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Dedicatória
Dedico este trabalho a todos os Tabeliães de Ofícios de Notas de
Barbacena, já falecidos, pois como instrumentadores do direito nos legaram um
precioso arquivo histórico de nossa sociedade; e, a todos que souberam
resguardar com dedicação essa parcela da História viva do Direito.
Em especial, ao atual Tabelião do Cartório do Primeiro Ofício de Notas,
Tarcísio Nascimento de Oliveira, meu pai.
Agradecimentos
“Nullum officium referenda gratia necessarium est”
Nenhum dever é mais importante que a gratidão
Capítulo I - INTRODUÇÃO
I.1. O Contexto Histórico no Brasil
O ano de 1808 inicia-se com a chegada ao Brasil da Família Real
Portuguesa fugindo da invasão de Napoleão Bonaparte na Metrópole. Aqui D.
João VI, então governante português, se instala de modo provisório e incerto,
com a idéia de voltar à Portugal.
No período do governo de D. João VI, de 8 de março de1808 a 25 de abril
de 1821, nenhuma legislação de interesse e importância para o Brasil assinala a
estada desta Dinastia Bragantina, nenhum Código foi feito e nem projetado. As
duas únicas exceções de relevância são: o Decreto de 28 de janeiro de 1808,
datado na Bahia, que abre as portas do Brasil ao comércio estrangeiro,
equiparando-se assim, desde logo, à Metrópole e em posição independente; e, o
Decreto de 16 de dezembro de 1815 que elevou o Brasil a Reino Unido ao de
Portugal e Algarves, assinado para Portugal poder ter representantes no
Congresso de Viena, já que não poderia ser considerado Grande Potência se
contasse tão somente o território Europeu organizado em Reino.
Afora esses dois atos mais salientes, a Corte Portuguesa entre nós
permaneceu de modo solitário, abaixo de sua missão, por quase quatorze anos,
quando se retirou para a Metrópole forçada pela Revolução do Porto de 24 de
agosto de 1820, deixando aqui, como regente D. Pedro de Alcântara, ou D. Pedro
I do Brasil.
Em 1822, D. Pedro I, é ordenado a voltar à Portugal, mas ele se rebela,
seguindo-se diversos acontecimentos que vão afrouxando o laço que prendia à
Metrópole, até o resultado da Independência aos 07 de setembro de 1822.
Nosso primeiro reinado se inicia, é convocada uma Assembléia
Constituinte para nos dotar de nossa Carta Magna. Um dos primeiros atos dessa
Assembléia foi a Lei de 20 de outubro de 1823 (Vide em Anexo). mandando
vigorar no novo Império as Ordenações do Reino (Filipinas), Leis, Regimentos,
Alvarás, Decretos e Resoluções promulgadas pelos reis de Portugal, e pelas quais
se governava o Brasil até então, enquanto não fossem alteradas e organizado um
novo Código.
D. Pedro I reinou até sua abdicação em 07 de abril de 1831. Outorgou-nos
uma Carta Magna em 25 de março de 1824, mas não nos deu um Código Civil,
conforme preceitua o artigo 179, inciso XVIII, da dita Constituição
(“Constituição Política do Império do Brazil, Art. 179, inciso XVIII- Organizar-
se-ha quanto antes um Codigo Civil, e Criminal, fundado nas solidas bases da
Justiça, e Equidade”) e por isso, nesse campo, as Ordenações Filipinas vigoraram
até a entrada em vigor do nosso Código Civil, em 1917.
I.2. A Vila de Barbacena
Barbacena antes de ser elevada à condição de Vila, judiciariamente
pertencia ao Termo de São João Del Rey e, depois, ao Termo de São José del
Rey, hoje Tiradentes, da Comarca do Rio das Mortes, cujas divisas iam até
Guaratinguetá, quando Minas e São Paulo formavam uma mesma
E completa:
“En sus funciones asesora y modeladora, el Notario há de ser
ministro y guardián de la equidad, más bien que del Derecho
estricto - sacerdote, há dicho Azpitarte, más de la equidad que de la
ley farisaica -, proponiendo a las partes aquellas soluciones que
representem la más pura justicia en el caso concreto y elaborando,
en definitiva, com equitativa justeza, el Derecho aplicable a la
relación jurídica que sea objeto de la autenticación notarial” (Apud
DIP, Ricardo Henry Marques, op. cit., págs. 94 e 96).
O notário tem a missão de colocar em prática o direito, outorgando
publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos, “de tal
maneira que a finalidade da paz social se alcance integralmente” (MELENDO,
Santiago Sentís, El Notariado y la Soledad, apud PARIZATTO, João Roberto,
Serviços Notariais e de Registro, pág. 16).
A escritura pública é o ato autêntico, isto é, o ato que consubstancia a
vontade e o fato querido pelas partes e lavrado precisamente conforme a verdade,
já que aos oficiais públicos são conferidos poderes para instrumentar os atos que
lhe são ordenados pela lei ou pedidos pelas partes e lavrá-los conforme a
manifestação da vontade das partes, sob severas sanções. Ao encerrar um
documento colocando a expressão dou fé o Tabelião está atestando a veracidade
daquele documento, atestando, pois, que tal ato corresponde à verdade.
Já dizia o ilustre membro da Academia Brasileira de Letras, Menotti del
Picchia:
“...fazer uma visita a um tabelionato de notas é receber uma lição
de psicologia. É ali que rebenta a grande onda espumejante dos
negócios. Ali consolidam-se as fortunas e registram-se as
‘débacles’. No ato público há a confirmação da sorte que coroou o
dominador dos mercados ou a rendição do azarado ou do pródigo
forçado a vender seus últimos cacarecos. O ato notarial é uma
chancela do destino. ...”
“O colono que se vai fazer lavrador, com a compra de uns alqueires
de terra, entra no cartório como um crente entra num templo:
tímido, sinão apavorado. Ele não sabe por qual magia aquela pena
que raspa o grande livro de capa negra opera a transladação do
domínio e da posse, quebrando os latifúndios, arrancando nacos do
chão ao orgulhoso terra-tenente. O oficial público que realiza tal
prodígio passa para ele a ter a força de um mago. A leitura de uma
escritura, na voz tabelioa, - geralmente o Oficial acavala um
‘pince-nez’ no promontório do nariz - assume a invocação litúrgica
das potências do Estado o qual sanciona as vendas, dá prazos
fatais ao gravame das hipotecas, opera emancipação, libera de
ônus a propriedade.”(DEL PICCHIA, Menotti, A Mágica Tabelioa, in
A Gazeta, recorte sem número e data, 1947).
III.2. Vendedores
A qualificação da parte era deficitária, não se declarava o estado civil
delas, a não ser quando fosse mulher viúva, por isso a pessoa comparecia como
outorgante vendedor sem precisar provar ou declarar o estado civil.
Existiram casos em que as escrituras apresentam, como vendedores,
marido e mulher, justamente por atender ao preceito contido na Ordenação de
que o marido não pode alienar bens de raiz sem o expresso consentimento da
mulher, qualquer que fosse o regime de bens adotado no casamento (Conforme
Ord., Liv. 4°, Tít. 48, princ.)
Em uma escritura lavrada no ano de 1929, no Primeiro Ofício, consta uma
menção interessante ao dizer que o bem vendido, no caso, um sítio Caxoeirinha,
foi havido pelo vendedor no estado civil de viúvo com dinheiro emprestado e não
diz, nesta escritura, o seu atual estado civil. Isso nos leva a acreditar que
possivelmente o senhor em questão fosse novamente casado, mas que o bem era
individual seu não necessitando pois da assinatura de sua nova esposa. Não há
outra razão plausível para se expressar a forma como foi adquirido pelo vendedor
e o seu estado civil quando da aquisição.
Uma escritura, do ano de 1808, também do Primeiro Ofício, tem como
outorgantes vendedores uma senhora viúva e os herdeiros de seu falecido marido,
e como os herdeiros eram menores, compareceu o tutor dos mesmos assinando a
venda sem qualquer menção a uma autorização judicial ou mesmo do termo de
nomeação do tutor.
Outra, lavrada em 1828, do mesmo Ofício, compareceu como vendedora
uma viúva, declarando vender o bem, no caso, a Fazenda denominada Invernada,
e constando, em seguida à individuação do bem, que os órfãos, filhos da
vendedora, tinham a metade da Fazenda. Nesta não consta a presença de tutor ou
autorização judicial para a venda, e a viúva é a única vendedora de todo o bem,
embora diga que não é a única proprietária.
Quando era só a mulher vendendo, não se tinha nenhuma outra pessoa para
assisti-la, provando que as mulheres, independente de seu estado civil, já que não
constava, tinham capacidade e legitimidade plenas para o ato de alienar bens.
III.3. Compradores
Nas escrituras em que tem mulheres na qualidade de compradora também
não se apresentava outra pessoa para assisti-la, nem marido ou outro parente,
caracterizando que ela gozava de plena capacidade civil.
A maior parte dos contratos tem só uma pessoa como compradora. Mas
naqueles em que têm mais de um comprador, a venda era em conjunto, não
determinando a parte que cada um adquiria. Apenas uma escritura do Primeiro
Ofício, do ano de 1819, mostrou dois compradores de um mesmo imóvel, ou
seja, de uma fazenda, em que foi feito, logo depois da caracterização do bem, a
divisão das terras, descrevendo as confrontações e parte que cada comprador
estava adquirindo.
Uma escritura do ano de 1830, lavrada no Segundo Ofício, os compradores
são dois irmãos menores, então representados por seu Tutor, adquirindo a fração
de um terço de uma casa, tendo os compradores a outra fração da casa, sem
qualquer cláusula específica ou autorização judicial.
O comprador sempre declarava que aceitava a escritura com todas as suas
cláusulas e condições, aceitando a quitação do preço feita pelos vendedores, se
era todo o valor pago, ou, quando pagava alguma parte do preço e ficava devendo
o restante, aceitava a quitação dada pela parte paga e se obrigava pessoalmente e
por seus bens a pagar o que ficava a dever no tempo constante do acordo, aos
vendedores ou a quem o instrumento da escritura lhe fosse apresentado.
III.4. Intervenientes
Interveniente é aquela pessoa que, não fazendo parte do documento de
venda, pois não tem direitos como vendedor e nem como comprador, pode
comparecer para anuir na transação ou declarar alguma situação que interessa ao
negócio realizado.
Em uma única escritura, lavrada no Livro n° 3 do Primeiro Ofício, ainda
no ano de 1808, compareceu um interveniente declarando que a Chácara objeto
daquele instrumento tinha sido vendido à vendedora e estava sem embaraço
algum por ter recebido o justo preço.
Capítulo IV - DOS OBJETOS DA ESCRITURA
Além dos elementos essenciais a qualquer negócio jurídico, a compra e
venda requer seus elementos específicos, que lhe são essenciais, tais como,
consentimento, coisa e preço. Isso é herança do direito romano, do qual não se
desalinha o direito português, a nós transmitido pelas Ordenações (Conforme
Ord., Liv. 4°, Tít. 1, princ.)
Um contrato de compra e venda sem coisa é nulo, pois o consentimento
que se requer das partes é em relação ao objeto e o preço. O objeto deve ser
perfeitamente caracterizado pelos elementos que o individualizam e, no ato da
escritura pública, já deve estar determinado.
IV.1. Características
Quase oitenta por cento das escrituras têm como objetos bens imóveis
constituídos de fazendas, chácaras, sesmarias e terras de cultura e matos, nos
subúrbios da Vila de Barbacena e nas localidades pertencentes a este Termo.
Muitos imóveis são localizados no “caminho” para o Rio de Janeiro, já que
em Barbacena passava o “Caminho Novo”, estrada que ligava o centro-
oeste ao Rio de Janeiro, na rota do ouro. Esse “Caminho Novo”, cuja construção
se iniciou em 1698 e finalizou em 1724, partia da Borda do Campo, berço da
cidade de Barbacena, seguindo o curso dos rios Paraibuna e Paraíba, para
transpor a Serra do Mar e atingir a baía do Rio de Janeiro.
Constam muitos lugares distintos e alguns muito distantes da Vila, tais
como, “paragem Pedro Alves, no lugar Monte Claro, caminho do Rio de
Janeiro”; “cabeceira do Rio Paraibuna”; “paragem Antônio Dias”; “barra do São
Luis, no sertão do Monte Verde”; por “cima da Serra da Mantiqueira”; na “Serra
Bonita” do “Sertão da Paraíba”; na “Applicação da Senhora da Conceição do Rio
Novo”, todas localidades do Termo da Vila de Barbacena. Apenas uma escritura
do Segundo Ofício de Notas traz um bem localizado no Termo da Vila de São
José, vizinho ao Termo da Vila de Barbacena.
São poucos os imóveis localizados na zona urbana, considerando como tal,
a indicação de que o bem está situado numa rua. Essencialmente, só constou
morada de casas no “Largo da Matriz” e “Largo do Rosário”, na “Rua do
Rosário”; na “rua que vai para o Rosário”; na “rua de baixo do Rosário,
denominada de Olaria”; por “trás da Capela de Nossa Senhora do Rosário”, na
“Rua Direita” e uma rua com o interessante nome “rua jogo da Bolla”.
Os bens imóveis são vendidos como corpo certo e determinado, ou seja,
seguindo a cláusula ad corpus, não importando para o negócio a verificação da
área ou metragem do imóvel. Era citado o bem e determinado por sua localização
e seus confrontantes. Quando o bem não era determinado se mencionava como
“sorte” ou “porção” de terras. Somente em quatro escrituras há a citação da
quantidade de terras vendidas, mas a medida da época era denominada de
“corda”, então tem-se: seis cordas de terras na Fazenda tal; hum quarto e vinte e
seis e meia cordas de terras no sítio tal, etc. Embora conste a quantidade da área
negociada não há menção alguma se o negócio é feito com preponderância das
medidas, ou seja, se é uma venda ad mensuram. Houve somente uma escritura
em que constou que a quantidade de cordas vendidas foi judicialmente
demarcada dentro de uma sesmaria. Numa escritura em especial constou que a
Fazenda vendida tinha uma área de 160 alqueires de plantas, mais ou menos.
Em quatro escrituras, os bens imóveis vendidos são acompanhados de
alguns bens móveis sem descrever a quantidade e qualidade dos mesmos, sendo
que em uma delas também consta como objeto as criações, não dizendo de que
tipo. Noutras escrituras constam as descrições das árvores acessórias ao bem de
raiz, inclusive uma plantação de pés de café, bem como das benfeitorias
existentes com suas características de construção e uso e até mesmo, estado de
conservação.
Somente em três escrituras, dos anos de 1812, 1815 e 1825, no Primeiro
Ofício, junto ao bem imóvel, foram vendidos alguns escravos. Essa situação de
ter somente essas escrituras de venda de escravos em relação às negociações que
deveriam ser feitas no período compreendido pela pesquisa, já que abrange o
período escravista no Brasil, se deve ao fato de que as escrituras de compra e
venda de escravos podiam ser cumulativamente lavradas por Tabeliães, Escrivães
do Cível e dos Juízes de Paz. Apareceram somente a negociação dos escravos
junto com um bem imóvel, já que a venda de imóvel só podia ser realizada pelo
Tabelião das Notas.
Na primeira dessas transações foram alienados os seguintes escravos:
Antônio Simão, Pedro Angola, Roque e Lourenço, cada um por duzentos mil
réis; Francisca, mulher daquele, por cento e setenta mil réis; Francisco Mendes,
por duzentos mil réis; Felicianna, mulher deste, por cento e setenta mil réis; Joan
Antônio, Manoel Pereira, Gerônimo pardo, Manoel Francisco, Paullo, Severino
Crioulo, Joberto Pardo, José Antônio, Silvério Pardo e Antônio Francisco, cada
um por duzentos mil réis; José Crioulo, Manoel Joaquim e André Crioulo, cada
um por cento e setenta mil réis; Joaquim Congo, por cento e trinta mil réis; Diogo
e Leocádia, cada um por quarenta mil réis. Na segunda, constam os escravos:
Antônio Mulato e Braz Crioulo, cada um por cento e sessenta mil réis; Claudino
Crioullo, de 4 anos de idade, por cinqüenta mil réis; Dionísio Crioullo, de 3 anos,
por quarenta mil réis; Jacinta Crioulla, por cento e quarenta mil réis; Feliciana
Crioulla, por cento e cinqüenta mil réis; Danjanna Crioulla, de 6 anos, por
sessenta mil réis. E, na última destas escrituras, temos os escravos: Manoel
Cabra, João Congo, Manoel Cabundá, Francisco Congo, José Congo, Lourenço
Congo, sem declarar idade deles e pelo preço total de um conto, duzentos e
noventa e dois mil e trezentos réis e, que também são vendidos junto à um bem
imóvel e alguns móveis e criações.
Nessas transações dos escravos não há nenhuma cláusula ou condição, já
que na época eram permitidas as cláusulas de serem os escravos libertados ou não
libertados, de serem vendidos para fora de um lugar. Eram cláusulas imorais,
talvez por isso não constem, já que não eram toleradas pelas instituições
religiosas e políticas, além do que o senhor do escravo era somente dono dos
serviços deste e não do seu corpo, como entre os romanos, não podendo
determinar que fossem vendidos para lugar fora do Império.
V.2. Moeda
A moeda em curso no Brasil, neste período, era a antiga moeda
portuguesa, real, em seu plural, réis. Já que o Brasil não tinha sua própria moeda,
e como as Ordenações determinam que o vendedor fica obrigado a receber
qualquer moeda corrente lavrada pelo cunho dos Reis portugueses, determinando
ainda a espécie da moeda (Conforme Ord., Liv. 4°, Tít. 21, princ.). Era até
penalizado com prisão e açoitamento público, ou mesmo degradação para a
África, a pessoa que rejeitasse receber em moeda cunhada pelos Reis (Conforme
Ord., Liv. 4°, Tít. 22, princ.).
O pagamento poderia ser feito em moeda de ouro, de prata ou de cobre.
Algumas poucas escrituras apresentam, em seu corpo, a descrição da moeda
usada no pagamento, sendo muito usado as expressões “em moeda corrente de
Barra e Prata”, “em moeda metálica de prata e cobre”, “em notas com câmbio de
5%” e “em notas do Banco do Brasil”.
Para moedas de cobre, era permitido até um certo valor de acordo com a
quantia total da obrigação, representando essa espécie somente uma parcela do
pagamento, proibindo o pagamento total em moeda de cobre 4. Nas escrituras que
mencionam ter o vendedor recebido em moeda de cobre, não se relaciona a
quantidade entregue nessa espécie. Contudo, uma escritura, do ano de 1829, em
que o valor da venda foi de 1:200$000 (hum conto e duzentos mil réis) teve a
quantia de 600$000 pagos em moeda de cobre, respeitando o limite que as
Ordenações impunha para o pagamento nessa moeda; já que para esse valor, ou
seja, “sendo o pagamento de maior quantia, que cem mil réis, se poderá pagar a
razão de mil réis em cada cem mil réis, dos primeiros cem mil réis por diante”
(Conforme Ord., Liv. 4°, Tít. 21, princ.).
Duas escrituras, uma de março de 1813 e outra de dezembro de 1813,
trazem o preço estipulado em cruzados, embora transformado em réis, assim
descrito: “o preço é de 4.000 cruzados que é 1:600$000 réis” e preço de 3.000
cruzados com 300$000 réis a vista, e 900$000 fiados”; estabelecendo que um
cruzado eqüivalia a quatrocentos réis.
Anexos
Normas, legislações e demais resoluções utilizadas na pesquisa e neste
trabalho citadas, transcritas na forma arcaica do português assim como consta dos
documentos:
Ordenações Filipinas
Primeiro Livro
Título LXXVIII
Dos Tabelliães das Notas.
“Em qualquer cidade, villa, ou lugar, onde houver casa deputada para os
Tabelliães das Notas, starão nella pela manhã, e à tarde, para que as partes, que
os houverem mister para fazer alguma scriptura, os possam mais prestes achar.
1- Mandamos, que onde houver dous Tabelliães das Notas, ou mais, nenhum
delles faça scriptura alguma, sem lhe ser distribuida pelo Distribuidor. E
fazendo o contrario, pela primeira vez será suspenso do seu Officio per seis
mezes, e pague dous mil réis para que o accusar: E pela segunda privado delle.”
...
“4- E screverão em hum livro, que cada hum para isso terá, todas as Notas dos
contractos que fizerem. E como forem scriptas, logo as leam perante as partes, e
testemunhas, as quaes ao menos serão duas. E tanto que as partes outorgarem,
assinarão ellas, e as testemunhas. E se cada huma das partes não souber
assinar, assinará por ella huma pessoa, ou outra testemunha, que seja além das
duas, fazendo menção, como assina pela parte, ou partes, porquanto ellas não
sabem assinar. E se em lendo a dita Nota for emendada, accrescentada per
entrelinha, mingoada, ou riscada alguma cousa, o Tabellião fará de tudo
menção no fim da dita Nota, antes das partes e testemunhas assinarem, de
maneira que depois não possa sobre isso haver duvida alguma.”
...
“6- E se os ditos Tabelliães não conhecerem algumas das partes, que os
contractos querem firmar, não façam taes scripturas: salvo se as partes
trouxerem duas testemunhas dignas de fé, que os ditos Tabelliães conheçam, que
digam que as conhecem. E no fim da Nota, os Tabelliães façam menção, como as
ditas testemunhas conhecem a parte, ou partes, as quaes assi mesmo assinarão
na Nota.”
...
“14- E não farão Carta alguma de venda, nem outro contracto de bens de raiz,
nem de cousa alguma, de que se deva Sisa, sem primeiro as partes lhes
presentarem certidão do Juiz do lugar, em que os taes bens de raiz stiverem, em
que se declare, como pagarão a Sisa, e fica entregue ao Recebedor. Na qual
certidão serão declarados os nomes dos contrahentes, e dos bens que se vendem,
e do preço, e em que parte stão, e o nome do Recebedor, e será feita pelo Scrivão
das Sisas do tal lugar, e assinada por elle, e pelo Juiz e Recebedor, e será
incorporada de verbo ad verbum nos ditos contractos. E o Tabellião, que o assi
não cumprir, perderá o Officio; e as scripturas que se fizerem contra fórma desta
Ordenação, serão nullas e de nenhum effeito. E as proprias partes ou seus
herdeiros poderão annullar os ditos contractos em qualquer tempo que quizerem,
e cobrar as novidades das ditas propriedades, desde o tempo que assi
contractaram. E não escusará aos Tabelliães da dita pena presentar as proprias
certidões, de como fica paga a Sisa, se não forem trasladadas nas scripturas. E
isto mesmo se guardará nos bens, que se venderem em pregão: nos quaes os
Scrivães, que fizerem as remataçòes, serão obrigados do dia da rematação a tres
dias, o fazerem screver no Livro das Sisas, e cobrar certidão do Scrivão dellas,
de como ficão assentadas. E o mesmo se guardará nas vendas e trocas, que se
fizerem de Náos, Navios, Barcas, e Bateis. E na Cidade de Lisboa se apresentará
certidão do Scrivão das Sisas do ramo, a que pertencer, assinada por elle, e pelo
Almoxarife da Casa.”
Título LXXX
Das causas, que são communs aos Tabelliães das Notas e aos do Judicial.
“7- E nas scripturas, que fizerem ponham sempre juntamente o dia, mez, e anno
do Nascimento de Nosso Senhor JESU CHRISTO, e não separado, como atéqui se
fazia, e a cidade, villa, ou lugar e casa, em que as fizerem, e assi os seus nomes
delles Tabelliães, que as fazem.
Título LXXXV
Dos Distribuidores das cidades, villas e lugares do Reino.
“1- E onde houver dous Tabelliães das Notas, ou mais, distribuirá entre elles
o Distribuidor dos Tabelliães do Judicial. Porém nos lugares onde houver muitos
Tabelliães das Notas, haverá hum Distribuidos apartado do dos Tabelliães do
Judicial; o qual será obrigado estar no Paço dos Tabelliães das Notas tres horas
pela manhã, e tres horas à tarde continuamente. E o Distribuidor, que distribuir
as scripturas entre os Tabelliães das Notas, assentará no livro da distribuição os
nomes das partes, que fizerem os contractos, e as cousas sobre que se fazem,
dizendo: Item a N. e N. Tabellião huma scriptura de venda de humas casas que
N. vendeo a N.”
Terceiro Livro
Título LIX
Das provas, que se devem fazer per scripturas publicas.
Quarto Livro
Título I
Das compras e vendas, que se devem fazer por preço certo.
“As compras e vendas que se podem fazer, não sómente quando o vendedor e
comprador stão presentes e juntos em hum lugar mas aindaque o vendedor stê
em hum lugar e o comprador em outro, consentindo ambos na venda, e
acordando-se per cartas, ou mensageiros, contentando-se o comprador da cousa
e o vendedor do preço.
E póde-se isso mesmo fazer a venda, postoque a cousa comprada não stê
presente diante o comprador e o vendedor, consentindo ambos na venda.”
Título V
Do comprador, que não pagou o preço ao tempo, que devia, por a causa não ser
do vendedor.
“2- E se o vendedor ao tempo do contracto deu spaço ao comprador para lhe
pagar o preço, se lh’o elle não pagar ao tempo, que lhe foi outorgado, poderá o
vendedor logo cobrar a cousa do comprador, se a tiver em seu poder, ou de
qualquer outra pessoa, em cujo poder a achar.
E não se poderá escusar de lha tornar, posto que lhe offereça o preço, pois lho
não pagou, nem offereceu ao tempo, que se obrigou.
Porém, se o vendedor quizer antes haver o preço, que a cousa vendida, podel-
o-ha demandar e haver, quando lhe aprouver.”
Título XIII
Do que quer desfazer a venda, por ser enganado em mais da metade do justo
preço.
Título XXI
Em que moedas farão os pagamentos do que se compra, ou deve.
Título XXII
Que não se engeite moeda d’El-Rey.
Título XLVIII
Que o marido não possa vender, nem alhear bens sem outorga da mulher.
“Mandamos, que o marido não possa vender, nem alhear bens alguns de raiz
sem procuração, ou expresso consentimento de sua mulher, nem bens, em que
cada hum delles tenha o uso e fructo sómente, que sejam casados por carta de
metade, segundo costume do Reino, quer por dote e arras.
O qual consentimento se não poderá provar, senão per scriptura publica; e
fazendo-se o contrario, a venda, ou alheação seja nenhuma, e sem effeito algum.
E postoque se allegue que a mulher consentio, e outorgou na venda, ou
alheamento caladamente, tal outorga tacita não valha, nem seja alguém
admitido a allegar, salvo allegando outorga expressa e provando-a; porque
muitas vezes as mulheres por medo, ou reverencia dos maridos deixam
caladamente passar algumas cousas, não ousando de as contradizer por receio
de alguns scandalos e perigos, que lhes poderiam vir.
Porém não tolhemos ao marido, que possa vender, ou renunciar qualquer
Officio que tiver, posto que a mulher não consinta.”
Legislação Extravagante
Assento da Junta Sobre a Creação das Villas de São Bento de Tamanduá, Queluz
e Barbacena (Apud, SAVASSI, Altair José, Barbacena, 200 anos, volume 1, pág.
115)
“Aos onze dias do mês de janeiro do corrente anno de mil, setecentos e noventa e
dous nesta Villa Rica de Nossa Senhora do Pillar de Ouro Preto na Meza da Junta
da Administração, e arrecadação da Real Fazenda desta Capitania, a que Prezidia
o Illustrissimo e Excellentissimo Senhor Visconde de Barbacena do Conselho de
Sua Magestade Governador, e Capitão General da mesma Capitania, estando
presentes os Ministros, Deputados da dita Junta abaixo assignados, perante elles
foi dito pelo referido Illustrissimo e Excellentissimo Senhor, que tendo sido
repetidos os Requerimentos de alguns dos povos da mesma Capitania muito
principalmente dos moradores das Freguezias de São Bento de Tamanduá,
Carijós, e Igreja Nova, em que lhe pedião fosse servido crear, e erigi em Villas
cada huma das ditas Freguezias, demarcando-lhes Termos competentes, o que
cedia, não só em benefício dos mesmos Suplicantes, por terem huns, e outros, nas
suas dependências Forenses, mais perto o Recurso da Justiça, como também no
melhor serviço de Sua Magestade; sendo este o meio mais seguro, e proprio de se
evitarem muitos delictos, que facilmente se perpetravão, porque de ordinario
ficavão impunidos pelas longitudes que havião dos referidos lugares aos
Julgados, e Villas onde tinhão actualmente as Justiças e sua Residencia; havia
elle dito lllustrissimo e Excellentissimo Senhor na consideração de que os
mencionados Requerimentos erão muito Rasoaveis, e justo pelas exactas
informações a que mandara proceder, e á vista das Reais Ordens feito crear, e
erigir em Villa a Freguezia de São Bento de Tamanduá com o seu Termo
competente, e com a mesma denominação, e assim tambem a Freguezia de
Carijós em Real Villa de Queluz, e a da Igreja Nova, com a denominação de Villa
de Barbacena preservando-Ihes da mesma sorte os seus competentes Termos, e
creando em cada uma dellas dous Juizes Ordinarios, trez Vereadores, hum
procurador do Conselho e hum Escrivão da Camara; assim tão bem dois
Tabelliães, hum Escrivão do Alcaide, hum Meirinho e hum Escrivão de Campo, e
hum Escrivão de Órfaons para o expediente das diligencias da Justiça; cujos
Officios se servião actualmente por conta da Fazenda Real emquanto se não
calcula o Donativo, e Terças partes que devem fazer pagar para então se
Rematarem por esta Junta na forma das Reaes Ordens de que para assim constar
mandou tomar este Assento em que assigna o dito Senhor com os Ministros
Deputados da mesma. E eu Jozé Caetano Cesar Manitte, que sirvo do
impedimento do actual Escrivão Deputado a fis escrever. – Visconde de
Barbacena – Affonço Dias Perª – Ant° Ramos da Silva Nogueira – Jozé Caetano
César Manitti.”
Decreto de 24 de Fevereiro de 1823 (Apud, SAVASSI, Altair José, op. cit., volume
1, pág. 119)
“Eleva á categoria de Cidade todas as Villas que forem Capitaes de
Provincias, e concede titulos honorificos às Povoações de Villa Rica,
S. Paulo, Itú, Sabará e Barbacena.”
“Eu o Principe Regente. Faço saber aos que o presente Alvará com força
de Lei virem: Que devendo ser toda a Legislação uniforme em systema, e
coherente em seus principios, e mui ajustada aos de Direito Natural, fonte da
Justiça universal, para que as suas decisões assentadas nos dictames da Razão,
e do justo sejão respeitadas, e observadas como convem, e sem contradicções, e
difficuldades; e sendo sem controversia estabelecido pelos Direitos Natural,
Romano, e Patrio, e pelo das Nações cultas, e civilisadas, que no contracto de
compra, e venda, ajustado o preço, e entregue ao comprador a cousa vendida, e
ao vendedor o preço, ou fiando-o elle, não só fica o contracto aperfeiçoado, mas
completo de todo; que por meio da tradição passa o domínio para o comprador,
ainda quando o ajuste foi feito ‘habita fide de praetio’; que deste contracto
nascem as acções pessoaes ‘exempto et vendito’, para se haver por meio dellas a
cousa vendida, e o preço; e que a acção de reivindicação he real, e tem origem
immediata no dominio.
He incoherente com estas regras justificadas do mais depurado Direito a
Ordenação do Livro IV tit. V §II, que determina, que fiando o vendedor o preço
com prazo certo, e não se lhe pagando dentro delle póde ou pedi-lo, ou ir haver
a cousa vendida do poder do comprador, ou de qualquer possuidor: decidindo-se
desta maneira que lhe he licito usar da acção pessoa ‘ex vendito’, ou da real de
reivindicação, quando o dominio, de que ella se deriva immediatamente devia
estar no comprador, para quem de sua livre vontade, e pelo facto da venda o
transferio o vendedor sem convenção alguma especial; não merecendo
consideração o argumento de que tal caso fica o dominio revogavel, sobre ser
argucia, e subtileza dos Comentadores, destituidos dos principios solidos de
Direito, não póde sustentar-se sem offensa da certeza de dominio, e que muito
convem attender em materia de Legislação á cerca do Direito de propriedade.
E não sendo a Decisão da referida Ordenação conforme com os principios
geraes até da mesma Legislação patria; e sendo contraria ao bem commum, e
utilidade do Publico, que muito interessa na estailidade, e firmeza dos
contractos, pelos embaraços, que da sua execução resultão nas transacções da
vida civil, e commercial, vendo qual quer que se reputa Senhor de alguma cousa
porque a houve de quem se julgava legitimo dono, virem reivindicar-lha, e
nascendo questões, e litigios de evicções, e authorias sempre embaraçados, e
muitas veses inuteis, por ter já decaido de bens aquelle de quem se deve
ultimamente haver o preço da compra.
E querendo evitar estes pleitos, e demandas porfiosas, e prejudiciaes á
tranquillidade, e felicidade dos meus fieis Vassallos, e livrar o commercio de
semelhantes difficuldades, que retardão, e empecem o seu giro, que importa seja
mui facil, e livre, maiormente devendo considerar-se o contracto da compra, e
venda o mais geral, e necessario para a sua prosperidade, por lhe servir pela
maior parte de base, e fundamento; e sendo além disto mui conforme a sciência
da Legislação ajuntar nas decisões legaes a justiça com publica utilidade.
Tendo ouvido o parecer de pessoas doutas, e zelosas do meu Real serviço,
e da prosperidade geral: Hei por bem revogar a sobredita Ordenação do liv. IV
tit. V §II, e determinar que fiando o vendedor o preço seja, ou não por prazo
certo, tenha somente a acção pessoa para pedi-lo, e não possa haver a coisa
vendida, por que lhe não fosse paga no tempo aprazado, devendo entender-se,
que a concessão do espaço para o pagamento sem outra convenção, não importa
mais do que não poder pedir-se o preço antes delle findar-se.
Pelo que mando, etc.
Dado no Palacio do Rio de Janeiro, em 4 de setembro de 1810. – Principe
com guarda.”
“Eu o Príncipe Regente faço saber aos que o presente Alvará com força
de lei virem: que sendo necessário, e forçosos estabelecer novos impostos, para
nas urgentes circumstancias, em que se acha o Estado, poder suprir-se as
despezas públicas, que se tem augmentado: não podendo bastar os rendimentos,
que haviam e que eram apropriados a outros tempos, e a mais moderada
precisões: e convindo lançar mão dos que já são conhecidos desde o princípio
da Monarchia, e que merecem preferencia por menos gravosos, e por terem
methodo de arrecadação mais suave, e approvado pela prática e experiência, e
tendo estas conhecidas vantagens a siza das compras e vendas, maiormente por
se pagar em occasião menos penosa, e quando se transfere o domínio: desejando
gravar o menos, que for possível, o livre gyro das transacções dos meus fiéis
vassallos no trafico ordinário da vida civil, para que no uso do direito de
propriedade tenham a maior liberdade que for compatível com o interesse da
causa pública: tendo ouvido o parecer de pessoas doutas, e zelosas do meu real
serviço: sou servido a determinar o seguinte.
I. De todas as compras, vendas e arrematações de bens de raiz que se
fizerem em todo este Estado e Dominios Ultramarinos, se pagará siza para a
minha Real Fazenda, que será de dez por cento do preço da compra, sem que
desta contribuição se entenda por isenta pessoa ou corporação alguma, por
mais caracterizada ou privilegiada que seja a que intervier em semelhantes
contratos; em conformidade do que se acha estabelecido nos Alvarás de 24 de
Outubro de 1796 e 8 de julho de 1800.
II. Pagar-se-há tambem em todo este Estado do Brasil para a minha Real
Fazenda meia siza, ou cinco por cento do preço das compras e vendas de
escravos ladinos, que se entenderão todos aquelles que não são havidos por
compra feita aos negociantes de negros novos, e que entram pela primeira vez
no paiz, transportados da Costa de Africa.
III. Para arrecadação da siza dos bens de raiz proporão as Camaras tres
pessoas das mais abonadas que houver, para se escolher uma para Recebedor ou
Thesoureiro nesta Corte e Districto da Capitania do Rio de Janeiro pelo
Conselho da minha Real Fazenda, e nas demais Capitanias pelas Juntas da
Administração e Arrecadação della; por maneira que haja um em cada Cidade e
Villa em que houver Camaras; e os Officiaes dellas ficarão e os seus herdeiros
responsáveis pelas faltas das pessoas, que propuzerem e que forem approvadas.
IV. Os recebedores nomeados receberão as sizas que lhes forem as partes
a pagar, carregando-las em receita os Escrivães das Camaras, que hei por bem
que sirvam de Escrivães das Sizas, sendo juizes dellas ou mesmo juizes de Fora,
onde os houver, e os Ordinários em cada uma das Villas respectivas. Para esta
carga haverá um livro rubricado pelos Ouvidores das Comarcas, nas Villas em
que forem Juizes das Sizas os Ordinários, e nas demais pelos mesmos Juizes de
Fora: e perceberão, o Escrivão um por cento pelo feitio e escripturação das
certidões, e o Thesoureiro também um por cento pela guarda do dinheiro, sem
mais ordenado ou emolumento algum.
V. No fim de cada tres mezes, e nos primeiros oito dias seguintes, se
remeterá ao meu Real Erario o que se tiver arrecadado nesta Corte e Província,
com o competente conhecimento extrahido do respectivo livro assignado pelo
Juiz, Recebedor, e Escrivão, dando-se a necessária quitação para ressalva do
referido Recebedor com as clarezas precisas. Nas Capitanias deste Estado e dos
Dominios Ultramarinos se fará a remessa às Juntas da Administração e
Arrecadação da minha Real Fazenda, por onde se expedirá a respectiva
quitação.
VI. A meia siza que se deve pagar na venda dos escravos ladinos se
arrendará a quem mais der, fazendo-se as arrematações na forma dos mais
Contratos nesta Corte e Provincia , no Conselho da minha Real Fazenda, e nas
referidas Capitanias nas Juntas da Administração e Arrecadação della.
VII. Emquanto porém não se arrematam, ou por não ser o tempo próprio e
opportuno, ou por parecer conveniente administrar por algum tempo para se
regular melhor o preço das arrematações, arrecadar-se-há pelo mesmo
Recebedor das sizas dos bens de raiz da mesma forma acima prescripta,
havendo porém diverso livro em que se lancem as verbas pelo mesmo Escrivão,
especificando-se o dia, mez e anno, os nomes dos vendedores e compradores, o
nome e a nação do escravo, e o preço da venda, para delle se extrahir o
conhecimento que deve acompanhar as remessas e competentes certidões que se
devem dar às partes quando as vendas se fizerem por escriptura publica.
Quando porém forem feitas por escriptos particulares, nelles declarará o
Escrivão das sizas, que foi paga a daquella venda, e que fica encarga ao
Recebedor, assignando esta declaração e conservando-se em mão do comprador
o titulo da compra; o apresentará quando lhe for exigido incorrendo nas penas
deste Alvará quando o não mostrar com a competente verba.
VIII. Todas as compras e vendas de bens de raiz, de que se não houver
pago a respectiva siza, serão nullas e de nenhum effeito e vigor, e as proprias
partes contratantes, ou seus herdeiros poderão defazel-as em qualquer tempo, e
os Escrivães ou Tabelliães que fizerem as escripturas sem certidão do
pagamento da siza, com as clausulas determinadas no cap. 20 do Regimento dos
encabeçamento das sizas e do § 14 da Ord. liv.I . Tit.78, incorrerão na pena do
perdimento do Officio, na fórma da mesma Lei e Regimento.
IX. Na mesma pena de nullidade incorrerão as vendas dos escravos
ladinos que se fizerem sem o pagamento da meia siza, e serão além disto
multados os vendedores e compradores em igual parte na perda do valor do
escravo, sendo a metade para o denunciante, se o houver, e a outra, ou toda, não
o havendo, para a minha Real Fazenda. E além de admittirem os Juizes das
Sizas e ou Ouvidores das Comarcas denuncias das vendas que assim se fizerem
sem o pagamento da siza, ou com diminuição do verdadeiro preço, perguntarão
nas devassas geraes e nas de correição de cada um anno por este artigo. E isto
se entenderá nas vendas, que forem feitas da data deste Alvará em diante,
admittindo-se as provas legaes dos que se quizerem escusar com esta defesa, e
decidindo os Juizes das sizas com assistencia do Procurador da Fazenda
respectivo, e podendo as partes interpor o competente recurso nesta Corte e
Província do Rio de Janeiro para o Conselho da minha Real Fazenda, e nos
mais logares para a Relação do Districto. E nesta mesma pena incorrerão os que
fizerem vendas de bens de raiz ou os arrematarem sem o pagamento da siza ou
com diminuição do preço, guardando-se e praticando-se em tudo as mesmas
disposições acima decretadas.
X. Os Ouvidores nas devassas de correição examinarão os livros das
receitas das sizas das Villas em que só há Juizes Ordinarios e proverão no que
for necessario corrigir ou emedar, pronunciando o Juiz e o Escrivão sendo
culpados: e nas devassas das residencias que tiverem os sindicantes dos Juizos
de Fóra e Ouvidores, perguntarão pelo modo com que se houveram na
fiscalisação deste ramo das minhas rendas Reaes, dando-se-lhes em culpa as
prevarições ou omissões que houverem comettido.
E este se cumprirá, como nelle se contém: pelo que mando à Mesa do
Desembargo do Paço, e da Consciencia e Ordens; Presidente do meu Real
Erario; Conselho da minha Real Fazenda; Regedor das J ustiças; e a todas as
mais pessoas, a quem pertencer o conhecimento deste Alvará o cumpram e
guardem, como nelle se contém. E valerá como carta passada pela Chancellaria,
posto que por ella não ha de passar, e que seu effeito haja de durar mais de um
anno sem embargo da Ordenação em contrario. Dado no Palacio do Rio de
Janeiro em 3 de Junho de 1809.
PRINCIPE com guarda. Conde de Aguiar
Alvará com força de lei, pelo qual Vossa Alteza Real há por bem
determinar que se pague a siza de dez por cento das compras e vendas de bens
de raiz, e meia siza de cinco por cento nas que se fizerem de escravos ladinos em
todo o Estado do Brazil e Dominios Ultramarinos; estabelecendo a fórma da
arrecadação deste imposto e determinando as penas em que incorrem os que a
não pagarem; na fórma acima exposta.
Para Vossa Alteza Real ver.
João Manoel Martins da Costa o fez.”
“Eu o Principe Regente faço saber aos que este alvará de declaração
viram, que havendo eu determinado, pelos justos e ponderosos motivos
expressados no Alvará de 3 de Junho de 1809, que todas as compras, vendas e
arrematações de bens de raiz que se fizerem em todo este Estado e Dominios
Ultramarinos, se pagasse para minha Real Fazenda siza de 10% do preço da
compra, sem que desta distribuição fosse isenta pessoa ou corporação alguma,
por mais caracterisada ou privilegiada, em conformidade do que se achava
estabelecido nos Alvarás de 24 de Outubro de 1796 e de 8 de Julho de 1800:
attendendo a que esta minha real disposição póde obstar as transacções
commerciaes, que pela falta de cabedaes são feitas a pagamentos em prazos
estabelecidos nas compras dos bens de raiz, e desejando eu sempre conciliar os
interesses da causa pública com o commodo dos meus fiéis vassallos e facilitar
por todos os modos as suas transacções no trafico ordinario da vida civil, com
plena liberdade do direito de propriedade, quanto é compatível com a
manutenção e conservação do Estado: hei por bem, declarando o sobredito
alvará nesta parte somente, ficando em tudo o mais no seu inteiro vigor, ordenar,
que daqui em diante o pagamento da siza das compras e arrematações dos bens
de raiz se faça sómente da quantia que se pagar à vista, continuando a fazer-se
na occasião dos pagamentos futuros, conforme for ajustado em consideração à
quantia delles, que sómente poderão ser feitos por quitações lavradas em juizo,
no traslado da escriptura principal da compra em que o Escrivão declare que foi
paga a respectiva siza, com pena de nulidade de taes pagamentos e da mesma
escriptura principal, na forma do paragrapho 8 do sobredito alvará, incorrendo
tambem os Escrivães que o contrario fizerem, nas mais penas impostas pelas
minhas leis.
Este se cumprirá como nelle se contém. Pelo que mando à Mesa do
Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens; Presidente do meu Real
Erario; Conselho da minha Real Fazenda; Regedor das Justiças; e a todas as
pessoas a quem pertencer o conhecimento deste meu alvará de declaração o
cumpram e guardem, como nelle se contém: E valerá como carta passada pela
Chancellaria, posto que por ella não há de passar, e o que o seu effeito haja de
durar mais de um anno, sem embargo da ordenacção em contrário. Dado no
Palacio do Rio de Janeiro em 2 de Outubro de 1811.
PRINCIPE com guarda.
Conde de Aguiar.
ALVARÁ DE DECLARAÇÃO, PELO QUAL Vossa Alteza Real há por bem
ordenar, que o pagamento da siza das compras e arrematações dos bens de raiz
se faça da quantia, que se der à vista, e se continue a fazer das quantias, que se
forem dando em pagamento; na fórma acima exposta.
Para Vossa Alteza Real ver. João Alves de Miranda o fez.”
Referências Bibliográficas
FONTES PRIMÁRIAS
FONTES SECUNDÁRIAS
1. BALBINO FILHO, Nicolau. Registro de Imóveis: Doutrina – Prática-
Jurisprudência. 4 ª ed. São Paulo: Atlas, 1978. 411 págs.
2. CASTRO, Sylvio Brantes de. Novo Manual dos Tabeliães (Teoria e
Prática). 3ª ed. comentada, aumentada e atualizada. São Paulo: Edições
e Publicações Brasil, 1953. (1ª ed de 1941). 458 págs.
3. DEL PICCHIA, Menotti. A Mágica Tabelioa, in A Gazeta. (recorte sem
número e data). 1947
4. GONÇALVES, Luís da Cunha. Da Compra e Venda no Direito Comercial
Português. 2ª Ed. Coimbra: Coimbra Editora, antiga Livraria França &
Arménio, 1924.
5. LUZ, Waldemar P. da. Tratado Prático dos Imóveis. 2ª ed. Porto Alegre:
Sagra, 1991. 375 págs.
6. NALINI, José Renato et all. Registros Públicos e Segurança Jurídica.
Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1998. 120 págs.
7. PARIZATTO, João Roberto. Serviços Notariais e de Registro - de acordo
com a Lei n° 8.935, de 18/11/94: atribuições dos tabeliães e oficiais:
manual prático. Brasília: Livraria e Editora Brasília Jurídica, 1995. 348
págs.
8. SAVASSI, Altair José. Barbacena, 200 anos. Volumes 1 e 2. Belo
Horizonte: Lemi, 1991. 290 págs. (Vol. 1) e 258 págs. (Vol. 2).
9. TELLES, José Homem Corrêa. Formulário dos Contractos, Testamentos, e
de outros Actos do Tabellionado. Rio de Janeiro: B.L.Garnier, 1881. 603
págs.
10. VALLADÃO, Haroldo. História do Direito, Especialmente do Direito
Brasileiro - Parte I. Rio de Janeiro: Livraria Freitas Bastos, 1973. 156
págs.
11. ________. História do Direito, Especialmente do Direito Brasileiro - Parte II
- Direito Brasileiro Imperial e Republicano. Rio de Janeiro: Livraria
Freitas Bastos, 1973. 156 págs.
12. VEIGA, Francisco Antônio. O Direito ao Alcance de Todos ou O
Advogado de Si Mesmo - Diccionario de Direito Usual. 2ª Ed.
acrescentada. Porto: Ernesto Chardron, 1884