era o guitarrista da banda. Ele foi
sempre o mais espiritualista e reflexivo dos rapazes de

157
Explosão da Inovação

Liverpool. Um pouco pela idade - era o mais jovem de todos


- e outro tanto pela personalidade própria, ele sempre foi o
mais tímido e reflexivo. Era também o que teve a origem mais
pobre, vindo de uma cidade portuária inglesa, de uma família
operária. Apesar de ser um grande intérprete e compositor,
não se importava de suas músicas serem preteridas frente às de
Lennon e McCartney. Nos Beatles, desempenhava mais o papel
de instrumentista.
Ringo Star, por sua vez, era o baterista e foi o último a se
integrar à banda. Por ser o mais velho dos quatro, era quem
tinha a experiência e a habilidade de intermediar as diferen-
ças pessoais e artísticas entre Lennon e McCartney. Apesar de
discreto e de não se envolver em polêmicas, era quem conse-
guia harmonizar melhor o clima dos Beatles. Sempre sorrindo
e simpático com os fãs e com a imprensa, teve um papel fun-
damental, contribuindo com a sonoridade da banda, com uma
abordagem rítmica inovadora para a época.
Assim, grande parte do sucesso do grupo se deveu à sua
heterogeneidade, pois seus integrantes, ao longo dos anos,
conseguiram construir um mosaico artístico riquíssimo, muito
superior à mera soma de suas personalidades e de seus talen-
tos individuais.
Em uma equipe heterogênea sinérgica, as pessoas que-
rem e sabem que têm que dar o melhor de si, usando todas as
suas habilidades para ajudar os companheiros durante a ativi-
dade. Esse grupo normalmente tende a enxergar soluções sob
diferentes prismas, e a soma dessas visões, em geral, resulta
em soluções mais eficientes e criativas.
Quando mais homogênea for uma equipe (mais para
a esquerda ela estiver no eixo), menor será a chance de esta
gerar ideias criativas. Equipes formadas por elementos muito
parecidos não conseguem explorar todas as dimensões de um
problema.

158
A Ideia criativa como faísca da inovação

É importante perceber que não dizemos aqui que equi-


pes homogêneas possuem pior desempenho se comparadas às
heterogêneas. Não é isso o que está sendo dito. Apontamos
a perspectiva da produção de ideias criativas. Quando se fala
em gerar ideias criativas, essas equipes têm mais dificuldades,
mas em vários outros pontos elas podem ter vantagens. Por
exemplo, por terem menor número de conflito de ideias e opi-
niões, o trabalho desenvolvido por elas tende a ser mais rápido
e tranquilo. A comunicação, fator crítico em qualquer trabalho
em equipe, também tende a ser mais fácil.
Porém, a característica da composição da equipe depende
muito da finalidade do trabalho em si. Um técnico de futebol
que quer ganhar o jogo não pode escalar um time com todos os
jogadores tendo características defensivas (quem é que vai ata-
car?). Também não pode selecionar apenas jogadores que sai-
bam jogar pela direita (quem vai jogar pela esquerda?). Além
disso, não pode escolher apenas jogadores veteranos (prova-
velmente vai faltar fôlego no final da partida) ou apenas jovens
(quem vai dar a experiência necessária nos momentos decisi-
vos e difíceis do jogo?).

5.4.3 Transpiração

A Transpiração está ligada ao esforço dispensado para


a obtenção de uma ideia. Obter uma solução criativa para um
problema não é tarefa fácil. Normalmente, é necessário um
grande esforço para se conseguir isso. Em algumas situações,
a “sacada criativa” surge com mais facilidade. Nesses casos, o
envolvimento da pessoa ou do grupo de pessoas com o proble-
ma a ser resolvido é tão grande, que a solução se torna uma
consequência da concentração da atenção empregada. Dessa
forma, a transpiração está vinculada tanto ao nível do esforço

159
Explosão da Inovação

quanto ao grau de envolvimento.


Progresso e crescimento exigem uma sequência natural
de desenvolvimentos. As crianças aprendem a correr, mas an-
tes aprenderam a se virar, a sentar, a engatinhar e depois a an-
dar. Cada etapa tem sua importância, e nenhuma delas deve ser
evitada. Na escola, aprende-se aritmética antes de álgebra e
álgebra antes de cálculo. Não é possível inverter a ordem. Para
se obter uma boa colheita, o agricultor teve que respeitar cada
uma das fases da plantação. Ele primeiro adubou a terra, arou
o terreno, depois selecionou as melhores sementes, plantou-as
e, por fim, passou meses irrigando e cuidando da sua planta-
ção. Esse esforço de meses normalmente é culminado em uma
época em que é preciso colher o alimento gerado. A lição da
agricultura pode ser estendida, na maioria das vezes, para cada
atividade humana. O resultado obtido hoje é fruto do esforço
orquestrado ontem, e a ação de hoje é que vai provocar a con-
sequência de amanhã.
A geração da Ideia Criativa segue esse padrão. É necessá-
rio um grande esforço para estudar o problema e desenvolver
um grande número de hipóteses até se chegar a uma grande
ideia. Em qual, acredita-se que a criatividade é oriunda muito
mais do momento inspirador do que da transpiração e do es-
forço humano. É necessário, sim, ter inspiração, mas o esforço
para a geração da ideia tem um papel muito maior. Ele é o pro-
tagonista da criatividade. Sem transpiração, não há invenção
nem novidade.
Até mesmo nos casos em que a grande ideia surgiu em
momentos de descontração e relaxamento do corpo, houve
previamente grande esforço por parte da pessoa. A desconcen-
tração leva à ideia criativa quando ela é precedida de trabalho
duro e intenso. Além disso, o indivíduo pode não estar preocu-
pado com aquela resolução naquele exato momento (pensando
que não está trabalhando no problema), mas seu subconscien-

160
A Ideia criativa como faísca da inovação

te continua atuando fortemente e, no momento de inspiração,


emergirá para o consciente.
Quando uma pessoa ou um grupo realiza muito esforço e
tem grande comprometimento com a resolução de um proble-
ma, considera-se esse um trabalho de Dedicação. Mas quando
não há muito envolvimento nem esforço por parte do indivíduo
ou do grupo para a busca de ideias criativas, considera-se esse
um trabalho de Acomodação. Como nem todos os trabalhos po-
dem ser divididos entre essas duas modalidades, suas variações
são inseridas em algum ponto do eixo horizontal.

Elemento T – Transpiração

acomodação dedicação

Baixo médio alto


envolvimento envolvimento envolvimento
e esforço e esforço e esforço

Ideias com Ideias com mediana Ideias com


baixíssima probabilidade de altíssima
probabilidade de gerar Inovação probabilidade de
gerar Inovação gerar Inovação

Quanto maior for a dedicação dispensada para a busca de


soluções (mais para a direita estiver no eixo Dedicação/Aco-
modação), maior será a possibilidade de que a ideia gerada seja
Criativa. Para se obter uma grande ideia é necessário gerar
várias, das quais apenas uma pequena parte tem o potencial
de provocar a Inovação. A força de vontade da pessoa ou da
equipe de trabalho é fundamental para catalisar esse processo.
Reza a história que Isaac Newton estava sentado embaixo
de uma árvore quando uma maçã caiu em sua cabeça. Intrigado

161
Explosão da Inovação

por aquele fato aparentemente simples, Newton teria se


perguntado: “Por que o fruto caiu?” e “Por que ele vem sempre
para baixo e não para cima”. Segundo a lenda, nesse momento,
o inglês foi iluminado por uma grande inspiração e descobriu
imediatamente a existência da gravidade. Ou seja, todo corpo
é atraído para o centro da Terra por conta de uma força de
atração dos corpos.
Mas será mesmo que Isaac Newton descobriu a gravida-
de por conta de um momento de inspiração? Conhecendo um
pouco mais a história e a vida desse homem, percebe-se que ele
foi um dos cientistas mais atuantes dos séculos XVII e XVIII.
Newton estudou e pesquisou sobre química, física, mecânica e
matemática. Em suas infinitas experiências e formulações, ela-
borou leis de física, o teorema binomial e a natureza das cores.
A lei da gravidade surgiu como consequência dos vários
estudos desenvolvidos e das hipóteses físicas criadas por ele
ao longo de sua vida. Pode ter havido sim algum momento de
inspiração, mas, na maior parte do tempo, o cientista teve que
se dedicar incansavelmente para chegar às suas conclusões.
Apesar de possuir um temperamento bem tranquilo e de ser
uma pessoa pacata e modesta, Newton se esforçava muito em
seu trabalho. Invariavelmente deixava de se alimentar e até de
dormir quando estava mergulhado em seu trabalho. Ele mes-
mo explica isso: “Nenhuma grande descoberta foi feita jamais
sem um palpite ousado”. Porém, o principal mérito de suas
descobertas estava no esforço concentrado para a obtenção de
alguma resposta específica: “Se vi mais longe foi porque esta-
va em pé sobre os ombros de gigantes”. Em outras palavras,
é o esforço coletivo e evolutivo dos cientistas que propicia as
grandes invenções.
Só é possível tamanha dedicação a uma causa ou a um tra-
balho quando se está emocionalmente envolvido com ele. En-
volvimento é o grau de interesse e comprometimento de uma

162
A Ideia criativa como faísca da inovação

pessoa ou organização, e a criatividade de uma ideia está dire-


tamente ligada à força de vontade que a pessoa tem em gerá-la.
Quanto menor for o esforço e a dedicação de uma pessoa
ou de uma equipe (mais para a esquerda ela estiver no eixo),
menor será a chance do surgimento de Ideias Criativas. Isso
se deve ao fato de a criatividade estar intrinsecamente ligada
ao envolvimento da pessoa com uma situação. Se não houver
envolvimento nem interesse, para que criar ideias? Para quê
se preocupar em trazer soluções inventivas para os problemas
existentes? Para que trazer novas respostas para os velhos
problemas se a situação atual for cômoda?
A acomodação não permite que novas ideias sejam ge-
radas. Uma empresa acomodada é aquela que está em um pa-
tamar de conforto e nele permanece estagnada. Quando está
nesse estado, as pessoas não se interessam pelos problemas e,
por consequência, não se preocupam em encontrar soluções
para eles. Se forem desafiadas a criar ideias, até irão gerá-las,
mas não com a reflexão necessária. E, muito provavelmente,
nenhuma será criativa. As pessoas apresentarão soluções ape-
nas para atender à demanda pontual.

5.4.4 Estalo

Estalo é o instante em que a ideia criativa surge. É o


momento em que ela aparece na mente da pessoa que busca a
melhor solução para um problema ou quando um participante
de um grupo de trabalho a propõe aos demais.
O surgimento de estalos criativos são decorrências de es-
truturas e de formas de trabalho individuais ou coletivas para
estimular a criação desse tipo de ideias. Existem várias for-
mas de se gerar novas ideias. Entre elas, destacam-se: Brains-
torming tradicional (elaborado pelo publicitário Alex Osborn,

163
Explosão da Inovação

nos anos 1940), a Analogia (ter uma ideia a partir de uma pa-
lavra ou de um conceito aleatório), Box de Ideias (listagem
dos principais tópicos da ideia para que sejam explorados) e
Brainwriting (versão silenciosa do Brainstorming, na qual cada
pessoa escreve suas ideias e as passa para que outras pessoas
as complementem de forma escrita, buscando um nível maior
de detalhes).
Porém, aqui o que se avalia não é a técnica em si, mas os
elementos que estão à sua volta. Esses elementos constituem
uma forma que pode ser analisada sob uma determinada ótica.
Nesse caso, a análise é feita de acordo com a liberdade cria-
tiva que se pode ter, entendendo-se por liberdade criativa o
conjunto de opções que os participantes do grupo podem usar
para gerar as ideias. Historicamente, a criatividade é maior em
condições de maior liberdade de expressão, opinião, compor-
tamento e valores.
Na Idade Antiga, o povo que mais contribuiu cultural,
econômica e politicamente para o mundo ocidental foi a Grécia,
onde surgiram os pilares da civilização ocidental moderna. A
democracia, a filosofia, o teatro, o culto à beleza, a arquitetura,
a valorização da educação e a concepção dos jogos olímpicos
são alguns dos valores trazidos desse povo até os nossos dias.
Entretanto, o que mais marcou a cultura helênica foi a grande
liberdade concedida aos seus cidadãos (não estão sendo con-
siderados os não cidadãos, aqueles que não tinham direitos e
faziam trabalho escravo). Eles tinham completa liberdade reli-
giosa, sexual, filosófica, política e de expressão. Nesse ambien-
te, surgiram grandes pensadores, como Tales de Mileto, Anaxi-
mandro, Heráclito, Platão, Sócrates, Aristóteles e Heródoto. A
liberdade para o trabalho deles suscitou o surgimento de várias
ideias criativas que formaram o esqueleto cultural da sociedade.
É importante perceber que o conceito da liberdade liga-
se também ao ambiente externo ou até mesmo à capacidade

164
A Ideia criativa como faísca da inovação

interna de uma organização. Porém, o que se aborda neste


tópico é o uso da liberdade como forma de criação, estimulando
o momento do estalo criativo.
Quando o processo de trabalho é baseado na livre ex-
pressão, considera-se que ele tem Liberdade. Porém, quando
predomina a baixa liberdade de opinião, o processo de trabalho
está em situação de Bloqueio. As condições intermediárias são
demonstradas no eixo horizontal da figura a seguir.

Elemento E – Estalo

Bloqueio liberdade

Baixa média alta


liberdade liberdade liberdade
criativa criativa criativa

Ideias com Ideias com mediana Ideias com


baixíssima probabilidade de altíssima
probabilidade de gerar Inovação probabilidade de
gerar Inovação gerar Inovação

Quanto mais liberdade houver no processo de geração


de ideias, (mais para a direita estiver no eixo Liberdade/Blo-
queio), maior será a chance do surgimento de soluções criati-
vas. A liberdade permite que os participantes da atividade ou-
sem mais, explorem um número maior de nuances e arrisquem
mais. Sem censura nem restrição, o trabalho tende a ser mais
inventivo.
Muitas vezes, as pessoas não sabem a origem dos objetos
que usam cotidianamente, pensando que sua invenção vem dos
primórdios da civilização, da Antiguidade ou da Idade Média,

165
Explosão da Inovação

mas muitos deles são invenções recentes da humanidade. Esse


é o caso do escorredor de arroz, uma criação brasileira da dé-
cada de 1960.
Cansada de chegar em casa depois do trabalho e ter que
desentupir a pia por causa do arroz acumulado, a cirurgiã den-
tista Therezinha Beatriz Alves de Andrade Zorowich inventou
o escorredor de arroz. Esse produto é uma espécie de bacia
conjugada a uma peneira em uma de suas extremidades, o que
facilita a lavagem do alimento sem que ele seja descartado. O
que sai das pequenas saliências na parte interna são as impu-
rezas contidas no arroz.
Com a ajuda do marido, Beatriz montou um protótipo e
registrou a criação, que mais tarde foi licenciada pela empresa
que passou a produzi-lo. O escorredor de arroz foi apresentado
pela primeira vez ao público na Feira de Utilidades Domésti-
cas de 1962, sendo considerado o grande sucesso daquele ano.
Mas por que coube a Beatriz Andrade a iniciativa do in-
vento e não às milhares de donas de casa que também vivencia-
vam diariamente o mesmo problema? A resposta é a liberdade
criativa que essa brasileira tinha e as outras não. Primeiramen-
te, Beatriz não cuidava exclusivamente da casa como a maioria
das mulheres da época. Assim, o incômodo de ter que limpar
a pia por causa do arroz era uma atividade inconcebível para
ela, enquanto para as outras mulheres poderia ser encarada
como “um mal necessário”. Além disso, a família dos Andra-
de Zorowich era constituída por muitos inventores. Para eles,
cada problema merecia uma solução compatível. Vários pro-
dutos foram criados e patenteados não só pela Beatriz, como
também por seu marido e por seus filhos, ao longo dos anos,
apesar de nenhum com tanto sucesso quanto o escorredor de
arroz. O amálgama de porcelana, a faca com um ligeiro estrei-
tamento na largura e na espessura na extremidade frontal, a
caixa de fósforos com um retentor interno, a máscara com abas

166
A Ideia criativa como faísca da inovação

laterais aplicável ao monitor de computador, o massageador


cardíaco, a escova dental com cabo e base separados e passíveis
de serem encaixados, e o temporizador para cargas elétricas
de aparelhos elétricos em geral são exemplos da inventividade
da família.
Portanto, quanto menor for a liberdade concedida aos
criadores (mais para a esquerda eles estiverem no eixo), menor
será a chance das ideias terem a criatividade necessária para
produzirem produtos Inovadores. A censura e as limitações
impostas pelas regras e convenções provocam verdadeiros blo-
queios criativos aos inventores.

5.4.5 Confiança

Confiança é o grau de certeza que se tem sobre o poder de


uma ideia. Quando se acredita na ideia, é mais provável que se
invista tempo e dinheiro para tirá-la do papel. Normalmente,
aqueles que creem em determinada ideia possuem maior grau
de engajamento e persistência para executá-la, passando a de-
fendê-la das várias pessoas e das forças existentes nos ambien-
tes externo e interno que querem matá-la. Acreditar em uma
ideia é conseguir imaginar sua realização e jamais desistir dela.
Em 1920, após o massacre de 400 indianos por parte de
soldados britânicos, Mohandas Karanshand Gandhi, filho de
um importante político local, passou a apoiar a independência
da Índia em relação à dominação da Inglaterra. Porém, esse
homem passou para a história com outro nome: Mahatma
Gandhi. Mahatma na língua hindu significa Grande Alma. Sua
vida toda foi baseada em uma única ideia: promover a indepen-
dência do seu país de forma pacífica.
A desvinculação política da Índia com a Inglaterra era
algo necessário para o povo indiano, mas Gandhi acreditava

167
Explosão da Inovação

que tão importante quanto esse fato era a forma como isso se
daria. Alimentar a violência contra os ingleses ou promover
uma guerra para a independência contrariava seus princípios
religiosos de agir sempre pela não violência e sua crença na
santidade de todos os seres vivos.
Mahatma Gandhi acreditava tão fortemente nos seus ide-
ais que permaneceu fiel a eles por toda a vida. Suas atitudes pa-
cíficas, como greve de fome, campanha da desobediência con-
tra o imposto do sal e o incentivo ao produto indiano, foram ao
longo dos anos desestabilizando o poder central inglês. Mes-
mo quando era preso (foi encarcerado inúmeras vezes), Gan-
dhi nunca usou a violência. Em 1947, após décadas de desgaste
por conta de suas atitudes truculentas e do contraste com a
imagem de dignidade e pureza do líder indiano, os ingleses
aceitaram conceder a independência à Índia. Assim, depois de
27 anos de luta silenciosa e pacífica, Gandhi conseguiu o que
sempre pregou.
Mas o que fez esse homem permanecer fiel à sua ideia
mesmo quando tudo à sua volta se contrapunha ao que ele pen-
sava? Sua convicção. Ao acreditar tão profundamente em seus
ideais, Gandhi conseguiu superar os obstáculos e as dificulda-
des que surgiram ao longo de tempo.
Quando alguém acredita completamente em uma ideia,
atinge a condição de Crença absoluta. Mas quando não acre-
dita nem um pouco em uma solução proposta, existe uma con-
dição de Descrença. As situações intermediárias entre essas
duas condições são demonstradas no eixo horizontal da figura
a seguir:

168
A Ideia criativa como faísca da inovação

Elemento C – Confiança

descrença crença

Baixa média alta


confiança na confiança na confiança na
ideia gerada ideia gerada ideia gerada

Ideias com Ideias com mediana Ideias com


baixíssima probabilidade de altíssima
probabilidade de gerar Inovação probabilidade de
gerar Inovação gerar Inovação

Quando se tem elevada confiança na ideia que está sendo


trabalhada (mais para a direita estiver no eixo Crença/Des-
crença), maior é a chance de torná-la uma Inovação. Ao crer
nas ideias em que estão trabalhando, as pessoas ficam natural-
mente mais motivadas e dispostas a desafiar os obstáculos que
surgem no meio do caminho.
Uma ideia criativa, por melhor que seja, se não tiver pelo
menos uma pessoa ou instituição que acredite e lute por ela,
estará fadada à morte. Em pouco tempo ela será assassinada
pelas mentes conservadoras. Para a chama da ideia criativa não
se apagar ela precisa de defensores. Quanto maior o número e
a fidelidade desses defensores, maiores serão as chances dela
prosperar.
Em 2001, o executivo de negócios Fábio Bueno Netto
teve uma ideia criativa. Ao passar na frente de uma máquina de
vender doces e salgadinhos, ele pensou: “Por que não vender
livros nessas máquinas?”. Afinal, se era possível vender cho-
colate, barra de cereal, refrigerante e salgadinho, era perfeita-
mente viável comercializar livros por elas. Com essa ideia na

169
Explosão da Inovação

cabeça, Fábio, que naquela época trabalhava em uma editora,


montou um projeto para apresentar a seus superiores. Ele in-
sistiu diversas vezes para provar o quanto e sua ideia era inte-
ressante, mas a resposta da empresa foi negativa. Acreditando
nela e na possibilidade de torná-la uma Inovação, o executivo
pediu demissão da editora e resolveu abrir sua empresa. Dessa
forma, era criada a 24x7 Cultural. O agora empresário tinha a
chance de provar que estava certo.
O modelo do novo negócio era vender livros por preços
populares através das máquinas nas estações de metrô da ci-
dade de São Paulo. Assim, enquanto os usuários aguardassem
a chegada dos trens ou estivessem dentro deles poderiam ler
livros que custariam, no máximo, R$ 5,00. Ou seja, com algu-
mas moedas seria possível adquirir um produto que proporcio-
naria a leitura para uma grande quantidade de pessoas que não
tinham esse hábito.
Mas os problemas com os quais Fábio Bueno Netto se
deparou para constituir a empresa foram inúmeros. Primeira-
mente, não havia uma máquina no mercado apropriada para
essa finalidade. Fábio chegou a viajar o mundo procurando-a,
mas não a encontrou. Dessa maneira, precisou desenvolver um
projeto próprio. Depois de muito trabalho, conseguiu adaptar
um equipamento para comercializar os livros. Em um segundo
momento, a dificuldade foi convencer as editoras a venderem
os livros a um preço menor. Depois de muita insistência, al-
gumas editoras aceitaram vender seus produtos por esse novo
canal de distribuição. E, para terminar, o empresário precisou
negociar com as estações do metrô para a colocação das má-
quinas.
Colocadas as máquinas em operação, novos problemas sur-
giram. Veja as palavras do empresário: “O primeiro dia foi real-
mente uma tragédia. Fiquei horas na estação de metrô São Joa-
quim, em São Paulo, só explicando o funcionamento da máquina

170
A Ideia criativa como faísca da inovação

para as pessoas que passavam, sem vender um livro sequer”.


Mas Fábio acreditava na sua ideia e não desistiu. Hoje a
empresa possui dezenas de máquinas espalhadas pela cidade,
com vendas mensais de milhares de exemplares. “Algumas ve-
zes sou taxado de louco, outras de visionário. Acho isso engra-
çado, e cada vez mais tenho a consciência de que as pessoas têm
percepções completamente diferentes sobre a mesma coisa. Às
vezes me sinto falando com as paredes, mas não desanimo e
sempre incentivo as pessoas que querem ter seu negócio próprio
a lutar por seus sonhos (ideias)”, comenta Fábio Bueno Netto.
Mas, quando não se acredita na ideia (quanto mais
para a esquerda ela estiver no eixo), menor é a chance de
transformá-la em uma Inovação. Normalmente, o bom senso
não permite que todos acreditem nas soluções mais inusitadas,
pitorescas e criativas que são dadas. O senso comum prega o
conservadorismo. As pessoas e as empresas não gostam de
correr riscos e sair da sua zona de conforto, principalmente
com aquelas soluções em cuja viabilidade não acreditam.
A descrença em determinada solução não permite que as
pessoas envolvidas em um projeto tenham a persistência ne-
cessária para se exporem ao fracasso. Quando não conseguem
ver a vantagem que vão ter quando aquilo terminar, acabam
nem começando.
No modelo da Explosão da Inovação, há um personagem
chamado “mata-fogo” que é muito comum nas empresas. Essa
figura é especialista em querer apagar a fagulha criativa das
ideias logo que elas surgem. Sua frase mais famosa é “isso não
vai dar certo”. Tradicionalmente, essa frase sempre vem acom-
panhada por outras: “nós já tentamos isso no passado e não
deu em nada”, “aqui nós não fazemos assim”, e “eu já estou
vendo tudo, isso é uma perda de tempo, não vai levar a nada”.
O “mata-fogo” tem essa reação porque não acredita nas no-
vas ideias. E se a pessoa que deu a sugestão não acreditar em

171
Explosão da Inovação

sua proposta, certamente abrirá espaço para que o “mata-fogo”


apague a chama criativa.
Não adianta uma empresa pedir a seus funcionários e
clientes que contribuam com soluções criativas se existir em
seu quadro de colaboradores, em grande quantidade ou em
pontos-chave, “mata-fogos” prontos para apagá-las. Mas tam-
bém não adianta os demais funcionários reclamarem disso.
Eles precisam acreditar em suas convicções e superar mais
essa adversidade. Quando se crê na importância e no impacto
de uma ideia criativa, não há “mata-fogo” que consiga fazer
direito o trabalho de podar a Inovação.

5.5 Relação entre os Elementos e os Tipos de Ideias

Depois que a análise da condição da geração da ideia cria-


tiva é feita, pode-se discutir a relação entre seus elementos e
os tipos de ideias geradas. Assim, como já foi feito nos dois ca-
pítulos anteriores, é válido relembrar que os componentes que
formam a Ideia Criativa, o chamado SETEC – sentidos, equi-
pe, transpiração, estalo e confiança –, são inter-relacionados,
existindo grande sinergia entre eles. Dessa forma, a melhor
avaliação dos elementos é feita de forma conjunta.

172
A Ideia criativa como faísca da inovação

Relação entre os elementos do SETEC

Sentidos
anestésico sinestésico
Equipe
Homogênea Heterogênea
Transpiração
acomodação dedicação
Estalo
Bloqueio liberdade
Confiança
descrença crença

A Ideia Criativa é aquela que possui grande probabilidade


de gerar uma Inovação. A Ideia Não Criativa, por sua vez, tem
baixa probabilidade de provocar o mesmo fato. A definição so-
bre qual é o tipo de uma ideia é determinada pela combinação
dos elementos SETEC. Cada componente da empresa deve ser
classificado segundo a escala de -3 (quando estiver totalmente
à esquerda) a +3 (quando estiver totalmente à direita). Veja o
modelo a seguir.

Modelo de Diagnóstico da Ideia Criativa – SETEC

Sentidos
anestésico sinestésico
Equipe
Homogênea Heterogênea
Transpiração
acomodação dedicação
Estalo
Bloqueio liberdade
Confiança
descrença crença

173
Explosão da Inovação

Seguindo os exemplos que estão sendo dados nos finais


dos capítulos, uma empresa foi avaliada segundo sua condição
de gerar ideias. Ela possui a seguinte característica: envolvi-
mento de todos os sentidos (+3), uma equipe muito heterogê-
nea (+2), grande dedicação para encontrar soluções (+3), um
grau equilibrado entre bloqueio e liberdade criativa (0) e baixo
índice de confiança na ideias geradas (-2). Essas informações
devem ser colocadas na tabela de diagnóstico SETEC a seguir:

Diagnóstico SETEC
(Calor – Ideia Criativa)

Sentidos

Equipe

Transpiração

Estalo

Confiança

O Gráfico do Calor é muito similar aos Gráficos do


Comburente e do Combustível. Ele é do tipo “teia de aranha”
ou “radar” e é criado a partir das informações da característica
da empresa descrita antes. Veja o gráfico a seguir:

174
A Ideia criativa como faísca da inovação

Gráfico do Calor

c E

E t

A condição da empresa em gerar ideias criativas está re-


lacionada ao tamanho da área preenchida no gráfico. Quanto
maior ela for, maior será a chance de se criar ideias criativas.
Por outro lado, quanto menor ela for, menor será a probabili-
dade de ideias criativas serem geradas.
Segundo o caso em pauta, percebe-se que a empresa
possui uma capacidade mediana de gerar ideias criativas. Sua
maior dificuldade está no fato de ela não acreditar nas soluções
propostas. Como ela vai transformar uma ideia em uma Ino-
vação se ela não acredita, não confia, não crê nas saídas inven-
tivas que ela mesma encontrou? Além disso, não há um grau
elevado de liberdade para resultar no estalo criativo. A falta
dessa condição pode estar afetando a confiança da organização.

175
CONCLUSÃO

177
O grande objetivo desse livro é compartilhar o modelo
da Explosão da Inovação e demonstrar que produtos e ser-
viços inovadores surgem obrigatoriamente da junção das ca-
racterísticas do ambiente externo, da capacidade interna e da
geração de idéias criativas. Este é o grande desafio de empre-
sas, profissionais e empresários que trabalham com esse tema
e visam a sua promoção. Eles precisam compreender essas va-
riáveis, gerenciá-las e conduzir o processo de forma a criar
as condições necessárias para que sua equipe e seus projetos
sejam bem-sucedidos.
A ideia de construir esse modelo, e depois transformá
-lo em livro, foi fruto de nossas crenças e estudos, mas,
acima de tudo, de nossas inquietudes com relação às várias
interpretações existentes acerca do tema Inovação. O modelo
da Explosão da Inovação foi construído a partir de estudos
de caso, em que foram feitas comparações entre casos reais
bem-sucedidos e projetos que fracassaram. Essas histórias
trouxeram subsídios que apontaram quais são os elementos
que fortalecem o surgimento de Inovações. A construção da
nossa proposta leva em consideração os fatores comuns que
conduziram empresas e pessoas a terem um histórico de
sucesso ou de fracasso com relação à Inovação.
A proposta do modelo não é gerar uma receita com os
passos pré-definidos para uma empresa inovar, mas estabelecer
uma base estruturada em que gestores possam compreender e
refletir sobre seu processo de gestão da Inovação. Assim, sua
aplicação pode ocorrer em vários setores, como nas artes, em
serviços, nos esportes, nos governos e nas indústrias, conforme
ilustrado nos exemplos ao longo da obra. O modelo também
pode auxiliar em muito na ponderação sobre as condições
existentes para que uma empresa inove. Sabendo quais são
os elementos mais críticos, a empresa pode gerar ações para
desenvolvê-los ou pensar em alternativas para superar suas

178
CONCLUSÃO

restrições. O modelo da Explosão da Inovação pode ser aplicado


tanto em uma empresa como em uma unidade de negócios
ou até mesmo em uma área específica de uma companhia.
Este estudo também serve para a análise comparativa entre
empresas concorrentes e setores empresariais.

Os Principais Obstáculos da Inovação

Ao aplicar o modelo da Explosão da Inovação como fer-


ramenta de diagnóstico nas empresas, encontramos costumei-
ramente quatro grandes problemas, aos quais denominamos:
“Asfixia Corporativa”, “Problema de Sísifo”, “Lâmpada Quei-
mada“ e “Terra Arrasada”. A explicação de cada uma dessas
situações encontra-se a seguir.

Asfixia Corporativa
Apesar de termos falado no Capítulo 3 (O Ambiente
Externo como Comburente da Inovação) que é cada vez mais
raro encontrar ambientes pouco inovadores, a verdade é que
eles ainda existem e atrapalham sensivelmente as companhias
neles inseridas. Normalmente, esse fato ocorre de forma
artificial seja pelo desenvolvimento de monopólios e cartéis de
mercado, seja pela criação de barreiras alfandegárias e subsídios
estatais ou pelo estabelecimento de reservas de mercado. É
curioso que as empresas que vivenciam essa realidade não
querem perder as vantagens atreladas a essa situação antes de
se tornarem realmente competitivas e inovadoras, mas elas só
vão conseguir esse novo status após competirem intensamente.
Ou seja, é um círculo vicioso que não termina nunca.
Esse cenário é chamado de “Asfixia Corporativa”, pois
falta oxigênio (comburente) para a empresa respirar o ar da
Inovação. Como ela vive em uma bolha isolada do mundo

179
EXPLOSÃO DA INOVAÇÃO

empresarial, não é estimulada a procurar o novo e o diferente,


preferindo manter suas rotinas, seus produtos e seus negócios
como sempre foram.
O papel dos líderes e dos consultores envolvidos em pro-
jetos de Inovação em empresas que vivenciam essa realidade é
de, primeiramente, mostrar os riscos dessa situação a médio e
a longo prazos e, em seguida, de propiciar que todos vejam o
ambiente como ele realmente é: hostil e desafiador. O trabalho
aqui é “estourar” a bolha de maneira progressiva, deixando
que o ar de fora (turbulência do mercado, escassez de recursos,
avanço tecnológico e ideias, níveis de rupturas, grau de com-
petição e quantidade de informações disponíveis) entre, acele-
rando de forma controlada o processo de Inovação.

Problema de Sísifo
Antes de tudo, é necessária a explicação de quem foi Sísifo
na Mitologia grega. Condenado pelos deuses por menosprezar
os seres divinos e por não temer a morte, Sísifo foi sentencia-
do a uma tarefa inglória por toda a eternidade: empurrar uma
enorme pedra até o alto de uma montanha. O problema estava
que, ao chegar ao cume, a pedra sempre rolava de volta para a
base da montanha. Dessa maneira, o trabalho de Sísifo sempre
recomeçava a partir do zero e era feito sem descanso.
Essa é a situação que algumas empresas vivenciam em
relação à Inovação. Querem inovar, tentam inovar, se esforçam
para inovar, mas não conseguem. Tudo por causa de uma bai-
xa capacidade interna: elas não conseguem promover ideias
criativas em novos produtos e serviços e ficam com a sensação
amarga de que o trabalho foi desperdiçado ou de que ele nunca
termina. Os motivos para isso são os mais variados: liderança
que não consegue motivar sua equipe, baixo grau de envol-
vimento dos funcionários, falta de capital para investimento,
estruturas burocráticas, ausência de pesquisa, conhecimento e

180
CONCLUSÃO

tecnologia, entre outros.


Tradicionalmente, as empresas que estão neste cenário
não conseguem perceber que o seu real problema está na baixa
capacidade interna de desenvolver projetos de Inovação. Para
elas, o problema está sempre atrelado à qualidade ou à quan-
tidade de ideias. Assim, o trabalho recomeça com a busca por
mais ideias. Essas novas soluções darão origens a novos proje-
tos que, por sua vez, serão mal desenvolvidos e, provavelmen-
te, desperdiçados. E a culpa novamente será das ideias geradas.
O papel dos líderes e dos consultores, neste caso, é mos-
trar que não adianta se preocupar exclusivamente com a co-
leta, a avaliação e a seleção de ideias criativas. Nem se deve
gastar mais energia do que já é dispensada nestas atividades.
O trabalho deve estar focado em tornar a companhia apta a
desenvolver seus projetos em produtos e serviços inovadores.
Caso contrário, ela continuará carregando a pedra para o alto
da montanha eternamente.

Lâmpada Queimada
Há casos em que a grande dificuldade da empresa está
em gerar ideias criativas para os seus produtos e para o seu
negócio. Essa dificuldade está vinculada a uma série de fatos,
sendo que o principal deles é o medo de mudar. Companhias
que tiveram um grande sucesso recente e que cresceram con-
sideravelmente nos últimos tempos acabam ficando receosas
de alterar as bases de sua consagração. Com medo de perder
tudo aquilo que conquistaram até então (muitas vezes por
meio da ousadia e do imprevisível), tornam-se naturalmente
mais conservadoras. Sem perceber, passam a trabalhar para
manter sua participação no mercado e seu status quo em vez de
surpreender o mercado e seus consumidores. Em muitos casos,
elas possuem uma excelente capacidade interna (funcionários
motivados e competentes, capital para o investimento e um

181
EXPLOSÃO DA INOVAÇÃO

sistema de trabalho aberto, fluído e flexível), mas sua cultura


corporativa limita a criatividade das ideias.
Existem também instituições em que os líderes atuam
como autênticos “mata-fogos” (ou “mata-chamas”). Essas fi-
guras têm a capacidade de podar todas as ideias (até mesmo
as mais criativas) logo no início, inviabilizando o processo de
inovação (na geração da ideia). A inibição da equipe é tamanha
em empresas com grandes e importantes “mata-fogos”, que as
ideias não surgem espontaneamente. Afinal, quem é ingênuo
de trazer uma solução sabendo que ela logo será descartada?
A empresa com este perfil recebe o nome de “Lâmpada
Queimada”, pois suas ideias criativas são nulas. O papel da alta
direção e dos consultores envolvidos em projetos nesse tipo
de empresa é de criar um ambiente saudável de criatividade e
de cooperação, no qual os funcionários sejam incentivados a
promover ideias de melhorias.

Terra Arrasada
A situação da empresa denominada “Terra Arrasada” é
a mais complexa de todas. Essa companhia possui baixa ca-
pacidade interna para a promoção da inovação e tem um nível
pobre de geração de ideias criativas. Os motivos que a levaram
a esta condição são: problemas financeiros que destruíram a
forma de trabalho da empresa e o moral de seus funcionários,
liderança centralizadora e destrutiva que não confia em sua
equipe, briga intensa pelo poder dentro da empresa, deixando
a Inovação em segundo plano, ou problemas de sucessão (nor-
malmente em empresas familiares) que ninguém sabe o que vai
acontecer.
A principal característica da empresa “Terra Arrasada” é
pensar apenas no presente. Sua função primordial é a sobrevi-
vência. Inovar ou pensar no amanhã são luxos que ela não se
dá ao direito de cogitar. Dessa forma, não consegue pensar em

182
CONCLUSÃO

soluções criativas para resolver seus problemas nem consegue


desenvolvê-las, mesmo quando alguém as traz (geralmente de
fora).
Neste caso, o trabalho da alta administração e dos con-
sultores está em mostrar que é nos momentos mais críticos e
difíceis que a Inovação é mais importante. Além disso, o tra-
balho aqui é duplo: de capacitação da corporação para desen-
volver a inovação e de alimentar a criatividade da equipe. Em
geral, esses trabalhos são os mais difíceis e requerem maior
tempo de maturação.

Considerações Finais

O modelo que criamos tem a finalidade de servir de nor-


te para profissionais, empresários e estudantes que apreciam
esse tema e possuem o desafio de inovar constantemente. A
proposta de associar nosso modelo ao processo de combustão,
utilizando os conceitos do “Triângulo de Fogo”, é de tonar
sua compreensão mais fácil e intuitiva. Além disso, os elemen-
tos do ambiente externo (CRIARE), da capacidade interna
(MACCS) e da ideia criativa (SETEC) foram definidos a partir
de nossas experiências e vivências em trabalhos acadêmicos,
profissionais e de consultoria e nos estudos de casos estabe-
lecidos. E estamos certos de que, apesar de ser um modelo
concreto e viável, ele pode ainda não estar inteiramente con-
solidado. Acreditamos que seja passível de aprimoramento e
de enriquecimento. Por tanto, estamos abertos a discussões e a
propostas de novas contribuições a ele.
Além do modelo proposto, procuramos inovar na forma
de transmitir os conceitos ao leitor, apresentando o jogo da
Explosão da Inovação. O objetivo deste é colocar em práti-
ca o modelo proposto nesse livro de forma divertida e lúdi-

183
EXPLOSÃO DA INOVAÇÃO

ca, além de possibilitar a geração efetiva de ideias inovadoras


para qualquer tema previamente definido. O Jogo Explosão da
Inovação é diversão certa e pode ser adquirido nas principais
livrarias do país ou pelo site da empresa Games for Business
(www.games4b.com.br).

Resumo do Modelo Explosão da Inovação

Para finalizar, apresentamos novamente os elementos que


compõem cada uma das dimensões da Explosão da Inovação:

Ambiente Externo – CRIARE:


C – Competição (do Isolamento à Rivalidade)
R – Recursos (da Abundância à Escassez)
I – Instabilidade (da Estabilidade à Turbulência)
A – Acesso à Informação (do Restrito ao Irrestrito)
R – Ruptura (da Continuidade à Revolução)
E – Evolução (da Estagnação ao Progresso)

Capacidade Interna – MACCS:


M – Motivação (do Desmotivado ao Motivado)
A – Autonomia (do Dependente ao Independente)
C – Conhecimento (da Ignorância à Sabedoria)
C – Capital (do Restrito ao Ilimitado)
S – Sistema (do Mecanicista ao Orgânico)

Ideia Criativa – SETEC:


S – Sentido (do Anestésico ao Sinestésico)
E – Equipe (do Homogêneo ao Heterogêneo)
T – Transpiração (da Acomodação à Dedicação)
E – Estalo (do Bloqueio à Liberdade)
C – Confiança (da Descrença à Crença)

184
CONSIDERAÇÃO FINAL

Mensagem Final

Inove Sempre!

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Site da Fifa – www.fifa.com
Site da Fórmula 1 – www.formula1.com

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CURRÍCULO DOS AUTORES

Márcio Abraham:
Master of Science em Engenharia Industrial pelo Te-
chnion Institute of Technology e Doutor em Engenharia de
Produção pela Escola Politécnica da USP, onde foi professor
por 10 anos e criador do Prêmio Procter & Gamble de Desen-
volvimento de Novos Produtos da Poli-USP. Master Black Belt
e consultor internacional, com ampla experiência em Inovação,
Gestão Empresarial, Lean Seis Sigma e Redução de Custos. É
Diretor Presidente do Setec Consulting Group e Comentarista
do Programa Eldorado Gestão.

Ricardo Bonacorci:
Coordenador de Projetos da Games for Business, empre-
sa especializada no desenvolvimento de jogos empresariais.
Especialista em Administração de Empresas pela FGV-SP,
Pós-graduado em Gestão de Inovação pela ESPM e Bacharel
em Propaganda e Marketing também pela ESPM. Trabalhou
em empresas como Coca-Cola (Brasil e Argentina), Gradiente,
Lojas Renner e Setec Consulting Group.

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