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Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Centro de Ciências Sociais


Instituto de Filosofia e Ciências Humanas

Natália Couto de Oliveira

Desenvolvimento, sustentabilidade e relações internacionais:


uma análise dos indicadores de desenvolvimento sustentável e
sua aplicação ao caso brasileiro

Rio de Janeiro
2012
Natália Couto de Oliveira

Desenvolvimento, sustentabilidade e relações internacionais: uma análise dos indicadores


de desenvolvimento sustentável e sua aplicação ao caso brasileiro

Dissertação apresentada, como requisito


parcial para a obtenção do título de Mestre
ao Programa de Pós-Graduação em
Relações Internacionais, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Área de
concentração: Política Internacional.

Orientador: Prof. Dr. Williams da Silva Gonçalves

Rio de Janeiro
2012
CATALOGAÇÃO NA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/ CCSA

O48 Oliveira, Natália Couto de.


Desenvolvimento, sustentabilidade e relações internacionais:
uma análise dos indicadores de desenvolvimento sustentável e
sua aplicação ao caso brasileiro / Natália Couto de Oliveira. –
2012.
169 f.

Orientador: Williams da Silva Gonçalves.


Dissertação (mestrado) – Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.

1. Relações internacionais – Brasil – Teses. 2.


Desenvolvimento sustentável – Brasil - Teses. I. Gonçalves,
Williams da Silva. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. III. Título.

CDU 327(81)

Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação.

___________________________ _________________________
Assinatura Data
Natália Couto de Oliveira

Desenvolvimento, sustentabilidade e relações internacionais: uma análise dos indicadores


de desenvolvimento sustentável e sua aplicação ao caso brasileiro

Dissertação apresentada, como requisito


parcial para a obtenção do título de Mestre
ao Programa de Pós-Graduação em
Relações Internacionais, da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro. Área de
concentração: Política Internacional.

Aprovada em 20 de março de 2012.


Banca examinadora:

Prof.º Dr. Williams da Silva Gonçalves (Orientador)


Instituto de Filosofia e Ciências Humanas - UERJ

Prof.ª Dra. Lia Cecília Baker Fonseca Valls Pereira


Instituto de Filosofia e Ciências Humanas - UERJ

Prof.ª Dra. Leane Cornet Naidin


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Rio de Janeiro
2012
AGRADECIMENTOS

Ao Prof.º Dr. Williams da Silva Gonçalves pelo ótimo trabalho de orientação que dedicou
a este projeto, sempre disponível e disposto a ajudar nas dificuldades encontradas no decorrer das
pesquisas.
Aos professores do PPGRI por me apresentarem às Relações Internacionais e me
proporcionaram um profundo aprendizado na área, o que me engrandeceu intelectualmente e
humanamente.
Aos grandes amigos que fiz nesses dois anos de intensa convivência e troca de
experiências. Afinal, o que levamos da vida são os amigos e são muitos os que quero levar
comigo depois dessa jornada.
Aos meus familiares por todo o suporte que me foi oferecido ao longo da vida e que me
levaram a galgar sempre degraus mais elevados sem temer o desamparo.
RESUMO

OLIVEIRA, Natália Couto de. Desenvolvimento, sustentabilidade e relações internacionais: uma


análise dos indicadores de desenvolvimento sustentável e sua aplicação ao caso brasileiro. 2012.
169 f. Dissertação (Mestrado em Relações Internacionais) – Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.

O desenvolvimento sustentável foi definido pelo Relatório Brundtland como “o


desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. Esse tipo de desenvolvimento abarca tanto
a questão do crescimento econômico com distribuição de renda, quanto a necessidade de se
preservar os recursos escassos do planeta, além de seus ecossistemas. O desenvolvimento
sustentável é um tema que aborda dois conceitos-chave que afetam as relações entre os países: a
necessidade de desenvolvimento de muitas nações que ainda não atingiram o patamar de riqueza
dos países desenvolvidos e o imperativo da sustentabilidade, que restringe a possibilidade do
desenvolvimento econômico ao interferir no processo produtivo das nações. Dessa forma, torna-
se necessário abordar o desenvolvimento sustentável na perspectiva das Relações Internacionais.
Acordos cooperativos em relação ao meio ambiente têm sido assinados muito mais como forma
de cooperação bilateral do que global. O contexto histórico nos leva a um ponto de inflexão no
cenário internacional, iniciado no ano de 2002 e que perdura até os dias atuais. Neste início de
século XXI, a convergência dos países ao desenvolvimento sustentável passa a ser analisada pelo
esforço unilateral de cada nação, explicitando o uso dos indicadores de desenvolvimento
sustentável e justificando sua apreciação. É neste período em que se dará a análise da economia
brasileira, conforme proposto pela dissertação. A partir da análise dos dados fornecidos pelos
indicadores para a situação do desenvolvimento sustentável no Brasil, tem-se elaborada a questão
central que esta dissertação procurará responder: a efetividade no uso destes indicadores para o
direcionamento das políticas de desenvolvimento sustentável das nações. A valoração do
desenvolvimento sustentável é de vital importância para o posicionamento das nações frente ao
tema ambiental no mundo. Como diferentes conceitos são aceitos para o tema, a possibilidade de
um grande acordo multilateral acerca do mesmo fica prejudicada. A maneira encontrada por
alguns países foi redirecionar suas economias unilateralmente à sustentabilidade. O que isso irá
provocar nas Relações Internacionais só o tempo poderá dizer. O que é certo é que a frágil
relação entre os países será afetada por esse fato. O Brasil desponta como um expoente do
desenvolvimento sustentável, pelo menos na intenção, e é através do uso de ferramentas como os
indicadores de desenvolvimento sustentável que podemos mensurar o quanto seu discurso se
converte em prática.

Palavras-Chave: Desenvolvimento. Sustentabilidade. Desenvolvimento sustentável. Indicadores


de desenvolvimento sustentável.
ABSTRACT

Sustainable development was defined by the Brundtland Report as development that


meets present needs without compromising the ability of future generations to meet their own
needs. This type of development includes both the issue of economic growth with income
distribution, and the need to preserve the scarce resources of the planet and its ecosystems.
Sustainable development is a topic that addresses two key concepts that affect the relations
between the countries: the need for development of many nations that have not yet reached the
level of wealth in developed countries and the imperative of sustainability, which restricts the
possibilities of economic development by interfering in the production process of nations. Thus,
it is necessary to address sustainable development in view of International Relations. Cooperative
agreements in relation to the environment have been signed much more as a form of bilateral
cooperation than global. Beginning of this century, the convergence of countries to sustainable
development is being considered by the unilateral effort of each nation, which explains the use of
sustainable development indicators and justify your analysis. It is this period that will give the
analysis of the Brazilian economy, as proposed by the paper. From the analysis of data provided
by indicators to the situation of sustainable development in Brazil has developed the central
question that this dissertation will seek to answer: the effective use of indicators for sustainable
development to the direction of policies of sustainable development of nations. The measurement
of sustainable development is of vital importance to positioning of the nations facing the
environmental issue in the world. How different concepts are accepted for the subject, the
possibility of a major multilateral agreement on the subject is impaired. The way found by some
countries was redirect their economies unilaterally to sustainability. What this will cause in
International Relations only time will tell. What is certain is that the fragile relationship between
the countries will be affected by this fact. Brazil has emerged as an exponent of sustainable
development, at least in speech, and it is through the use of tools such as sustainable development
indicators that we can measure how much the speech is converted into practice.

Keywords: Development. Sustainability. Sustainable development. Sustainable development


indicators.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 – As fases históricas da internacionalização do meio ambiente .................................. 21

Quadro 2 – Princípios da declaração de Estocolmo ................................................................... 27

Quadro 3 – As negociações da CNUMAD ................................................................................. 37

Quadro 4 – Dimensões do ambientalismo .................................................................................. 68

Quadro 5 – Paradigma social dominante X Paradigma da ecologia profunda ........................... 80

Quadro 6 – Pirâmide de informações ......................................................................................... 85

Quadro 7 – Principais projetos em indicadores de desenvolvimento sustentável ....................... 94

Gráfico 1 – Pontuação do índice EVI para todos os países (inclui países com dados
insuficientes)............................................................................................................. 98
Figura 1 – Índice DNA Brasil – Brasil Real ........................................................................... 109

Figura 2 – Índice DNA Brasil – Comparação 2004/2005 ...................................................... 110

Quadro 8 – Iniciativas de desenvolvimento sustentável selecionadas – Brasil ....................... 116

Figura 3 – Posição do Brasil no Barômetro de Sustentabilidade ............................................. 141

Quadro 9 – Situação do Brasil relativa ao desenvolvimento sustentável, segundo dimensões e


subsistemas............................................................................................................... 141
Figura 4 – Escala de cores do Dashboard of Sustainability ..................................................... 145

Gráfico 2 – DS - indicadores de desenvolvimento do milênio - erradicação da pobreza ......... 146

Gráfico 3 – DS - indicadores de desenvolvimento do milênio - educação primária universal .. 147

Gráfico 4 – DS - indicadores de desenvolvimento do milênio - equidade de gênero ............. 148

Gráfico 5 – DS - indicadores de desenvolvimento do milênio - redução da mortalidade infantil


................................................................................................................................. 149

Gráfico 6 – DS - indicadores de desenvolvimento do milênio - saúde materna ....................... 149

Gráfico 7 – DS - indicadores de desenvolvimento do milênio - combate ao HIV, malária e


tuberculose ............................................................................................................ 150
Gráfico 8 – DS - indicadores de desenvolvimento do milênio - defesa da sustentabilidade
ambiental ................................................................................................................ 151
Gráfico 9 – DS - indicadores de desenvolvimento do milênio - parceria mundial para o
desenvolvimento .................................................................................................... 152
Gráfico 10 – DS - índice de objetivos de desenvolvimento do milênio ......................................153
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AGNU Assembleia Geral das Nações Unidas


AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
BS Barometer of Sustainability
C,T&I Ciência, Tecnologia e Inovação
CDB Convenção sobre Diversidade Biológica
CDS Comissão de Desenvolvimento Sustentável
CEPAL Comissão Econômica da América Latina e o Caribe
CNUDM Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar
CNUMAD Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento
CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente
CONFEA Conselho Federal de Engenharia e Agronomia
CPDS Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21
Nacional
DBO Demanda Bioquímica de Oxigênio
DS Dashboard of Sustainability
EBS Escala do Barômetro da Sustentabilidade
EDN Escala de Desempenho Nacional
EFM Ecological Footprint Method
EUA Estados Unidos da América
EVI Environmental Vulnerability Index
FMI Fundo Monetário Internacional
G-77 Grupo dos 77
GATT General Agreement on Tariffs and Trade
GEF Global Environmental Facility
HIV Vírus da Imunodeficiência Humana
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDA International Development Association
Ideb Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico
IDG Índice de Desenvolvimento Ajustado ao Gênero
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IDS Índice de Desenvolvimento Sustentável
IFES Institutos Federais de Educação Tecnológica
IPH Índice de Pobreza Humana
IQA Índice de Qualidade da Água
LPI Living Planet Index
MPG Medida de Participação Segundo o Gênero
OCDE Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
ODA Assistência Oficial para o Desenvolvimento
ODM Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
OMS Organização Mundial de Saúde
ONG Organização Não Governamental
ONU Organização das Nações Unidas
PIB Produto Interno Bruto
PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNB Produto Nacional Bruto
PNMC Política Nacional sobre Mudança do Clima
PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PPA Plano Plurianual
PrepCom Preparatory Committee
Proálcool Programa Nacional do Álcool
PSR Pressure-State-Response
Seea System of Environmental-Economic Accounts
Sopac Comissão de Geociência Aplicada do Pacífico Sul
UC Unidade de Conservação
UNCTAD United Nations Conference on Trade and Development
UNEP United Nations Environment Programme
UNFCCC United Nations Framework Convention on Climate Change
WCP World Climate Programme
WWF World Wide Fund for Nature
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ................................................................................................. 12
1 A EVOLUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: DE
ESTOCOLMO AOS DIAS ATUAIS ............................................................... 18
1.1 Panorama Histórico das Negociações Ambientais ......................................... 18
1.1.1 A década de 1970 e a Conferência de Estocolmo ............................................... 20
1.1.2 A década de 1980 e os altos e baixos da questão ambiental no sistema
internacional ........................................................................................................ 30
1.1.3 A década de 1990, a RIO-92 e os grandes acordos ambientais .......................... 35
1.1.3.1 A Agenda 21 ....................................................................................................... 42
1.1.3.2 A comissão de desenvolvimento sustentável e a Agenda 21 .............................. 46
1.1.4 Os anos 2000, Joanesburgo e a necessidade de um novo paradigma de
desenvolvimento ................................................................................................ 49
2 ABORDAGENS CONCEITUAIS E PRÁTICAS DE
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL .................................................... 56
2.1 Definição de desenvolvimento .......................................................................... 56

2.2 Definição de sustentabilidade ........................................................................... 66


2.3 Definição de desenvolvimento sustentável ...................................................... 74
2.4 Os Indicadores de desenvolvimento sustentável ............................................ 82
3 APLICAÇÕES DOS INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL ............................................................................................... 93

3.1 Análise dos indicadores de desenvolvimento sustentável .............................. 93

3.1.1 Indicadores de Organismos Internacionais ......................................................... 96


3.1.2 Indicadores selecionados de países desenvolvidos ........................................... 100
3.1.3 Indicadores de sustentabilidade formulados pelo Brasil .................................. 107
3.2 A trajetória da sustentabilidade no Brasil .................................................... 111
3.2.1 Incentivos brasileiros ao desenvolvimento sustentável .................................... 118
3.2.2 Aplicação dos indicadores de desenvolvimento sustentável para o caso
brasileiro ............................................................................................................ 125
3.2.2.1 O Indicador de Desenvolvimento Sustentável do IBGE ................................... 125
3.2.2.2 Avaliação brasileira pelo Barometer of Sustainability ..................................... 139
3.2.2.3 Aplicação do Dashboard of Sustainability para o caso brasileiro .................... 144
4 CONCLUSÃO ................................................................................................. 154
REFERÊNCIAS................................................................................................. 171
12

INTRODUÇÃO

A questão ambiental é um tema relativamente recente para as Relações Internacionais. Ela


surge como um problema internacional somente na segunda metade do século XX, ainda assim
como demanda dos países desenvolvidos onde os efeitos da poluição, provocada pelo processo de
industrialização e crescimento econômico, tinha atingidos níveis capazes de mobilizar a
sociedade civil.
A questão do desenvolvimento também é significativamente recente. A noção de
desenvolvimento como sinônimo de crescimento econômico remonta aos economistas clássicos
do século XIX, para os quais havia um limite máximo imposto ao crescimento devido à
produtividade marginal dos fatores. David Ricardo defendia que a terra arável apresentava
rendimentos marginais decrescentes, devido ao desgaste dos nutrientes, e esse fator limitava o
crescimento das nações até um ponto de "steady state1". Somente no século XX, o economista
Robert Solow, vai formular uma teoria de crescimento econômico em que será possível crescer
além do estado estacionário, introduzindo novas tecnologias ao sistema econômico.
A necessidade ao desenvolvimento, entendido por crescimento econômico, como
reivindicação natural dos países só surge após a Segunda Guerra Mundial, fruto da independência
das colônias asiáticas e africanas e da renovação do pensamento econômico latino-americano2.
Os moldes em que se embasava o desenvolvimento do chamado Terceiro Mundo3 foram os
mesmos pelos quais as grandes potências atingiram seu patamar de riqueza. O objetivo era se
desenvolver através de um modelo que ficou conhecido como “substituição de importações”.
Neste contexto era imprescindível a proteção da indústria nascente e obter a escala necessária

1
Estado estacionário (steady state) está ligado ao ramo da Economia que trata do crescimento econômico. O estado estacionário,
teoria formulada por Robert Solow, é uma situação na Economia em que o investimento iguala a depreciação. Neste estágio, há a
saturação dos fatores produtivos da economia. Qualquer investimento adicional não provocará mais nenhum crescimento
econômico, pois será inteiramente corroído pela depreciação. Assim, não há mais possibilidade natural de crescimento. Fonte:
ELLERY Jr, Roberto, e GOMES, Victor. Modelo de Solow, Resíduo de Solow e Contabilidade do Crescimento. março de 2003.
Disponível em: http://www.victorgomes.com.br/docs/cursos/ecb1/solow_ecb.pdf. Acesso em 11/06/2011. 21 páginas.
2
SILVA, Guilherme A. e GONÇALVES, Williams. “Dicionário de Relações Internacionais” São Paulo: Editora Manole, 2010, p.
40.
3
Expressão utilizada para designar a realidade socioeconômica dos países subdesenvolvidos da Ásia, África, Oceania e América
Latina, em sua maioria tornados independentes após a Segunda Guerra Mundial. O sentido original da expressão emana
diretamente da estrutura bipolar do sistema internacional dos anos 1950. Os países do Terceiro Mundo são, portanto, aqueles que
não fazem parte do mundo dos países capitalistas desenvolvidos, tampouco pertencem ao mundo dos países socialistas. [...]
[Esses] países [eram] muito vulneráveis às flutuações dos mercados internacionais e [dependiam] de ajuda dos países
desenvolvidos e das politicas de proteção elaboradas pelos organismos internacionais. Fonte: SILVA, Guilherme A. e
GONÇALVES, Williams. 2010. “Dicionário de Relações Internacionais” Editora Manole. p. 280.
13

para que se barateassem os custos de produção, de forma que se firmassem indústrias em países
onde a economia era basicamente agrário-exportadora.
O desenvolvimento como o debatido nesta dissertação, só foi surgir anos mais tarde, com
a divulgação do Relatório Brundtland4, em 1987. Deste relatório provém a definição de
desenvolvimento sustentável: “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem
comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. Este tipo
de desenvolvimento abarca tanto a questão do crescimento econômico com distribuição de renda,
quanto a necessidade de preservação dos recursos escassos do planeta, além de seus ecossistemas.
Como o desenvolvimento sustentável envolve relações tanto nacionais como
transfronteiriças (ou ainda globais), não é possível estudá-lo isoladamente. É um tema que aborda
dois conceitos-chave que afetam as relações entre os países: a necessidade de desenvolvimento de
muitas nações que ainda não atingiram o patamar de riqueza dos países desenvolvidos e o
imperativo da sustentabilidade, que restringe a possibilidade do desenvolvimento econômico ao
interferir no processo produtivo das nações.
Dessa forma, torna-se necessário abordar o desenvolvimento sustentável na perspectiva
das Relações Internacionais. O principal objetivo da dissertação é dar um foco maior a questão
ambiental na perspectiva desenvolvimentista, o que significa a adoção de um conceito de
sustentabilidade em que é permitido o desenvolvimento econômico.
O arcabouço dessa dissertação se baseia em três acontecimentos históricos importantes
para a questão ambiental no mundo: a Conferência Mundial sobre o Homem e o Meio Ambiente,
ocorrida em 1972 na Suécia; a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento, ocorrida em 1992 no Brasil; e a Conferência das Nações Unidas sobre
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, ocorrida em 2002 na África do Sul. É a partir desses
acontecimentos que a problemática ambiental é exposta dentro das Relações Internacionais, é
concebido o conceito de desenvolvimento sustentável e que as políticas adotadas pelos países em
torno do meio ambiente são avaliadas.
A Primeira Conferência Mundial sobre o Homem e o Meio Ambiente, também conhecida
como Conferência de Estocolmo, acontece no período da détente entre as potências mundiais da
Guerra Fria: os Estados Unidos e União Soviética. O maior espaço dado às necessidades dos

4
Relatório Brundtland, também chamado Nosso Futuro Comum (Our Common Future) é o documento final da Comissão
Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, promovida pela ONU, nos anos 80 e chefiada pela então primeira-ministra da
Noruega, Gro Harlen Brundtland. Disponível em: <http://www.mudancasclimaticas.andi.org.br/node/91> Acesso 11/06/2011.
14

países do Terceiro Mundo pode ser considerado efeito desta situação. O enfraquecimento
momentâneo das questões do eixo Leste/Oeste de negociação abriu espaço para que se
expusessem os conflitos do eixo Norte/Sul dentro da conferência.
A Conferência de Estocolmo ficou marcada pela questão do desenvolvimento como
centro de discussão entre os países do Norte e os países do Sul. Neste caso, o Sul menos
desenvolvido saiu vitorioso porque conseguiu pautar a defesa do meio ambiente em função do
desenvolvimento igualitário das nações. Esta conferência foi o primeiro marco ambiental em
termos globais, e as ideias plantadas na Conferência influenciaram o conceito de
desenvolvimento sustentável, anos mais tarde.
Já a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
(CNUMAD), ocorrida em 1992 no Rio de Janeiro, acontece sobre um contexto diferente, após a
queda do muro de Berlim e o fim da cortina de ferro. Este fato produz uma visão mais otimista
dos formuladores de política externa em torno do multilateralismo, algo fundamental para uma
grande Conferência sobre Meio Ambiente.
A RIO-92, como ficou conhecida a CNUMAD, foi um grande sucesso em termos da
disponibilidade das nações em prol de fomentar grandes acordos ambientais. É nesta Conferência
que se estabelecem os maiores acordos ambientais da história, como a Agenda 21. A CNUMAD
abre caminho também para que os países em desenvolvimento obtenham suas demandas em torno
da sustentabilidade e para a busca de financiamento ao novo modelo de desenvolvimento. A ideia
de um desenvolvimento baseado na sustentabilidade foi cunhada nesta Conferência.
Na década seguinte ocorre a Conferência de Joanesburgo, com o objetivo de averiguar o
que de fato tinha sido posto em prática dos acordos assinados no Rio de Janeiro. O que foi visto
nesta Conferência foi um atraso geral na implementação das convenções e uma indisposição,
principalmente por parte dos Estados Unidos, em prosseguir com os acordos e com a ajuda
financeira e tecnológica para a implementação de ferramentas que permitissem o
desenvolvimento sustentável nos países em desenvolvimento.
Essa situação pode ser considerada um reflexo dos atentados terroristas de 11 de setembro
de 2001 no Sistema Internacional. Tal fato provocou o enfraquecimento da pauta ambiental nas
Relações Internacionais, ao colocar a segurança nacional novamente no centro da agenda dos
Estados. Além disso, a multilateralidade também se viu enfraquecida. A visão de um mundo
cooperativo caiu por terra e os países têm atuado mais individualmente que cooperativamente.
15

Acordos cooperativos em relação ao meio ambiente têm sido assinados muito mais como
forma de cooperação bilateral do que global. A mitigação dos efeitos do aquecimento global que
se tornou um fator premente na agenda, não consegue ser contemplada em nenhum acordo
multilateral, apesar do esforço envolvido para tanto.
Posto esse arcabouço, o contexto histórico nos leva a um ponto de inflexão no cenário
internacional que começa no ano de 2002 e vai até os dias atuais. Esse será o período analisado
por esta dissertação em termos da utilização dos indicadores de desenvolvimento sustentável.
Nesse início de século XXI, a convergência dos países ao desenvolvimento sustentável também
passa a ser analisada pelo esforço unilateral de cada nação, o que explicita o uso dos indicadores
e justifica sua análise.
A utilização dos indicadores de desenvolvimento sustentável como ferramenta indicativa
do progresso dos países em relação à sustentabilidade ganha força no cenário internacional atual.
A evolução do conceito de desenvolvimento sustentável, através do arcabouço histórico das
Conferências Internacionais, nos leva a um embasamento teórico que servirá para a análise do
período demarcado pela primeira década do século XXI. É neste período que se dará a análise da
economia brasileira, conforme proposto pela dissertação.
Primeiramente, a dissertação se propõe a fornecer uma visão histórica da questão
ambiental em nível internacional nos últimos quarenta anos. Paralelamente, o trabalho tentará
mostrar a evolução do conceito de desenvolvimento sustentável de acordo com as mudanças no
paradigma ambiental. Essa conceituação permitiu a elaboração dos indicadores de
desenvolvimento sustentável. É a partir do conhecimento desses indicadores que são formuladas
as políticas ambientais das nações e se permite a comparação entre o grau de desenvolvimento
sustentável das mesmas.
No primeiro capítulo da dissertação pretende-se realizar um histórico da questão
ambiental, abordando as três grandes Conferências do meio ambiente realizadas pelas Nações
Unidas e sua importância para a formulação oficial do conceito de desenvolvimento sustentável.
Esse histórico será descrito através de fontes primárias, tais como documentos oficiais das
conferências ambientais e fontes secundárias como livros que abordam o tema.
O segundo capítulo da dissertação se dedica à formulação dos conceitos de
desenvolvimento, sustentabilidade e desenvolvimento sustentável e à formulação dos indicadores
de desenvolvimento sustentável que serão utilizados para a constituição de cenários que
16

consigam avaliar o desenvolvimento sustentável brasileiro. Para essa etapa foram utilizadas
fontes secundárias na obtenção das definições de conceitos, com o auxílio da opinião de
especialistas no assunto, além de analisada a metodologia dos indicadores de desenvolvimento
sustentável.
O terceiro capítulo da dissertação se baseia na exposição dos diferentes tipos de
indicadores criados pela comunidade internacional com o intuito de mensurar o desenvolvimento
sustentável. Neste capítulo é feita uma análise sobre as vantagens e desvantagens de cada um dos
indicadores. Além disso, são testados três diferentes indicadores para o caso brasileiro. Esse
capítulo se aprofunda no estudo das características de cada indicador, além da aplicação dos
mesmos no caso concreto do Brasil.
O capítulo também faz uma revisão bibliográfica a fim de descrever o desenvolvimento
sustentável brasileiro, através de fontes secundárias. O país foi escolhido para exemplificar o grau
de sustentabilidade fornecido pelos indicadores, pois o mesmo é visto como uma nação em
desenvolvimento com grande influência nos fóruns multilaterais sobre o tema ambiental e
também com grande potencial poluidor.
O Brasil é considerado um país emergente em termos econômicos, e que possui uma
elevada produção industrial voltada para o mercado interno e uma grande exportação de
commodities5 (tanto minerais quanto agrícolas). O país ainda apresenta o agravante da descoberta
do pré-sal, uma grande quantidade de petróleo (uma commodity altamente poluente) que pode
prejudicar o processo de desenvolvimento sustentável do país.
A partir da análise dos dados fornecidos pelos indicadores para a situação do
desenvolvimento sustentável no Brasil tem-se elaborada a questão central que esta dissertação
procurará responder: a efetividade no uso dos indicadores de desenvolvimento sustentável para o
direcionamento das políticas referentes à este tema nas nações. A dissertação procura refletir
sobre tais indicadores e o quanto eles são influenciados por conceitos e valores externos que não
podem ser expurgados do cálculo nem do desenvolvimento nem da sustentabilidade.

5
Commodity é um termo de língua inglesa que, como o seu plural commodities, significa mercadoria, e é utilizado nas transações
comerciais de produtos de origem primária nas bolsas de mercadorias. Usada como referência aos produtos de base em estado
bruto (matérias-primas) ou com pequeno grau de industrialização, de qualidade quase uniforme, produzidos em grandes
quantidades e por diferentes produtores. Estes produtos "in natura", cultivados (soft commodity) ou de extração mineral (hard
commodity), podem ser estocados por determinado período sem perda significativa de qualidade. Definição disponível em:
<http://www.investorwords.com/975/commodity.html> Acesso em: 01/06/2011.
17

A valoração do desenvolvimento sustentável é de vital importância para o posicionamento


das nações frente ao tema ambiental no mundo. Como diferentes conceitos são aceitos para o
tema, a possibilidade de um grande acordo multilateral fica prejudicada. A maneira encontrada
por alguns países foi redirecionar suas economias unilateralmente à sustentabilidade. O que isso
irá provocar nas Relações Internacionais só o tempo poderá dizer. O que é certo é que a frágil
relação entre os países será afetada por esse fato. O Brasil desponta como um expoente do
desenvolvimento sustentável, pelo menos na intenção, e é através do uso de ferramentas como os
indicadores de desenvolvimento sustentável que podemos mensurar o quanto do discurso se
converte em prática.
18

1. A EVOLUÇÃO DO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: DE ESTOCOLMO


AOS DIAS ATUAIS

1.1 Panorama Histórico das Negociações Ambientais

A questão do desenvolvimento tem sido tema recorrente nas Relações Internacionais


desde a década de 1950. Fruto da independência das colônias asiáticas e africanas e da renovação
do pensamento econômico latino-americano ocorrido no fim da Segunda Guerra Mundial, o
desenvolvimento era sinônimo de crescimento econômico, que se refletia em acúmulo de riqueza,
não importando o seu efeito distributivo. Com o advento da Conferência de Bandung6, o Terceiro
Mundo se impôs como ator internacional coletivo, instaurando o eixo Norte/Sul7 de negociações
na arena internacional – em contraposição ao eixo Leste/Oeste imposto pela Guerra Fria –, cujo
objetivo principal era a luta pelo desenvolvimento dessas nações.
Outro fator que alterou o pensamento sobre o desenvolvimento foi a criação da Comissão
Econômica da América Latina e o Caribe (CEPAL) que “teve como objetivo primeiro o exame da
economia da América Latina para explicar as razões de seu atraso diante das economias
industrializadas e para recomendar as medidas necessárias para a superação dessa desigualdade.”
(SILVA; GONÇALVES, 2010, p.16). A partir deste momento, o conceito de desenvolvimento se
expande a fim de atingir a distribuição da riqueza produzida no mundo, dando sustentação teórica
à reinvindicação dos países da periferia do sistema econômico internacional aos mesmos direitos
das potências dominantes.

6
Para saber mais sobre a Conferência de Bandung ler SILVA, Guilherme A. e GONÇALVES, Williams. 2010. “Dicionário de
Relações Internacionais” Editora Manole. p. 27-29
7
Outra forma de classificar os países através da questão econômica, ou da desigualdade social existente. Considerando os
aspectos socioeconômicos, divide-se o mundo em países desenvolvidos, ou Norte, e subdesenvolvidos, ou Sul. Essa não é uma
divisão geográfica, mas podemos dizer que na América a linha divisória é a fronteira Estados Unidos - México; a Europa é
separada pelo Mediterrâneo; na Ásia, o Japão é o mais desenvolvido, tendo como os tigres Asiáticos como economias emergentes;
Oceania a Austrália e a Nova Zelândia se enquadram no clube dos ricos. Fonte:
http://www.juliobattisti.com.br/tutoriais/arlindojunior/geografia007.asp
19

A luta em favor do desenvolvimento foi a bandeira dos países periféricos8 na década de


1960 e 1970, quando os mesmos buscaram formar um bloco coeso em torno dessa bandeira nos
fóruns internacionais. Os moldes em que tentavam promover o desenvolvimento na periferia
eram os mesmos utilizados pelas grandes potências para atingir seu patamar de riqueza décadas
antes. O objetivo da periferia era desenvolver seus países por meio de um modelo que ficou
conhecido como “substituição de importações”. Segundo este modelo, era necessário proteger a
indústria nascente e obter a escala necessária para que se barateassem os custos e se firmassem
indústrias em países onde a economia era basicamente agrário-exportadora.
Somente na década de 1970 é que o desenvolvimentismo dos países periféricos sofrerá um
enfrentamento maior por parte dos países centrais. A ideia de preservação ambiental iria entrar na
arena internacional como contraponto ao desenvolvimento. A noção surgida nas economias
desenvolvidas era a de que se os países em desenvolvimento atingissem o mesmo patamar de
riqueza deles, não haveria recursos naturais suficientes para manter o consumo mundial e o
planeta consequentemente entraria em colapso. Como afirmado no trabalho “Integração entre o
meio ambiente e o desenvolvimento: 1972–2002” de autoria do PNUMA9,

No final da década de 1960, as questões ambientais eram uma preocupação quase que
exclusivamente do mundo ocidental. Em países comunistas, a destruição implacável do meio
ambiente em nome da industrialização continuava de forma incessante. Em países em
desenvolvimento, a preocupação com o meio ambiente era vista como um luxo do Ocidente.”
(2003, p. 2).

A oposição entre desenvolvimento e subdesenvolvimento iria tomar corpo dentro da


problemática ambiental no início da década de 1970 e inaugurar um polo de discussão no eixo
Norte/Sul de negociações que perdura até os dias atuais. Todo esse debate levou, décadas mais
tarde, ao conceito de desenvolvimento sustentável e a uma nova visão de desenvolvimento dentro
dos limites ambientais. Este capítulo objetiva retratar o caminho percorrido pelos países nas
negociações ambientais até chegar ao patamar de hoje, onde o meio ambiente se tornou variável-
chave para o desenvolvimento de qualquer nação do globo.

8
Conceito central na teoria elaborada por Raul Prebish para analisar o processo de desenvolvimento do capitalismo na América
Latina. Para a teoria cepalina, a caracterização dos países em "atrasados" decorre da relação do capitalismo mundial de
dependência entre países "centrais" e países "periféricos". A periferia mundial (países periféricos) se apresenta como aqueles
espaços onde os fluxos, o desenvolvimento da ciência, da técnica e da informação ocorram em menor escala e as interações em
relação ao centro se dão gradativamente. A dependência expressa subordinação, a ideia de que o desenvolvimento desses países
está submetido (ou limitado) pelo desenvolvimento de outros.
9
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
20

1.1.1 A década de 1970 e a Conferência de Estocolmo

Em contraposição ao projeto desenvolvimentista dos países periféricos surge nos países


centrais, no início dos anos 1970, o temor de que o desenvolvimento colocaria em risco a
sustentabilidade do planeta. Na verdade, a preocupação com as questões ambientais nos países
desenvolvidos surge já na década anterior, em consequência da poluição causada pelo processo
industrial de suas próprias economias.
O modelo capitalista clássico de industrialização desses países foi baseado na produção
em massa, sustentada por fontes de energia fósseis, em sua grande maioria. Tal produção é
extremamente poluente e agressiva ao meio-ambiente, o que gerou, a partir da década de 1970,
uma nova preocupação em torno do desenvolvimento: como obtê-lo de forma sustentável?
Começa a crescer dentro dos países desenvolvidos o questionamento de

um estilo de desenvolvimento internacionalizado, [...] determinado em grande parte pela


adaptação do modelo tecnológico das empresas transnacionais, como uma tendência
homogeneizadora da economia mundial, e que se manifesta principalmente nos processos de
modernização da agricultura, de urbanização, de apropriação da base de recursos naturais e de
utilização de fontes não renováveis de energia. [...] uma realidade ambiental que se caracteriza
pela assimetria – as economias centrais do Norte e as economias periféricas do Sul.
(GUIMARÃES, 1997, p. 204).

A partir deste fato se constrói um conflito demarcado pelo eixo Norte/Sul que irá culminar
na Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente humano, a Conferência de Estocolmo.
Seu contexto histórico se dá em um momento “marcado pelo forte questionamento tanto do
modelo ocidental de desenvolvimento quanto do modelo socialista.” (LAGO, 2007, p. 27). Era o
momento da détente entre os blocos comunista e capitalista, o que possibilitou o surgimento de
novos temas na agenda global. O aparecimento do meio ambiente nessa agenda foi, portanto,
consequência direta do período de arrefecimento da Guerra Fria e da ascensão do Terceiro
Mundo.
Segundo Carlos Milani, “Os anos 70 foram marcados pela aceleração, em diferentes
âmbitos (político, econômico, ecológico, cultural e científico), de um conjunto de fenômenos10
cujos resultados foram [...] um processo lento e descontínuo de transformações das relações entre

10
Entre os quais estão o crescimento demográfico, as migrações, o desperdício de energia, a urbanização acelerada, a pobreza, o
peso da dívida externa nos países em desenvolvimento, as políticas de eco desenvolvimento, o desflorestamento, os efeitos
transfronteiriços da poluição do ar e da água, as chuvas ácidas, o efeito estufa e a perda da biodiversidade.
21

[...] nações e governos a respeito do meio ambiente.” (1998, p. 306). Essa evolução contribuiu
para a internacionalização e a transnacionalização da questão ambiental. O quadro abaixo
explicita os principais eventos ocorridos desde a década de 1960 que contribuíram para esse
processo.
Consideração Dimensão da
Fases Temas principais* Planos de discussão
da problemática problemática
Da criação do termo
"ecologia" (1866) aos Não-científica fauna e flora local e nacional local
anos 50
Os anos que antecederam
águas/rios em regime de
a Conferência de Não-científica internacional regional
partilha e Antartica
Estocolmo
poluição do ar, nuclear,
De 1972 ao término dos Científica e
florestas, matérias-primas e internacional global
anos 70 conflitual
desertificação
Científica e clima mundial, camada de
De 1985 à Conferência
potencialmente ozônio, patrimônio genético, internacional global
do Rio de Janeiro
consensual florestas tropicais
Científica e aqueciemento global,
A partir de 1992 internacional global
política desenvolvimento sustentável
Quadro 1
As Fases Históricas da Internacionalização do Meio Ambiente
* Os temas de um período anterior são igualmente considerados nas etapas subsequentes, mesmo que não correspondam aos problemas centrais
dessa nova etapa
Fonte: M ILANI, Carlos. O meio ambiente e a regulação da Ordem M undial. P. 310

Alguns autores argumentam que o impacto político internacional do tema ambiental se


deu com o surgimento do trabalho The Limits to Growth, publicado pelo Clube de Roma.11 Tal
publicação, segundo o economista Tom Tietenberg, é um importante exemplo de “modelo
pessimista” do desenvolvimento em função dos recursos naturais. (apud. LAGO, 2007, p. 29). De
acordo com o PNUMA,
o modelo do Clube de Roma analisava cinco variáveis: tecnologia, população, nutrição, recursos
naturais e meio ambiente. A principal conclusão do estudo foi a de que, se as tendências da época
continuassem, o sistema global se sobrecarregaria e entraria em colapso até o ano 2000. Para que
isso não ocorresse, tanto o crescimento populacional quanto o crescimento econômico teriam de
parar. (2003, p. 3).

O trabalho pressupunha a passagem do perfil de crescimento econômico para o perfil de


equilíbrio, clamando por alterações drásticas em torno do crescimento demográfico e da

11
Foro de discussão concebido pelo industrial italiano Aurélio Peccei, e patrocinados por grandes empresas como a FIAT e a
Volkswagen, que reuniam cientistas, acadêmicos, economistas, industriais e membros de instituições públicas de países
desenvolvidos. Tal foro de discussão mostrou que a preocupação com o meio ambiente atingia grande parcela da sociedade e,
principalmente, alguns decision makers, conscientes das implicações políticas e econômicas de uma mudança de paradigma.
22

utilização dos recursos naturais. Essas considerações seguiam na direção contrária do processo de
desenvolvimento dos países em desenvolvimento, os quais o Clube considerava como uma
ameaça ao planeta. O argumento central era que os países industrializados poluíam e se outros
países se desenvolvessem, a escala de poluição seria muito maior.
Apesar deste estudo ter sido muito criticado por atender exclusivamente aos interesses dos
países desenvolvidos, um de seus pontos positivos foi tornar pública pela primeira vez a noção de
limites externos; ou seja, a ideia de que o desenvolvimento poderia ser limitado pelo tamanho
finito dos recursos terrestres.
Durante os anos 1970, a escala da problemática ecológica deslocou-se, gradualmente, do
nível regional e nacional em direção ao nível internacional. Essa década ficaria marcada por
várias teses catastrofistas sobre o meio ambiente e pela proliferação de teorias conservacionistas
neomalthusianas, tais como a do Clube de Roma. Além disso, essas teses teriam sido
aproveitadas e manipuladas por alguns países desenvolvidos, que passavam por uma crise12 em
seu modelo de crescimento econômico, para servir de acordo com seus interesses. Com relação a
este tema, Carlos Milani argumenta que:
Estas hipóteses [teses catastróficas] foram retomadas e manipuladas por alguns países
desenvolvidos que detinham poder decisivo na definição da agenda internacional, e que viam no
meio ambiente o bode expiatório da crise do modelo de desenvolvimento fundado exclusivamente
na competitividade e na expansão de mercados. Os países do Sul, nesse contexto, reagiram com
muita firmeza e reticência: a descolonização, o desarmamento e o desenvolvimento encontraram-
se à base da diplomacia multilateral dos países recentemente independentes, aliados aos outros
países em desenvolvimento. (1998, p. 313).

Para os países em desenvolvimento, a agenda ambiental criada naquele momento era no


mínimo precipitada. Aplicável aos países desenvolvidos por seu histórico poluidor, ela estava
sendo transposta ao plano internacional impondo os mesmos critérios de restrições aos países em
desenvolvimento. Estes não poderiam seguir normas tão rígidas quanto ao crescimento
demográfico ou a utilização de seus recursos naturais se quisessem chegar a um patamar de
desenvolvimento elevado. Ou seja, para os países em desenvolvimento, a preocupação com o
meio ambiente era vista como algo para países desenvolvidos.
De acordo com Carlos Milani, “da perspectiva dos países em desenvolvimento, a adoção
pelos países industrializados, do critério ecológico nas políticas de desenvolvimento não seria
compatível com a necessidade de crescimento econômico.” (1998, p 313). Isso logo ficou claro

12
Declínio da “era de ouro keynesiana” (1950-1965), onde os países desenvolvidos conseguiram manter altas taxas de
crescimento no pós-Segunda Guerra. A década de 1970 ficou marcada pelas altas taxas de inflação e desemprego provocados
inicialmente pela crise do petróleo de 1973. Esse fenômeno ficou conhecido como estagflação nos países desenvolvidos.
23

na convocação da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, tornando
inevitável para os países em desenvolvimento estudar estratégias e posições que orientassem a
inserção do tema desenvolvimento econômico-social nas discussões internacionais, de maneira a
favorecer os seus principais interesses. Segundo André Aranha Corrêa do Lago,
A Conferência de Estocolmo constituiu etapa histórica para a evolução do tratamento das questões
ligadas ao meio ambiente no plano internacional e também no plano interno de grande número de
países. O tema, no entanto, ao ganhar crescente legitimidade internacional, passou a ser discutido
cada vez menos do ponto de vista científico, e cada vez mais no contexto político e econômico.
(2007, p. 32).

A posição dos países em desenvolvimento já pôde ser percebida nos preparativos para a
Conferência, com a formação de um comitê preparatório composto por 27 países, incluindo o
Brasil. Desde o início, houve a resistência dos países em desenvolvimento com os rumos em que
se desenhava a Conferência. Para esses países, a eliminação da pobreza deveria ser a prioridade
máxima do homem e o desenvolvimento econômico estava acima das preocupações ambientais.
“‘A pobreza é a pior forma de poluição’, afirmou a primeira-ministra da Índia, Indira Gandhi, que
desempenhou um papel importantíssimo no direcionamento da agenda da Conferência [...] [de]
Estocolmo [...], às questões dos países em desenvolvimento.” (STRONG, 1999, apud PNUMA,
2003, p. 2).
O fator determinante para a obtenção do apoio dos países em desenvolvimento à
Conferência foi a decisão de convocar o Grupo de Peritos sobre Desenvolvimento e Meio
Ambiente, que se reuniu em Founex, na Suíça, em junho de 1971. André Aranha Correia do Lago
afirma que o encontro em “Founex foi determinante para a definição do foco que teria a
Conferência [...] [mudando] o rumo das negociações do meio ambiente de um modo geral,
ampliando de forma significativa a relevância do debate ambiental para os países em
desenvolvimento.” (2007, p.37).
O relatório obtido em Founex articulava as relações essenciais entre meio ambiente e
desenvolvimento, fornecendo a base e o suporte intelectual para políticas com vistas à
Conferência de Estocolmo. Tal relatório é composto de cinco capítulos onde se discutem as
questões ambientais a serem tratadas naquela Conferência.
O Relatório Founex argumenta que os principais problemas ambientais dos países em
desenvolvimento são essencialmente diferentes dos problemas enfrentados pelos países
desenvolvidos e não deveriam ser colocados da mesma forma em Estocolmo. Em grande parte, o
tipo de problema ambiental que era enfrentado nos países em desenvolvimento é aquele que pode
24

ser superado pelo próprio processo de desenvolvimento. Para o relatório, o reconhecimento das
questões ambientais em países em desenvolvimento é um aspecto da ampliação do próprio
conceito de desenvolvimento. E a escolha entre o tipo de crescimento econômico só poderia ser
efetuada pelo próprio país, levando-se em conta sua estratégia desenvolvimentista, não podendo
ser determinada por qualquer regra estabelecida a priori.
O documento final apresentado em Founex refletia a linha de pensamento da CEPAL,
com um cunho muito mais desenvolvimentista. Para os países em desenvolvimento, o
subdesenvolvimento e a pobreza eram o pior tipo de poluição existente e seus problemas
ambientais eram, em sua grande maioria, causados pela perpetuação de ambos (como falta de
saneamento e habitação adequados, por exemplo). O desenvolvimento era apresentado como a
solução para o fim dos problemas ambientais nos países em desenvolvimento, invertendo a
equação dos países ricos onde o desenvolvimento era o causador dos problemas ambientais.
A Conferência de Estocolmo, a partir de então, deixava seu caráter pretensamente
científico e ganhava um perfil muito mais político, com os países em desenvolvimento muito
mais articulados. O Relatório de Founex propunha princípios e ações que se tornaram argumentos
clássicos nas negociações de meio ambiente, como as referências às principais ameaças que
podem surgir para as exportações de países em desenvolvimento, em consequência das
preocupações ambientais dos países desenvolvidos, ou a necessidade de monitorar a criação de
barreiras não tarifárias baseadas em preocupações ambientais. Mas o principal argumento do
relatório ficava por conta da necessidade de
fundos adicionais para subsidiar pesquisas sobre problemas ambientais de países em
desenvolvimento, para compensar grandes deslocamentos de exportações de países em
desenvolvimento, para cobrir importantes aumentos no custo de desenvolvimento de projetos
devido a padrões ambientais mais elevados e para financiar a reestruturação do investimento, da
produção ou do perfil das exportações, que se tornariam necessários pelas preocupações
ambientais dos países desenvolvidos. (LAGO, 2007 p. 39)

Após o relatório de Founex, ficava claro que os países em desenvolvimento conseguiriam


ser ouvidos e sua posição estava consolidada em torno do relatório. Evitou-se, assim, o fracasso
da Conferência de Estocolmo antes mesmo dela começar.
Durante a XXVI Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, foi aprovada a
Resolução 2849 sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, que incorporava os elementos de
interesse dos países em desenvolvimento e, de certo modo, formalizava o Relatório Founex em
um texto oficial que tinha por objetivo orientar os trabalhos da Conferência de Estocolmo. O
texto final da resolução contém muito mais recomendações que se referem aos direitos dos países
25

em desenvolvimento – e às ameaças a seu desenvolvimento que as questões de meio ambiente


poderiam acarretar – do que propriamente indicações sobre a preservação ambiental. Isso explica
a decepção dos países desenvolvidos com o rumo que a Conferência tinha tomado. A Conferência
de Estocolmo começava com relevância reduzida para esses países.
Além de toda a questão do debate “desenvolvimento versus meio ambiente”, a
Conferência de Estocolmo trouxe outra importante novidade: a presença da China como
participante. Era o primeiro grande evento internacional no qual a República Popular da China
participava como membro das Nações Unidas. Em contraponto, os países comunistas como
União Soviética, Hungria, Bulgária, Polônia e Tchecoslováquia, participantes ativos na
preparação da Conferência, se recusaram a participar da mesma, em protesto pela decisão da
Assembleia Geral das Nações Unidas de limitar a participação em Estocolmo aos países membros
da ONU, ou membros de uma ou mais de suas Agências Especializadas.
Os documentos que deveriam ser constituídos pela Conferência (a Declaração sobre o
Meio Ambiente Humano e o Plano de Ação para o Meio Ambiente Humano) já haviam tomado
forma nas reuniões preparatórias. Entretanto, novas discussões e emendas eram previsíveis, uma
vez que, dos 115 países presentes à Conferência, somente 27 haviam participado do Comitê
Preparatório. Segundo André Aranha Corrêa do Lago,
A discussão do Plano de Ação foi dividida em seis temas distribuídos entre três comissões –
Primeira Comissão: planejamento e administração de assentamentos humanos com vistas à
qualidade ambiental (tema 1) e aspectos educacionais de informação, sociais e culturais dos
assuntos do meio ambiente (tema 4); Segunda Comissão: administração de recursos naturais (tema
2) e desenvolvimento e meio ambiente (tema 5); e Terceira Comissão: identificação e controle dos
poluentes de amplo significado internacional (tema 3) e consequências institucionais no plano
internacional (tema 6). (2007, p. 43)

A principal preocupação dos países em desenvolvimento seria com as publicações de


teses ambientalistas ligadas ao Clube de Roma, que poderiam causar o recrudescimento de
algumas questões que haviam sido superadas pelo Relatório Founex, como o conceito de
crescimento zero. Porém, para benefício desses países, a ligação conceitual entre
desenvolvimento e meio ambiente que foi obtida no processo preparatório se tornaria
incontestável em Estocolmo, marcando de forma definitiva o tratamento multilateral do meio
ambiente.
A Conferência de Estocolmo ficou marcada pelo embate do eixo Norte/Sul. Por um lado,
os países em desenvolvimento conseguiram conter a inclusão de diversos conceitos que lhes
pareciam prejudiciais, principalmente nas áreas de crescimento demográfico e de soberania. Por
26

outro lado, os países desenvolvidos saíram vitoriosos, como nas questões de financiamento e
cooperação. A ideia de que o crescimento econômico não deveria seguir os padrões estabelecidos
pelos países desenvolvidos ficou arraigada nesta Conferência. O mundo já não via com bons
olhos o crescimento econômico e o padrão de consumo da época, e ficou estabelecido que os
países em desenvolvimento deveriam sim perseguir o crescimento, mas de uma forma menos
impactante ao meio ambiente.
O tema da discussão das responsabilidades ambientais foi algo que surgiu na Conferência
e perdurou ao longo dos anos. Os países em desenvolvimento concordaram que deveriam seguir
outros rumos de crescimento e padrões de consumo, mas não queriam arcar com as despesas
sozinhos, afinal não foi por responsabilidade deles que o mundo havia chegado naquele patamar
alarmante de poluição. Os países em desenvolvimento clamavam por ajuda financeira e
tecnológica para conseguir alcançar o desenvolvimento sem grandes impactos ambientais e, ao
mesmo tempo, não perder competitividade frente aos países desenvolvidos.
No final da Conferência, foram aprovados a Declaração da Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente Humano, com 26 princípios (descritas no quadro abaixo), e o Plano
de Ação para o Meio Ambiente Humano, com 109 recomendações.

1. Os direitos humanos devem ser defendidos; o apartheid e o colonialismo devem ser condenados
2. Os recursos naturais devem ser preservados
3. A capacidade da Terra de produzir recursos renováveis deve ser mantida
4. A fauna e a flora silvestres devem ser preservadas
5. Os recursos não-renováveis devem ser compartilhados, não esgotados
6. A poluição não deve exceder a capacidade do meio ambiente de neutralizá-la
7. A poluição danosa aos oceanos deve ser evitada
8. O desenvolvimento é necessário à melhoria do meio ambiente
9. Os países em desenvolvimento requerem ajuda
10. Os países em desenvolvimento necessitam de preços justos para as suas exportações, para que realizem a
gestão do meio ambiente
11. As políticas ambientais não devem comprometer o desenvolvimento
12. Os países em desenvolvimento necessitam de recursos para desenvolver medidas de proteção ambiental
13. É necessário estabelecer um planejamento integrado para o desenvolvimento
14. Um planejamento racional deve resolver conflitos entre meio ambiente e desenvolvimento
15. Assentamentos humanos devem ser planejados de forma a eliminar problemas ambientais
16. Os governos devem planejar suas próprias políticas populacionais de maneira adequada
17. As instituições nacionais devem planejar o desenvolvimento dos recursos naturais dos Estados
18. A ciência e a tecnologia devem ser usadas para melhorar o meio ambiente
19. A educação ambiental é essencial
20. Deve-se promover pesquisas ambientais, principalmente em países em desenvolvimento
21. Os Estados podem explorar seus recursos como quiserem, desde que não causem danos a outros
22. Os Estados que sofrerem danos dessa forma devem ser indenizados
23. Cada país deve estabelecer suas próprias normas
24. Deve haver cooperação em questões internacionais
25. Organizações internacionais devem ajudar a melhorar o meio ambiente
26. Armas de destruição em massa devem ser eliminadas

Quadro 2
Princípios da Declaração de Estocolmo
Fonte: PNUMA, Integração entre o meio ambiente e o desenvolvimento: 1972–2002.
27

Independentemente das disputas entre os Estados participantes, a Conferência saiu com


algumas vitórias importantes, como a entrada definitiva do tema ambiental na agenda multilateral
e a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Este é um órgão
dentro das Nações Unidas cujas atribuições são agir e coordenar programas ambientais. Em suas
responsabilidades estão:
coordenar programas ambientais dentro do sistema da Organização das Nações Unidas; prestar
assessoria na formulação e implementação de programas ambientais; garantir a cooperação da
comunidade científica, assim como de outras comunidades profissionais de todas as regiões do
mundo; prestar assessoria sobre cooperação internacional na área de meio ambiente; e apresentar
propostas relativas ao planejamento a médio e longo prazos para programas das Nações Unidas na
área de meio ambiente. (PNUMA, 2003, p. 4).

Além disso, as Nações Unidas, para muitos observadores, teriam saído fortalecidas de
Estocolmo,
não só porque o sucesso do modelo de Conferência acabou gerando uma série de outras
importantes Conferências nos anos seguintes, mas também porque, de certa maneira, o meio
ambiente dava uma nova raison d’être a uma organização acusada de não acompanhar as rápidas
mudanças do mundo moderno. (LAGO, 2007 p. 48).

A Declaração da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano e seus
princípios constituíram o primeiro conjunto de “soft law” (leis internacionais sem aplicação
prática) para questões ambientais internacionais. Somadas ao Plano de Ação para o Meio
Ambiente Humano, essas ações criaram as bases para todas as negociações sobre o meio
ambiente.
Apesar do sucesso da primeira Conferência da ONU sobre o meio ambiente, ela também
não deixou de sofrer críticas, principalmente por parte de algumas delegações que se sentiram
derrotadas no debate. Os países desenvolvidos acabaram sendo os mais críticos, justamente
porque não esperavam os rumos que a Conferência tomou, devido ao forte apelo ao
desenvolvimento dos países periféricos.
Essa situação só foi possível pela divisão existente dentro do grupo dos países
desenvolvidos, cujas prioridades não eram coincidentes em vários pontos da agenda. As
desavenças entre os países desenvolvidos iriam se acentuar ao longo dos anos. Em Estocolmo, a
maioria deles não demonstrou grande interesse no desenvolvimento da agenda ambientalista, com
28

exceção dos países nórdicos, onde se encontrava a Suécia, a anfitriã do evento. Estes queriam o
cumprimento da agenda ambiental crua, sem levar em conta a necessidade de desenvolvimento
de outros países.
A Conferência de Estocolmo também trouxe à tona mais diferenças do que soluções entre
as posições dos países em desenvolvimento e desenvolvidos. As questões financeiras e as bases
para estabelecer a divisão de responsabilidades e de custos entre os países foi o grande ponto de
interrogação de Estocolmo, e continua a ser até hoje. Na Conferência, ficou estabelecido o
repasse de 0,7% do PNB13 dos países desenvolvidos para o desenvolvimento, dentro dos padrões
ambientais de países em desenvolvimento, com um horizonte indefinido para o seu cumprimento.
Até hoje esse é um ponto de discussão não resolvido, uma vez que a maioria dos países
desenvolvidos não fez qualquer tipo de repasse estabelecido.
No contexto das profundas mudanças por que passaram as Relações Internacionais ao
longo do tempo, o meio ambiente foi adquirindo potencial importante de transformação das cenas
políticas e econômicas mundiais. Ainda na década de 1970, foi realizado um simpósio sob a
jurisdição do PNUMA e da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento
(UNCTAD) em Cocoyoc, no México. Tal simpósio verificou os fatores sociais e econômicos que
levam à deterioração ambiental. O relatório obtido no México (também conhecido como a
Declaração de Cocoyoc) influiu diretamente no pensamento ambiental, e suas palavras reafirmam
o caráter desenvolvimentista da década: “Os impactos destrutivos combinados de uma maioria
carente lutando para sobreviver e uma minoria rica consumindo a maior parte dos recursos
terrestres têm comprometido os próprios meios que permitem a todas as pessoas sobreviver e
prosperar.” (UNEP/UNCTAD, 1974, apud. PNUMA, 2003).
A conclusão do simpósio sobre a condição ambiental era de que o problema não era de
escassez material absoluta, mas sim de má distribuição e mau uso dos recursos, tanto do ponto de
vista econômico quanto social. A tarefa dos estadistas era a de orientar seus países em direção a
um novo sistema mais capaz de satisfazer os limites internos das necessidades humanas básicas
para todas as pessoas do mundo, e fazê-lo sem violar os limites externos dos recursos e do meio
ambiente do planeta. Estava sendo moldada, dessa forma, a primeira formulação de
desenvolvimento sustentável.
Os seres humanos têm necessidades básicas: alimentação, abrigo, vestimentas, saúde, educação.
Qualquer processo de crescimento que não leve à sua realização – ou pior, que a impeça – é uma

13
Produto Nacional Bruto
29

paródia da ideia de desenvolvimento. Precisamos todos redefinir nossos objetivos, ou novas


estratégias de desenvolvimento, ou novos modos de vida, incluindo um padrão mais modesto de
consumo entre os ricos. (PNUMA, 2003, p. 7).

Em 1979, foi realizada a primeira Conferência Mundial sobre o Clima, em Genebra,


mostrando que a preocupação climática também iria tomar conta da agenda ambiental na década
seguinte. O Programa Mundial do Clima (WCP) foi estabelecido no ano seguinte,
proporcionando uma estrutura para cooperação internacional em pesquisas e fornecendo a base
para a identificação de questões climáticas importantes ocorridas nas décadas de 1980 e 1990,
como a destruição da camada de ozônio e o aquecimento global.
Entretanto, a década que viria a seguir não seria das melhores para as questões
ambientais. De Estocolmo até a próxima Conferência das Nações Unidas sobre o meio ambiente,
ocorrida em 1992, se passariam vinte anos, dentre os quais estariam a década de 1980, uma
década confusa com altos e baixos para o problema do meio ambiente.

1.1.2 A década de 1980 e os altos e baixos da questão ambiental no sistema internacional

A década de 1980 inicia-se em meio a uma crise sistêmica da economia mundial, em


consequência das duas crises do petróleo da década anterior que provocaram a chamada
estagflação nos países desenvolvidos e a crise da dívida externa nos países em desenvolvimento.
Além disso, o conflito Leste/Oeste voltava a ganhar força após a invasão soviética do
Afeganistão e a intervenção norte-americana em Granada (1983), acompanhada da ascensão do
presidente Ronald Reagan, nos Estados Unidos. Esses acontecimentos provocaram o
enfraquecimento das ações multilaterais propagadas pela década anterior, inclusive o
enfraquecimento da questão ambiental nos fóruns de discussões internacionais.
A Conferência de Estocolmo parecia um evento distante diante das mudanças do cenário
internacional e suas resoluções pareciam cada vez mais fluidas frente aos temas denominados
centrais nas Relações Internacionais. Para Lilian C. B. Duarte, “as grandes expectativas de
Estocolmo pareciam ir se desvanecendo diante de uma realidade que se apresentava cada vez
mais assustadora: os dois choques do petróleo, o desemprego maciço, a reestruturação das
corporações, em suma, a recessão global.” (2003, p. 26).
30

A euforia causada pela Conferência de Estocolmo parecia finalmente ter se esgotado. O


início da década de 1980 foi marcado pelo recuo da questão ecológica em relação à década de
1970, sobretudo em termos de normas ambientais. A maior parte dos acordos dessa época ficou
concentrada em itens como a poluição do mar (correspondendo a quase metade dos tratados
ambientais entre 1950 e 1990). O desinteresse dos países pelas políticas ambientais já era visível,
e na segunda metade da década a cooperação internacional em prol do meio ambiente não era
considerada prioritária.
Os anos de 1980 pareciam perdidos para a causa ambiental. No entanto, os mesmos
motivos que levaram a comunidade internacional a essa queda de interesse foram responsáveis
por algumas ações que contribuíram para a preservação do meio ambiente. O maior exemplo a
ser dado é o da recessão global que assolava o mundo naquele período. Um dos resultados desta
recessão foi a intensificação das buscas por formas alternativas de energia. Por exemplo, temos
os programas de energia nuclear que foram intensificados na Europa. Outro exemplo foi o
Proálcool, programa brasileiro para substituir o petróleo pelo álcool da cana-de-açúcar como
combustível (apesar da discussão existente sobre os reais benefícios destas medidas ao meio
ambiente).
Tais programas não foram lançados como forma de atenuar os efeitos nocivos do petróleo
ao meio ambiente, mas sim atenuar os efeitos nocivos da alta do preço do petróleo na economia
dos países. A mudança de comportamento nos países obedecia mais às “dores do bolso” do que
propriamente à consciência ecológica.
Apesar dessa falta de apoio à causa ambiental, os anos 1980 também foram marcados por
vários desastres ambientais além das novas descobertas científicas do perigo que a poluição causa
para a vida no planeta. Já nos primeiros anos da década comprovou-se que a camada de ozônio
estava se tornando mais fina e havia rompido em algumas partes, formando extensas áreas
desprotegidas da radiação solar. Este fato era alarmante para os países desenvolvidos, já que eles
são mais vulneráveis às doenças provocadas por tal radiação. Nesta época, também começaram a
ser divulgadas ao público as pesquisas sobre o “efeito estufa” e suas consequentes alterações nos
padrões climáticos do planeta, que poderiam gerar uma infinidade de desastres como: enchentes,
secas, furacões, derretimento de geleiras e modificação de terras agriculturáveis.
Carlos Milani argumenta que os vários eventos ocorridos no fim da década de 1980
contribuíram para uma retomada da consciência ecológica por parte da sociedade e culminaram
31

num “verdadeiro boom de iniciativas ambientais, particularmente por conta de catástrofes


provocadas pela atividade humana e por mudanças climáticas”. (1998, p.315). Ainda neste
período houve a confirmação de vários fenômenos ecológicos globais, mas a explosão de
Chernobyl (1986) e o assassinato de Chico Mendes (1988) foram os fatos mais marcantes que
impulsionaram o movimento ambientalista novamente.
A década de 1980 ainda viu se formar, já no seu fim, um consenso internacional em torno
da sobreposição “de ecossistemas globais e suas partes e processos integrantes, bem como da
ameaça fundamental que o não funcionamento desse sistema poderia causar à economia mundial
baseada, exclusivamente, na liberalização [comercial].” (MILANI, 1998, p. 316). Nesse sentido,
aumentaram-se o número de conferências que discutiam as questões dos bens comuns14 como a
atmosfera. Enquanto entre 1972 e 1979 haviam sido organizadas apenas duas conferências sobre
a questão atmosférica, entre 1985 e 1990 foram 17 sobre o mesmo tema.
A abertura da “cortina de ferro” do bloco Soviético a partir da ascensão do presidente
Mikhail Gorbachev ao poder e de sua política de reformulação do partido comunista – seu projeto
se resumia nas expressões glasnost ("transparência") e perestroika ("reestruturação") apresentado
no 27.º Congresso do Partido Comunista Soviético em Fevereiro de 1986 – facilitou a inserção de
novos temas na agenda internacional. A questão ecológica foi usada como ponto de convergência
entre os países do Leste e do Oeste. Além disso, havia o interesse russo em querer apagar a
imagem provocada pelo acidente de Chernobyl.
Com o enfraquecimento das tensões entre os EUA e a União Soviética, o tema ambiental
voltou à agenda. O meio ambiente foi tema de discussão das reuniões de cúpula entre o
presidente americano Reagan e Gorbachev (1987 e 1988) e adicionalmente foi assinado um
acordo na área de pesquisa científica sobre mudanças climáticas e proteção da camada de ozônio
entre os dois países.
A movimentação dos dois países em torno da questão ambiental não ficou só no eixo
Leste/Oeste de negociação, atingindo também os interesses dos outros países do Norte,
provocando o renascimento do eixo Norte/Sul tanto nas questões exclusivamente ambientais,

14
Bem comum é uma falha de mercado, pela qual são chamados os bens não-exclusivos e rivais, ou seja, não é possível excluir
um consumidor pela capacidade de pagar pelo consumo de um bem ou serviço, mas o consumo de um bem por uma pessoa
impede o consumo do mesmo bem por outra pessoa. Os exemplos mais claros e frequentes de bens comuns são os recursos
ambientais, onde não se pode excluir os consumidores, por não haver direito de propriedade sobre os bens, mas o consumo de um
causa externalidades para outros, como a poluição ambiental e a extinção de espécies animais, pela caça por exemplo.
32

como também naquelas que atingiam a esfera econômica do problema. Em 1988, o G-715 incluiu
pela primeira vez o tema ambiental como item importante na sua declaração final, mostrando a
crescente importância do tema no cenário econômico mundial. A relação de trocas nas
economias, principalmente a migração das empresas transnacionais para territórios onde havia
uma maior permissividade nos processos de proteção ambiental, estava no cerne da questão para
os países desenvolvidos.
Um passo definitivamente importante para a construção de um consenso ambiental
internacional foi a publicação do Relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, conhecido como Relatório Brundtland16, em 1987. A Comissão Brundtland,
foi criada em 1983 para realizar audiências ao redor do mundo e produzir um relatório formal
com suas conclusões. Este processo possibilitou que diferentes grupos expressassem seus pontos
de vista em questões importantes, como agricultura, silvicultura, água, energia, transferência de
tecnologias e desenvolvimento sustentável em geral.
A partir do Relatório Brundtland, foi oficializada a definição de desenvolvimento
sustentável, que perdura até hoje como base nas discussões das questões ambientais.
Desenvolvimento sustentável é “o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem
comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades.” O
documento criado pela comissão foi intitulado Nosso Futuro Comum e aponta para a
incompatibilidade entre o desenvolvimento sustentável e os padrões de produção e consumo
vigentes.
As conclusões do Relatório não poupam os países desenvolvidos nem aqueles em
desenvolvimento, mas oferecem alternativas e apontam caminhos viáveis que não excluem o
desenvolvimento dos pobres e o questionamento dos padrões dos países mais ricos. Se há um
documento que se pode comparar ao Relatório Brundtland, este seria o Relatório de Founex:
ambos enfocam o meio ambiente no contexto do desenvolvimento e estabelecem a base conceitual
das Conferências de Estocolmo e do Rio de Janeiro. (LAGO, 2007, p. 65).

O relatório aponta uma visão crítica do modelo de desenvolvimento adotado pelos países
industrializados e reproduzido pelas nações em desenvolvimento, e ressalta os riscos do uso
excessivo dos recursos naturais sem considerar a capacidade de suporte dos ecossistemas. De
acordo com o relatório extraído do PNUMA,

15
O Grupo dos Sete e a Rússia, mais conhecido como G8, é um grupo internacional que reúne os sete países mais industrializados
(Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá) e desenvolvidos economicamente do mundo, mais a
Rússia.
16
Homenagem à primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland, que chefiou a Comissão Mundial sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento.
33

A Comissão [Brundtland] enfatizou problemas ambientais como o aquecimento global e a


destruição da camada de ozônio, conceitos novos para a época, e expressou preocupação em
relação ao fato da velocidade das mudanças estar excedendo a capacidade das disciplinas
científicas e de nossas habilidades atuais de avaliar e aconselhar. A Comissão concluiu que os
arranjos institucionais e as estruturas de tomada de decisões existentes, tanto em âmbito nacional
quanto no internacional, simplesmente não comportavam as demandas do desenvolvimento
sustentável. (WCED, 1987, apud, PNUMA, 2003).

O Relatório Brundtland apontava várias medidas que deveriam ser adotadas para a
conservação e utilização dos recursos naturais de forma sustentável. No plano internacional,
foram propostas metas como a adoção da estratégia de desenvolvimento sustentável por órgãos e
instituições internacionais de financiamento ao desenvolvimento; proteção dos ecossistemas
supranacionais como a Antárctica e os oceanos; banimento das guerras; e implantação de um
programa de desenvolvimento sustentável pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Além da Comissão e do Relatório Brundtland, na década de 1980 foram assinados outros
acordos de extrema importância para o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável. Dentre
eles estão: a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), de 1982; o
Protocolo de Montreal sobre Substâncias que Destroem a Camada de Ozônio, de 1987
(implementando a Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio, de 1985); e a
Convenção da Basiléia para o Controle de Movimentos Transfronteiriços de Resíduos Perigosos
e sua Eliminação, de 1989.
O protocolo de Montreal é um dos exemplos mais bem-sucedidos de cooperação
internacional sobre o meio ambiente. A conclusão do Protocolo foi considerada como um modelo
promissor de cooperação entre os hemisférios Norte e Sul, os governos e o setor empresarial no
tratamento de questões ambientais globais. Muito desse mérito está na utilização de um Fundo
Multilateral criado como um incentivo à participação de países em desenvolvimento. Porém, lidar
com o problema da camada de ozônio, e com um fundo específico para isso, se mostrou muito
mais satisfatório que lidar com outros problemas ambientais que se apresentariam na década de
1980.
O final da década de 1980 representou o declínio do sistema mundial conhecido desde a
Segunda Guerra Mundial e o início de uma incerteza quanto à “configuração de mundo” que iria
se impor dali por diante. Duas opções eram válidas naquele momento. A primeira seria um
domínio total de uma única potência no sistema internacional, onde os Estados Unidos eram o
candidato natural (e único) para assumir o papel, criando um mundo unipolar. A segunda seria de
34

uma convergência de todas as nações à lógica capitalista e à adoção do sistema liberal/democrata


por parte da maioria dos países.
O otimismo com o fim da Guerra Fria e com a maior possibilidade do fortalecimento das
Nações Unidas foi o que impulsionou, no início da década de 1990, as discussões de vários
acordos multilaterais. A crença num mundo “mais multilateral” estava imperando naquele
momento, possibilitando também a ascensão do tema ambiental novamente na agenda, mas agora
configurado nas bases do desenvolvimento sustentável. Na década de 1990 surgiram várias
negociações e acordos sobre o meio ambiente, incluindo uma grande Conferência sobre o tema.
Em 1989 seria convocada a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (CNUMAD) para junho de 1992. “Pela Resolução 44/228, aprovada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas, em 22 de dezembro de 1989, foi aceito o oferecimento do
Governo brasileiro para sediar a Conferência.” (LAGO, 2007, p. 66). A partir de então a
Conferência ficaria conhecida como RIO-92 e seria o maior evento organizado pelas Nações
Unidas até aquele momento, reunindo delegações de 172 países e 108 Chefes de Estado ou de
Governo.
Nas palavras das próprias Nações Unidas, A CNUMAD foi convocada “para elaborar
estratégias e medidas para parar e reverter os efeitos da degradação ambiental, no contexto dos
crescentes esforços nacionais e internacionais para a promoção do desenvolvimento sustentável e
ambientalmente adequado em todos os países.”17
Pela participação dos países na Conferência, fica evidente a retomada da importância do
meio ambiente na agenda internacional, vinte anos após a Conferência de Estocolmo. Outro
ponto importante a ser ressaltado é a realização do encontro num país em desenvolvimento, numa
clara indicação de que a questão ambiental não era mais só exclusividade dos países ricos, mas
“uma questão que exigia um engajamento coletivo da comunidade internacional.” (LAGO, 2007,
p. 53).
Contudo os objetivos dos países em desenvolvimento continuavam sendo muito diferentes
daqueles almejados pelos países desenvolvidos, não obstante a mudança radical no cenário
internacional, que seria causada pelo fim da Guerra Fria e o novo papel que as Nações Unidas
pareciam assumir no centro do sistema internacional.
17
“To elaborate strategies and measures to halt and reverse the effects of environmental degradation in the context of increased
national and international efforts to promote sustainable and environmentally sound development in all countries.” UNITED
NATIONS, doc. A/RES/44/228, “United Nations Conference on Environment and Development.”
35

1.1.3 A década de 1990, a RIO-92 e os grandes acordos ambientais

A abertura dos anos 1990 era vista como um cenário de multilateralidade, onde o
liberalismo, tanto político quanto econômico ganhava contornos de “melhor política” a ser
seguida pelos países que buscavam o desenvolvimento. Nesse contexto, ganhava corpo também a
ideia de que se as fronteiras se tornassem mais fluidas e as economias mais interligadas, o mundo
seria globalizado. O esforço para obter resultados nas negociações multilaterais de rodadas
internacionais, como a Rodada Uruguai do GATT18, evidencia a tentativa de cooperação numa
nova configuração de mundo que se avizinhava.
Assim também aconteceu com a questão ambiental, em que a década de 1990
“caracterizou-se pela busca por uma melhor compreensão sobre o conceito e o significado do
desenvolvimento sustentável, paralelamente às tendências crescentes em direção à globalização,
especialmente no que diz respeito ao comércio e à tecnologia.” (PNUMA, 2003, p. 14). A
configuração das mudanças mundiais permitiu que a Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento fosse um encontro onde os interesses multilaterais prevalecessem
sobre os individuais, apesar da persistente divergência entre o eixo Norte/Sul de negociação.
Desde o começo, a RIO-92 foi considerada o momento final de diversos processos de
negociações sobre aquecimento global, diversidade biológica e desflorestamento. O Relatório
Brundtland teve influência direta sobre a definição dos rumos da Conferência, fazendo com que o
meio ambiente na CNUMAD fosse interpretado em sentido mais amplo da perspectiva do
desenvolvimento sustentável. “A noção de que o desenvolvimento sustentável se baseia em três
pilares – o econômico, o social e o ambiental – favorece, nas discussões do Rio de Janeiro, tanto
as prioridades dos países desenvolvidos, quanto aquelas dos países em desenvolvimento.”
(LAGO, 2007, p. 56).
Uma série de negociações foi iniciada no âmbito da CNUMAD visando ultimar acordos
internacionais que seriam assinados durante a Conferência. No fim da década de 1980, já havia se
iniciado a discussão das duas Convenções que foram abertas para assinatura na Conferência do
Rio: a Convenção-Quadro sobre Mudança do Clima e a Convenção sobre Diversidade Biológica.

18
General Agreement on Tariffs and Trade (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio)
36

Entretanto, essas duas convenções, foram negociadas fora do quadro institucional do Preparatory
Committee (PrepCom), o comitê preparatório da Convenção.
O amálgama de diferentes fóruns de negociação dentro da CNUMAD foi resultado do
interesse do grupo dos países em desenvolvimento, liderados pelo Brasil, que preferiam ver essas
negociações apoiadas mais em questões políticas e econômicas do que sob um aspecto puramente
técnico e científico. Como o PNUMA tinha um aspecto mais cientifico, para as discussões sobre
mudanças climáticas foi criado um novo fórum de negociação no nível da Assembleia Geral das
Nações Unidas (AGNU), o que tornaria as discussões mais políticas. Essa atitude dos países em
desenvolvimento acabou se refletindo dentro da Conferência, que acolheu resoluções de vários
fóruns de decisão, englobando todos no mesmo grau de importância, sejam aqueles propostos
pelo próprio PrepCom, pelo PNUMA ou pela AGNU. Abaixo está relacionado um quadro que
explicita tais negociações.

Convenção sobre a biodiversidade


negociações sob PNUMA em cinco
sessões de junho de 1991

Conferência da ONU sobre Meio


Ambiente e Desenvolvimento: os
principais textos negociados durante
as diferentes sessões do PrepCom Convenção sobre mudanças
entre 1990 e 1992 climáticas
• Declaração sobre florestas • IPCC – comitê científico
• Declaração do Rio (desde 1988)
• Agenda 21 • Negociações na AGNU em
seis sessões (de fevereiro de
1991 a maio de 1992)

Global Environmental Facility – GEF


Fundo estabelecido sob os auspícios do BM, do PNUMA e do PNUD, visando financiar projetos
ligados às duas convenções e aos temas globais.

Quadro 3
As negociações da CNUMAD
Fonte: MILANI, Carlos. O meio ambiente e a regulação da Ordem Mundial. P. 310
37

As ambições da RIO-92 eram consideráveis. Buscava-se um acordo global em quase todas


as áreas pertinentes ao meio ambiente. Dessa forma, sua preparação exigiu muito do PrepCom, já
que seria necessário conciliar a vontade dos países desenvolvidos, que queriam garantir
resultados positivos em relação ao meio ambiente global, com a dos países em desenvolvimento,
que buscavam salientar sua maior preocupação com políticas de desenvolvimento. Os principais
documentos assinados na RIO-92 sob a responsabilidade do PrepCom foram: a Agenda 21, a
Declaração do Rio e a Declaração de princípios sobre florestas.
Desde a aprovação da Resolução 44/228 da AGNU, o desenvolvimento sustentável
passou a ser o principal eixo das negociações ambientais, o que se tornou uma vantagem para os
países em desenvolvimento e propiciou a retomada das negociações globais entre Norte e Sul. O
processo de negociação de acordos e declarações que foram levados à RIO-92 revelou
divergências típicas desse diálogo. Porém, diferentemente da clássica dicotomia entre meio
ambiente e desenvolvimento, o que estava no âmago da discussão era a divergência entre a
possibilidade de regulação internacional e de delegação de soberania na solução de problemas
globais (global commons), a imposição de condicionalidades no financiamento de projetos de
desenvolvimento, e a utilização prática do princípio poluidor-pagador19 e do princípio de
precaução20. Os países em desenvolvimento desejavam a divisão das responsabilidades
ambientais (sobretudo em termos financeiros) e a transferência de tecnologia em bases
preferenciais.
Diante de tantas demandas, fica clara a percepção de que, apesar do envolvimento de
ONGs e da sociedade civil como um todo, além da pressão da mídia, o debate dentro da cúpula
da RIO-92 ficou concentrado na discussão clássica de financiamento e soberania. Dentro dessa
abordagem mais política, a delegação brasileira, representando os interesses dos países em
desenvolvimento, apoiou a criação da Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CDS) para
monitorar a Agenda 21, o principal documento assinado na Convenção, o que enfraqueceria o
PNUMA. De acordo com Eduardo Vargas, Diretor do Departamento de Meio Ambiente e Temas
Especiais do Ministério das Relações Exteriores, “tendo em vista que o PNUMA não tem
mandato na área de desenvolvimento, a CDS foi criada como forma de dar maior perfil político e

19
O Princípio do Poluidor Pagador obriga quem poluiu a pagar pela poluição causada ou que pode ser causada.
20
O Princípio da Precaução estabelece a vedação de intervenções no meio ambiente, salvo se houver a certeza que as alterações
não causaram reações adversas, já que nem sempre a ciência pode oferecer à sociedade respostas conclusivas sobre a inocuidade
de determinados procedimentos.
38

de reunir as várias agências e órgãos das Nações Unidas que tratam das matérias relacionadas ao
desenvolvimento sustentável.” (apud. LAGO, 2007, p. 72).
A grande discussão na RIO-92 seria mesmo financeira. Além das demandas da Agenda
21, o grande fator de discórdia entre Norte/Sul ficou mesmo na situação dos financiamentos para
os projetos ambientais que estavam sendo desenvolvidos na Conferência. Diferentemente de
Estocolmo, a RIO-92 trazia implícita a questão do desenvolvimento, mas esse desenvolvimento
deveria se dar em moldes sustentáveis e o custo para se alcançá-lo foi o que pautou a divergência
entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento.
Uma das questões mais polêmicas foi a da Ajuda Oficial ao Desenvolvimento, para a qual
os países em desenvolvimento desejavam obter um compromisso dos países ricos de
contribuírem com o patamar de 0,7% do seu PNB. Como fora abordado na Conferência de
Estocolmo, essa era uma promessa que não tinha sido cumprida até então. A necessidade de
financiamento nunca seria cumprida em sua totalidade, com os poucos países desenvolvidos
doadores diminuindo seu percentual gradualmente durante o passar dos anos.
Milani explicita muito bem o teor das negociações financeiras ao dizer que na RIO-92,
volta à tona o velho diálogo Norte/Sul, com uma roupagem nova, mas sem que o grande
problema dos fundos internacionais adicionais, num contexto de economia mais globalizada,
fosse resolvido. “Os debates sobre o desenvolvimento sustentável permaneceram sob o domínio
de fatores econômicos, demográficos e institucionais.” (1998, p. 321).
Com o fim das negociações da CNUMAD foi mencionada a necessidade de maior
transparência nos mecanismos de financiamento, como o Global Environmental Facility (GEF),
mecanismo de financiamento engendrado pelos países desenvolvidos no âmbito da Agenda 21.
Esses países também alteraram a meta de doação de 0,7% do PNB aos países em
desenvolvimento. O argumento corrobora o compromisso com essa cifra, dividindo os países em
desenvolvimento em dois grupos: os dos países que “aceitam ou já aceitaram atingir a meta [de
desenvolvimento sustentável] no ano 2000”, e países que “concordam em aumentar seus
programas de ajuda de forma a alcançar a meta tão cedo quanto possível” 21.
Ao invés de um fundo verde, que era a ideia central para o financiamento do
desenvolvimento sustentável elaborada nos comitês preparatórios da Conferência, a RIO-92

21
MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Relatório da Delegação do Brasil: Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento. p. 56.
39

obteve vários mecanismos de financiamento na tentativa de alinhar os interesses de cada país.


Conforme declara o embaixador Rubens Ricupero, a Conferência
montou um verdadeiro sistema financeiro, um conjunto de elementos inter-relacionados com o
objetivo comum de custear os programas ambientais […], sistema flexível composto de
mecanismos de financiamento diversificados (IDA22, bancos regionais, o GEF e outros fundos
multilaterais, agências especializadas da ONU, instituições de cooperação técnica, os programas
bilaterais responsáveis por quase dois terços da ajuda, alívio de dívida, fundos privados,
investimentos, financiamento inovador como os tradable permits, etc.). (apud. LAGO, 2007, p.
81)

Apesar dos conflitos, em sua maioria gerados pela questão financeira, a CNUMAD foi um
sucesso em seu objetivo principal de pautar uma agenda comum para o desenvolvimento
sustentável. Em termos de acordos, tivemos a Agenda 21 como principal documento assinado e
também a Declaração do Rio, que institui princípios para a definição de desenvolvimento
sustentável. Além disso, foi na CNUMAD que se estabeleceu a Convenção Quadro sobre
Mudanças Climáticas, que iria ganhar importância ao longo da década e se tornaria o foco da
questão ambiental no início do século XXI.
A Declaração do Rio surge como resultado do trabalho do PrepCom que tinha como
objetivo central obter uma “Carta da Terra” (Earth Charter) dos membros da Conferência. Com
poucas páginas, a Declaração do Rio conseguira resumir muitas das mais importantes questões
que dividiram os interesses e preocupações dos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Tal
documento representava um equilíbrio tão delicado entre as concessões e acordos entre os países
participantes que não sofreu alterações na própria Conferência e acabou formulado contendo os
27 princípios originais.
Desses princípios, alguns favoreciam claramente os países em desenvolvimento, ao
reiterar e fortalecer sua posição em Estocolmo. Tais princípios eram: a afirmação do direito
soberano dos países de explorar os próprios recursos segundo as próprias políticas de meio
ambiente e desenvolvimento (Princípio 2), o direito ao desenvolvimento (Princípio 3) e o fato de
normas ambientais aplicadas por alguns países serem inadequadas para outros (Princípio 11).
Outros “constituem franco progresso no arcabouço conceitual das negociações sobre meio
ambiente e desenvolvimento [como] o princípio das responsabilidades comuns, porém

22
International Development Association.
40

diferenciadas (Princípio723), e a necessidade de reduzir e eliminar os padrões insustentáveis de


produção e consumo (Princípio 8).” (LAGO, 2007, p. 83)
Ainda dentro da Declaração do Rio, os países desenvolvidos também conseguiram impor
algumas vantagens, inserindo alguns pontos de seu interesse como o princípio de que a proteção
ambiental deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento (Princípio 4); o de que
o princípio da precaução deverá ser amplamente observado pelos Estados (Princípio 1524) e ainda
o de que seja efetuada a avaliação do impacto ambiental (Princípio 17). Esses princípios,
aprovados em favor dos países desenvolvidos, influem nas políticas de cooperação ambiental dos
mesmos. Ou seja, funcionam como critério de avaliação financeira para a liberação de fundos que
podem ser utilizados pelos países em desenvolvimento em projetos ambientais.
Na Conferência do Rio também ficou acordada a questão das florestas tropicais. Com a
alegação de que a biodiversidade dentro dessas florestas seria um bem global comum, os países
desenvolvidos queriam que as mesmas fossem consideradas patrimônios da humanidade,
acarretando a perda de soberania nesses territórios, e, como consequência, a perda de
exclusividade em explorar e pesquisar os recursos naturais e a biodiversidade dessas florestas.
Nesse caso, os países em desenvolvimento conseguiram uma grande vitória ao manter a
soberania de seu território onde está localizada a maior parte desse tipo de floresta.
No fim da Conferência, a posição dos países em desenvolvimento prevaleceu e a
declaração aprovada ficou conhecida como “Declaração de Princípios com Autoridade e Não
Juridicamente Obrigatória para um Consenso Mundial sobre o Manejo, Conservação e o
Desenvolvimento Sustentável de Todos os Tipos de Florestas”, onde estava claro o papel de
proteção desses ambientes, mas dando autonomia para os países na preservação e manutenção de
suas florestas.
A questão do desmatamento, principal fato alegado pelos países desenvolvidos para a
perda da soberania dos países em desenvolvimento, foi abordada tanto nessa declaração quanto

23
Os Estados deverão cooperar com o espírito de solidariedade mundial para conservar, proteger e restabelecer a saúde e a
integridade do ecossistema da Terra. Tendo em vista que tenham contribuído notadamente para a degradação do ambiente
mundial, os Estados têm responsabilidades comuns, mas diferenciadas. Os países desenvolvidos reconhecem a responsabilidade
que lhes cabe na busca internacional do desenvolvimento sustentável, em vista das pressões que suas sociedades exercem sobre o
meio ambiente mundial e das tecnologias e dos recursos financeiros de que dispõem. (Declaração do Rio Sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, p. 1).
24
Com a finalidade de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas
capacidades. Quando houver perigo de dano grave ou irreversível, a falta de certeza científica absoluta não deverá ser utilizada
como razão para que seja adiada a adoção de medidas eficazes em função dos custos para impedir a degradação ambiental.
(Declaração do Rio Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, p. 1).
41

na Agenda 21. Os países em desenvolvimento conseguiram manobrar essa alegação e ainda


utilizaram a questão do desmatamento a seu favor dentro da discussão do aquecimento global,
assegurando que fosse dada a verdadeira dimensão da contribuição das queimadas para o
agravamento do mesmo. Isso permitiu que os países em desenvolvimento contornassem a
tendência de atribuir-lhes a maior responsabilidade frente ao efeito estufa, quando na verdade os
maiores poluidores eram os países desenvolvidos, devido aos seus padrões de produção e
consumo.
Com um grande número de questões a serem debatidas, e com um grande número de
acordos assinados, a Convenção do Rio foi sem dúvida bem sucedida. O meio ambiente se
tornava um tema prioritário dentro da agenda internacional vinte anos após a Conferência de
Estocolmo. De acordo com o PNUMA, a Rio-92 produziu ao menos sete grandes resultados:
A Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (contendo 27 princípios); a
Agenda 21 – um plano de ação para o meio ambiente e o desenvolvimento no século XXI; duas
grandes convenções internacionais – a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do
Clima (UNFCCC) e a Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB); a Comissão de
Desenvolvimento Sustentável (CDS); um acordo para negociar uma convenção mundial sobre a
desertificação; e a declaração de Princípios para o Manejo Sustentável de Florestas. (PNUMA,
2003, p. 16)

Ao analisar os acordos da CNUMAD, pode-se dizer que os Princípios do Rio reafirmaram


as questões que haviam sido formuladas em Estocolmo, colocando os seres humanos no centro
das preocupações relacionadas ao desenvolvimento sustentável, ao declarar que estes têm o
direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia com a natureza. A RIO-92 proporcionou
um grande debate em nível mundial tanto em questões relacionadas ao meio ambiente quanto às
relacionadas ao desenvolvimento, enfatizando os diferentes pontos de vista dos hemisférios Norte
e Sul. Após a Conferência, o desenvolvimento sustentável ganhou vida própria, impondo-se nas
deliberações de organismos, desde conselhos municipais às organizações internacionais.
Entretanto, “a perspectiva de que o desenvolvimento sustentável seria a base de um novo
paradigma da cooperação internacional, revelou-se ilusória, uma vez que o processo de
globalização [tanto econômica quanto financeira] se sobrepôs ao da cooperação no âmbito
ambiental.” (LAGO, 2007, p. 86). Não que a globalização seja impedidora do desenvolvimento
sustentável. Ao contrário, para muitos a preocupação com o meio ambiente é consequência da
globalização. Porém, ao interferir no processo de produção e consumo, o desenvolvimento
sustentável acaba gerando uma incompatibilidade com o crescimento das empresas
transnacionais que é proporcionado pela globalização.
42

1.1.3.1 A Agenda 21

A Agenda 21 é o instrumento sem validade legal mais importante e influente no campo do


meio ambiente e serve como base de referência para o manejo ambiental na maior parte do
mundo. Esse documento, elaborado na Conferência do Rio, trata de um plano de ação
parcialmente baseado em uma série de contribuições especializadas de governos e organismos
internacionais. A Agenda 21 estabelece assim uma base sólida para a promoção do
desenvolvimento em termos de progresso social, econômico e ambiental. De acordo com André
Aranha Corrêa do Lago,
trata-se de um programa de ação que atribui novas dimensões à cooperação internacional e
estimula os governos, a sociedade civil e os setores produtivo, acadêmico e científico a planejar e
executar juntos programas destinados a mudar as concepções tradicionais de desenvolvimento
econômico e de proteção do meio ambiente. (2007, p. 76).

O documento tem quarenta capítulos, e suas recomendações estão divididas em quatro


25
áreas ou seções principais, das quais as duas primeiras resumem a abordagem do
desenvolvimento sustentável. A seção 1 expressa as dimensões social e econômica do
desenvolvimento sustentável, reunindo dois de seus três pilares e a seção 2 aborda a gestão de
recursos naturais para o desenvolvimento sustentável, o terceiro pilar.
No âmbito do PrepCom da RIO-92, as negociações da Agenda 21 avançaram
consideravelmente. Mesmo assim, cerca de 15% do documento ficou para ser negociado somente
dentro da Conferência. A ideia da formulação da Agenda era que este documento se tornasse a
base para a atuação dos governos na questão ambiental, em nível internacional.
Para atingir esses objetivos, três elementos eram fundamentais: um mecanismo financeiro
com autonomia e recursos vultosos; um compromisso que permitisse a criação de um sistema
eficaz de transferência de tecnologia; e a reforma e o fortalecimento das instituições para que o

25
Questões sociais e econômicas como a cooperação internacional para acelerar o desenvolvimento sustentável, combater a
pobreza, mudar os padrões de consumo, as dinâmicas demográficas e a sustentabilidade, e proteger e promover a saúde humana.
Conservação e manejo dos recursos visando o desenvolvimento, como a proteção da atmosfera, o combate ao desmatamento, o
combate à desertificação e à seca, a promoção da agricultura sustentável e do desenvolvimento rural, a conservação da diversidade
biológica, a proteção dos recursos de água doce e dos oceanos e o manejo racional de produtos químicos tóxicos e de resíduos
perigosos. Fortalecimento do papel de grandes grupos, incluindo mulheres, crianças e jovens, povos indígenas e suas
comunidades, ONGs, iniciativas de autoridades locais em apoio à Agenda 21, trabalhadores e seus sindicatos, comércio e
indústria, a comunidade científica e tecnológica e agricultores. Meios de implementação do programa, incluindo mecanismos e
recursos financeiros, transferência de tecnologias ambientalmente saudáveis, promoção da educação, conscientização pública e
capacitação, arranjos de instituições internacionais, mecanismos e instrumentos legais internacionais e informações para o
processo de tomada de decisões. (PNUMA, 2003, p. 16).
43

esforço do desenvolvimento sustentável fosse levado adiante de forma efetiva, com


acompanhamento atento desse processo.
A concepção original desses elementos foi alterada durante as negociações para
conformar as expectativas tanto de países desenvolvidos como de países em desenvolvimento. A
subordinação da Agenda 21 à Comissão de Desenvolvimento Sustentável (CDS) foi uma forma
de contemplar as expectativas dos países em desenvolvimento que preteriam o PNUMA,
afirmando que não havia sentido em fortalecer uma agência eminentemente ambiental, quando se
pretendia criar um novo paradigma – o desenvolvimento sustentável, cuja grande força seria a
transversalidade, exigindo a participação de organismos ligados a três pilares: ambiental,
econômico e social.
Na questão financeira, a Agenda 21 era pautada em transferências anuais dos países
desenvolvidos para os países em desenvolvimento. Esse montante foi estimado em 125 bilhões de
dólares por ano, durante sete anos, totalizando 875 bilhões em transferências. Porém, o custo base
de implementação da Agenda nos países em desenvolvimento “foi estimado pelo Secretariado da
Cúpula da Terra como sendo de aproximadamente US$ 625 bilhões ao ano, com os países em
desenvolvimento cobrindo 80% do custo, ou seja, US$ 500 bilhões.” (PNUMA, 2003, p. 18). Isso
mostra uma disparidade entre o financiamento externo e interno da Agenda 21 dentro dos países
em desenvolvimento que arcariam com o custo de implementar programas de desenvolvimento e
de novas tecnologias muitas vezes disponíveis apenas nos países desenvolvidos.
O maior clamor dos países em desenvolvimento, tanto na Agenda 21 quanto na RIO-92,
era justamente a transferência de tecnologia e o apoio financeiro dos países desenvolvidos.
Esperava-se ao menos que os países desenvolvidos cobrissem os 20% restantes do custo de
implementação da Agenda, cumprindo assim com a antiga meta de consagrar 0,7% do seu
Produto Nacional Bruto à Assistência Oficial para o Desenvolvimento (ODA), acordada desde os
tempos da Conferência de Estocolmo.
Tendo em vista a crescente pressão sobre os países desenvolvidos para que se
comprometessem financeiramente com a Agenda, esses procuraram encontrar uma alternativa à
ideia do mecanismo financeiro, que ganharia corpo dentro da RIO-92. A proposta seria a criação
de uma entidade independente que administraria os recursos novos e adicionais pelos quais os
países em desenvolvimento esperavam. Poucos meses antes do início da CNUMAD, foi
anunciada a criação do Global Environmental Facility (GEF), fora do contexto das negociações e
44

sem qualquer articulação com os países em desenvolvimento. Esse passaria a ser o fundo global
reservado às questões ambientais mundiais. De acordo com o PNUMA,
O Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF) foi criado em 1991 como uma parceria
experimental entre o PNUMA, o PNUD e o Banco Mundial para gerar dividendos ecológicos a
partir do desenvolvimento local e regional, fornecendo subvenções e empréstimos a juros baixos
para países em desenvolvimento e economias em transição. Após a Rio-92, intencionava-se que
funcionasse como o mecanismo de financiamento da Agenda 21 e que mobilizasse os recursos
necessários. O Fundo ajuda a financiar projetos de desenvolvimento em âmbito regional, nacional
e global que beneficiem o meio ambiente mundial em quatro áreas básicas – mudanças climáticas,
biodiversidade, camada de ozônio e águas internacionais – e também economias e sociedades
locais. (2003, p. 18)

A criação do GEF antes da CNUMAD permitiu aos países desenvolvidos definir os


problemas ambientais globais da maneira como eles os percebiam, sem contar com a visão dos
países em desenvolvimento. Foi estabelecido um limite e uma amplitude própria para sua
responsabilidade nos problemas ambientais e para a ajuda aos países em desenvolvimento. Essa
foi uma manobra bem sucedida dos países do Norte, que conseguiu deslocar a proposta do Sul de
um fundo global verde dentro da Agenda 21. Como argumentado por André Aranha Corrêa do
Lago, o GEF estava longe de ser o mecanismo financeiro que os países em desenvolvimento
gostariam de ver criado na RIO-92,
não só pelos recursos que seriam necessários para a execução dos programas da Agenda 21, que o
GEF não poderia – nem pretendia – cobrir, mas também pelo fato de o GEF ter sido colocado sob
a égide do Banco Mundial, isto é, sujeito à lógica das instituições de Bretton Woods – nas quais
predomina o voto ponderado, e não ao contexto da Assembleia Geral das Nações Unidas, mais
igualitário, transparente e democrático. (2007, p. 79).

Além disso, o GEF só apoiaria projetos cujos resultados fossem benefícios globais, ou
seja, os países desenvolvidos só financiariam projetos em países em desenvolvimento que
beneficiassem a eles próprios. A diferença entre as promessas feitas pelos doadores e suas
contribuições efetivas ao GEF causou uma justificada preocupação nos países em
desenvolvimento. “Embora o compromisso dos países desenvolvidos fosse o de contribuir com
0,7% do seu PNB para a ODA anualmente, esta só recebeu 0,29% em 1995, o nível mais baixo
alcançado desde 1973”. (GEF, 1997, apud. PNUMA, 2003, p. 19).
O conflito Norte/Sul, no âmbito da Agenda 21 estava acirrado devido a esta questão
financeira. Os países desenvolvidos insistiam na globalização dos fenômenos ambientais,
excluindo processos de efeito localizado, enquanto os países em desenvolvimento defendiam
convergência desses processos e a não distinção entre “benefícios globais” e “benefícios
nacionais ou locais”. Por baixo desse conflito estava mesmo a questão dos financiamentos de
projetos ambientais e a necessidade de obtenção de tecnologias limpas.
45

Mesmo com todas as questões financeiras, a criação da Agenda 21 foi um avanço para a
construção do desenvolvimento sustentável. Foi a partir de seus preceitos que toda uma pauta
substancial de ações foi tomada na década de 1990 tanto no terreno nacional quanto no
internacional. A Agenda 21 se constituiu num poderoso instrumento de reconversão da sociedade
capitalista industrial rumo a um novo paradigma, que exige a reinterpretação do conceito de
progresso para algo que promova a qualidade de vida, não apenas o crescimento econômico
quantitativo.
O mais importante ponto das ações prioritárias da Agenda é o planejamento de sistemas
de produção e consumo sustentáveis contra a cultura do desperdício. A Agenda 21 é um plano de
ação para ser adotado global, nacional e localmente, por organizações do sistema das Nações
Unidas, governos e pela sociedade civil, em todas as áreas em que a ação humana impacta o meio
ambiente.
O documento referente a Agenda 21, assinado na RIO-92, deu frutos a partir de um
estreito acompanhamento feito na década de 1990 no qual foram elaborados ajustes e revisões.
Primeiro, com a conferência Rio+5; posteriormente com a adoção de uma agenda
complementária denominada Metas do Desenvolvimento do Milênio (Millenium Development
Goals), com ênfase particular nas políticas de globalização e na erradicação da pobreza e da
fome; e mais recentemente, a Cúpula de Joanesburgo, em 2002, terceira e última grande
Conferência sobre meio ambiente e desenvolvimento promovida pelas Nações Unidas.

1.1.3.2 A Comissão de Desenvolvimento Sustentável e a Agenda 21

A Comissão de Desenvolvimento Sustentável foi estabelecida depois da Cúpula da Terra


para apoiar e supervisionar os governos, as organizações das Nações Unidas, os setores comercial
e industrial, as organizações não governamentais e outros setores da sociedade civil, sobre as
medidas que deveriam ser adotadas para aplicar os acordos firmados na CNUMAD.
Após o advento da RIO-92, a Assembleia Geral da ONU criou a Comissão de
Desenvolvimento Sustentável como uma comissão funcional de seu conselho econômico e social.
Tal comissão é composta por representantes de 53 países, com mandatos de 3 anos, eleitos entre
os Estados Membros das Nações Unidas com base em uma representação geográfica equitativa.
46

Seu papel é examinar a implementação da Agenda 21, nos níveis nacional, regional e
internacional, guiada explicitamente pelos princípios da Declaração do Rio de Janeiro.
A Comissão monitora a integração dos objetivos desenvolvimentistas e ambientais que
permeiam todo o sistema das Nações Unidas, coordena o processo decisório entre governos
nessas matérias e faz recomendações sobre quaisquer medidas necessárias para a promoção do
desenvolvimento sustentável. Ela tem também a função de rever os compromissos financeiros
assumidos na Agenda 21. Em todas essas matérias a Comissão pode formular recomendações,
através do Comitê Econômico e Social da ONU, à Assembleia Geral.
Na Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento –
CNUMAD levantou-se a necessidade de desenvolver indicadores capazes de avaliar a
sustentabilidade, já que os instrumentos disponíveis, entre eles o PIB, não forneciam dados
suficientes para análise.
O documento final da Conferência, a Agenda 21, em seu capítulo 40, destaca:
Os indicadores comumente utilizados, como o Produto Nacional Bruto (PNB) ou as medições das
correntes individuais de contaminação ou de recursos, não dão indicações precisas de
sustentabilidade. Os métodos de avaliação da interação entre diversos parâmetros setoriais do meio
ambiente e do desenvolvimento são imperfeitos ou se aplicam deficientemente. É preciso elaborar
indicadores do desenvolvimento sustentável que sirvam de base sólida para adotar decisões em
todos os níveis e que contribuam para uma sustentabilidade autorregulada dos sistemas integrados
do meio ambiente e o desenvolvimento. (United Nations, 1992).

Desde a assinatura da Agenda 21, 178 países concordaram em corrigir distorções geradas
por uma avaliação exclusivamente econômica do PIB. Para tanto, deve-se somar a esse cálculo
dados sobre recursos socioambientais e subtrair os dados de atividades predatórias e o
desperdício de recursos, dentre outras distorções. Só assim seria possível definir padrões de
sustentabilidade e desenvolvimento que incluíssem aspectos econômicos, sociais, éticos e
culturais.
A CDS avalia os progressos em direção ao desenvolvimento sustentável através de
relatórios apresentados anualmente pelos governos. Em meados de 1996, aproximadamente 75
governos anunciaram que haviam estabelecido comissões nacionais de desenvolvimento
sustentável ou outros órgãos de coordenação. Entre as questões examinadas pela CDS, cabe
incluir: o comércio e o meio ambiente, os modos de produção e de consumo, a luta contra a
pobreza, a dinâmica demográfica, os recursos e mecanismos financeiros, a educação, a ciência, a
transferência de tecnologia ecologicamente racional, a cooperação técnica, o fomento à
capacitação, e a adoção das decisões e das atividades dos principais grupos.
47

Para ajudar os países a formular suas normas sobre a sustentabilidade e a controlar seus
efeitos, a Agenda 21 reconhece a necessidade de se estabelecer uma série de indicadores de
desenvolvimento sustentável com aceitação internacional. A transferência de tecnologia
ecologicamente racional é outra questão sobre a qual a Comissão aprovou um programa de
trabalho, promovendo formas de produção industrial menos poluentes. Impulsionados pelas
discussões e pelos resultados da CNUMAD, e seguindo a Agenda 21 Global, governos e
sociedade deram início a um conjunto de ações de construção de “Agendas 21”, nos âmbitos
nacional, regional e local.
Cinco anos depois da RIO-92, a ONU fez uma avaliação crítica dos resultados daquele
encontro e da aplicação prática do desenvolvimento sustentável. A sessão resultou em um
relatório e um programa para prosseguir a implementação da Agenda 21. A Assembleia
reconheceu o processo de globalização acelerada, bem como as intensas interações que vêm
ocorrendo nas relações comerciais entre os países. Também reconheceu o crescimento de
mercados de capitais e do investimento externo direto26.
Entretanto, houve tendências negativas generalizadas. A operacionalização do
desenvolvimento sustentável continuou insuficiente e com muitas dificuldades para superar
interesses estabelecidos. Nos cinco anos desde a Rio 92, a pobreza e os padrões de consumo e
produção permaneceram insustentavelmente altos. As desigualdades de renda se ampliaram entre
e dentro de nações, e houve deterioração continuada do meio ambiente global.
O investimento externo direto está substituindo a assistência externa ao desenvolvimento,
levando a benefícios seletivos, porque está baseado em objetivos econômicos e não sociais. A
Assembleia demonstrou preocupação com a falta de progressos na implementação da Agenda 21,
especialmente nos países menos desenvolvidos, devido à falta de vontade política dos governos
para catalisar as mudanças.
Assim, embora a RIO-92 tenha sido o mais importante acordo de cúpula de todos os
tempos, reunindo os Chefes de Estado de 179 países, a maioria deles não cumpriu os acordos nela
firmados. Embora um número razoável de países tenha tomado algumas iniciativas, a maioria dos
Governos não tem feito muito esforço para a construção da Agenda 21.
A CDS é responsável por acompanhar o processo de implementação da Agenda 21 e da
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Além disso, busca prover um
26
Fonte: http://www.agenda21local.com.br/con3b.htm Site visitado em 30 de outubro de 2011.
48

melhor direcionamento para que se acompanhe o Plano de Aplicação de Joanesburgo nos âmbitos
local, regional e internacional (conhecida, também, como Joanesburgo 2002, Rio+10 ou Cúpula
da Terra II, pois foi realizada dez anos depois da Rio-92 para avaliar a implementação da Agenda
21 e dos demais acordos da primeira Cúpula da Terra).
O Plano de Execução de Joanesburgo (Capítulo X) e a Comissão sobre Desenvolvimento
Sustentável (CDS), na sua 11a e 13a sessões, incentivaram a continuação dos trabalhos sobre
indicadores de desenvolvimento sustentável dos países, em consonância com as suas condições
específicas e prioridades. A CDS-13 convidou a comunidade internacional a apoiar os esforços
dos países em desenvolvimento nesse aspecto.
A terceira revisão de indicadores da CDS foi finalizada em 200627, por um grupo de
peritos dos países desenvolvidos e em desenvolvimento e organizações internacionais. A nova
edição contém 96 indicadores, incluindo um subconjunto de 50 indicadores básicos28. O conjunto
de indicadores da CDS baseia-se nas duas edições anteriores (1996 e 2001), que têm sido
desenvolvidas, melhoradas e extensivamente testadas como parte da implementação do Programa
de Trabalho sobre Indicadores de Desenvolvimento Sustentável.

1.1.4 Os anos 2000, Joanesburgo e a necessidade de um novo paradigma de desenvolvimento

A Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, mais conhecida como Cúpula de


Joanesburgo, foi a última grande Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada
pelas Nações unidas. A Conferência ocorreu no início do século XXI em um momento não tão
bom para as questões ambientais, já que o mundo estava com os olhos voltados para os atentados
terroristas ocorridos em 11 de setembro de 2001. E também, a se julgar pela retirada dos Estados
Unidos do Protocolo de Quioto, o governo americano não parecia querer apoiar as questões
ambientais e os grandes acordos multilaterais nesse período.
A Resolução 55/199 da Assembleia Geral das Nações Unidas, intitulada “Revisão decenal
do progresso alcançado na implementação dos resultados da Conferência das Nações Unidas
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento” convocou a Conferência para o ano de 2002. O

27
Fonte: www.un.org/esa/sustdev/natlinfo/indicators/guidelines.pdf
28
Fonte: www.un.org/esa/sustdev/natlinfo/indicators/methodologysheets.pdf
49

objetivo maior era verificar os avanços obtidos pela Agenda 21 após dez anos de sua
implementação.
Embora o otimismo com a Agenda na época, os resultados não pareciam muito
animadores. Segundo disse o próprio Secretário Geral das Nações Unidas, Kofi Annan,
The record in the decade since the Earth Summit is largely one of painfully slow progress and a
deepening global environmental crisis. (O registro da década desde a Cúpula da Terra é
principalmente uma demonstração de progresso penosamente lento e de uma crise ambiental que
se aprofunda). (Apud, LAGO, 2007, p. 87).

Apesar da evolução do arcabouço jurídico conseguido em relação ao desenvolvimento


sustentável, a dificuldade de implementação dos compromissos era inegável. Ficava evidente o
descompasso entre os compromissos assumidos pelos governos e a aplicação dos mesmos. O
sistema multilateral, que parecia ter saído fortalecido do Rio de Janeiro, chegava agora em
Joanesburgo desacreditado devido à falta de resultados concretos. Conforme crescia a certeza
científica sobre os danos causados ao meio ambiente, decrescia o esforço político para atender a
essas demandas.
A década de 1990 se configurou como um período de grande crescimento econômico.
Pode-se caracterizar tal crescimento como sendo impulsionado por circunstâncias políticas,
dentre elas o fim da Guerra Fria e a decisão da China de se integrar ao sistema capitalista. Isso
abria um enorme espaço para investimentos em áreas antes dominadas pelo socialismo, como o
Leste Europeu, fazendo com que os fluxos de capitais se tornassem mais intensos. Além disso,
avanços tecnológicos, como a internet, permitiram grandes saltos setoriais nas comunicações e o
vertiginoso aumento do fluxo de transações comerciais e financeiras.
Essas mudanças mostraram ao mundo o fortalecimento do padrão de vida ocidental, cuja
existência passou a ser conhecida em todo o globo graças aos meios de comunicação. A rápida
aceleração nas telecomunicações somada ao aumento do influxo de capitais ao redor do globo
fazem da globalização o conceito-chave da década. O objetivo das economias naquele momento
era atingir os padrões de desenvolvimento impostos pelas sociedades ocidentais. Isso incluía
seguir os padrões institucionais, econômicos e sociais que os países desenvolvidos impunham
como o necessário para se chegar ao desenvolvimento29.

29
É nessa época que surge o Consenso de Washington, o grande exemplo de “orientação” econômica para os países latino
americanos, que viveram a década perdida nos anos 1980 e necessitavam refinanciar suas dividas frente aos investidores
internacionais. Do ponto de vista dos países em desenvolvimento, a adoção dos princípios do Consenso de Washington –
austeridade fiscal, privatizações e abertura de mercados – não traria os resultados esperados, lançando-os em um período de
incerteza econômica, elevado desemprego e aumento da pobreza.
50

Contudo, o desenvolvimento associado à globalização não segue os preceitos do


desenvolvimento sustentável. André Aranha Corrêa do Lago afirma que: “a globalização, em sua
fase atual, parece corresponder mais ao capitalismo selvagem do que à visão mais humanista
contida no conceito de desenvolvimento sustentável.” (2007, p. 88). A globalização seria um dos
motivos pelo fracasso das negociações ambientais ao redor do globo. O avanço das economias e
o desmembramento produtivo das empresas transnacionais em várias partes do globo impediam
que medidas em prol do desenvolvimento sustentável fossem tomadas com o argumento de perda
de competitividade entre os países – e consequentemente fuga de empresas e de postos de
trabalho.
O pensamento do início da década de 1990, que “a abertura dos mercados, impulsionada
pela racionalidade dos agentes, traria uma série de benefícios que se derramaria para os mais
variados domínios” (DUARTE, 2003, p. 44) se mostrou um falácia. Discutia-se a reformulação
do Conselho de Segurança da ONU, assim como do Banco Mundial e do FMI30, reinvindicações
dos países em desenvolvimento que até hoje não foram atendidas.
O período que ficou conhecido como “década das conferências” foi substituído
rapidamente por um choque de realidade, que mostrava, após as declarações de boas intenções
entre os países dentro das grandes conferências multilaterais, uma grande dificuldade de
“implementação das resoluções com os parcos recursos disponíveis e de legitimação de valores
supostamente universais em um planeta globalizado.” (DUARTE, 2003, p. 45).
O que se tem ao final da década de 1990 é a visão dos Estados Unidos como a única
superpotência capaz de enfrentar sozinha grandes desafios, militares, políticos e econômicos e o
temor de que se configurasse um sistema internacional onde um único Estado figurasse à frente
dos outros em todos os setores. O exemplo mais claro disso é a relação dos Estados Unidos com
as Nações Unidas, onde o país se sobrepõe às vontades da maioria e retira a autoridade da ONU
agindo unilateralmente.
Com a ascensão de George W. Bush ao poder, em 2000, essa situação só veio a se acirrar.
De acordo com Lílian Duarte, “A Comunidade de Estados dava-se conta da instauração de um
multilateralismo seletivo, em que as organizações internacionais agiam setorialmente segundo
interesses específicos, sob o pretexto de defenderem valores universais”. (2003, p.46)

30
Fundo Monetário Internacional
51

No final do século XX, as críticas à globalização tornaram-se mais duras, articuladas e


numerosas, pois esta não conseguiu reduzir a pobreza – em muitos casos a ampliou – e nem
garantiu a estabilidade econômica dos países em desenvolvimento. As crises financeiras
internacionais que se sucederam ao longo da década sempre tiveram seu epicentro nesses países:
México (1994), países asiáticos (1997), Rússia (1998), Brasil (1999) e Argentina (2001). Isso
abalou profundamente a confiança dos mesmos nas políticas neoliberais, levando ao
questionamento da fórmula de desenvolvimento econômico adotada.
O quadro no início do século XXI era o de dificuldades nas negociações internacionais,
representado por sucessivos fracassos em torno das questões comerciais, com a recusa dos países
desenvolvidos em baixar os subsídios agrícolas e eliminar as barreiras não-tarifárias, além do
pouco espaço de manobra para que os países em desenvolvimento conseguissem barganhar uma
melhor situação. O tema ambiental, principalmente no que tange ao desenvolvimento sustentável,
estava enfraquecido e os países desenvolvidos diminuíam a cada ano a ajuda financeira, deixando
os países em desenvolvimento sozinhos para resolver os próprios problemas.
Se pelo lado econômico as dificuldades para o sucesso da Conferência de Joanesburgo
pareciam intransponíveis, pelo lado político a situação se complicou de vez a partir dos atentados
de 11 de setembro nos Estados Unidos. Os atentados provocaram uma mudança radical das
prioridades da agenda da política internacional, que eram claramente desfavoráveis ao debate
sobre o desenvolvimento sustentável. O multilateralismo se enfraqueceu de vez com as ações de
retaliação unilaterais por parte do governo W. Bush.
A pauta da agenda internacional ficou marcada no começo do século XXI pela guerra ao
terrorismo e pelo enfraquecimento das Nações Unidas. André Aranha Corrêa do Lago afirma que,
Mesmo sem os atentados de 11 de setembro, os Estados Unidos poderiam não ter dado maior
atenção à Cúpula, mas o contexto político permitiu que se justificasse a percepção de que
Joanesburgo era uma distração, ou uma perda de tempo, diante de tantas questões urgentes na
agenda internacional. (2007, p. 92).

A nova era de cooperação multilateral, imaginada no começo dos anos 1990 com o fim da
Guerra Fria, se encerrava no fim de 2001 ao ser proclamada a guerra ao terror. E a Cúpula
Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, marcada para 2002 já estava direcionada ao
fracasso mesmo antes de começar. Ela acontecia em um momento descendente da curva
cooperação internacional.
Os problemas de Joanesburgo começaram já nas reuniões preliminares da Conferência,
com os conflitos se estendendo não somente nos eixos Norte/Sul, mas também ao longo dos eixos
52

Norte/Norte e Sul/Sul. Além da questão dos financiamentos, os conflitos no Norte foram


pautados pela discordância entre Estados Unidos e União Europeia quanto ao posicionamento
perante o aquecimento global. Enquanto isso, no eixo Sul/Sul havia dúvidas até mesmo sobre
quais deveriam ser os principais temas da reunião, mostrando uma desarticulação desses países
pela primeira vez em quarenta anos.
A questão climática evoluiu de maneira particularmente complexa entre o Rio e
Joanesburgo. As dificuldades geradas em torno da assinatura do Protocolo de Quioto e a retirada
dos Estados Unidos do mesmo provocou uma crise em torno da questão do aquecimento global,
opondo os países desenvolvidos (lê-se Europa e Estados Unidos), que não conseguiria ser
resolvida na Conferência. Segundo André Aranha Corrêa do Lago,
A Convenção [Quadro das Nações Unidas Sobre Mudanças Climáticas] é incentivada pelos
europeus por [...] sua vantagem comparativa. A matriz energética europeia já sofrera
modernização em função de ajustes provocados pelas crises do petróleo e pela cada vez mais
severa legislação ambiental na União Europeia. Do lado norte-americano, no entanto, [...] as
ambiguidades científicas, a perspectiva de custos elevados e a falta de apoio da indústria [...], tudo
isso incentivou aqueles que defendiam que a mudança do clima iria ser simplesmente usada pelos
competidores para obter ganhos relativos às custas dos EUA. (2007, p. 98)

Já a questão dos países em desenvolvimento era mais complexa. Os menos desenvolvidos


queriam enfatizar a questão do desenvolvimento e combate à pobreza – como em Estocolmo – e
o aumento de desembolso para projetos de saneamento. Enquanto os países de maior
desenvolvimento queriam “examinar o cumprimento e a implementação dos acordos firmados,
reavaliar os padrões de consumo, incentivar o uso de energias renováveis e a transferência de
tecnologias e o fomento de programas e instituições ambientais”. (DUARTE, 2003, p. 54).
Para os países em desenvolvimento e, sobretudo, para as maiores economias em
desenvolvimento como o Brasil, o apoio incondicional ao Protocolo de Quioto tornou-se
prioritário na agenda de Joanesburgo. Isso se deve ao fato de os países do Anexo 1 terem metas
de reduções dos gases do efeito estufa, e os países em desenvolvimento não as terem,
representando politicamente o claro reconhecimento do princípio das responsabilidades comuns,
porém diferenciadas, um dos pilares da posição do G-7731 e China no tocante a desenvolvimento
sustentável. O fato dos países em desenvolvimento não possuírem metas de redução de gases do

31
O Grupo dos 77 nas Nações Unidas é uma coalizão de nações em desenvolvimento, que visa promover os interesses
econômicos coletivos de seus membros e criar uma maior capacidade de negociação conjunta na Organização das Nações Unidas.
Havia 77 membros fundadores da organização, mas a organização, desde então, expandiu para 131 países membros. O grupo foi
fundado em 15 de junho de 1964 pela "Declaração Conjunta dos Setenta e Sete Países" emitida na Conferência das Nações Unidas
sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).
53

efeito estufa assegurava certa flexibilidade a seus projetos de desenvolvimento, o que era
economicamente interessante para eles.
O processo preparatório para a Cúpula de Joanesburgo foi menos ambicioso que o do Rio
já que não havia processos de negociação para Convenções a serem assinadas na Conferência,
nem se pretendia elaborar um documento da complexidade e abrangência da Agenda 21. O que se
objetivava era progredir onde se havia verificado impasse ou não se lograra cumprimento das
metas. Ou seja, encontrar caminhos mais práticos para que o acordado no Rio fosse
implementado. Nesse sentido, a Conferência foi planejada para dar especial importância às
contribuições que demonstrassem a viabilidade do desenvolvimento sustentável nos níveis local,
regional, nacional e internacional.
Mas ainda nas negociações preparatórias havia a clara impressão de que os principais
atores na questão climática – Estados Unidos, União Europeia e o Grupo dos 77 e China – não
estavam dispostos a fazer concessões para que se avançassem os temas acordados no Rio de
Janeiro. De acordo com André Aranha Corrêa do Lago,
O impasse provocado pela radicalização das posições dos países desenvolvidos e em
desenvolvimento no processo preparatório levou a que temas como a reiteração de princípios
acordados no Rio, a globalização, os meios de implementação – no contexto dos quais era dada
especial atenção à questão de comércio – e a governança tivessem de ser negociados, sob forte
pressão, durante a própria Cúpula. Importantes temas, no entanto, dividiam os países
desenvolvidos. Estados Unidos e União Europeia enfrentaram-se em diversos momentos, como
nas questões de energias renováveis, de mudança do clima, de acompanhamento das iniciativas de
Tipo 232 ou, ainda, de responsabilidade corporativa33. (2007, p. 108).

Estiveram presentes na Cúpula mais de cem chefes de Estado e de Governo, com exceção
do Presidente George W. Bush. Apesar do grande número de participantes, para muitos, a
fórmula de Conferência das Nações Unidas, inaugurada em Estocolmo e repetida para os mais
diversos temas, pareceu esgotada com Joanesburgo, onde os resultados não teriam sido atingidos.
Olhando de outra perspectiva, porém, a prioridade política que o meio ambiente adquiriu no
período da Conferência do Rio não se repetiria, mas o patamar atingido teria sido preservado pelo
envolvimento dos atores.
A Conferência de Joanesburgo conseguiu angariar alguns resultados positivos tais como:
a fixação ou a reafirmação de metas para a erradicação da pobreza, água e saneamento, saúde,
produtos químicos perigosos, pesca e biodiversidade; a inclusão de dois temas de difícil progresso
em inúmeras negociações anteriores (energias renováveis e responsabilidade corporativa); a
decisão política de criação de fundo mundial de solidariedade para erradicação da pobreza; e o

32
Projetos ambientais que independem de entendimentos entre governos e que estimulam a relação direta entre governos locais,
comunidades, entidades e empresas ou ONGs.
33
A responsabilidade corporativa tem por objetivo gerenciar os impactos ambientais e sociais e econômicos de uma empresa.
54

fortalecimento do conceito de parcerias entre diferentes atores sociais para a dinamização e


eficiência de projetos. (LAGO, 2007, p. 110).

As críticas à Conferência foram muito maiores que seus resultados de fato. O Plano de
Implementação da Cúpula, principal documento produzido pelos participantes, no qual os países
prometem lutar contra a pobreza, foi considerado letra morta, afinal esse preceito consta desde a
Conferência de Estocolmo como objetivo a ser perseguido para o desenvolvimento sustentável.
Tal plano é composto de dez seções, sendo as principais sobre os Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento; a África; erradicação da pobreza; alteração dos padrões
insustentáveis de produção e consumo; proteção e gestão das bases de recursos naturais para o
desenvolvimento econômico e social; desenvolvimento sustentável em um mundo voltado para a
globalização; e governança. O texto acrescentava pouco ao que já tinha sido discutido na RIO-92.
A principal diferença estava na introdução do tema da globalização.
O que Joanesburgo oferece a questão ambiental é uma forma mais pragmática de lidar
com o desenvolvimento sustentável. Enquanto a Conferência do Rio havia estabelecido um
diálogo entre países em desenvolvimento e países desenvolvidos que permitiu a aceitação
universal do conceito de desenvolvimento sustentável, a Cúpula de Joanesburgo procurou
traduzir o conceito em ações concretas.
Não se pode negar as falhas ocorridas nesta Conferência, mas ela deixou de cumprir muito
do seu papel mais por culpa das divergências entre os países, num contexto mundial em que as
relações multilaterais estavam enfraquecidas. A configuração de mundo hoje, quase dez anos
após a última Conferência sobre Desenvolvimento Sustentável, mostra que as ações unilaterais
ainda são predominantes.
Existindo a necessidade urgente de um novo consenso a respeito da questão ambiental,
sobretudo em função das mudanças climáticas, resta aos países tentar um novo esforço para que
se chegue a um acordo com parâmetros claros e responsabilidades definidas entre os
participantes, alcançando com isso um novo patamar dentro da produção capitalista. Enquanto
isso não é possível, tem-se como base as ações unilaterais em prol do meio ambiente, aonde os
países vão buscando se adequar à nova condição de desenvolvimento por indicadores e modelos
de sustentabilidade.
55

2. ABORDAGENS CONCEITUAIS E PRÁTICAS DE DESENVOLVIMENTO


SUSTENTÁVEL

2.1 Definição de desenvolvimento

A questão do desenvolvimento surge como um dos paradigmas centrais das ciências


sociais na segunda metade do século XX, efeito dos processos de descolonização das colônias
asiáticas e africanas e do surgimento do pensamento cepalino na América Latina, além da
emergência do sistema das Nações Unidas. Por se tratar de uma problemática ampla e de escala
global, a conceituação do desenvolvimento possui característica interdisciplinar e é atravessada
por polêmicas de caráter ideológico e teórico.
Durante muito tempo, o desenvolvimento econômico foi confundido com o crescimento
econômico puro. Isso levou à crença de que era suficiente manter elevadas taxas de crescimento
do PIB, para se chegar ao desenvolvimento pleno. Ao analisar o crescimento econômico de
alguns países em desenvolvimento, que obtiveram taxas elevadas no passado, fica claro que esta
é uma condição necessária, mas não suficiente ao desenvolvimento. Taxas elevadas de
crescimento econômico podem esconder elevados níveis de desigualdade, tanto entre países
como dentro de cada nação.
É evidente que para se obter uma melhor medida do desenvolvimento necessitamos saber
qual é a verdadeira distribuição de renda e qualidade de vida de uma população. Ou seja, para se
configurar como desenvolvido, um país tem que oferecer um determinado nível de condições
básicas – saúde, educação, segurança e oportunidade de escolha – a seu povo. Ainda assim, esse
sentido de desenvolvimento não configura nenhuma relação com o meio ambiente. Um país pode
ser desenvolvido mesmo que possua altos níveis de degradação ambiental, não respeitando a
sustentabilidade ambiental. Esse é o caso do desenvolvimento obtido pelos países desenvolvidos
após a Revolução Industrial e que perdurou até a segunda metade do século XX, quando o
conceito de desenvolvimento sustentável foi efetivamente criado.
Neste início de século XXI, o mundo está lidando com as consequências de um
crescimento econômico perverso em que, após o fim do socialismo e da adoção do Consenso de
Washington pelas economias em desenvolvimento, a desregulamentação do mercado levou a uma
56

crise sistêmica cuja raiz está na financeirização34 da economia mundial. O capital produtivo foi
substituído pelo capital financeiro na obtenção da riqueza, gerando como efeito colateral a
intensificação das desigualdades sociais.
O desenvolvimento sustentável aparece nesse cenário como uma forma diferente de se
pensar o desenvolvimento, no qual estão inseridas as noções de desenvolvimento somadas às
questões da sustentabilidade, tanto a sustentabilidade ambiental quanto a social, a econômica e a
institucional. A faceta ambiental ganha um peso importante no conceito desenvolvimento, ao
mesmo tempo em que não é conflitante com o crescimento econômico, o primeiro conceito de
desenvolvimento adotado pelos especialistas.
Durante muito tempo o desenvolvimento foi tratado como sinônimo de crescimento
econômico. Esse continua a ser um dos equívocos mais constantes na busca para uma definição
de desenvolvimento. A adoção desse conceito simplifica o estudo do desenvolvimento, que fica
resumido à análise de indicadores consolidados conceitualmente, como a evolução do PIB. Tal
análise pode ser considerada parte do estudo do desenvolvimento, mas não deveria ser tomada
como conceito completo. Nas palavras de José Eli da Veiga,
Este amálgama das duas ideias [desenvolvimento e crescimento econômico] simplifica bastante a
necessidade de se encontrar uma maneira de medir o desenvolvimento, pois basta considerar a
evolução de indicadores bem tradicionais, como, por exemplo, o Produto Interno Bruto per capta.
(2008, p. 17).

A divergência conceitual entre crescimento econômico e desenvolvimento ficou evidente


quando o PNUMA lançou o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) em 1990, para evitar o
uso exclusivo do PIB como medida de aferição do desenvolvimento. A criação do IDH, que leva
em conta aspectos sociais além dos aspectos econômicos na análise do desenvolvimento, surge
como uma demanda para explicar porque o crescimento econômico intenso de alguns países após
a Segunda Guerra, não resultou necessariamente em maior acesso de populações pobres a bens
materiais e culturais, como ocorria nos países desenvolvidos. De acordo com Oswaldo de Rivero,
diplomata peruano,
São os gurus do mito do desenvolvimento que têm uma visão quantitativa do mundo. Ignoram os
processos qualitativos histórico-culturais, o progresso não linear da sociedade, as abordagens
éticas, e até prescindem dos impactos ecológicos. Confundem crescimento econômico com o
desenvolvimento de uma modernidade capitalista que não existe nos países pobres. Com tal
perspectiva, eles só percebem fenômenos econômicos secundários, como o crescimento do PIB, o
comportamento das exportações, ou a evolução do mercado acionário, mas não reparam nas
profundas disfunções qualitativas estruturais, culturais, sociais e ecológicas que prenunciam a

34
vigência de um padrão de crescimento econômico onde a acumulação de riquezas desenvolve-se predominantemente através de
canais financeiros, reduzindo significativamente as imobilizações de capital nos setores diretamente produtivos.
(http://desafios.ipea.gov.br/003/00301009.jsp?ttCD_CHAVE=5080).
57

inviabilidade dos quase-Estados-nação subdesenvolvidos. (2002, p. 132 apud, VEIGA, 2008, p.


22).

Muito dos países que obtiveram grandes êxitos econômicos durante o século XX não
conseguiram transferir melhorias efetivas a suas populações como acesso à educação e à saúde e
tal fato não podia ser explicado apenas com a medição do PIB. Dessa forma, começou um intenso
debate internacional sobre o sentido do desenvolvimento. De um lado estavam os que viam o
desenvolvimento apenas como crescimento econômico, cuja ideia era que, a partir deste, a
distribuição da renda viria de forma natural e todos teriam acesso ao bem-estar. Do outro,
estavam os que acreditavam na intervenção estatal como forma de condicionar o crescimento
econômico a melhorias sociais.
Olhando a questão do desenvolvimento econômico da perspectiva dos países em
desenvolvimento, a intervenção estatal era tida como a saída para o desenvolvimento,
principalmente nos países latino-americanos. Essas intervenções foram feitas ao longo do século
passado em grande parte desses países, em maior ou menor grau. Para essas nações os processos
para se chegar a um patamar elevado de desenvolvimento não estavam condicionados apenas à
questão econômica, mas também a questões estruturais. Já em outros países, como os asiáticos, a
intervenção estatal ocorreu de forma diferente, às vezes levando à adoção do socialismo e outras
fazendo uso do próprio capitalismo, mas sempre com forte presença do Estado como mola
propulsora do desenvolvimento.
Ainda assim, muitas nações não viram seu desenvolvimento decolar nas décadas passadas,
ficando estagnadas e elevando o nível de pobreza. Segundo alguns teóricos, a inviabilidade
econômica dessas nações está diretamente ligada à sua pobreza científico-tecnológica. Com um
histórico de pouca produção científica, tais nações ficam defasadas diante dos países
desenvolvidos e perdem competitividade. Se levarmos em conta o fato de muitas dessas nações
terem aberto suas economias na década de 1990 sem o suporte do Estado, o que se vê é o
aumento da importação de produtos altamente industrializados, e com maior valor agregado, e a
exportação de matérias primas. Esse é o caso típico da América Latina.
De acordo com a teoria cepalina, os países latino-americanos foram inseridos no sistema
econômico mundial de uma forma desfavorável. O pensamento estruturalista opõe os países
desenvolvidos e em desenvolvimento em centro e periferia. A periferia seria absorvedora de
padrões de consumo e tecnologia adequados ao centro, mas frequentemente inadequados à
disponibilidade de recursos e ao nível de renda dela mesma.
58

O processo de crescimento, emprego e distribuição de renda na periferia seria distinto do


que ocorre nos países centrais. As diferenças devem ser encontradas no fato de que as economias
periféricas possuem uma estrutura pouco diversificada e tecnologicamente heterogênea, o oposto
do que se encontra nos países centrais. A periferia importa tecnologia defasada do centro e, por
isso, está sempre um passo atrás em termos de desenvolvimento, esse movimento é como um
círculo vicioso perpetuando as estruturas econômicas e sociais que alimentam o sistema
econômico.
Somado a esse quadro tem-se a explosão demográfico-urbana nos países em
desenvolvimento, atrofiando o processo de distribuição de renda e mantendo a pobreza interna,
mesmo havendo crescimento econômico positivo. A questão demográfica entra como um
agravante ao desenvolvimento, pois eleva o custo social dentro dos países em desenvolvimento.
A combinação de exportações de bens com baixo valor agregado, ou baixa tecnologia, com
explosão demográfica é produtora de pobreza. Essa incapacidade de transferir recursos do
mercado mundial para crescentes populações urbanas impede os países de se desenvolverem.
José Eli da Veiga argumenta que, de acordo com Celso Furtado, a ideia de
desenvolvimento econômico é um mito. E graças a ela tem sido possível desviar as atenções da
tarefa básica de identificação das necessidades fundamentais da coletividade, para concentrá-las
em objetivos abstratos como são os investimentos, as exportações e o crescimento. Ainda
segundo Furtado, grande parte do pensamento das ciências sociais se fundamentam na ideia de
que o desenvolvimento econômico pode ser universalizado da mesma forma que vem sendo
praticado pelos países que lideraram a revolução industrial.
Segundo essa visão, os padrões de consumo da minoria da humanidade que vive nos
países altamente industrializados poderão ser acessíveis às grandes massas de população em
rápida expansão que se formam na periferia. Tal ideia se torna uma falácia a partir do momento
em que se observa a escassez dos recursos existentes no planeta. É insustentável para a maior
parte da humanidade alcançar o padrão de consumo dos países desenvolvidos e estes só
conseguirão manter seu patamar de riqueza e consumo se a perpetuação da pobreza no resto do
globo for persistente.
Ainda assim, há quem acredite que é possível manter o padrão de consumo atual dos
países desenvolvidos e inserir esse patamar de consumo nos países em desenvolvimento, sem
causar um colapso nos recursos disponíveis do planeta. O argumento utilizado por esses autores é
59

fundamentado na noção de progresso tecnológico. Ou seja, mesmo os recursos sendo escassos,


sempre haverá uma forma de progredir via transformação tecnológica e outros recursos
inutilizados poderão ser melhores aproveitados.
Até meados dos anos 1970, o desenvolvimento se identificava com progresso material.
Esse progresso levaria espontaneamente à melhoria dos padrões sociais. Logo a relação se
mostrou mais complexa, pois o jogo político intervinha, fazendo com que o crescimento tomasse
rumos diferentes, com efeitos heterogêneos na estrutura social. Mesmo assim, o desenvolvimento
era visto como sinônimo de crescimento econômico, mudando apenas a maneira como este era
direcionado.
Apenas na década de 1990 o crescimento econômico passou a ser entendido como
elemento de um processo maior, já que seus resultados não se traduziram automaticamente em
benefícios, percepção que só ficou clara com a criação do IDH. A sociedade percebeu a
importância de refletir sobre a natureza do desenvolvimento que se desejava, isso inclui as visões
ambientalista, cultural, social e institucional do desenvolvimento. As políticas de
desenvolvimento deveriam ser estruturadas por valores que não seriam somente os da dinâmica
econômica.
Entre os extremos que reduzem o desenvolvimento econômico a um simples crescimento
e o que o descarta como inexequível existe o caminho do meio, que deve ser perseguido pelos
formuladores de políticas. Um desses caminhos é o adotado pelo economista Armatya Sen,
segundo o qual a liberdade individual é considerada um comprometimento social. Tal liberdade
consiste na eliminação de tudo o que limita as escolhas e as oportunidades das pessoas, como a
má distribuição de renda, por exemplo. A expansão da liberdade é vista como principal fim e
principal meio do desenvolvimento.
O crescimento econômico é um dos meios para alcançar essa liberdade, mas ela também
depende de muitos outros determinantes como a educação, a saúde e os direitos civis. As
principais fontes de privação da liberdade seriam a pobreza e a tirania, a carência de
oportunidades econômicas e a destituição social sistêmica, a negligência dos serviços públicos e a
intolerância ou interferência de Estados repressivos. Como se vê, a industrialização, o progresso
tecnológico ou a modernização social contribuem expressivamente para a expansão da liberdade
humana, mas essa depende de inúmeras outras influências.
60

Nesse contexto, a liberdade de participar dos mercados mundiais, a começar pelo mercado
de trabalho, é uma contribuição importante para o desenvolvimento, independentemente do que
os mecanismos de mercado fazem para promover o crescimento econômico ou a industrialização.
As barreiras existentes entre os mercados distorcem o desenvolvimento. Sobre esse ponto, José
Eli da Veiga comenta que “a negação de acesso aos mercados de produtos frequentemente está
entre as privações enfrentadas por muitos produtores sujeitos a organização e restrições
tradicionais. A liberdade de participar do intercambio econômico tem um papel básico na vida
social.” (2008, p. 35).
Apesar de vivermos em um mundo globalizado, onde as fronteiras dos Estados nacionais
estão mais abertas e onde as trocas entre as nações são cada vez mais difundidas, muitas das
liberdades elementares são negadas a uma grande parcela da população. Essa ausência de
liberdade relaciona-se diretamente com a pobreza econômica e com a ausência do Estado como
fornecedor de serviços públicos e assistência social. Ou ainda a violação da liberdade pode ser
resultado direto da falta de liberdades políticas, imposta por regimes autoritários que cerceiam a
vida social, política e econômica de uma dada comunidade.
A garantia da liberdade é obtida através da participação estatal como provedora de um
sistema de bem-estar social que proporcione uma maior proteção individual dentro das nações. O
desenvolvimento pode então ser conduzido através do custeio público. A viabilidade desse
processo reside no fato de que os serviços sociais mais relevantes são altamente trabalho-
intensivos e, portanto, relativamente baratos nas economias em desenvolvimento, nas quais os
salários são baixos. De acordo com José Eli da Veiga, “uma economia pobre pode ter menos
dinheiro para despender em serviços de saúde e educação, mas também precisa gastar menos
dinheiro para fornecer os mesmos serviços, que em países ricos custariam muito mais.” (2008, p.
40)
Diante do custeio do desenvolvimento pelo Estado, um país não precisa esperar pelo
longo período de crescimento econômico. A qualidade de vida pode ser beneficiada, sem que os
baixos níveis de renda se transformem em empecilho, através de um programa adequado de
serviços sociais. José Eli da Veiga argumenta que
a qualidade de vida pode ser muito melhorada, a despeito dos baixos níveis de renda, mediante um
programa adequado de serviços sociais. O fato de a educação e os serviços de saúde também
serem produtivos para o aumento do crescimento econômico corrobora o argumento em favor de
dar-se mais ênfase a essas disposições sociais nas economias pobres, sem ter de esperar “ficar
rico” primeiro. (2008, p. 41)
61

Quando se afirma que o desenvolvimento não se resume ao crescimento econômico,


produzido pelo aumento do PIB, é comum que se observe o problema pelo lado da distribuição de
renda. Ou seja, o desenvolvimento poderia ser alcançado com uma combinação entre o
crescimento econômico e a diminuição das desigualdades sociais através da distribuição de renda.
Porém, essa questão não é tão simples, existindo outros fatores que influenciam no
desenvolvimento.
Seguindo o pensamento de Douglass North, o processo de desenvolvimento depende
essencialmente da qualidade das instituições de cada sociedade, sendo estas a síntese das crenças
do seu povo, ou a expressão concreta da mentalidade das pessoas. Uma das explicações para o
relativo atraso dos países em desenvolvimento está no fato destes terem importado modelos e
instituições dos países desenvolvidos, não conformando a realidade de seu povo.
Como são países de industrialização recente, buscaram os modelos de crescimento dos
países desenvolvidos e implantaram instituições de fora para dentro, enquanto estes
desenvolveram suas instituições de dentro para fora, de acordo com suas necessidades. O mau
funcionamento político-institucional dos países em desenvolvimento pode ter sua raiz nesse tipo
de questão.
Já Jared Diamond segue em outra direção para explicar o desenvolvimento, mostrando
que a cultura influencia no mesmo e que ele é resultado essencialmente de fatores ambientais.
Diamond vai em direção oposta a do modelo de pensamento dominante na ciência econômica,
que é baseado na ideia de equilíbrio. Tal modelo ignora a união entre os sistemas econômicos e
bióticos, além de não se preocupar com a existência de limites naturais. No sistema econômico
convencional os fatores a serem maximizados são utilidades individuais, e não as necessidades de
um sistema biótico. Assim, as políticas econômicas não dão a devida atenção a quaisquer
condicionantes de ordem ecológica.
Levando em consideração as contribuições desses autores que dão maior ênfase ao campo
ambiental, social e institucional, tem-se que o desenvolvimento deve ser definido como uma
mudança qualitativa, e não quantitativa.
O princípio que gera o desenvolvimento pode ser entendido de forma evolucionista, em
que surgem diferenciações dentro de generalidades. Por sua vez, as diferenciações tornam-se
generalidades das quais surgem outras diferenciações. De acordo com José Eli da Veiga,
“desenvolvimento é um processo aberto que cria complexidade e diversidade, porque múltiplas
62

generalidades são fontes de múltiplas diversificações – algumas ocorrendo simultaneamente, em


paralelo, outras em sequência.” (2008, p. 52).
Dessa forma, é possível pensar que o desenvolvimento não ocorre de forma linear nem
como um conjunto de linhas abertas, mas opera como uma rede de co-desenvolvimentos
independentes. Sem essa rede não há desenvolvimento. Tal rede, por sua vez, depende das
diferenciações e generalidades do próprio desenvolvimento, quanto mais diferenciações dentro de
um ramo maior será a rede. Assim, quanto mais diferenciações mais generalidades; e quanto mais
generalidades mais bases para desenvolvimentos posteriores.
Nesta visão evolucionista, o desenvolvimento econômico utiliza os mesmos princípios
universais utilizados pelo resto da natureza. Em outras palavras, o desenvolvimento econômico
seria uma versão do desenvolvimento natural. O interesse prático dessa ideia está na necessidade
de assimilar que o desenvolvimento não é um conjunto de coisas, mas um processo que produz
essas coisas.
Entendida essa noção de desenvolvimento, basta somá-la à ótica institucionalista de
Douglass North para ver que, se o processo de desenvolvimento falha em algum país, não adianta
importar um modelo de desenvolvimento pronto de outro lugar. Este é apenas um resultado e o
processo não vai junto. Por isso a existência de instituições ociosas, o mau uso dos recursos e o
consequente atraso.
É da combinação da natureza com o trabalho humano que surge o recurso inicial da
economia de qualquer comunidade. Do ponto de vista qualitativo para o desenvolvimento
econômico, o principal ingrediente é o trabalho humano, mesmo que este não o seja do ponto de
vista quantitativo. Através do trabalho humano, os recursos importados da natureza são
transformados e ganham valor ou aumentam de valor. Cada transformação da natureza
corresponde a um percentual de crescimento de uma dada comunidade. Se esse percentual
consegue ser transformado em qualidade de vida para aquela região, configura-se o
desenvolvimento.
Quanto mais diversificado for um sistema econômico, maiores são as possibilidades do
desenvolvimento, pois é da diversidade interna que dependem a expansão e o próprio
desenvolvimento. Economias predominantemente rurais ou baseadas na produção de um único
bem para exportação – como no caso do petróleo – geralmente não atingem o desenvolvimento
qualitativo. As primeiras são predominantemente pobres e as segundas, apesar de ricas, possuem
63

elevadas taxas de concentração de renda. A diversidade permite com que a riqueza se perpetue
por todo o sistema, fazendo com que as diferenças de renda sejam atenuadas e que o
desenvolvimento seja atingido.
Essa tese corrobora o pensamento cepalino de que é preciso se industrializar para se
desenvolver. Tal teoria foi dominante nos países em desenvolvimento durante boa parte do século
XX, ficando em segundo plano a partir da década de 1980 quando as ideias neoliberais ganharam
força por todo mundo.
A ideia de desenvolvimento que se destaca atualmente, leva em conta a combinação de
sustentabilidade e respeito às instituições e acordos multilaterais, além da participação estatal de
uma forma diferente daquela empregada na América Latina do século XX, o Estado deve ser
provedor das condições para que as instituições privadas se desenvolvam e também prover a
proteção social necessária para sua população. Ou seja, o Estado deve ser o principal defensor do
desenvolvimento econômico do seu país, devendo direcioná-lo para padrões que respeitem o
meio-ambiente, já que os recursos são escassos e necessários ao futuro das outras gerações.
Jose Eli da Veiga argumenta que
continuam a existir muitas incógnitas sobre alguns elementos essenciais do crescimento
econômico de longo prazo: população, tecnologia, relação com a distribuição e natureza das
variações do crescimento. Todavia, apesar dessas incógnitas, houve recentemente um duplo
avanço teórico: ênfase generalizada na importância das instituições e maior abertura para um
resgate da antiga economia política. (2008, p. 76).

North considera que o surgimento da agricultura pode ter sido um acelerador do progresso
material mais importante até do que o surgimento da grande indústria. O que ele denomina como
primeira revolução econômica acelerou o crescimento principalmente porque o direito de
propriedade trouxe o incentivo essencial ao avanço do conhecimento e do aprendizado
tecnológico. E ela deu origem ao Estado, condição essencial da especialização e da divisão do
trabalho.
A Revolução Industrial seria o grande momento da segunda revolução econômica, ou o
auge de uma série de eventos anteriores que geraram uma verdadeira revolução ao promoverem a
fusão entre ciência e tecnologia. De acordo com José Eli da Veiga, “muito mais importante que o
feixe de inovações normalmente associado à ideia de revolução industrial foi a ampliação da
oferta de novos conhecimentos que se tornou possível com a mudança do direito de propriedade,
iniciada na Grã-Bretanha, em 1624, com a primeira lei de patentes.” (2008, p. 77).
64

Na visão de North, o sistema econômico é um complexo de instituições. Destas, as


fundamentais são as regras constitucionais, fortemente condicionadas pela tecnologia militar e
pela ideologia. Por isso, a organização econômica é basicamente condicionada pelo Estado.
Seguindo essa lógica, o desenvolvimento seria promovido pela vontade do Estado, de acordo com
sua ideologia, levando em conta sua própria noção de desenvolvimento e respeitando as
instituições, tanto aquelas em âmbito nacional, quanto as regras internacionais ao qual o próprio
Estado se dispôs a seguir.
Os relatórios anuais preparados pelo PNUD fornecem uma noção concisa do que seria o
desenvolvimento nos parâmetros atuais. Ele tem a ver com a possibilidade das pessoas viverem o
tipo de vida que escolheram, com a provisão dos instrumentos e das oportunidades para fazerem
suas escolhas. Essa ideia é tão política quanto econômica, indo desde a proteção dos direitos
humanos ao aprofundamento da democracia.
Celso Furtado sintetiza o significado de desenvolvimento econômico ao afirmar que o
crescimento econômico, tal como conhecemos, vem se fundando na preservação dos privilégios
das elites que satisfazem seu afã de modernização; já o desenvolvimento se caracteriza pelo seu
projeto social subjacente. Dispor de recursos para investir está longe de ser condição suficiente
para preparar um melhor futuro para a massa da população. Mas quando o projeto social prioriza
a efetiva melhora das condições de vida da população, o crescimento se metamorfoseia em
desenvolvimento.
Existe um novo requisito que exige ajustes em ultrapassadas concepções do
desenvolvimento: a sustentabilidade ambiental do crescimento e da melhoria da qualidade de
vida. Trata-se de um novo imperativo, em virtude da percepção de que a biosfera, em níveis
global, regional, nacional e local, está sendo submetida a pressões insuportáveis e prejudiciais
para o próprio desenvolvimento e as condições de vida.
Ignacy Sach é um dos teóricos recentes que insere a questão ambientalista dentro de uma
visão específica de desenvolvimento, que leva em conta o papel do Estado e as características
únicas de cada nação. Ele renuncia à ideia comum de desenvolvimento por esta ter funcionado
como uma armadilha ideológica inventada pra perpetuar as assimetrias entre as minorias
dominantes e as maiorias dominadas, nos países e entre os países.
65

O desenvolvimento tem sido exceção histórica e não regra geral. Ele não é o resultado espontâneo
da livre interação das forças de mercado. Os mercados são tão somente uma entre as varias
instituições que participam do processo de desenvolvimento. E os únicos países da periferia a se
saírem razoavelmente bem durante a ultima década do século XX foram exatamente aqueles que
se recusaram a aplicar ao pé da letra as prescrições cultuadas no chamado Consenso de
Washington. (VEIGA, 2008, p. 80).

Não se pode mais pensar o desenvolvimento sem levar em consideração a questão da


sustentabilidade do ambiente em que esse desenvolvimento está inserido. Para tal, é necessário
conhecer a noção de sustentabilidade que é adotada nas mais diferentes regiões. Como esta
também é uma noção mais política que científica, o desenvolvimento sustentável fica
condicionado a duas vertentes de escolhas normativas financiadas pela política adotada em cada
região.
Podemos ter então combinações de diferentes tipos de desenvolvimento, como aquele que
é definido como puro e simples crescimento econômico ou o que considera o desenvolvimento
qualitativo de uma região e não seu valor quantitativo com diferentes visões de sustentabilidade.
O conjunto dessas combinações proporcionará as mais diversas noções sobre o que é
desenvolvimento sustentável. Nenhuma dessas noções está completamente certa ou errada, por se
tratar de conceitos políticos. O se deve ter em mente é o alcance de um consenso sobre o tipo de
desenvolvimento que pode ser adotado pelas nações sem que este interfira no desenvolvimento e
na qualidade de vida de outras nações.
Como foi visto, o crescimento econômico puro não é o melhor caminho para alcançar esse
objetivo. Além disso, a sustentabilidade entra como um aditivo a esta equação de melhor tipo de
desenvolvimento ao levar em conta a necessidade da melhor combinação dos recursos escassos
dentro do desenvolvimento econômico. A seguir será explicitado o conceito de sustentabilidade e
de que forma este conceito interfere no desenvolvimento. Trata-se de um conceito mais abstrato
que o próprio desenvolvimento, o que dá maior margem de discussão.

2.2 Definição de sustentabilidade

O conceito de sustentabilidade é um conceito que pode provocar vários padrões de


resposta. Primeiro, existem aqueles que acreditam que não exista dilema entre conservação
ambiental e crescimento econômico, podendo haver uma combinação ótima entre os dois. O
debate internacional esteve pautado na ideia de que o crescimento econômico só prejudicaria o
66

meio ambiente até um determinado patamar de riqueza auferida pela renda per capita. A partir
desse patamar o crescimento econômico seria positivo para a qualidade ambiental.
Essa hipótese só seria comprovada se um grande número de países tivesse indicadores
confiáveis sobre um amplo leque de variáveis ecológicas, porém o mais provável é que se
constatem os diversos estilos de crescimento e as circunstâncias em que ele ocorre, rejeitando a
ideia de uma relação linear entre qualidade ambiental e renda per capita. Aliás, já existem bons
indicadores que mostram políticas de preservação ambiental desastrosas em países
desenvolvidos.
Do lado oposto aos otimistas do crescimento econômico estão aqueles que defendem que
a sustentabilidade ambiental só seria possível na chamada condição estacionária, ou seja, com
nenhum crescimento econômico. De acordo com essa teoria, a economia continuaria a melhorar
em termos qualitativos, substituindo, por exemplo, energia fóssil por energia limpa. Mas nas
sociedades mais avançadas seria abolida a obsessão pelo crescimento do PIB.
Para fins dessa dissertação, o caminho escolhido para definir a sustentabilidade é o
caminho do meio entre esses dois pensamentos. Ou seja, uma forma de desenvolvimento
econômico, que contempla o crescimento e que contribua para a preservação ambiental. A
conciliação entre desenvolvimento econômico e conservação da natureza é algo que demanda
tempo e participação da sociedade, não podendo ocorrer no curto prazo nem de forma isolada.
De acordo com Goldsmit (1972, apud. BELLEN, 2005, p. 23), “uma sociedade pode ser
considerada sustentável quando todos os seus propósitos e intenções podem ser atendidos
indefinidamente, fornecendo satisfação ótima para seus membros”. Dentro do conceito de
sustentabilidade, Pearce (1993, apud. BELLEN, 2005, p. 25) afirma que existem dois extremos
ideológicos: o tecnocentrismo e o ecocentrismo, e dentro destes extremos ainda existem mais
duas variantes distintas.
A tendência tecnocêntrica acredita que a sustentabilidade se refere à manutenção do
capital total disponível no planeta e que ela pode ser alcançada pela substituição de capital natural
pelo capital gerado pela capacidade humana. Já na outra ponta, o ecocentrismo ratifica a
importância do capital natural e da necessidade de conservá-lo não apenas pelo seu valor
financeiro, mas pelo seu valor substantivo.
Esses dois extremos ressaltam a noção de sustentabilidade fraca e forte. Na concepção de
sustentabilidade fraca não existem limites para o desenvolvimento. Já na concepção de
67

sustentabilidade forte existem limites naturais que impedem o desenvolvimento desenfreado do


planeta. Essas diferentes dimensões da sustentabilidade e do ambientalismo são evidenciadas no
quadro abaixo:
Tecnocêntrico Ecocêntrico

Cornucopiana Adaptativa Comunalista Ecologia Profunda


Exploração de recursos, Conservacionismo de
Preservacionismo de Preservacionismo Rótulo
orientação pelo recursos, posição
recursos profundo Ambiental
crescimento. gerencial.

Economia verde,
Economia verde Economia verde
mercado verde
profunda. Economia muito profunda,
Economia antiverde, livre conduzido por Tipo de
steady-state, forte regulação
mercado. instrumentos de economia
regulação para minimizar a
incentivos
macroambiental. tomada de recursos.
economicos.

Objetivo econômico,
Crescimento
maximização do
econômico nulo, Reduzida escala da
crescimento econômico. Modificação do
crescimento economia e da
Considera que o crescimento
populacional nulo. população.
mercado livre em econômico, norma do Estratégia de
Perspectiva sistêmica, Imperativa
conjunção com o capital constante, gestão
saúde do todo mudança de escala,
progresso técnico deve alguma mudança de
(ecossistema), interpretação literal
possibilitar a eliminação escala.
hipótese de Gaia e de Gaia.
das restrições relativas
suas implicações.
aos limites e à escassez.
Equidade intra e Interesse coletivo
Bioética (direitos e
intergeracional sobrepuja o interesse
Direitos e interesses dos interesses
(pobres individual, valor
indivíduos conferidos a todas
contemporâneos e primário dos Ética
contemporâneos, valor as espécies), valor
gerações futuras), ecossistemas e valor
instrumental na natureza. intrínseco da
valor instrumental na secundário para suas
natureza.
natureza. funções e serviços.

Sustentabilidade muito Sustentabilidade Grau de


Sustentabilidade fraca. Sustentabilidade forte.
fraca. muito forte. sustentabilidade

Quadro 4
Dimensões do Ambientalismo
Fonte: BELLEN, Hans M ichael van. Indicadores de sustentabilidade - Uma análise comparativa. P. 26

A sustentabilidade ambiental em sentido estrito parte do princípio que os recursos naturais


e o capital são elementos complementares e não substitutos. Ou seja, só é possível adotar a
tendência tecnocêntrica no curto prazo, podendo os recursos naturais realmente ser substituídos
68

por capital. Mas se tratando de bens finitos e escassos, no longo prazo a tendência é que esses
recursos desapareçam, uma vez que a capacidade humana não pode substituí-los indefinidamente.
A ideia central seria então preservar para desenvolver, isto é, a atividade humana não
pode ultrapassar a capacidade de renovação da natureza. Esse fato nos leva ao dilema da troca do
crescimento econômico quantitativo pelo qualitativo, algo a ser adotado pelos países mais
desenvolvidos. Para os países em desenvolvimento, a margem superior de crescimento
econômico ainda deve ser atingida.
De acordo com a noção de que nenhum sistema é sustentável havendo bolsões de pobreza
em seu interior, os países em desenvolvimento devem alimentar o desenvolvimento econômico,
que implica não somente em crescimento econômico, mas principalmente em maior qualidade de
vida para suas populações. Assim, deve-se perseguir uma nova forma de desenvolvimento que
abarque a questão ambiental em seu interior. Portanto, a sustentabilidade é uma questão muito
mais crítica para os países desenvolvidos que para os em desenvolvimento. Ela precisa antes de
tudo ser atingida no ponto em que o nível de uso dos recursos é simultaneamente suficiente para
permitir qualidade de vida à população e compatível com a capacidade de suporte ambiental.
Podemos dizer que um sistema sustentável é composto de duas partes: o sistema
ambiental e o sistema social. O sistema social está inserido no sistema ambiental e depende deste
para se manter. Sem os recursos extraídos da natureza, a sociedade não consegue produzir o
necessário para sua existência. Além disso, é no sistema ambiental que a sociedade elimina os
resíduos gerados pelo seu processo produtivo. Sobre esse assunto, Bossel afirma que:
A sustentabilidade da sociedade humana nunca esteve seriamente ameaçada, uma vez que a carga
provocada pela atividade humana sobre o sistema era de escala reduzida, o que permitia uma
resposta adequada e uma adaptação suficiente. As ameaças sobre a sustentabilidade de um sistema
começam a requerer atenção mais urgente na sociedade à medida que o sistema ambiental não é
capaz de responder adequadamente à carga que recebe. Se a taxa de mudança ultrapassa a
habilidade do sistema de responder, ele acaba deixando de ser viável. (1999, apud. BELLEN,
2005, p. 28).

As ameaças à viabilidade de um sistema social derivam de três fatores principais: as


dinâmicas da tecnologia, da economia e da população. Todos esses fatores podem levar a uma
elevada taxa de mudança que podem transformar um sistema sustentável em insustentável. Por
esse motivo, torna-se necessário operacionalizar o conceito de sustentabilidade implícito em cada
sociedade. Essa operacionalização do conceito auxilia na verificação da sustentabilidade do
sistema, ou, pelo menos, na identificação das ameaças à sustentabilidade. Daí a necessidade de se
69

formular indicadores de desenvolvimento sustentável que possibilitem o posicionamento da


sociedade em relação à sustentabilidade.
A maior parte do debate atual sobre sustentabilidade se refere a visões específicas de
diversos autores para aspectos distintos do conceito. A maioria dos autores sugere que as
definições de sustentabilidade devem incorporar aspectos de sustentabilidade econômica e
ecológica somada ao bem-estar humano. Sob esse prisma, é necessário que se observe a
sustentabilidade por diferentes óticas. Assim, não há sustentabilidade em sentido amplo, se não
houver a combinação de desenvolvimento econômico, preservação ambiental e justiça social.
O conceito de sustentabilidade pode ser entendido a partir de diversas dimensões. No caso
das sociedades ocidentais, a dimensão econômica tem sido predominantemente utilizada.
Segundo Pronk e ulHaq (1992, apud. BELLEN, 2005, p. 23), o crescimento econômico é um item
fundamental dentro da sustentabilidade. Para eles, “o desenvolvimento é sustentável quando o
crescimento econômico traz justiça e oportunidades para todos os seres do planeta, sem privilégio
de algumas espécies, sem destruir os recursos naturais finitos e sem ultrapassar a capacidade de
carga do sistema”.
A sustentabilidade econômica abrange a alocação e distribuição eficiente dos recursos
naturais, respeitando uma escala apropriada. A visão economicista da sustentabilidade passa
pelos conceitos de sustentabilidade forte e fraca. Ambas são baseadas na preservação do capital
natural35 para as gerações futuras. Para a sustentabilidade forte, o capital natural deve ser mantido
e não reduzido, enquanto na sustentabilidade fraca se admite a troca de diferentes tipos de
capitais, desde que seja mantido o seu estoque constante.
Dentro dessa visão, o capital natural não deve ser tratado como independente do sistema
todo, mas sim como parte integrante do mesmo. A integração entre meio ambiente e economia
deve ser atingida dentro do processo decisório de diferentes setores, tanto na esfera
governamental, como fora dela. Dessa forma é possível alcançar a sustentabilidade do sistema.
O problema em se pensar a sustentabilidade pela perspectiva econômica está no fato dessa
ótica negligenciar os componentes sociais e ambientais de um sistema sustentável. A visão
econômica não leva em consideração a perda de bem-estar da sociedade devido à escassez de um
recurso natural, desde que ele possa ser substituído por outro de igual valor. Sobre esse ponto,
Bellen argumenta que “existe uma crescente percepção de que é necessário considerar no
35
O capital natural é constituído pela base de recursos naturais, renováveis e não-renováveis, pela biodiversidade, e pela
capacidade de absorção de dejetos dos ecossistemas. (BELLEN, 2005, p. 35).
70

planejamento, nas políticas e nas ações [econômicas] de longo prazo aspectos não monetários,
demográficos, sociais e ambientais para realmente se alcançar a sustentabilidade.” (2005, p. 36).
Na perspectiva social, a sustentabilidade é vista como um processo de desenvolvimento
que leve a um crescimento estável com distribuição equitativa de renda, ocasionando a
diminuição das diferenças entre os vários níveis de classes e a melhoria das condições de vida da
população de um país. O problema em se olhar a sustentabilidade somente pela ótica social está
no fato de que o desenvolvimento com distribuição de renda pode ser alcançado, sem que com
isso haja a preservação ambiental necessária. É o caso dos países desenvolvidos, onde o alto grau
de desenvolvimento alcançado foi obtido através de um modelo de produção extremamente
poluidor e intensivo no uso dos recursos naturais.
Pela perspectiva da sustentabilidade ambiental, a principal preocupação é a dos impactos
sobre o meio ambiente decorridos da atividade humana. A sustentabilidade seria alcançada pela
utilização dos recursos naturais, mantendo sua deterioração em um nível mínimo. “Deve-se
reduzir a utilização de combustíveis fósseis, diminuir a emissão de substâncias poluentes, adotar
políticas de conservação de energia e de recursos, substituir recursos não renováveis e aumentar a
eficiência em relação aos recursos utilizados.” (SACHS, 1997, apud. BELLEN, 2005, p. 37).
A sustentabilidade ambiental está diretamente ligada ao conceito de sustentabilidade forte
e muito forte. O problema em se adotar somente a ótica ambiental, é que esta não se preocupa
com o bem-estar imediato da sociedade. É uma visão do crescimento econômico zero, como a
elaborada antes da Conferência de Estocolmo. Esse conceito não permitiria aos países em
desenvolvimento alcançarem o patamar de progresso do grupo de países desenvolvidos e
imputaria à periferia a condenação de sempre conviver com bolsões de pobreza, o que vai contra
o conceito de sustentabilidade social.
Além da distinção entre sustentabilidade forte e fraca e das dimensões que esta assume no
nível ambiental, social e econômico, existe o debate sobre o caráter objetivo ou subjetivo do
conceito de sustentabilidade. Na verdade, nos últimos anos, a palavra sustentabilidade passou a
ser usada com sentidos tão diferentes que se distanciou da sua origem, bem anterior à atual
aplicação no conceito de desenvolvimento. A fraqueza, a imprecisão e a ambivalência que o
conceito de sustentabilidade ganhou ao longo do tempo, foram as razões de sua força e aceitação
quase total. Sobre isto Bellen afirma que,
Todas as definições e ferramentas relacionadas à sustentabilidade devem considerar o fato de que
não se conhece totalmente como o sistema [ecológico] opera. Pode-se apenas descobrir os
71

impactos ambientais decorrentes de atividades e a interação com o bem-estar humano, com a


economia e o meio ambiente. Em geral se sabe que o sistema interage entre as diferentes
dimensões mas não se conhece especificamente o impacto dessas interações. (2005, p.38).

Apesar de toda a discussão sobre sustentabilidade, ainda não se sabe qual o seu verdadeiro
poder de alcance, apenas se sabe que é necessário manter o nível de capital natural para que as
futuras gerações possam se desenvolver. Para isso é importante que se aumente a produtividade
dos recursos naturais, tanto renováveis quanto não-renováveis. A definição de sustentabilidade
atualmente estaria no uso racional dos recursos escassos e no processo de reaproveitamento
desses recursos. Aumentar a produtividade de um recurso pode ser um bom substituto para a
utilização de maior quantidade desse recurso. A questão central da sustentabilidade residiria
então no fato de que o investimento deve ser feito no fator limitante, no caso o capital natural.
Segundo José Eli da Veiga,
quanto mais escasso se torna o capital natural remanescente, mais complementar ele se mostra. A
captura de peixes, por exemplo, não é limitada pelo número de embarcações cada vez mais
eficientes, mas sim pelos cardumes que restam. Também não é o numero de serrarias que restringe
o corte de madeira, mas as florestas que continuam de pé. O óleo cru bombeado não se limita pela
capacidade construída de extração, mas pelos estoques de petróleo remanescentes. E a capacidade
da atmosfera em continuar servindo como depósito de dióxido de carbono talvez ainda venha a ser
mais limitante que os próprios estoques de combustíveis fósseis. (2008, p. 143)

Esse movimento de uso mais consciente dos recursos passa pela inversão da lógica
comercial do mundo globalizado. O que se propõe é sair da ideologia da integração econômica
global do livre comércio, do livre movimento de capitais e do crescimento promovido por
exportações a uma direção mais nacionalista que busque desenvolver a produção doméstica para
mercados internos como primeira opção, recorrendo ao comércio internacional apenas quando
este for mais eficiente. (VEIGA, 2008, p. 144)
O globalismo não contribui, em geral, para um real aumento da produtividade dos
recursos naturais. O que se tem é a dilapidação desses recursos que são exportados em grande
quantidade pelos países em desenvolvimento e entram como ganhos no PIB desses países, mas
que na verdade podem ser configurados como uma perda de riqueza para a nação. A globalização
até o momento proporcionou uma competição que reduz padrões salariais e externaliza custos
sociais e ambientais mediante exportação de capital natural a preços baixos, enquanto os
classifica como renda.
Para se chegar a um consenso sobre o que é a sustentabilidade em termos globais, deve-se
levar em consideração a força de interesses que serão contrariados, principalmente nos países
mais ricos. Contrariamente às projeções e às previsões quantitativas, a sustentabilidade deve ser
72

analisada de forma qualitativa, procurando lidar com as mais prováveis mudanças de rumo no
planeta.
A sustentabilidade é o carro-chefe do processo de institucionalização que insere o meio
ambiente na agenda política internacional, além de fazer com que esta dimensão passe a permear
a formulação e a implantação de políticas públicas em todos os níveis nos Estados nacionais e
nos órgãos multilaterais de caráter supranacional.
José Eli da Veiga acrescenta que,
Sendo uma questão primordialmente ética, só se pode louvar o fato da ideia de sustentabilidade ter
adquirido tanta importância nos últimos vinte anos, mesmo que ela não possa ser entendida como
conceito científico. A sustentabilidade não é, e nunca será, uma noção de natureza precisa,
discreta, analítica ou aritmética, como qualquer positivista gostaria que fosse. Tanto quanto a ideia
de democracia – entre muitas outras ideias tão fundamentais para a evolução da humanidade –, ela
sempre será contraditória, pois nunca poderá ser encontrada em estado puro. (2008, p. 165)

No caso da sustentabilidade, o debate científico está bem menos amadurecido do que o


debate sobre a ideia de desenvolvimento. O consenso obtido até o momento é que a humanidade
precisa evitar a degradação da biosfera e a destruição da diversidade biológica e ecológica, a fim
de evitar a sua própria destruição. Trata-se de obter qualidade de vida para o homem e para a
biosfera que não seja conseguida principalmente à custa das gerações futuras. Abarca a
sobrevivência da diversidade cultural humana e também de muitos dos organismos com os quais
ela divide o planeta, assim como as comunidades que eles formam.
Para Veiga, uma sustentabilidade maior significaria uma estabilização da população, na
maioria das regiões; práticas econômicas que encorajem a cobrança de custos reais; crescimento
econômico em qualidade ao invés de quantidade; e vida a partir dos dividendos da natureza e não
do seu capital. Seria necessária a adoção de tecnologias com baixo impacto ambiental e a riqueza
deveria ser distribuída de forma mais equitativa.
Além disso, para haver sustentabilidade, são imprescindíveis instituições globais e
transnacionais mais fortes para lidar com os problemas mundiais mais urgentes e um público
melhor informado sobre os desafios múltiplos e interligados do futuro. E o mais importante e
difícil de ser alcançado: o predomínio de atitudes que favoreçam a unidade na diversidade, isto é,
a cooperação e competição não violenta entre tradições culturais diferentes e Estados-nações,
assim como a coexistência com os organismos que compartilham a biosfera com os seres
humanos.
73

2.3 Definição de desenvolvimento sustentável

O termo “desenvolvimento sustentável” foi oficialmente cunhado com a elaboração do


Relatório Brundtland, em 1987, sendo definido como o desenvolvimento que satisfaz as
necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas
próprias necessidades.
Este é um termo que necessita das definições de outros dois termos – desenvolvimento e
sustentabilidade – para o seu entendimento. Graças a isso, existem diversas definições para
desenvolvimento sustentável, adotando as diferentes visões de desenvolvimento e
sustentabilidade de acordo com os mais diferentes critérios políticos, econômicos e sociais, o que
provoca uma grande indefinição do conceito de desenvolvimento sustentável, não se sabendo
exatamente o que o termo significa.
De acordo com José Eli da Veiga,
A noção de desenvolvimento sustentável, de tanta importância que ganhou nos últimos anos,
procura vincular estreitamente a temática do crescimento econômico com a do meio ambiente.
Para compreender tal vinculação, são necessários alguns conhecimentos fundamentais que
permitem relacionar pelo menos três âmbitos: o dos comportamentos humanos, econômicos e
sociais, que são objeto da teoria econômica e das demais ciências sociais; o da evolução da
natureza, que é objeto das ciências biológicas, físicas e químicas; o da configuração do território,
que é objeto da geografia humana, das ciências regionais e da organização do espaço. É evidente
que esses três âmbitos se relacionam, interagem e se sobrepõem, afetando-se e condicionando-se
mutuamente. (2008, p. 187)

Um dos fatores preocupantes para o desenvolvimento sustentável é a manipulação do


termo de acordo com o grupo de interesse que o utiliza. Cada grupo social incorpora um conteúdo
ao conceito, para que este possa se encaixar em seus propósitos. Para certos setores do
movimento ambientalista desenvolvimento sustentável significa uma “proteção do verde”
independente da realidade social envolvida. Para os empresários trata-se do desenvolvimento que
possa garantir a “sustentabilidade da taxa de lucro” baseada, sobretudo, na criação de
equipamentos contra poluição. Para alguns governos, constitui uma forma de solicitação de
empréstimos internacionais a organismos financeiros que foram obrigados a introduzir as
variáveis ambientais em seus critérios de aprovação de projetos. De acordo com Wagner Costa
Ribeiro, o conceito de desenvolvimento sustentável
tornou-se referência para inúmeros trabalhos e interesses os mais diversos. Se de um lado existe os
que acreditam que o planeta em que vivemos é um sistema único que sofre consequências a cada
alteração de um de seus componentes, de outro, está os que acreditam que o modelo hegemônico
pode ser ajustado à sustentabilidade. Esse é o debate: manter as condições que permitam a
74

reprodução da vida humana no planeta, ou manter o sistema, buscando a sua sustentabilidade.


(2001)

Tendo como princípio conciliar crescimento e conservação ambiental, o conceito de


desenvolvimento sustentável, por ser um termo vago, passou a servir a diferentes interesses. De
nova ética do comportamento humano, passando pela proposição de uma revolução ambiental até
ser considerado um mecanismo de ajuste da sociedade capitalista (capitalismo soft), o
desenvolvimento sustentável tornou-se um discurso poderoso, promovido por organizações
internacionais, empresários e políticos, repercutindo na sociedade civil internacional e na ordem
ambiental internacional.
O fato de existirem diferentes concepções sobre a ideia de desenvolvimento sustentável
possivelmente explica as diferentes versões para o conceito. Essa variedade de concepções faz
com que este conceito deixe de ser operacionalizado, prejudicando a implementação dos
processos para um novo modelo de desenvolvimento. Daí surge a necessidade de se definir
concretamente o conceito, verificando criticamente o seu significado e as dimensões que ele
abrange. De acordo com Bellen,
Os objetivos do desenvolvimento sustentável desafiam as instituições contemporâneas. Elas têm
reagido às mudanças globais relutando em reconhecer que este processo esteja realmente
ocorrendo. As diferenças em relação ao conceito de desenvolvimento sustentável são tão grandes
que não existe um consenso sobre o que deve ser sustentado e tampouco sobre o que o termo
sustentar significa. Consequentemente, não existe consenso sobre como medir a sustentabilidade.
Infelizmente, [...] sem uma definição operacional minimamente aceita torna-se impossível traçar
estratégias e acompanhar o sentido e a direção do progresso. (2005, p.38).

Os programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente e para o Desenvolvimento –


PNUMA e PNUD – adotam um conceito de desenvolvimento sustentável baseado na
modificação da biosfera e na aplicação de recursos para atender às necessidades humanas e
aumentar a sua qualidade de vida. De acordo com esse conceito, as Nações Unidas recomendam
que a melhor forma de assegurar a sustentabilidade do desenvolvimento está em se considerar os
fatores social, ecológico e econômico, dentro de uma perspectiva de curto, médio e longo prazo.
A definição de desenvolvimento sustentável adotada pelas Nações Unidas segue os
conceitos definidos tanto no Relatório Brundtland quanto na Agenda 21, documento assinado na
Conferência do Rio, que reafirma a necessidade de se desenvolver das gerações atuais sem se
descuidar do uso dos recursos para as gerações futuras. Desde a criação do Relatório Brundtland,
ocorre o processo de legitimação e institucionalização normativa da expressão “desenvolvimento
sustentável”. Este foi caracterizado por ser um conceito político e amplo para o progresso
econômico e social.
75

De acordo com Hans Michael van Bellen, a definição de desenvolvimento sustentável


contém dois conceitos-chave: a necessidade, referindo-se particularmente às necessidades dos
países em desenvolvimento, e a ideia de limitação, imposta pelo estado da tecnologia e de
organização social para atender às necessidades do presente e do futuro. (2005, p. 24).
Para a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, os objetivos críticos
que derivam do conceito de desenvolvimento sustentável são: crescimento renovável; mudança
de qualidade do crescimento; satisfação das necessidades essenciais por emprego, comida,
energia, água e saneamento básico; garantia de um nível sustentável de população; conservação e
proteção da base de recursos; reorientação da tecnologia e gerenciamento do risco; reorientação
das relações econômicas internacionais. (BARONI, 1992, p. 16)
A formulação da definição de desenvolvimento sustentável é de extrema importância, pois
ela irá permear os indicadores de sustentabilidade, apontado a importância de cada componente
dentro do indicador. O conceito de desenvolvimento sustentável como o adotado pelas Nações
Unidas dá uma maior ênfase à questão social. Seu objetivo primeiro seria alcançar um nível de
bem-estar econômico razoável e equitativamente distribuído que pode ser perpetuamente
continuado por muitas gerações humanas. Isto implica usar os recursos naturais de maneira a não
degradá-los ou eliminá-los, ou diminuir sua utilidade para as gerações futuras.36
O desenvolvimento sustentável pode ser definido como um padrão de transformações
econômicas estruturais e sociais que otimizam os benefícios sociais e econômicos disponíveis no
presente, sem destruir o potencial de benefícios similares no futuro. Outra definição de
desenvolvimento sustentável pode ser encontrada pelo contexto dos recursos naturais (excluindo
os não-renováveis) e ambientais: o uso feito desses insumos no processo de desenvolvimento
deve ser sustentável ao longo do tempo. Se aplicarmos a ideia aos recursos naturais, a
sustentabilidade deve significar que um dado estoque de recursos (árvores, qualidade do solo,
água etc.) não pode declinar.37 Além dessas definições, existe aquela que é fundamentada pela
noção de não declínio do bem-estar per capita, fator que evidencia o seu claro apelo ao critério de
equidade entre gerações.38

36
GOODLAND, Robert & LEDOC, G. "Neoclassical Economics and Principles of Sustainable Development". Ecological
Modelling, 38, 1987.
37
MARKANDYA, Anil & PEARCE, David. "Natural Environments and the social rate of discount". Project APPRAISAL, 3(1),
1988.
76

S. C. Herculano, afirma que o desenvolvimento sustentável tem dois significados: é uma


expressão que vem sendo usada como epígrafe, senha e resumo da boa sociedade humana. Neste
sentido, a expressão ganha foros de um substituto pragmático, seja da utopia socialista tornada
ausente, seja da proposta de introdução de valores éticos na racionalidade capitalista meramente
instrumental. Na sua segunda acepção, desenvolvimento sustentável é um conjunto de
mecanismos de ajustamento que resgata a funcionalidade da sociedade capitalista.
(HERCULANO, 1992 p. 30 apud. RIBEIRO, 2001).
A variabilidade de definições de sustentabilidade permite que se definam conceitos de
desenvolvimento sustentável desde a noção pura de defesa do meio ambiente até a noção de
sustentabilidade fraca onde a depleção de um recurso pode ser substituída pela obtenção de um
bem que amplie o desenvolvimento de uma nação. Além disso, ainda há, dentro da definição de
sustentabilidade, componentes que não são usualmente mensurados como os componentes
históricos e culturais.
Alguns autores confundem desenvolvimento sustentável com sustentabilidade ecológica –
que tem a ver somente com a capacidade dos recursos se reproduzirem ou não se esgotarem –;
outros reconhecem que deve haver limites para o crescimento econômico porque ele é
insustentável do ponto de vista dos recursos; e outros substituem a ideia tradicional do
desenvolvimento pelo desenvolvimento sustentável, onde a incorporação do adjetivo sustentável
à ideia tradicional do desenvolvimento reconhece implicitamente que este não foi capaz de
aumentar o bem-estar e reduzir a pobreza, como era sua proposta.
Arthur L. Dahl, autor citado por Bellen, afirma que “a definição de desenvolvimento
sustentável elaborada no Relatório Brundtland é muito geral e não implica responsabilidade
específica a respeito das dimensões do desenvolvimento sustentável e nem em relação às
gerações futuras.” (2005, p. 27). Para ele, um dos maiores problemas do conceito é o fato de que
a sociedade necessita saber aonde quer chegar para depois poder medir se esses objetivos estão
sendo alcançados. Para atingir o objetivo do desenvolvimento sustentável deve-se primeiramente
ter uma noção clara e compreensível do seu conceito. Ou seja, o formulador de política deve
conseguir assimilar o conceito de desenvolvimento sustentável ao mesmo tempo em que deve
transmitir esse conceito de maneira clara para a sociedade.

38
PEZZEY, John. Economic Analysis of Sustainable Growth and Sustainable Development. Washington, DC, Banco Mundial,
Departamento de Meio Ambiente, relatório de trabalho nº 15, maio, 1989.
77

Numa visão mais simplificada, desenvolvimento sustentável quer simplesmente dizer um


desenvolvimento que pode ser continuado, o que suscita uma nova pergunta sobre o que é
desenvolvimento. Para uns, é número do PIB, para outros inclui algum fenômeno socialmente
desejado. O que deve estar claro, porém, é que o desenvolvimento sustentável não pode ser
confundido com uma receita para os países saírem da pobreza, uma vez que isto pode ser
alcançado sem a preocupação em reduzir desperdícios no uso dos recursos, indo de encontro ao
propósito da sustentabilidade.
Na definição clássica de desenvolvimento sustentável, adotada pelas Nações Unidas,
existe essa contradição que o assemelha a interpretação de desenvolvimento como erradicação da
pobreza. Isso pode acontecer devido a crença na tecnologia, onde o desenvolvimento sustentável
estaria limitado pelo estágio atual da tecnologia e da organização social, no tocante aos recursos
ambientais. O problema dessa definição está em afirmar que tanto a tecnologia quanto a
organização social poderiam ser geridas e aprimoradas a fim de proporcionar uma nova era de
crescimento econômico, sem se preocupar com a capacidade da biosfera de absorver os efeitos da
atividade humana.
Tal pensamento não dissocia a noção de crescimento da noção de desenvolvimento e não
leva em conta os preceitos da sustentabilidade ambiental, onde os recursos se mantém escassos,
embora haja evolução tecnológica. Margaret Baroni faz uma crítica ao conceito clássico de
desenvolvimento sustentável, adotado pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o
desenvolvimento:
Embora haja o reconhecimento, pela Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, de que o crescimento até hoje comprometeu a possiblidade do desenvolvimento
para as gerações futuras, sua visão normativa continua sendo a da busca do crescimento
econômico e do fim da pobreza. (1992, p. 18)

O conceito de desenvolvimento sustentável, defendido tanto no Relatório Brundtland


quanto na Agenda 21, se baseia em dois pilares: a prioridade na satisfação das necessidades das
camadas mais pobres da população e as limitações que o estado da tecnologia e da organização
social impõe ao meio ambiente. A proposta do Relatório Brundtland, a partir de sua interpretação
sobre o que seja a essência do desenvolvimento sustentável, passa pela eliminação da pobreza e
pela crença de que a conservação e a elevação da base de recursos possa garantir que a
eliminação da pobreza seja permanente.
Ao assumir as limitações que a tecnologia e a organização social impõem sobre o meio
ambiente, o conceito de desenvolvimento sustentável se torna um conceito dinâmico, pois a
78

sociedade e o meio ambiente estão em contínua transformação. As tecnologias, culturas e valores


se modificam constantemente e uma sociedade sustentável deve levar em consideração essas
transformações. De acordo com Hardi e Zdan,
desenvolver significa expandir ou realizar as potencialidades, levando a um estágio maior ou
melhor do sistema. O desenvolvimento deve ser qualitativo e quantitativo, o que o diferencia da
simples noção de crescimento econômico. O desenvolvimento sustentável, ainda não é um estado
fixo, harmonioso; ao contrário, trata-se de um processo dinâmico de evolução. [...] algumas
características do sistema devem ser preservadas para assegurar a continuidade da vida. [...] o
sistema é global e apenas um ator [...] não pode ser considerado sustentável em si mesmo: uma
parte do sistema não pode ser sustentável se outras não o são. (1997, apud. BELLEN, 2005, p.31).

A percepção de desenvolvimento sustentável, adotada pelas Nações Unidas, parte do


princípio de que os modelos de desenvolvimento adotados tanto nos países desenvolvidos como
nos países em desenvolvimento são inviáveis, pois ambos seguem padrões de crescimento
econômico que não são sustentáveis a longo prazo. Além disso, introduz uma dimensão ética e
política de que o desenvolvimento é um processo de mudança social que implica transformações
nas relações econômicas e sociais.
Entre as principais estratégias definidas pelo Relatório Brundtland, está a necessidade de
se relançar o crescimento nos países em desenvolvimento, a fim de modificar a qualidade desse
crescimento para se levar em conta o decréscimo do estoque de recursos naturais de cada país e a
de aumentar a resistência do desenvolvimento a crises. A conservação dos ecossistemas e dos
recursos naturais se tornaria condição básica para o desenvolvimento sustentável de acordo com o
relatório. Segundo Antônio Carlos S. Diegues,
Para que [a] conservação [ecológica] se realize são necessárias algumas condições básicas, além
de outras de caráter social, cultural e político. A primeira é a de que o desenvolvimento sustentável
deve prever a manutenção dos processos ecológicos fundamentais dos quais depende a
sobrevivência humana. [...] A outra condição é a preservação das diversidades genéticas e
biológicas. [...] O terceiro pressuposto ecológico do desenvolvimento sustentável é a utilização
sustentada das espécies e dos ecossistemas. Nesse sentido, é importante, ainda que difícil, se
definir a capacidade de sustentação ou carga dos vários ecossistemas naturais utilizados pela
sociedade, para que a reprodução dos processos e funções ecológicas possa continuar acontecendo.
(1992, p. 26)

Um dos aspectos positivos da argumentação que está por trás do conceito de


desenvolvimento sustentável é a tentativa de resolver as contradições entre o crescimento
econômico, a distribuição de renda e a necessidade de conservar os recursos ambientais, não só
em benefício das gerações atuais, mas também das gerações futuras. Assim, surge a necessidade
de uma nova ética, diferente daquela subjacente ao crescimento econômico puro, na qual a
natureza deve ser subjugada a qualquer preço, expandindo essa dominação para as relações
sociais.
79

A nova ética que surge com o conceito de desenvolvimento sustentável baseia-se, por um
lado na noção de convivialidade e, por outro, no abandono da perspectiva antropocêntrica para
uma perspectiva mais global, biocêntrica. Novos paradigmas sociais que se confrontam com os
atuais estariam em curso através da implementação do desenvolvimento sustentável. O quadro a
seguir mostra a diferença entre os dois paradigmas.

Paradigma social dominante X Paradigma da ecologia profunda

Paradigma social dominante Paradigma da ecologia profunda

Harmonia com a natureza. Natureza


Domínio sobre a natureza, meio constituída por seres vivos com
ambiente como recurso direitos à existência independente
de seu valor de uso
Objetivos não-
Objetivos materiais/crescimento
materiais/sustentabilidade
econômicos
ecológica
Recursos naturais ilimitados Recursos finitos
Soluções baseadas Soluções adaptadas a cada situação
exclusivamente na tecnologia e ecossistema. Necessidade
avançada/Consumismo básica/reciclagem
Centralização/Grande escala Descentralização/Pequena escala
Autoritarismo/Estruturas Estruturas
repressivas democráticas/participação social
Quadro 5
Fonte: DIEGUES, Antônio Carlos S. Desenvolvimento Sustentável ou Sociedades Sustentáveis: da
crítica aos modelos aos novos paradigmas. São Paulo em Perspectiva. nº 6, vol. 2. São Paulo Jan/Jul.
1992. p. 27

Várias críticas sobre o desenvolvimento sustentável e sua aplicabilidade surgiram ao


longo do tempo. Redclift (1987, apud. DIEGUES, 2008, p. 27) critica a proposta do Relatório
Brundtland por não ter dado ênfase às condições internacionais que o desenvolvimento
sustentável enfrentaria. Segundo o autor, a proposta ignora as relações de forças internacionais,
os interesses dos países industrializados em dificultar o acesso dos países em desenvolvimento à
tecnologia, as relações desiguais no comércio entre os países e a oposição de multinacionais a
propostas tecnológicas contrárias aos seus interesses globais. Além disso, o relatório não leva em
80

conta as contradições internas dos países em desenvolvimento, que os impede de atingir o


desenvolvimento sustentável.
A segunda crítica de Redclift está na crença nas forças de mercado para solucionar os
problemas ambientais. Nesse sentido, o Relatório Brundtland adotou uma postura próxima da
economia neoclássica, para a qual os problemas ambientais são considerados externalidades nos
projetos de desenvolvimento. Ele defende a necessidade do planejamento como instrumento para
resolver as contradições entre o crescimento econômico e a conservação do meio ambiente. No
entanto, essas questões não são somente técnicas, mas também políticas e dizem respeito a visões
e interesses dos vários grupos que compõem a sociedade, que possuem interesses divergentes
sobre o acesso e o uso dos recursos ambientais.
Para Antônio Carlos S. Diegues, existe a necessidade de se pensar o problema global do
desenvolvimento sustentável sob a perspectiva de sociedades sustentáveis. Isso significaria a
estruturação de cada sociedade em termos de sustentabilidade própria, segundo suas tradições
culturais, seus parâmetros próprios e sua composição étnica específica. Essa forma de divisão do
desenvolvimento sustentável permitiria a cada sociedade escolher e definir seus padrões de
produção e consumo, bem como o de bem-estar a partir de sua cultura, de seu desenvolvimento
histórico e de seu ambiente natural.
Deixa-se de lado o padrão das sociedades industrializadas, enfatizando-se a possibilidade
de existência de uma diversidade de sociedades sustentáveis, desde que pautadas pelos princípios
básicos da sustentabilidade ecológica, econômica, social e política. Para existir uma sociedade
sustentável é necessário que se tenha o enfoque na sustentabilidade ambiental, política econômica
e social, como um processo e não como um estágio final. Isso requer um sistema político que
tenha a capacidade de ser mutável de acordo com as contingências.
Apesar de ser possível direcionar o desenvolvimento para que este seja mais sustentável,
ainda não é possível definir precisamente as condições de sustentabilidade de um determinado
desenvolvimento. O problema está na incapacidade de se captar precisamente a dinâmica da
sustentabilidade humana e ambiental. Sobre isto, Bellen afirma que, “um dos princípios que está
por trás de qualquer política que promova o desenvolvimento sustentável é que o
desenvolvimento implica, em menor ou maior grau, alguma forma de degradação do ambiente”
(2005, p. 33).
81

O grande paradoxo do desenvolvimento sustentável é manter a sustentabilidade, uma


noção das ciências da natureza, com o permanente avanço na produção exigida pelo
desenvolvimento, cuja matriz está na sociedade. Se levarmos em conta o desenvolvimento
sustentável como um conjunto de valores sociais desejáveis para as nações, este deveria incluir:
aumentos na renda real per capita; melhora no nível de saúde; melhora educacional; acesso aos
recursos; distribuição de renda mais justa; e aumentos nas liberdades básicas, como componentes
da sustentabilidade econômica e social, somada à sustentabilidade ambiental, que restringe a
possibilidade de crescimento econômico, ao racionalizar o uso dos recursos.
Dependendo da definição de sustentabilidade adotada, a meta de desenvolvimento a se
alcançar será diferente. Essa meta poderá ser indicada ou até mesmo direcionada através das
aferições dos indicadores de desenvolvimento sustentável, que em geral são formados por
composições estatísticas que fornecem uma visão quantitativa do conceito de desenvolvimento
sustentável adotado. A seguir é explicitada a definição conceitual dos indicadores de
desenvolvimento sustentável, mostrando a sua elaboração e sua composição.

2.4 Os Indicadores de desenvolvimento sustentável

Para se orientar uma economia, canalizando seus esforços produtivos a fim de que se
consiga obter os resultados esperados, é necessário construir instrumentos de avaliação desses
resultados. Muitas vezes os resultados produtivos alcançados pelos países não refletem o real
aumento de riqueza e bem-estar de sua população. Um exemplo claro deste fenômeno é a
medição da exportação de recursos naturais, que aparece como aumento do PIB nas contas
nacionais, mas que na realidade, mostra a venda de recursos naturais herdados, que o país não
teve de produzir e que não vai poder repor, e, portanto, pode ser considerada como
descapitalização, ou aumento da riqueza imediata à custa das dificuldades futuras.
Indicadores nada mais são do que uma forma quantitativa de informar sobre o progresso
em direção a uma meta específica. Eles também podem ser entendidos como um recurso que
deixa mais perceptível um fenômeno que não seja detectável de imediato. Segundo Gallopin,
A mais importante característica do indicador, quando comparado com os outros tipos ou formas
de informação, é a sua relevância para a política e para o processo de tomada de decisão. Para ser
representativo, o indicador tem de ser considerado importante tanto pelos tomadores de decisão
quanto pelo público. (1996, apud. BELLEN, 2005, p. 42).
82

A metodologia para se medir o desenvolvimento era restrita à medição do PIB, obtida


pelo sistema de contas nacionais, elaborado ainda na década de 1950 no quadro das Nações
Unidas. Somente a partir de 1990, com as visões de Amartya Sen e a metodologia dos
Indicadores de Desenvolvimento Humano (IDH), houve uma inversão radical nesse processo. O
social deixa de ser visto como um meio para assegurar objetivos econômicos; pelo contrário, o
econômico passa a ser visto como um meio para melhorar a qualidade de vida das pessoas.
O bem-estar humano é um dado mais difícil de se medir do que a obtenção de riqueza por
parte de um país porque dentro dele estão inseridas variáveis qualitativas e não apenas
quantitativas. Além disso, deve-se levar em consideração parâmetros econômicos, sociais,
culturais e ambientais. Um indicador de desenvolvimento sustentável pode se basear em todos
esses parâmetros ou em apenas alguns deles.
É consenso que uma política de desenvolvimento sustentável não é possível sem
indicadores. Entretanto, os obstáculos para a criação desses indicadores passam por parâmetros
de conceituação, implementação e monitoramento de sistemas locais, nacionais ou internacionais.
A dificuldade em se implantar um indicador de desenvolvimento sustentável está na sua aceitação
perante toda a comunidade global.
O grande desafio para se criar um indicador de desenvolvimento sustentável é chegar a
um consenso sobre os meios de avaliar e medir as percepções objetivas – e não subjetivas – do
bem-estar, atribuindo valores a elas, como foi feito no caso das medidas de educação, saúde e
padrões de vida do IDH. Para esse indicador ser tomado como base, ele precisaria possuir o status
que o PIB goza hoje dentro da sociedade. Sobre esse assunto, Anne Louette afirma que
é bem verdade que a atual falta de conhecimento objetivo sobre os ecossistemas impede o
surgimento de um índice de desenvolvimento que também inclua a dimensão ambiental. O bem-
estar é evidentemente difícil de ser medido, mas a realidade é que, enquanto não forem adotadas
formas aceitas e generalizadas de medir os nossos recursos naturais, o bem-estar e os resultados da
utilidade social de nossas atividades, não teremos como formular e avaliar nem políticas públicas,
nem privadas [de desenvolvimento sustentável]. (2009, p. 20)

Existe uma grande dificuldade em se tentar monetizar os bens públicos, tais como a água
e o ar, o esgotamento de recursos naturais pela exploração predatória, e a degradação do meio
ambiente por meio de processos produtivos poluidores (externalidades negativas que atinjam
meios como solo, ar e água). Tal tarefa é imprescindível para que seja possível planejar um
desenvolvimento que não vise restritamente à dimensão econômica. Portanto, trata-se da tentativa
de evidenciar a interdependência de variáveis econômicas e socioambientais no modelo produtivo
e de desenvolvimento econômico adotado.
83

A necessidade de indicadores para medir o desenvolvimento sustentável surge com a


formulação da Agenda 21 e está expressa nos seus capítulos 8 e 40, tendo por objetivo
transformar o desenvolvimento sustentável em uma meta global aceitável. Com a assinatura da
Agenda 21, cento e setenta e oito países concordaram em corrigir distorções geradas por uma
avaliação exclusivamente econômica do PIB. Para isto, as nações deveriam somar ao cálculo do
PIB dados sobre recursos socioambientais e subtrair os dados de atividades predatórias e
desperdício de recursos, entre outras distorções. Só assim seria possível definir padrões de
sustentabilidade e desenvolvimento que incluíssem aspectos econômicos, sociais, e ambientais.
Depois da Conferência do Rio de Janeiro, a Comissão de Desenvolvimento Sustentável
das Nações Unidas (CDS) estipulou um prazo de cinco anos para criar os instrumentos
necessários, aos tomadores de decisão no nível nacional, para medir e avaliar o desenvolvimento
sustentável. Um dos fatores apontados pela Comissão era a necessidade de criar padrões de
referência para medir o progresso da sociedade em direção à sustentabilidade. Bellen argumenta
que “é necessário trabalhar com uma unidade para medir a proximidade em relação a esse
objetivo. Ela deve ser suficientemente ampla para englobar uma gama de fatores que estão
relacionados com a sustentabilidade, como ecológicos, econômicos, sociais, culturais,
institucionais e outros.” (2005, p. 52). Daí o esforço de se formular indicadores que permitam a
medição da sustentabilidade de forma homogênea a nível internacional.
Para formular bons indicadores de desenvolvimento sustentável é necessário
primeiramente conhecer o mecanismo de funcionamento de um indicador. Os melhores
indicadores são aqueles que resumem ou simplificam as informações brutas, de modo que
possam ser entendidos e assimilados tanto pelos formuladores de políticas quanto pela sociedade
em geral. Além disso, é necessário que os indicadores façam com que os fenômenos ocorridos no
mundo real se tornem mais aparentes. Isso é particularmente importante para a questão ambiental,
já que é a partir dos indicadores que se evidencia a correlação da ação humana com a degradação
do meio ambiente.
Os indicadores podem ser quantitativos ou qualitativos. Há uma tendência dos autores em
afirmar que, para a avaliação das experiências de desenvolvimento sustentável, seria importante
se levar em conta mais as variáveis qualitativas, tornando o indicador com um viés qualitativo. O
problema nessa abordagem está na assimilação de tais dados, pois nada garante que não haverá
alguma perda de valor nos dados na hora de calcular o indicador. Entretanto, um indicador
84

somente quantitativo não seria capaz de mostrar toda a abrangência do desenvolvimento


sustentável devido as suas limitações implícitas ou mesmo explícitas.
A maior parte dos indicadores existentes foi criada com um objetivo específico. São
indicadores ambientais, econômicos, sociais, de saúde e não podem ser considerados indicadores
de sustentabilidade em si. Porém, eles possuem um potencial representativo dentro do contexto
do desenvolvimento sustentável. Tais indicadores podem ser agregados na forma de um índice de
sustentabilidade. No quadro abaixo, está esquematizada uma pirâmide de informações, que
representa a trajetória dos dados puros até a formulação de um índice.

Índices

Indicadores

Dados Analisados

Dados Primários

Quadro 6
Pirâmide de informações
Fonte: BELLEN, Hans Michael van. Indicadores de sustentabilidade: Uma
análise comparativa. p. 44

Os índices nada mais são do que a agregação de indicadores de vários tipos, apresentados
de forma simplificada. Os problemas complexos do desenvolvimento sustentável requerem
sistemas interligados, indicadores inter-relacionados ou a agregação de diferentes indicadores.
Daí, explicam-se o surgimento de índices que meçam a sustentabilidade. Devido a essa
complexidade, existem poucos indicadores que lidam especificamente com o desenvolvimento
sustentável, geralmente desenvolvidos com o propósito de entender melhor os fenômenos
relacionados à sustentabilidade.
85

Para Gallopin, “os indicadores de sustentabilidade podem ser considerados os


componentes da avaliação do progresso em relação a um desenvolvimento dito sustentável.”
(1996, apud. BELLEN, 2005, p.45). Ele ainda afirma que, na avaliação de programas de
desenvolvimento sustentável, os indicadores devem ser selecionados em diferentes níveis
hierárquicos de percepção. Essa afirmação imputa a ideia de que diferentes tipos de indicadores
são importantes em diferentes escalas. E a utilização de indicadores em escalas indevidas pode
fazer com que estes percam seu sentido e sua relevância.
Outra questão importante na hora de se avaliar o desenvolvimento sustentável é a
dimensão temporal. Como o ambiente, as tecnologias, o modo de produção e a constituição da
sociedade mudam com o tempo, o desenvolvimento sustentável hoje, pode não o ser no futuro.
Os indicadores devem ter a capacidade de captar as mudanças da sociedade ao longo do tempo a
fim de apontar com precisão a convergência da mesma para a meta de desenvolvimento
sustentável.
Os indicadores de desenvolvimento sustentável podem ser vetoriais ou escalares. De
acordo com Dahl,
um número de indicadores apresentados simultaneamente, mas não agregado, para dar um retrato
das condições ambientais, pode ser denominado um vetor. Um vetor consiste na generalização de
uma variável. Por outro lado, um índice escalar é um simples número gerado de agregação de dois
ou mais fatores. (1997, apud. BELLEN, 2005 p. 46).

Um indicador vetorial seria uma fotografia de momento do desenvolvimento sustentável


numa determinada sociedade, enquanto um indicador escalar apontaria a evolução dos programas
de desenvolvimento sustentável ao longo do tempo, mostrando o caminho seguido por uma
sociedade para atingir a meta estabelecida. Os dois tipos de indicadores são válidos para avaliar o
desenvolvimento sustentável. O primeiro tipo seria mais como uma espécie de alerta para a
sociedade em geral e o segundo para avaliar se a aplicação de uma política específica na área esta
surtindo o efeito desejado. Ou seja, esse tipo de indicador é mais direcionado aos formuladores de
políticas.
Os vetores possuem a vantagem de poder ser expressos graficamente, pois são dados
bidirecionais, têm magnitude e direção. Essa facilidade de se expressar graficamente dá uma
noção mais clara da realidade, bem como torna possível fazer projeções para o futuro. Segundo
Bellen, “vetores que expressem a direção do movimento rumo a uma meta, e a velocidade desse
movimento, podem fornecer uma maneira de ilustrar o conceito de sustentabilidade sem cair em
julgamentos de valor sobre o desenvolvimento.” (2005, p.46). Isso permite aos países definir um
86

modelo de desenvolvimento para uma sociedade futura, bem como relatar onde estão
acontecendo progressos em direção à sustentabilidade e em que taxa.
Além disso, devem-se levar em conta valores qualitativos específicos que estão embutidos
dentro dos indicadores. Eles podem ser implícitos ou explícitos. Os explícitos são aqueles
tomados conscientemente e correspondem a uma parte importante na formulação de um
indicador, mas os valores implícitos também estão incluídos nesse processo de criação. Segundo
Bellen,
Os julgamentos de valor implícitos decorrem de aspectos que não são facilmente observáveis e que
são, na sua maioria, inconscientes e relacionados com as características pessoais e de uma
determinada sociedade (cultura). A sua mensuração afeta de qualquer maneira o processo de
formulação dos indicadores. Existe uma grande diferença entre as diversas esferas em que se mede
a sustentabilidade – mundial ou global, nacional, regional, local ou comunitária –, resultado dos
mais diversos fatores culturais e históricos, que implicam os valores que predominam nessas
esferas. Muito embora não se possa evitar esse aspecto, deve-se reconhecer que ele está sempre
presente e procurar torna-lo o mais explícito possível. (2005, p. 47).

Os indicadores agregados, ou índices, possuem o grande problema de obscurecer


informações que ameaçam a visualização completa da realidade de um sistema, mascarando
alguns setores e realçando outros. Entretanto, a necessidade de indicadores com certo grau de
agregação é imprescindível para o monitoramento da questão da sustentabilidade. Para resolver o
problema da agregação, os dados devem ser estratificados em termos de grupos sociais ou setores
industriais ou ainda distribuição espacial. “A generalização deve atender à regra geral de que o
indicador consiga capturar eventuais problemas de uma maneira clara e concisa.” (BELLEN,
2005, p. 48).
Em relação às suas funções, os indicadores podem ser divididos em dois grupos:
sistêmicos e de performance. Os indicadores sistêmicos são fundamentados em referenciais
técnicos e fornecem um grupo de medidas individuais para as diferentes questões características
do ecossistema e do sistema social, em que muitas variáveis não podem ser quantificadas nem
definidas em termos físicos. Os indicadores de performance são utilizados como ferramentas de
comparação, que incorporam indicadores descritivos e referências a um objetivo político
específico. São os indicadores de performance que fornecem aos formuladores de políticas
informações sobre o alcance das metas estabelecidas.
Alguns sistemas de indicadores foram desenvolvidos para a utilização em escala nacional,
mas uma das barreiras ao seu uso é justamente a heterogeneidade entre as nações. Alguns
elementos essenciais dentro do cálculo dos indicadores como nível de industrialização, estrutura
econômica, espaço geográfico, entre outros diferem muito de país para país. Por esse motivo, a
87

maior parte da pesquisa empírica em torno de indicadores de sustentabilidade se dá em países


mais ou menos homogêneos, como os países da União Europeia, que possuem um grau de
desenvolvimento e um nível de institucionalização parecido.
Para países em desenvolvimento, a pesquisa em torno dos indicadores ainda é incipiente
se levarmos em conta a comparabilidade entre as nações. Os estudos sobre sustentabilidade ainda
ocorrem em âmbito nacional e a comparabilidade das nações é reduzida e prejudicada pelas
disparidades entre os países. Nesse caso é grande a heterogeneidade entre os diversos países em
relação a elementos essenciais específicos.
De acordo com Bellen, “dadas as diferentes interpretações do desenvolvimento
sustentável e as preferências dos diversos membros, um consenso deve ser alcançado na maioria
das questões críticas que afetam a sustentabilidade da comunidade envolvida, para uma pequena
cidade ou uma nação.” (2005, p. 50). Isso nos leva a questão de como são selecionados os
elementos dentro dos indicadores, e para isso existem duas abordagens dominantes: a top-down e
a bottom-up.
A abordagem top-down define tanto o sistema quanto o grupo de indicadores a ser
utilizados, não podendo o tomador de decisão adaptar o sistema às condições locais. Esse método
é utilizado pela maioria dos organismos internacionais como a Comissão de Desenvolvimento
Sustentável das Nações Unidas. A vantagem dessa abordagem é fornecer uma avaliação mais
homogênea e mais válida dos indicadores. A desvantagem está em não levar em conta as
especificidades de cada comunidade e as limitações de recursos naturais.
A abordagem bottom-up é mais utilizada por iniciativas regionais e comunitárias. Ela é
obtida a partir de um processo participativo em que os indicadores são selecionados com a
interferência de diversos atores envolvidos no processo. Sua desvantagem está na limitação à um
pequeno espaço onde possa ser aplicado e a vantagem é a consideração de cada especificidade de
uma dada comunidade.
Para uma avaliação de indicadores no âmbito da comparabilidade de países a abordagem
mais indicada é a top-down, onde será aplicada uma avaliação homogênea de indicadores pré-
estabelecidos. Esses indicadores também têm que ter a capacidade de transformar o conceito de
desenvolvimento sustentável algo operacional. O objetivo deve ser a redução da distância entre o
conceito abstrato e tomada diária de decisão no processo de desenvolvimento.
88

As medições são indispensáveis para que o conceito de desenvolvimento sustentável se


torne operacional. São elas que ajudam os tomadores de decisão e a sociedade em geral a
definirem suas metas de desenvolvimento e permitem avaliar o alcance dos objetivos traçados. A
mensuração também auxilia na escolha entre alternativas políticas e na correção da direção de
uma política, em resposta a uma realidade dinâmica.
Segundo Bellen,
o desenvolvimento sustentável deve ser entendido como desenvolvimento econômico progressivo
e balanceado, aumentando a equidade social e a sustentabilidade ambiental, e os tomadores de
decisão, que atuam nos diferentes níveis de gestão (local, regional, nacional e internacional),
precisam de informações nesse processo. Um dos obstáculos, segundo a própria CDS, é construir
um consenso relativo ao conceito de sustentabilidade para iniciar um projeto de indicadores de
nível nacional. (2005, p. 55).

Para Gallopin,
a função básica e principal dos indicadores de desenvolvimento sustentável é apoiar e melhorar a
política ambiental e o processo de tomada de decisão em diferentes níveis. O maior nível é o
global ou internacional. As convenções internacionais referentes a temas específicos como clima,
biodiversidade, desertificação, são extremamente importantes e os indicadores podem auxiliar e
influenciar no processo decisório, legitimando as próprias convenções. Está mais ou menos claro
que sem indicadores que revelem a necessidade de políticas globais em temas específicos, a
adoção de protocolos internacionais fica muito prejudicada. As agências internacionais têm a
função não apenas de identificar e desenvolver indicadores apropriados, mas também de torná-los
acessíveis perante a comunidade internacional. (1996, apud BELLEN, 2005, p. 58).

Existem várias limitações no uso de indicadores. Uma das principais é a perda de


informação vital ao se agregar inúmeros dados distintos. No mundo real seria necessário mais do
que um indicador para capturar os aspectos mais importantes de um fato ocorrido. Desse modo o
indicador faz uma simplificação da realidade que é útil como medida, mas que deve ser
acompanhada de outras informações para uma análise mais precisa da realidade.
Bellen argumenta que, após analisar alguns métodos que pretendem capturar a
sustentabilidade, a maioria se mostra inadequada para alcançar os propósitos fundamentais na
avaliação da sustentabilidade. (2005, p.60). Os indicadores têm um aspecto ambíguo por serem
importantes e perigosos ao mesmo tempo, já que funcionam como ferramenta e estão
simultaneamente no centro do processo decisório. O indicador não mede precisamente um
sistema atual, mas faz uma aproximação do mesmo, utilizando informações passadas e
projetando um cenário aproximado. É difícil apurar sua tendência, por isso o indicador pode ser
deliberada ou acidentalmente desviado.
Outro problema dos indicadores é a falta de mensuração para dados qualitativos que
podem ser importantes na composição do índice. Os indicadores também podem levar a
sociedade a uma percepção falsamente positiva da realidade quando são mal formulados ou mal
89

utilizados, ou ainda baseados em modelos não confiáveis. Daí a necessidade de se trabalhar com
indicadores reconhecidos internacionalmente e que tenham um aval da comunidade científica.
Bellen ainda afirma que “outra questão importante a ser observada é a ausência de
indicadores não triviais na dimensão institucional do desenvolvimento sustentável. Esse aspecto
pode ser considerado atualmente um dos maiores problemas nos projetos relativos à indicadores
de sustentabilidade.” (2005, p. 70).
Apesar de todos os problemas na mensuração dos indicadores, existem diversas tentativas
para avaliar o desenvolvimento sustentável dentro de suas várias dimensões. Seguindo esse
raciocínio, foram elaborados alguns sistemas para integrar as diversas dimensões da
sustentabilidade.
Esses tipos de sistema são de suma importância para a avaliação correta do
desenvolvimento de uma região e também para se obter uma analise confiável do estágio de
desenvolvimento sustentável de cada nação. A formulação de uma boa política para o
desenvolvimento passa pela escolha de um sistema de indicadores que congregue as quatro
dimensões do desenvolvimento sustentável: social, econômica, ambiental e institucional.
Para se colocar em prática o conceito de desenvolvimento sustentável, deve-se
compreender melhor os processos humanos e naturais que estão relacionados com os problemas
ambientais, econômicos e sociais. Assim, a mensuração de um indicador deve estar focada nas
atividades que criam problemas tanto no ecossistema local quanto no ambiente global, na
economia nacional e nos indivíduos.
Além disso, deve-se levar em conta as mudanças resultantes no ecossistema, na economia
e na sociedade tanto a curto quanto a longo prazos, sejam elas reversíveis ou não, e as respostas
do sistema político, sua extensão e seu impacto. De acordo com Bellen,
a agregação e a utilização de índices compostos são elementos importantes para realizar
julgamentos de valor e comparações entre as principais tendências políticas de desenvolvimento
sustentável. O problema da agregação dos dados está relacionado a como juntar variáveis que são
expressas em diferentes unidades de mensuração. [...] Em princípio, a agregação não é uma média
de dados individuais combinados. A ponderação consiste num julgamento de valor que atribui
importância diferente a elementos distintos da ferramenta. Os princípios da ponderação devem ser
justificados apropriadamente. [...] Índices compostos são necessários devido à abordagem
integrativa do conceito de desenvolvimento sustentável; o problema desses índices é que a sua
combinação é muitas vezes arbitrária. (2005, p. 77).

Quando um índice ou indicador de desenvolvimento sustentável é formulado, este pode


ter um viés que influencia no seu resultado devido à arbitrariedade dos valores de sua
ponderação. Assim, permanece o desafio de interpretar os dados e apontar as necessidades reais
90

de mudanças. “As tendências dos índices podem se mostrar contraditórias: diferentes valores
levam a diferentes ponderações e interpretações alternativas dos mesmos dados.” (BELLEN,
2005, p. 78).
Assim, um modelo conceitual é necessário para organizar os diferentes tipos de
indicadores existentes, relevantes ao desenvolvimento sustentável. Sobre essa necessidade,
Bellen afirma que
o sistema é a referência direta ao conceito subjacente de desenvolvimento sustentável que define o
processo de avaliação [de um indicador]. Um sistema é um modelo conceitual que ajuda a
selecionar e organizar questões que vão definir o que vai ser medido pelos indicadores. Modelos
conceituais, mesmo não capturando o mundo real e sua complexidade, que estão além de todo o
conhecimento, fornecem um retrato de como o mundo real funciona e ensinam, assim, a melhor
forma de lidar com ele. (2005, p. 78).

Esse sistema ao qual o autor se refere pode ser classificado de duas formas: pelos meios
que estes identificam as dimensões mensuráveis e selecionam e agrupam as questões a serem
mensuradas; ou pelos conceitos que são utilizados para justificar os procedimentos de
identificação e seleção de indicadores. O sistema efetivo serve como base para ser revisado de
tempos em tempos e nos testes das prioridades atuais.
O conceito de desenvolvimento sustentável é normalmente abordado de forma
multidimensional. Para se conhecer melhor uma ferramenta de avaliação deve-se observar quais
dimensões são utilizadas e de que forma. Além disso, é necessário que se saiba qual o campo de
aplicação da ferramenta, onde esta pode e deve ser aplicada, já que existem diferentes esferas de
utilização de um sistema de indicadores e o uso dessas ferramentas em um nível não
correspondente ao seu potencial pode levar a um resultado viesado da realidade.
A classificação da dimensão da ferramenta, ou seu escopo, fundamenta-se no que é
efetivamente medido. A classificação mais comum é a de três escopos: econômico, ecológico e
social. De acordo com Bellen,
A dimensão ecológica ou biofísica se refere a informações sobre as condições e as mudanças nos
recursos naturais como solo, atmosfera, incluindo clima e qualidade do ar, qualidade e quantidade
de água, vida selvagem e vegetação, reservas naturais e hábitats naturais, bem como recursos não
renováveis como minerais, metais e combustíveis fósseis. O escopo econômico se caracteriza por
indicadores sobre as condições e as mudanças referentes à produção, comércio e serviços, dados
fiscais e monetários, (bancos, finanças, inflação, balança de comércio, orçamento) e recursos
humanos (emprego, trabalho e rendimentos). O escopo social é caracterizado por medidas
referentes a condições e mudanças na demografia, saúde pública, situação das comunidades
indígenas, satisfação pessoal e recursos arqueológicos e históricos. (2005, p. 85)

Os sistemas de indicadores podem assim ser classificados de acordo com a unidade


espacial ou fronteira geográfica, como global, continental, regional ou local. A utilização dessas
ferramentas fica restrita à esfera espacial para qual foi desenvolvida. Dessa forma um indicador
91

usado para medir o desenvolvimento sustentável a nível local, não pode ser generalizado e
utilizado em nível global, pois não terá recursos suficientes para tal esfera.
Quanto aos dados utilizados pelo sistema, estes podem ser classificados tanto pela
tipologia quanto por seu grau de agregação. Essa primeira característica refere-se à ênfase
metodológica dos dados, ou ainda ao uso de informações qualitativas e/ou quantitativas e em qual
proporção, desde sistemas de informações totalmente qualitativos aos totalmente quantitativos.
Além disso, o sistema pode ser classificado de acordo com a orientação em termos de
participação, abrangendo desde uma abordagem top-down, ou orientada prioritariamente por
especialistas, até uma abordagem bottom-up, na qual existem pesos para todos os atores
envolvidos no processo.
Dentro dessas classificações estão inseridos os conceitos de desenvolvimento e
sustentabilidade que irão formar a base dos indicadores. Como estes são conceitos
eminentemente políticos adotados pelos países, cada nação pode ter sua própria interpretação de
desenvolvimento sustentável e sua própria formulação de indicador. Dependendo do conceito
adotado, o indicador pode agregar mais dados qualitativos ou ter uma maior participação dos
atores no processo. Isso tornará o indicador mais ou menos viesado na formulação de uma
tendência da sociedade examinada naquele momento.
Deve-se ter cuidado na interpretação de tais indicadores, pois não há um indicador 100%
confiável, eles servem como parâmetros que apontam uma tendência e não podem ser utilizados
como única ferramenta de análise do desenvolvimento sustentável na sociedade.
É necessário atualmente compreender melhor o conceito de desenvolvimento sustentável,
suas características e limitações, para que ele possa ser mais bem usado como orientação geral da
sociedade. Para isso, as ferramentas existentes devem ser conhecidas quanto à avaliação de
sustentabilidade. No capitulo a seguir serão explicitados alguns tipos de indicadores e será feita
uma avaliação pratica do desenvolvimento sustentável para o caso brasileiro através da aplicação
dos indicadores de desenvolvimento sustentável.
92

3. APLICAÇÕES DOS INDICADORES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

3.1 Análise dos indicadores de desenvolvimento sustentável

Com a divulgação do Relatório Brundtland e a realização da Conferência das Nações


Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), o desenvolvimento
sustentável passou a ser considerado pauta prioritária entre as nações. Levando-se em
consideração a dificuldade encontrada em definir um parâmetro padrão para o desenvolvimento
sustentável, várias instituições começaram a desenvolver indicadores para a medição do nível de
sustentabilidade. De acordo com o trabalho de Anne Louette, ‘Indicadores de Nações: uma
Contribuição ao Diálogo da Sustentabilidade’,
o documento final da [CNUMAD], a Agenda 21, em seu capítulo 40, destacava: os indicadores
comumente utilizados, como o Produto Nacional Bruto (PNB) ou as medições das correntes
individuais de contaminação ou de recursos, não dão indicações precisas de sustentabilidade. Os
métodos de avaliação da interação entre diversos parâmetros setoriais do meio ambiente e o
desenvolvimento são imperfeitos ou se aplicam deficientemente. É preciso elaborar indicadores de
desenvolvimento sustentável que sirvam de base sólida para adotar decisões em todos os níveis e
que contribuam para uma sustentabilidade autorregulada dos sistemas integrados, do meio
ambiente e do desenvolvimento. Desde a assinatura da Agenda 21, 178 países concordaram em
corrigir distorções geradas por uma avaliação exclusivamente econômica do PIB. (2009, p. 12).

Dentro desse contexto, alguns países começaram a desenvolver seus próprios indicadores
e o que temos atualmente é um compêndio de índices e classificações nos quais cada nação
atribui seus valores e necessidades na formulação dos mesmos. Esse movimento não permite que
se equalize ou torne a noção de desenvolvimento sustentável homogênea, prejudicando sua
avaliação. Sobre isso a autora Anne Louette afirma que,
apesar de todas essas iniciativas, nenhuma medida pessoal e nenhum conjunto de indicadores goza
de amplo reconhecimento dentro do contexto do debate político e para o público em geral. Talvez
devido à existência de divergências no que diz respeito aos fundamentos conceituais, ou pela falta
da simplicidade analítica que havia assegurado o sucesso do PIB. (2009, p. 13)

No quadro abaixo, encontra-se uma lista com os principais projetos de indicadores de


desenvolvimento sustentável. É importante notar que existem indicadores formulados por
organismos internacionais, que teoricamente seriam menos impactados pela participação de
atores locais no processo. Nota-se também a participação do Brasil nesta lista. Tendo em vista ser
este um país em desenvolvimento, percebe-se uma posição proativa do mesmo no processo de
criação e utilização de indicadores de desenvolvimento sustentável.
93

Índice Instituição País


EVI - Environmental Vulnerability Index SOPAC e PNUMA Internacional
IDH + IPH + IDG + MPG PNUD Internacional
LPI - Living Planet Index WWF Internacional
PSR - pressure state reponse OCDE Internacional
Seea - system of integrated environmental and economic account United Nations Statitical Division Internacional
Wealth of nations Banco Mundial Internacional
Mips - Material input per servisse Wuppertal Institut Alemanha
SOB - System basic orientors Kassel University Alemanha
SPI - Sustainable process index Institute of Chemical Engineering – Graz University Austria
DNA Brasil Instituto DNA Brasil e NEPP – Unicamp Brasil
IDS - Indicadores de Desenvolvimento Sustentável IBGE Brasil
GNH - Gross National Happiness Centro de Estudos do Butão Butão
BS - Barometer of sustainability IUCN e IDRC Canadá
DS - Dashboard of sustainability International Institute for Sustainable Development Canadá
EFM - Ecological footprint model Wackemagel e Rees EUA
IEWB - Index of Economic Well-being Centre for the Study of Living Standards Canadá
NRTEE - National round table on the environment and economy Human/Ecosystem Approach Canadá
WN - The Well-being of Nations IDRC e IUCN Canadá
Calvert-Henderson Quality of Life Indicators Calvert Group EUA
EPI - Environmental Performance Index Universidade de Yale e Universidade de Columbia EUA
ESI - Environmental Sustainability Index World Economic Forum EUA
GPI - Genuine Progress Indicator (IPR) Redefining Progress EUA
BIP 40 - Baromêtre des Inegalités et de la Pauvreté Réseau d’Alerte sur les Inegalités et de la Pauvreté França
HPI - Happy Planet Index NEF New Economics Foundation Reino Unido
Isew - Index of Sustainable Economic Welfare CES e NEF Reino Unido
EIP - European Indices Project Eurostat União Européia
Quadro 7
Principais projetos em indicadores de desenvolvimento sustentável
Fonte: BELLEN, Hans Michael van. Indicadores de sustentabilidade: Uma análise compartiva. p. 90 e Compêndio de Indicadores de Sustentabilidade de Nações.
Disponível em: http://www.compendiosustentabilidade.com.br/compendiodeindicadores/indicadores/default.asp?paginaID=26&it_idioma=1 Elaboração própria.

Os indicadores de desenvolvimento sustentável seguem os princípios de Bellagio que são


instruções normativas com o objetivo de orientar a avaliação do progresso rumo ao
desenvolvimento sustentável. São princípios inter-relacionados, que devem ser aplicados de
forma conjunta. Tais princípios orientam a avaliação de todo o processo, desde a escolha do
projeto dos indicadores e sua interpretação até a comunicação dos resultados finais. Ao todo, dez
princípios devem ser seguidos pelos indicadores a fim de que estes tenham maior credibilidade
com o público. De acordo com Anne Louette,
[o] princípio um [...] prevê o estabelecimento de uma visão do desenvolvimento sustentável e
metas claras que a tornem factível e significativa aos tomadores de decisão. O processo inclui,
ainda, definição do conteúdo da avaliação (princípios 2 a 5) e do processo de avaliação (princípios
6 a 8), além da necessidade de melhoria contínua do sistema (princípios 9 e 10). (2009, p.10).

Resumidamente, os princípios de Bellagio abarcam: um guia de visões e metas39; uma


perspectiva holística40; um escopo adequado41; um foco prático42; abertura e transparência43;

39
Ser guiado por uma visão clara do desenvolvimento sustentável e metas que definem essa visão.
94

comunicação efetiva44; uma ampla participação45; avaliação constante46 e capacidade


institucional47. Além disso, os indicadores devem possuir como elementos essenciais a
consideração da equidade e da disparidade dentro da população atual e entre esta e as futuras
gerações, lidando com a utilização de recursos, com o superconsumo e pobreza, direitos humanos
e acesso a serviços; a consideração das condições ecológicas das quais a vida depende; e a
consideração do desenvolvimento econômico e de outros aspectos que não são oferecidos pelo
mercado e que contribuem para o bem-estar humano e social48.
Embora seja notório o papel dos indicadores para mensurar o desenvolvimento
sustentável, é muito difícil encontrar um indicador que além de possuir ampla aceitação, ainda
respeite os dez critérios de Bellagio. Sobre este ponto, José Eli da Veiga afirma que
É possível que se tenha pecado por excesso de pretensão ao se estabelecer esses dez princípios.
Todavia, mesmo que a referência seja apenas o quinto critério – foco prático: as avaliações devem
se basear num conjunto explícito de categorias que liguem perspectivas e metas a indicadores –, é
forçoso constatar que continuam a existir sérias clivagens e bloqueios, tanto conceituais quanto
operacionais, para que ele seja cumprido. (LOUETTE, 2009, p. 29)

40
Incluir visão do sistema todo e de suas partes; considerar o bem-estar social, bem-estar ecológico e bem-estar econômico dos
subsistemas; seu estado atual, tendência e taxa de mudança tanto dos componentes das partes como da interação entre as partes;
considerar as consequências positivas e negativas da atividade humana de forma a refletir os custos e benefícios para os sistemas
humano e ecológico, em termos monetários e não monetários.
41
Adotar um horizonte de tempo suficientemente longo para capturar as escalas de tempo humano e dos ecossistemas, atendendo
às necessidades das futuras gerações, bem como da geração atual em termos de processo de tomada de decisão no curto prazo;
definir o espaço de estudo para abranger não apenas impactos locais, mas também o impacto de longa distância sobre pessoas e
ecossistemas; construir um histórico das condições presentes e passadas para antecipar futuras condições.
42
Um sistema de categorias explícitas ou um sistema organizado que conecte a visão e as metas com os indicadores e os critérios
de avaliação; um número limitado de questões-chave para análise; um número de indicadores ou combinações de indicadores que
sinalizem claramente o progresso; um padrão de medidas para permitir a comparação, quando possível; comparação de valores
dos indicadores com suas metas, valores de referência, limites ou direção da mudança.
43
Tornar os métodos e dados usados acessíveis a todos; deixar explícitos todos os julgamentos, suposições e incertezas de dados.
44
Ser projetado para atender às necessidades do público e do grupo de usuários; ser feito de forma que os indicadores e as
ferramentas estimulem e engajem os tomadores de decisão; procurar a simplicidade na estrutura do sistema e utilizar linguagem
clara e simples.
45
Obter ampla representação do público profissional, técnico e comunitário, incluindo participação de jovens, mulheres e
indígenas para garantir o reconhecimento dos valores, que são diversos e dinâmicos; garantir a participação dos tomadores de
decisão para assegurar uma forte ligação com a adoção de políticas e os resultados da ação.
46
Desenvolver a capacidade de repetidas medidas para determinar tendências; ser interativa, adaptativa e responsiva às mudanças
e incertezas, porque os sistemas são complexos e estão em frequente mudança; ajustar as metas, sistemas e indicadores com as
novas descobertas decorrentes do processo; promover o desenvolvimento do aprendizado coletivo e o feedback necessário para a
tomada de decisão.
47
Definir clara responsabilidade e apoiar constantemente o processo de tomada de decisão; assegurar capacidade institucional para
a coleta de dados, sua manutenção e documentação; apoiar o desenvolvimento da capacitação local de avaliação.
48
Fonte: Brunvoll et al. 2002, apud. Louette, Anne. 2009, p. 29.
95

Dentre os indicadores mais utilizados, os formulados por organismos internacionais têm


mais chances de seguir os princípios de Bellagio e possuir maior credibilidade junto à
comunidade internacional. Porém, eles não estão isentos de possuir algum viés ideológico, ou
seja, nenhum indicador é totalmente isento e seguro.
Alguns indicadores formulados por países a nível nacional podem apresentar um grau de
agregação mais completo que os fomentados pelos organismos internacionais. Por isso existe a
necessidade de uma análise criteriosa entre os indicadores apresentados para que se escolha o
mais completo e o que se adapte melhor aos objetivos traçados. No caso dessa dissertação, o
indicador mais indicado é aquele que leve em conta o lado social além do lado ambiental e
considere o imperativo do desenvolvimento, já que se trata de uma análise de um país em
desenvolvimento.

3.1.1 Indicadores de Organismos Internacionais

As Nações Unidas, através do PNUD, adotam um conjunto de indicadores distintos para a


medição do bem-estar humano, começando com o IDH que combina três indicadores de base: a
esperança de vida ao nascer, a renda e o nível de educação. Esse indicador mede o
desenvolvimento dos países, levando em conta, não só a obtenção de riqueza, mas também
fatores sociais, culturais e políticos que influenciam a qualidade de vida. O IDH pretende ser uma
medida geral e sintética do desenvolvimento humano, mas não abrange todos os aspectos do
desenvolvimento. Ele ainda é limitado, pois não leva em conta o que se poderia chamar de efeitos
colaterais do progresso, como o desemprego, o aumento da criminalidade, novas necessidades de
saúde, poluição ambiental, etc.
Somado a esse índice está o IPH, que mede as privações no desenvolvimento humano49. É
um indicador derivado do IDH, e possui algumas limitações como seu antecessor. As variáveis
utilizadas para a obtenção do IPH são: vida longa e saudável, conhecimento e padrão de vida
digno. Além desses dois índices, as Nações Unidas levam em conta também a questão do gênero

49
O IPH mede as carências no desenvolvimento humano básico em termos do percentual de pessoas cuja expectativa de vida não
atinge os 40 anos, do percentual de adultos analfabetos e do estabelecimento de condições econômicas para um padrão de vida
aceitável em termos do percentual de pessoas sem acesso a serviços de saúde e água potável e do percentual de crianças menores
de 5 anos com peso insuficiente. Fonte: LOUETTE, Anne. Indicadores de Nações: uma contribuição ao diálogo da
Sustentabilidade. Compêndio de Indicadores de Sustentabilidade de Nações. 1.ª ed. WHH – Willis Harman House, 2007. Vários
Colaboradores.
96

no desenvolvimento humano, acrescentando a esses indicadores o IDG50 e o MPG51. Tais


indicadores levam em conta as mesmas dimensões do IDH, mas penalizam as desigualdades entre
homens e mulheres.
Nenhum desses indicadores leva em conta o meio ambiente para a apuração do bem-estar
humano, não sendo por isso assimilados como o melhor conjunto de indicadores para medir o
desenvolvimento sustentável. Ainda no âmbito das Nações Unidas, o PNUMA apresenta o EVI
como uma alternativa para medir a sustentabilidade. Ele é um índice de vulnerabilidade do meio
ambiente, tomando como base todo o bem-estar humano.
O EVI foi desenvolvido com a colaboração da Comissão de Geociência Aplicada do
Pacífico Sul (Sopac) e foi construído por meio de consultas e colaboração entre países,
instituições e especialistas de todo o planeta. É um índice pronto para a utilização em nível
nacional e foi concebido para ser usado por todos as nações. Segundo Anne Louette,
O EVI permite refletir o grau em que o meio ambiente de um país está sujeito a danos e
degradação. Está concebido para ser usado em conjunto com índices de vulnerabilidade econômica
e social, a fim de fornecer insights sobre processos que possam influenciar negativamente o
desenvolvimento sustentado dos países. (2009, p. 62).

Ou seja, é um indicador que pode suplantar a combinação de IDH+IPH+IPG+MPG na


tentativa de obter a medição do desenvolvimento sustentável. O maior problema encontrado
nesses indicadores é sua não-agregação. Deve-se trabalhar com muitos índices diferentes para
tentar chegar a uma combinação que dê a orientação do desenvolvimento sustentável. Isso pode
atrapalhar e desestimular a utilização dos mesmos. Já o EVI oferece um método padronizado para
caracterizar a vulnerabilidade ambiental e reconhecer questões que possam exigir enfrentamento
específico no contexto de cada um dos três pilares da sustentabilidade, isto é, aspectos
ambientais, econômicos e sociais do desenvolvimento de um país.
O EVI baseia-se em cinquenta outros indicadores para estimar a vulnerabilidade do meio
ambiente de um país a choques futuros, combinados por média simples e apresentados

50
O Índice de Desenvolvimento Ajustado ao Gênero (IDG) leva em conta as mesmas dimensões do IDH, mas penaliza as
desigualdades entre homens e mulheres. Quanto maior a disparidade entre os sexos no desenvolvimento humano básico, menor o
IDG de um país, comparado com o seu IDH. O IDG é simplesmente o IDH descontado ou ajustado para baixo pela desigualdade
entre os sexos. Compêndio de Indicadores de Sustentabilidade de Nações. 1.ª ed. WHH – Willis Harman House, 2007. Vários
Colaboradores.
51
A Medida de Participação Segundo o Gênero (MPG) revela se as mulheres tomam parte ativa na vida econômica e política.
Incide nas desigualdades entre homens e mulheres em áreas-chave da participação econômica e política, bem como na tomada de
decisões. Verifica a quota de assentos no parlamento ocupados por mulheres, de legisladores femininos, de funcionários
superiores e gestores e de profissionais liberais e técnicos femininos. Também inclui a disparidade entre homens e mulheres em
matéria de rendimentos, refletindo a independência econômica. Compêndio de Indicadores de Sustentabilidade de Nações. 1.ª ed.
WHH – Willis Harman House, 2007. Vários Colaboradores.
97

simultaneamente na forma de um único índice. Além disso, apresenta uma gama de sub-índices
temáticos importantes para os processos decisórios e um perfil que mostra os resultados para cada
indicador. Segundo Anne Louette “médias simples foram usadas nos indicadores porque são de
entendimento mais fácil e porque modelos mais complexos não parecem oferecer vantagens para
a expressão ou utilidade do índice”. (2009, p. 62).
Dentre os sub-índices utilizados pelo EVI estão: mudanças climáticas, biodiversidade,
água, agricultura e pesca, aspectos de saúde humana, desertificação e exposição a desastres
naturais. Esses sub-índices podem ser usados também individualmente pelos países para detectar
áreas em que possam melhorar e direcionar suas políticas.
Ao todo 235 países receberam uma pontuação, de acordo com o grau de
vulnerabilidade/resiliência ambiental calculado com o EVI, constituindo um ranking mundial. As
pontuações consideradas válidas foram as de países que forneceram dados para mais de oitenta
por cento dos cinquenta indicadores. Cada país é classificado em quatro categorias diferentes:
extremamente vulnerável, altamente vulnerável, vulnerável, em risco ou resiliente. Abaixo
apresentamos um gráfico que demonstra a distribuição dos países de acordo com esta
classificação.
98

Entre os projetos de indicadores de desenvolvimento sustentável formulados pelos


organismos internacionais, o EVI parece ser o mais completo dentro da definição mais ampla de
desenvolvimento sustentável. Seus cinquenta indicadores abarcam diversos aspectos da
sustentabilidade e do bem-estar humano. Além do EVI, existem outros indicadores elaborados no
nível das Nações unidas como o Seea formulado por sua divisão estatística e o wealth of nations
formulado pelo Banco Mundial.
Outros indicadores também foram criados fora do âmbito das Nações Unidas, como o LPI
formulado pelo WWF e o PSR formulado pela OCDE. O LPI é um indicador do estado da
biodiversidade no mundo. Ele é prioritariamente um indicador ambiental, que não leva em conta
a questão do desenvolvimento como um parâmetro necessário, não sendo portanto um índice
compatível com o objetivo da dissertação. Já o PSR foi formulado pela OCDE e constitui mais
esquema causal do que um índice propriamente dito. Ele tenta mostrar que as atividades humanas
exercem pressões (tais como emissões de poluentes ou mudanças no uso da terra) sobre o
ambiente, que podem induzir a mudanças na situação ambiental. A sociedade responde então a
essas mudanças com políticas ambientais e econômicas e programas para prevenir, reduzir ou
moderar as pressões e/ou os estragos ambientais. Os indicadores de desenvolvimento sustentável
serviriam então para ajudar a identificar e apoiar as relações PSR.
O Seea é um sistema anexo ao sistema de contas nacionais dos países, formulado pela
divisão estatística da ONU. Ele tenta ajustar o cálculo do PIB aos problemas ambientais,
reunindo informações econômicas e ambientais em um quadro comum com o intuito de medir a
contribuição do ambiente para a economia e o impacto da economia sobre o meio ambiente. Ele
fornece estatísticas descritivas aos decisores políticos para monitorar essas interações, bem como
um banco de dados para o planejamento estratégico e análise de políticas para identificar os
caminhos mais sustentáveis do desenvolvimento. Como ele é um sistema que se insere apenas no
foco das contas nacionais, também não é o mais indicado para uma definição completa do
desenvolvimento sustentável.
Por último tem-se o wealth of nations formulado pelo Banco Mundial que procura
calcular uma “poupança verdadeira” (genuine savings) rebatizada de “poupança líquida ajustada”
(adjusted net savings). O problema com esse método é que existe uma grande disparidade nos
cálculos do Banco Mundial entre os bens ambientais para os quais é fácil atribuir valores
monetários e aqueles para os quais isso não é tão fácil. Recursos como petróleo, gás natural,
99

minerais, extração de madeira, ou a emissão de gás carbônico na atmosfera são contabilizados


pelo Banco Mundial, enquanto que água potável, solo, áreas de pesca oceânicas, florestas e
manguezais como provedores de serviços ecossistêmicos, assim como a atmosfera como destino
de partículas, nitrogênio e óxidos de enxofre não entram nessa conta, deixando o indicador com
um grande viés.
Além disso, os preços estimados pelo Banco Mundial baseiam-se em premissas que
ignoram a capacidade limitada dos sistemas naturais de recuperarem-se de perturbações (a
resiliência). Dessa forma, esse tipo de indicador não é o mais aconselhável para estimar o
desenvolvimento sustentável.

3.1.2 Indicadores selecionados de países desenvolvidos

Além dos indicadores promovidos pelos organismos internacionais, existem indicadores


criados por alguns países com o intuito de medir a sustentabilidade em seus territórios. Tais
países começaram a investir na construção de indicadores logo após a Conferência do Rio, onde
ficou acordado que as nações deveriam incentivar o redirecionamento de suas economias ao
desenvolvimento sustentável.
Hans Michael van Bellen elabora em sua pesquisa uma avaliação comparativa entre os
indicadores de desenvolvimento sustentável dos países desenvolvidos. Para tanto, ele apresentou
uma lista com os mais variados indicadores a especialistas do mundo todo, ranqueando-os de
acordo com o maior número de avaliações positivas. Entre os quesitos necessários estavam a
acessibilidade e a clareza, o quanto o indicador era utilizado e também quantos aspectos do
desenvolvimento sustentável ele abrangia.
Em suas considerações, van Bellen afirma que
existe uma grande fragmentação entre os diversos especialistas quanto às metodologias de
avaliação de sustentabilidade que consideram mais importantes. Entretanto, os três sistemas de
indicadores mais lembrados cobrem juntos 35,5% das indicações. As metodologias de avaliação
que obtiveram mais indicações no levantamento foram: o EFM52, o DS53 e o BS54. (2005, p. 96).

Levando em consideração o trabalho comparativo de Bellen, os três indicadores citados


acima foram selecionados para serem explicitados nesta dissertação. Isto porque, de acordo com
52
Ecological Footprint Method.
53
Dashboard of Sustainability.
54
Barometer of Sustainability.
100

o autor, esses indicadores são os mais reconhecidos internacionalmente pela perspectiva do


desenvolvimento sustentável.
O EFM nasceu nos Estados Unidos em 1993, tendo evoluído consideravelmente nos
últimos anos. Ele é uma ferramenta de contabilidade de recursos que mede em que grau a
humanidade está usando os recursos da natureza mais rapidamente do que eles podem se
regenerar. A ferramenta ilustra o quanto cada país está consumindo e que tipo de recurso está
consumindo.
O indicador se baseia em pegadas ecológicas, que variam bastante de região para região.
A Pegada Ecológica mede o grau em que as demandas ecológicas das economias humanas
respeitam ou ultrapassam a capacidade da biosfera de fornecer bens e serviços. Quando a pegada
da humanidade ultrapassa a quantidade de biocapacidade renovável, uma diminuição do capital
natural tem de ser feita, e isso é considerado insustentável. De acordo com Anne Louette,
A Pegada de uma população é a quantidade total de áreas de terra e água biologicamente
produtivas que ela exige para produzir os recursos que consome e para absorver os resíduos que
elimina, usando a tecnologia atual. Como as pessoas consomem recursos e serviços ecológicos de
todas as partes do mundo, sua Pegada é a soma de todas essas áreas, independentemente de onde
estejam localizadas no planeta. (2009, p. 54).

De acordo com os criadores do EFM, uma das chaves para alcançar a sustentabilidade
seria o acompanhamento do efeito acumulado do consumo humano de recursos naturais e da
geração de resíduos. Ainda segundo os criadores do indicador, as contas relativas aos últimos
quarenta anos mostram uma tendência de crescimento ao longo de 25 anos além da quantidade de
biocapacidade renovável. Com este resultado, pode-se concluir que a pegada ecológica da
humanidade parece ter rompido os limites ecológicos e é, portanto, insustentável.
A Pegada Ecológica pode ser aplicada em escalas que vão desde produtos isolados até
famílias, organizações, regiões, nações e a humanidade como um todo. Para calculá-la é
necessário estimar o consumo de bens e serviços e a produção de resíduos da unidade de
população em estudo. Esses bens e serviços englobam categorias como alimentos, vestuário,
transporte, energia, lazer, habitação, etc. Após essa estimação, faz-se o cálculo da área necessária
para a obtenção desses bens dividindo-se a média anual de consumo desse item pela média da sua
produtividade.
Cada uma dessas áreas é considerada equivalente a um tipo de área biologicamente
produtiva, e a sua soma constitui a Pegada Ecológica. A pegada ecológica é formada por um
101

retângulo, onde a base é proporcional ao número de habitantes da região estudada e a altura é


equivalente ao consumo per capta dos recursos da mesma população. Segundo Anne Louette,
Hoje em dia, a maioria dos países e o mundo como um todo estão lidando com déficits ecológicos.
[...] Atualmente, a Pegada Ecológica é 23% maior do que a capacidade de regeneração do planeta.
Ou seja, é necessário mais do que um ano e três meses para a Terra regenerar o que é utilizado em
um único ano. A manutenção ou aumento dessa diferença resultará no esgotamento dos recursos
naturais do planeta. Essa é uma grande ameaça subestimada e que não é trabalhada
adequadamente. (2009, p. 56).

O EFM aborda a questão da relação da sociedade com o meio ambiente. Existe um


consenso de que o ecossistema terrestre não é capaz de sustentar indefinidamente o nível de
atividade econômica e de consumo de matéria-prima. Para seus criadores, a base do conceito de
sustentabilidade é a utilização dos serviços da natureza dentro do princípio de manutenção do
capital natural, ou seja, o aproveitamento dos recursos naturais dentro da capacidade de carga do
sistema.
De acordo com esse método, o crescimento econômico ilimitado não é passível de
realização. A sustentabilidade então exigiria que se passasse da gestão dos recursos naturais para
a própria gestão da humanidade. Fica explícito pelos autores a incapacidade de se alcançar um
padrão de vida comparável ao norte-americano para toda a humanidade. Quanto a essas
premissas, Bellen afirma que
a confusão envolvendo o conceito de desenvolvimento sustentável não é totalmente inocente; de
alguma maneira essa discussão reflete os conflitos de interesse acerca do tema. [...] a
sustentabilidade é na verdade um conceito simples, ao menos conceitualmente, e [...] as
implicações do modelo ecological footprint method podem ajudar a entender pelo menos as
necessidades ecológicas para se alcançar uma sociedade sustentável. (2005, p. 118).

Para o EFM, o desenvolvimento sustentável depende da redução da destruição ecológica.


As principais causas da entrada reduzida da agenda ambiental na sociedade são os conflitos de
interesse, as visões de mundo diferenciadas, a incapacidade de análise, a expectativa crescente
em termos de consumo e o medo de mudanças.
Bossel (1999, apud. BELLEN, 2005, p. 126) argumenta que o EFM captura de maneira
muito eficiente a esfera ambiental da sustentabilidade que é afetada pela atividade econômica
humana, mas não consegue alcançar o sistema na dimensão social da sustentabilidade. O EFM
aborda apenas a questão dos recursos naturais, além de ser uma ferramenta estática, não
permitindo extrapolações temporais. A sustentabilidade forte é o eixo central da ferramenta.
Como as questões dos países em desenvolvimento, envolvem muito mais do que apenas a
preservação pura e simples do estado natural do sistema ecológico, esta ferramenta não é a mais
indicada para uma análise dessas nações.
102

O Dashboard of Sustainability (DS) é um índice desenvolvido no Canadá, constituído


como um índice agregado de vários indicadores de desempenho econômico, social e ambiental
que mostra, visualmente, os avanços dos países em direção à sustentabilidade. Essa ferramenta
foi concebida para ser entendida por especialistas, pela mídia, por formuladores de políticas
públicas e pelo público em geral, atendendo ao requisito de acessibilidade dos princípios de
Bellagio.
O DS faz parte dos dispositivos de sustentabilidade das Nações Unidas. Seu índice utiliza-
se da metáfora de um painel de veículo, apresentando avaliações econômicas, ambientais, sociais
e institucionais especificas de cada país. Com isto, é possível saber se a nação em questão se
aproxima ou se distancia da meta de sustentabilidade.
O indicador foi construído a partir de uma visão holística com uma abordagem
relacionada à teoria dos sistemas, onde dois sistemas são considerados: o humano e o circundante
ecossistema, ao contrário de modelos mais específicos em que a economia e as instituições
sociais são consideradas sistemas separados. Quanto a essa questão Bellen afirma que:
indicadores de sustentabilidade referem-se à combinação das tendências ambientais, econômicas e
sociais. Esses sistemas devem mostrar a interação das três dimensões, sendo que o projeto de bons
indicadores de sustentabilidade é tarefa difícil. A maioria dos atuais sistemas de indicadores surgiu
durante o século XX e aborda as diferentes dimensões separadamente. Sistemas gerais de
indicadores, relacionados com o desenvolvimento sustentável, surgiram apenas na ultima década
mas tem avançado rapidamente. (2005, p. 139)

O DS foi operacionalizado para a comparação de países a partir de 46 indicadores, que


compõem as três dimensões utilizadas: a área de meio ambiente, com 13 indicadores, a área
econômica, com 15 indicadores e a área social, com 18 indicadores. Seu sistema cobre
aproximadamente 100 nações que podem ser avaliadas nessas áreas, tanto individualmente
quanto em conjunto. De acordo com Anne Louette, “a nova edição do painel promove
indicadores para as Metas de Desenvolvimento do Milênio, especialmente para países em
desenvolvimento. Esses indicadores ajudam a definir as estratégias de redução da pobreza e
monitorar o alcance das metas.” (2009, p. 51)
Cada um dos indicadores dentro das dimensões da sustentabilidade propostas pelo sistema
pode ser avaliado tanto em termos de sustentabilidade como no âmbito do processo decisório a
partir de dois elementos principais: importância e performance. A importância de cada indicador
é determinada pelo tamanho que este assume perante os outros na representação visual do sistema
correspondente. Já o desempenho do indicador é mensurado por meio de uma escala de cores que
varia do vermelho até o verde.
103

A representação gráfica do sistema do DS é construída pelo painel visual de três displays,


correspondendo aos grupos estudados, quais sejam, econômico, ambiental e social. Seus
mostradores mostram a performance desses grupos para o caso do país abordado, possuindo uma
seta que aponta o valor que reflete a performance atual do sistema. Um gráfico também procura
medir as mudanças de desempenho do sistema avaliado.
Anne Louette descreve a representação gráfica do DS como sendo constituída por
um painel visual de três displays, que correspondem a três grupos ou blocos: as performances
econômica, social e ambiental. A performance do sistema é apresentada por meio de uma escala de
cores que varia do vermelho-escuro (crítico), passando pelo amarelo (médio) até o verde-escuro
(positivo). Um gráfico procura refletir as mudanças de desempenho do sistema avaliado, e existe
um medidor que mostra a quantidade remanescente de alguns recursos críticos. Nesse sentido, os
indicadores devem facilitar o processo de comunicação acerca do desenvolvimento sustentável,
transformando esse conceito em dados numéricos, medidas descritivas e sinais orientativos. (2009,
p. 52)

Para cada dimensão do DS existe um índice agregado que a representa. No caso da


dimensão econômica, a ferramenta pode utilizar o PIB ou um novo índice de performance
econômica que inclua aspectos importantes como inflação e desemprego. No caso da dimensão
social, encontrar um índice apropriado é uma tarefa mais difícil, embora o IDH possa ser
utilizado para esse fim. Como dimensão ambiental, o DS pode se utilizar de outros índices
conhecidos como o EFM, o que o torna efetivamente mais completo.
De acordo com Bellen,
no dashboard of sustainability a performance de um sistema pode ser avaliada a partir de
diferentes perspectivas: a comparação com “vizinhos” isto é, países ou cidades similares; a
comparação de desempenho com seus antecessores, ou comparação no tempo; planejamento, ou
comparação dos objetivos estabelecidos com os resultados. (2005, p. 134)

A maior parte das informações que estão no banco de dados do sistema do DS foi obtida
através de instituições internacionais públicas, como o Banco Mundial, o Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento, a Organização Internacional do Trabalho, o World Resources
Institute, etc. Ainda assim, uma área considerada particularmente sensível e onde muitos esforços
devem ser feitos refere-se à fonte de dados dos países em desenvolvimento para enriquecer as
medidas sobre sustentabilidade.
Uma das desvantagens do DS é que ele pode mascarar a sustentabilidade efetiva do
desenvolvimento. Dentro do conceito de diferentes dimensões que o DS apresenta, é possível que
a dificuldade em avaliar o desenvolvimento surja não pela falta de parâmetros, mas sim pela
abundância de indicadores potenciais que seriam úteis. O que deve ou não ser medido depende da
visão sobre sustentabilidade dentro de cada país, ou de um consenso existente na esfera
104

internacional. Como esse consenso parece longe de acontecer, os indicadores como o DS, por
mais completos que sejam nos trarão a noção de sustentabilidade individualizada das nações,
podendo um país ser mais bem avaliado que outro dependendo das variáveis utilizadas e de suas
ponderações.
O último indicador apontado por Hans Michael van Bellen em sua pesquisa é o Barometer
of Sustainability. O BS é uma metodologia que serve para avaliar e relatar o progresso em direção
a sociedades sustentáveis, combinando diversos indicadores sociais e ambientais e fornecendo
uma avaliação por meio de uma escala de índices.
Ele foi elaborado no Canadá por diversos especialistas ligados, principalmente, aos
institutos The World Conservation Union e The International Development Research Centre. O
BS compara o bem-estar humano e o do ecossistema dentro das sociedades, a velocidade e o
sentido da mudança para uma sociedade sustentável e os principais pontos fortes e fracos da
mesma. Segundo seus formuladores, esse indicador é direcionado às agências governamentais e
não governamentais, a gestores e pessoas envolvidas com questões relativas ao desenvolvimento
sustentável, em qualquer âmbito do sistema, do local ao global.
De acordo com Anne Louette, o BS é
a única escala de desempenho destinada a medir o bem-estar humano e do ecossistema
conjuntamente, sem sobrepor um ao outro. Seus dois eixos – um para o bem-estar humano, outro
para o do ecossistema – permitem que indicadores socioeconômicos e ambientais sejam
combinados independentemente, mantendo-os separados, possibilitando análises de interações
pessoas-ecossistemas. (2009, p. 44)

Uma das características mais importantes do Barometer of Sustainability é sua capacidade


de combinar indicadores, permitindo aos usuários chegarem a conclusões a partir de muitos
dados considerados, por vezes, contraditórios. A ferramenta combina uma série de indicadores
ambientais e sociais, utilizando escalas de performance. A adoção desse tipo de escala permite
que se utilize a medida mais apropriada para cada um dos indicadores. Como resultado tem-se
um grupo de medidas de performance, todas na mesma escala geral, possibilitando a combinação
e a utilização conjunta de indicadores.
Os extremos da escala são definidos com “bom ou ótimo” para o lado positivo e “ruim ou
péssimo” para o negativo. As posições dos indicadores são esboçadas dentro dessa escala,
resultando em um grupo de medidas de performance, todas utilizando a mesma escala geral,
possibilitando, assim, a combinação e a utilização conjunta dos indicadores.
105

A definição dos indicadores a serem escolhidos pela ferramenta passa pela aceitação do
conceito de que as pessoas e os ecossistemas devem ser tratados conjuntamente e com igual
importância. Isto demonstra a visão do BS da existência de um caminho lógico para transformar
os conceitos gerais do desenvolvimento sustentável, bem-estar e progresso em um grupo de
condições humanas e ecológicas concretas. O desafio da ferramenta é identificar as características
que revelem mais sobre o estado geral do sistema, utilizando um número mínimo de indicadores.
A medição da sustentabilidade feita pela ferramenta consiste no cálculo de índices para o
bem-estar social e para a ecosfera. Os indicadores para a formulação desses índices são
escolhidos apenas se puderem ser definidos numericamente. Indicadores puramente descritivos
são ignorados, já que são partes do contexto e não podem ser modificados. Essa predileção por
índices numéricos acaba sendo prejudicial por não levar em consideração questões qualitativas da
sustentabilidade, prejudicando a ferramenta nesse ponto de vista.
O índice de bem-estar do ecossistema identifica tendências da função ecológica no tempo.
É uma função da água, da terra, do ar, da biodiversidade e da utilização dos recursos. O índice de
bem-estar humano representa o nível geral de bem-estar da sociedade e é uma função do bem-
estar individual, saúde, educação, desemprego, pobreza, rendimentos, crime, bem como negócios
e atividades humanas.
A representação gráfica do BS é feita através de um gráfico bidimensional que relaciona
o bem-estar humano e o bem-estar do ecossistema, que são colocados em escalas relativas, indo
de 0 a 100, e indicam uma situação ruim até uma boa em termos de sustentabilidade. Tal escala
está dividida em cinco setores de 20 pontos cada um, mais sua base, equivalente a 0. A
localização do ponto de interseção definido por esses dois eixos, dentro do gráfico bidimensional,
fornece uma medida de sustentabilidade do sistema. As tendências podem representar o progresso
ou não de uma determinada cidade, estado ou nação. Quanto a divisão da escala em cinco setores,
ou dimensões, Bellen argumenta que
Um sistema comum de dimensões permite que a avaliação seja ajustada às condições e às
necessidades locais, ao mesmo tempo em que permite a comparação com outras iniciativas. O
sistema foi projetado para comportar um grande número de questões dentro de um pequeno grupo
principal. As dimensões são amplas o suficiente para acomodar a maioria das preocupações das
sociedades atuais, sendo que qualquer questão considerada importante para o bem-estar da
sociedade e do meio ambiente tem seu lugar dentro de uma das dimensões. Essas dimensões
representam conceitos que não são puramente técnicos, que são igualmente importantes e
facilmente combináveis dentro de índices de bem-estar. (2005, p. 151)

Para o BS, existem quatro passos interligados para se entender o conceito de


desenvolvimento sustentável. São eles: a globalidade, que considera que as pessoas fazem parte
106

do ecossistema e que ambos devem ser tratados conjuntamente e com igual importância; o
levantamento de questões, já que não há muito conhecimento sobre a relação das pessoas com o
ecossistema; as instituições reflexivas, ou grupos de pessoas atuando em conjunto para questionar
e aprender coletivamente; e o foco nas pessoas, que são tanto problema como solução.
O índice considera os pesos do meio ambiente e da sociedade em um sistema com
diferentes dimensões. Num sistema com três dimensões como o DS, o peso atribuído à sociedade
é duas vezes maior que o do meio ambiente, enquanto num sistema de quatro dimensões, o peso é
três vezes maior. No BS, as duas dimensões (humana e ecológica) têm peso igual e são
mensuradas separadamente. Essa divisão entre pessoas e ecossistemas permite a comparação dos
progressos nos sistemas e possibilita avaliar seus custos. Porém, a questão dos pesos, ou de como
dividir a escala de performance, faz com que o método utilizado pelo BS não seja considerado
científico para muitos autores.
A avaliação de um determinado sistema, considerando o desenvolvimento sustentável,
envolve julgamentos de valor tanto para a ferramenta de avaliação quanto para suas metas,
passando pelas decisões dos indicadores, sua agregação e interpretação. Por esse motivo, o BS
não é um sistema absoluto e sim uma abordagem relativa. A partir dos processos deve-se decidir
quais indicadores ou índices devem ser abordados pela ferramenta. Esse fato dá um peso mais
político para a ferramenta, já que o usuário pode escolher os indicadores como ele achar
conveniente.
Uma das desvantagens do BS é que ele ainda não foi testado para medir a saúde de
ecossistemas em condições culturais e ecológicas bastante diferentes. Seu campo de testes
envolve um processo conhecido como “comunidade sentinela”, que representa uma combinação
de técnicas de medição quantitativas e qualitativas. Mas seu sistema só está disponível para 37
países, o que deixa um grande escopo de nações fora das medições e enfraquece a confiabilidade
da ferramenta.

3.1.3 Indicadores de sustentabilidade formulados pelo Brasil

Sendo um país em desenvolvimento empenhado em demonstrar seu comprometimento


com o desenvolvimento sustentável, o Brasil também tem desenvolvido índices com o objetivo
107

de medir a sustentabilidade no plano nacional. Dentre eles, podemos destacar o DNA Brasil,
elaborado pela Unicamp e o IDS, elaborado pelo IBGE.
O DNA Brasil é um índice que tem como objetivo medir o progresso real e a qualidade de
vida dentro do país, em relação a uma situação ideal, projetada para ocorrer em 2029. Para tal, ele
busca visualizar a realidade brasileira por meio de indicadores, integrando diversas dimensões.
Além disso, o DNA Brasil tem o intuito de comparar a realidade brasileira com expectativas de
futuro e a situação de outros países e balizar a mobilização de atores, públicos e privados,
envolvidos em projetos de desenvolvimento.
O índice calculado pela ferramenta possui como base sete dimensões sociais e econômicas
da realidade brasileira. São elas: bem-estar econômico55, competição econômica56, condições
socioambientais57, educação58, saúde59, proteção social básica60 e coesão social61. Para sintetizar a
comparação dessas variáveis, foi definida uma forma geométrica baseada nas projeções feitas
pelos participantes de uma reunião organizada pelo Instituto DNA Brasil em outubro de 2004, às
quais foi atribuído o valor 1. Situações piores para um mesmo indicador brasileiro definem
valores inferiores a 1, enquanto que situações melhores são definidas com valores acima de 1.
O conjunto de pontos definidos pelos indicadores brasileiros forma uma área que se
aproxima de um círculo, o qual foi adotado para facilitar a visualização gráfica. Os extremos do
gráfico apontam os valores ideais para as projeções de 2029, tais valores foram obtidos através de
apontamentos dos participantes da formulação da ferramenta, que indicaram uma situação
desejável e realista a ser alcançada no referido ano, a partir da situação real brasileira retratada
com base em informações de 2002.

55
Renda per capita e sua distribuição inter-regional; relação entre as remunerações médias das mulheres e dos homens; relação
entre as remunerações médias de negros e de brancos; taxa de ocupação formal.
56
Exportações mundiais: evolução da participação do Brasil, com destaque para produtos ou setores de média e alta intensidade
tecnológica.
57
Instalações adequadas de esgotamento sanitário; destino adequado do lixo urbano; tratamento do esgoto sanitário.
58
Taxa de escolarização líquida no ensino médio; concluintes do ensino médio na idade esperada; desempenho do aluno no PISA
(Programa Internacional para Avaliação do Estudante).
59
Anos potenciais de vida perdidos (APVP); mortalidade infantil; coeficientes de mortalidade por acidentes cardiovasculares
(ACVs) e acidentes vasculares cerebrais (AVCs).
60
Cobertura previdenciária para maiores de 65 Anos; financiamento da atenção à saúde.
61
Distribuição de renda interpessoal; morte por homicídio em homens, na faixa de 15 a 24 anos; percentual de adolescentes que
são mães; justiça tributária.
108

A comparação com as projeções para 2029 possibilita a verificação da nova situação


relativa do Brasil, diante das mesmas. Em sua primeira medição, o índice apontou que o Brasil
estava na faixa de 46,8% dos 100% projetados. Em virtude de correções nos indicadores, esse
índice acabou sendo elevado para 47,6%, ou seja, 52,4 pontos percentuais separavam o Brasil de
2004 do Brasil que os conselheiros do Instituto projetaram como factível e racionalmente
desejável. Em 2005, o índice teve uma pequena melhora: foi para 49,3%. Na sua terceira
atualização, em 2006, manteve sua tendência de melhora, ainda que mínima, e subiu para 51,4%.
Como pode ser observado, o DNA Brasil se dedica mais aos indicadores sociais do que os
propriamente ambientais, constando nele apenas dados sobre saneamento básico, o que não o
qualifica como bom estimador para o desenvolvimento sustentável. Ele poderia ser usado como
complemento de outro índice ambiental para uma visão mais completa do bem-estar humano.
As figuras abaixo apresentam uma noção do índice DNA Brasil real e a comparação do
índice de 2004 com o índice de 2005.

Figura 1
Índice DNA Brasil – Brasil Real
Fonte: LOUETTE, Anne. Indicadores de Nações: uma contribuição ao diálogo da Sustentabilidade.
Compêndio de Indicadores de Sustentabilidade de Nações. 1.ª ed. WHH – Willis Harman House, 2007.
Vários Colaboradores. P. 50
109

Figura 2
Índice DNA Brasil – Comparação 2004/2005
Fonte: LOUETTE, Anne. Indicadores de Nações: uma contribuição ao diálogo da
Sustentabilidade. Compêndio de Indicadores de Sustentabilidade de Nações. 1.ª ed. WHH –
Willis Harman House, 2007. Vários Colaboradores. P. 50

Além do DNA Brasil, o país possui o Indicador de Desenvolvimento Sustentável,


indicador oficial formulado pelo governo. Ele foi elaborado pelo IBGE em 2002 e possui
informações sobre a realidade brasileira que integram as dimensões social, ambiental, econômica
e institucional. O conjunto das informações relatadas pelo indicador ajuda na comparação inter-
regional do Brasil, bem como na comparação deste com outros países, e indica as necessidades e
prioridades para a formulação e avaliação de políticas de desenvolvimento sustentável.
A edição de 2008 reuniu 60 indicadores, dentre eles 12 novos, relativos a questões
emergentes, que propiciam uma avaliação mais completa do desenvolvimento sustentável. Tais
indicadores são divididos da seguinte maneira através de suas quatro dimensões: ambiental (23
indicadores); social (19 indicadores); econômica (12 indicadores); e institucional (6 indicadores).
Devido ao maior número de indicadores ambientais, esta dimensão tem um peso maior na
formulação do índice. Além disso, eles se referem a quatro diretrizes: equidade – aspectos
distributivos; eficiência – uso racional dos recursos; adaptabilidade – diversificação, alternativas
110

nos processos de produção; e atenção a gerações futuras – recursos e bens econômicos,


ecológicos e humanos que serão legados às futuras gerações.
O IDS fornece em sua dimensão ambiental informações relacionadas com o uso dos
recursos naturais e com a degradação ambiental organizadas nos seguintes temas: atmosfera,
terra, água doce, oceanos, mares e áreas costeiras, biodiversidade e saneamento. Em sua
dimensão social, os indicadores abrangem os temas população, trabalho e rendimento, saúde,
educação, habitação e segurança, vinculados à satisfação das necessidades humanas, melhoria da
qualidade de vida e justiça social.
Já a dimensão econômica dos indicadores busca retratar o desempenho macroeconômico e
financeiro, os impactos no consumo de recursos materiais e uso de energia, mediante a
abordagem dos temas quadro econômico e padrões de produção e consumo. Além dessas
dimensões existe a dimensão institucional, desdobrada nos temas quadro institucional e
capacidade institucional, que oferece informações sobre a orientação política, a capacidade e os
esforços realizados com vistas às mudanças necessárias para a implementação do
desenvolvimento sustentável.
O IDS é um dos índices mais completos e específicos em termos de medição do
desenvolvimento sustentável brasileiro. Por esse motivo ele se torna um dos indicadores mais
indicados para analise do quadro de desenvolvimento sustentável no Brasil. Como o país foi
selecionado para o estudo de caso dessa dissertação, esse indicador pode ser adotado. A seguir
serão aplicados indicadores internacionais para o estudo do desenvolvimento sustentável no caso
brasileiro e será feita uma análise mais especifica do país buscando os dados oferecidos em seu
próprio território. Esse procedimento de estudo será feito para que se minimize o quanto possível
o aparecimento de viés no cenário do desenvolvimento sustentável.

3.2 A trajetória da sustentabilidade no Brasil

O Brasil é ator central nas discussões das questões ambientais, não só por sua política
externa bastante ativa nos fóruns sobre o tema, mas principalmente por ser um país rico em
recursos naturais e constituir a maior biodiversidade do planeta. O país é um exemplo singular do
modelo de desenvolvimento por substituição de importações. Em algumas áreas do país o
desenvolvimento alcançado o coloca entre os países ricos – que em relação ao meio ambiente
111

sofrem com a superexploração de recursos, poluição e consumo exacerbado –, em outras áreas há


necessidade de recursos básicos como saneamento e habitação, o que o posiciona como país
pobre e que necessita se desenvolver.
Essa situação interna provoca posicionamentos às vezes conflituosos em sua política
externa. Com relação às questões ambientais o posicionamento brasileiro sempre foi a favor do
desenvolvimento. Inicialmente, em favor do desenvolvimento em oposição ao meio ambiente e
posteriormente em favor do desenvolvimento sustentável.
Na Conferência de Estocolmo, o objetivo brasileiro foi remover obstáculos ao seu
crescimento na esfera internacional, e logo o país ganharia o status de vilão. As teses brasileiras
levadas a Conferência podem ser assim resumidas:
A poluição não é um conceito absoluto (como a soberania), mas relativo, e se a interferência
humana sobre o meio ambiente fosse tomada em termos absolutos, seria necessário eliminar a
humanidade; os países em desenvolvimento não são poluidores, apenas possuem pequenos cistos
de poluição; nos países menos desenvolvidos, a degradação ambiental deriva da pobreza, que
origina fenômenos como erosão do solo, favelas e queimadas. Com o crescimento econômico, a
poluição da pobreza pode ser corrigida, e uma parcela do bolo pode ser destinada à correção da
poluição da afluência (como é designada a poluição resultante do consumo dos países
desenvolvidos). Por um lado, gastos com meio ambiente são ilegítimos quando representam
desvios de fundos que seriam destinados ao crescimento econômico; por outro, sempre que altos
níveis de renda são atingidos, a proteção ao meio ambiente se torna prioridade; finalmente a
principal responsabilidade para com a proteção do meio ambiente é dos países desenvolvidos, e a
principal responsabilidade dos subdesenvolvidos é atingir altos níveis de desenvolvimento.
(DUARTE, 2007, p.18)

O Brasil acabou saindo fortalecido da Conferência de Estocolmo, pois conseguiu atingir


seu objetivo de atrelar o tema ambiental à agenda desenvolvimentista, o que mais tarde originaria
a ideia de desenvolvimento sustentável. Apesar desse feito, é notório o efeito negativo que teve a
posição brasileira frente à comunidade internacional. Por muitos anos o Brasil teve que lutar
contra o estigma de grande poluidor e destruidor ambiental. Esse quadro só mudaria 20 anos mais
tarde, com a RIO-92.
No início da década de 1990, o país adotou uma postura proativa na questão ambiental, a
começar por sua proposta de sediar a CNUMAD. Essa era uma decisão que representava altos
riscos, uma vez que era a primeira vez que um país em desenvolvimento sediaria um evento de
tal porte, mas o pensamento do governo era o de que, politicamente e em matéria de imagem, o
país tinha mais a ganhar do que a perder ao se oferecer como sede.
Uma grande diferença entre as duas Conferências foi a grande participação da sociedade
civil nos debates, principalmente no Brasil, onde foi criado um fórum de discussão prévio para
112

formar a agenda do país na RIO-92, deixando o debate ambiental mais rico. Para André Aranha
Corrêa do Lago,
Estes temas, provenientes muitas vezes da agenda internacional, e introduzidos de maneira parcial
e ‘de cima para baixo’ na agenda interna, passaram a ser discutidos ‘de baixo para cima’, graças à
maior participação da sociedade civil nos planos político, social e econômico. Assim, o meio
ambiente conquistou, progressivamente, maior legitimidade nos países em desenvolvimento.
(2007, p.55)

O Brasil sempre esteve longe de ter uma posição de alinhamento aos países
desenvolvidos. O pensamento brasileiro sempre foi o de que os países ricos eram os principais
responsáveis pelas ameaças globais ao meio ambiente. Todavia, com a redemocratização, o Brasil
assumia perante sua sociedade civil a parcela de responsabilidade que lhe cabia em relação aos
problemas ambientais e a forma de combatê-los. Ainda assim, o país continuaria a defender que
“o desenvolvimento econômico era o melhor caminho para lidar com os problemas ambientais e
que a soberania sobre seus recursos naturais era indiscutível62” (LAGO, 2007, p.153).
Para o Brasil, a Conferência do Rio era de extrema importância, pois era uma forma de
resguardar os princípios pelos quais o país havia lutado em Estocolmo. Como anfitrião, o Brasil
deveria manter posições firmes, mas sem perder o foco de que sua atuação deveria levar em conta
a necessidade de se chegar a um consenso. Esse consenso significaria o sucesso da Conferência e,
sobretudo, do Brasil, melhorando a imagem externa do país.
A participação brasileira na Conferência foi bem sucedida. De acordo com Lílian C. B.
Duarte, “Para o Brasil a Conferência do Rio permanece como um marco das relações
multilaterais e um êxito diplomático que correspondeu às expectativas e aos objetivos.” (2003,
p.43) O Brasil atuou em defesa do desenvolvimento e da soberania nacional e buscou articular
posições em prol de consensos. Mas o seu maior êxito foi ter conseguido modificar sua imagem
no exterior, passando de grande vilão ambiental à grande defensor do desenvolvimento
sustentável.
Após a Conferência, a posição Brasileira continuou a ser a da defesa do desenvolvimento
para os países mais pobres e a mudança no padrão de consumo dos países mais ricos. A
Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional (CPDS),
trabalhou na criação do documento da Agenda 21 Brasileira, em resposta à Conferência do Rio
62
A posição do Brasil em relação a sua soberania ficou evidenciada na questão das florestas. A posição dos países desenvolvidos
era de transformar as florestas tropicais em bens comuns globais, o que prejudicaria diretamente a soberania nacional em relação à
Amazônia. O argumento era de que os países em desenvolvimento não tinham condições de cuidar de tais bens, que possuíam
uma grande biodiversidade a ser explorada e cuja destruição provocaria quantidades preocupantes de emissões de gases do efeito
estufa. O Brasil contra argumentava que as florestas não eram capazes de absorver a quantidade de gases lançados na atmosfera
pelos países desenvolvidos e ainda que esse argumento ia contra todos os princípios de soberania acordados em Estocolmo.
113

de 1992. A CPDS é presidida pelo Ministro do Meio Ambiente, e é composta por representantes
do Ministério do Planejamento, do Ministério das Relações Exteriores, do Ministério da Ciência e
Tecnologia, do Gabinete Civil e membros da sociedade civil, incluindo as ONGs.
O documento foi assinado em julho de 2002 pelo presidente Fernando Henrique Cardoso,
como preparação para a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, ocorrida em
Joanesburgo no mesmo ano. Esta estratégia abrangente não é classificada como um documento
oficial do governo. Pelo contrário, a Agenda 21 Brasileira foi criada através de anos de ampla
consulta em todos os setores da sociedade e por isso é classificada como um "pacto social".
Embora a Agenda 21 Brasileira não seja considerada uma estratégia de desenvolvimento
sustentável nacional, ela observa que o objetivo comum a ser alcançado não é restrito à
preservação do meio ambiente por si só, mas a um progressivo e ampliado desenvolvimento
sustentável, que traz para discussão a busca de equilíbrio entre crescimento econômico, equidade
social e preservação ambiental. Ela expande o conceito de desenvolvimento sustentável e como a
situação do Brasil se encaixa no contexto internacional.
A maior parte da Agenda 21 Brasileira define objetivos, incluindo ações e
recomendações. Estes são organizados nas seguintes áreas prioritárias: a economia na sociedade
do conhecimento; inclusão social para uma sociedade solidária; estratégia para a sustentabilidade
urbana e rural; estratégia para os recursos naturais: água, biodiversidade e florestas; e
governabilidade e ética para a promoção da sustentabilidade. Os componentes finais da Agenda
incluem uma discussão sobre mecanismos de implementação e instrumentos, acompanhado por
uma visão geral das realizações já concebidas no país.
O documento procurou estabelecer uma negociação balanceada entre seus objetivos, as
políticas ambientais e as estratégias de desenvolvimento econômico e social na intenção de
consolidá-los dentro do processo de desenvolvimento sustentável. Ela também identificou
algumas medidas que deveriam ser tomadas com o objetivo de superar as restrições econômicas,
políticas, institucionais e culturais como o aumento da consciência ambiental, abrindo a estrutura
do sistema político nacional para políticas direcionadas para a redução das desigualdades e
redução da pobreza e identificando fontes viáveis de recursos financeiros.
A cada quatro anos, o governo brasileiro promove seu Plano Plurianual – PPA, onde são
incluídos programas que recebem fundos da União. Em sua versão para os anos de 2000-2003, o
114

plano incorporou informações sobre consultas realizadas e documentos escritos até aquele
momento que se referiam à temas básicos da Agenda 21 Brasileira.
Esperava-se que, incorporando estes temas ao nível do planejamento nacional
eventualmente, eles fossem incorporados também às políticas públicas. Entre os anos de 2004-
2007, o PPA previu um maior corte orçamental para o setor ambiental. Ao mesmo tempo, o novo
PPA promoveu a inserção da dimensão ambiental na estratégia de desenvolvimento nacional. Isso
demonstra a disponibilidade do governo em integrar as questões ambientais com a política de
desenvolvimento do Brasil.
O Brasil também está envolvido ativamente com outros países latino-americanos em uma
variedade de iniciativas de desenvolvimento sustentável, como a Iniciativa da América Latina e
Caribe. O país também assinou a "Declaração Presidencial sobre a Cúpula Mundial sobre
Desenvolvimento Sustentável", que foi apresentada conjuntamente em julho de 2002 pelos
Presidentes da América do Sul. Esta declaração reiterou o compromisso desses países para a
implementação da Agenda 21. De acordo com as Nações Unidas,
President Lula is also demonstrating commitment to Latin American relations in an effort to
ensure that South American countries can gain a respectable and competitive position in a
globalized world. (O Presidente Lula também tem demonstrado compromisso para as relações da
América Latina num esforço para assegurar que os países da América do Sul possam obter uma
posição respeitável e competitiva num mundo globalizado.) (JICA 2003, p.2, apud. UN, 2004,
p.4).

Com relação aos indicadores de desenvolvimento sustentável, o Ministério do Meio


Ambiente trabalha nesta área e atualmente é divulgado a cada dois anos o Indicador de
Desenvolvimento Sustentável oficial. Segue abaixo um quadro relacionando as iniciativas de
desenvolvimento sustentável promovidas pelo Brasil após a RIO-92.
115

Iniciativa Resumo

O Brasil tem uma ampla gama de instrumento de legislação ambiental em


vigor. Uma peça particularmente crítica da legislação é a Lei de Crimes
Ambientais que foi aprovada em Fevereiro de 1998. Esta lei estabelece uma série
de infrações administrativas e crimes contra o meio ambiente, bem como suas
Lei de crimes ambientais (Lei sanções correspondentes. Ela estabelece multas de até US$ 50 milhões e penas
9605) de prisão por crimes que vão desde abate ilegal de árvores e morte de
animais selvagens à poluição industrial e graffiti. Porém o nível de
implementação da lei não está claro. Além disso, vários artigos foram
vetados seis meses após sua aprovação, o que tirou muito do poder que esta
lei foi projetada para ter.

Para orientar políticas públicas e decisões privadas sobre a promoção do


desenvolvimento da Amazônia sem abrir mão de seu patrimônio natural, o
Brasil determinou que era necessário conhecer a extensão e localização do
desmatamento. O instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) implementou
Controle do Desmatamento da o projeto Prodes, com o objetivo de garantir a continuidade na geração
Amazônia de estimativas de desmatamento oficial. O projeto é baseado na análise de 229
imagens de satélite que cobrem a região (cerca de 4 milhões de quilômetros
quadrados). Este projeto não só fornece uma imagem visual da taxa
de desmatamento na área, como permite que as atividades de exploração não
autorizadas possam ser identificadas (MMA 2002, cap. 6, p. 4).

A CPDS foi criada em 1997. Esta Comissão é presidida pelo Ministro do Meio
Ambiente. Tem representantes da Ministério do Planejamento, Orçamento e
Gestão, do Ministério das Relações Exteriores, do Ministério da Ciência e
Comissão de Políticas de
Tecnologia, do Gabinete Civil, e membros da sociedade civil, incluindo ONGs e
Desenvolvimento Sustentável
academia (Socioambiental 2002, p. 1). Esta Comissão criada com êxito da
e daAgenda 21 Nacional (CPDS)
Agenda 21 Brasileira, com a entrada de mais de 40.000 pessoas. Foram
realizadas consultas com todos os setores da sociedade, e em todos os níveis de
governo.

Quadro 8
Iniciativas de Desenvolvimento Sustentável Selecionadas – Brasil
Fonte: UNITED NATIONS. Brazil Case Study: Analysis of National Strategies for Sustainable Development. In: National Strategies for
Sustainable Development: Challenges, Approaches, and Innovations Based on a 19-country Analysis – 2004. Disponível em: <
http://www.iisd.org/ measure/capacity/sdsip.asp >

No início do século XXI, o Brasil buscava ganhar espaço de maneira mais independente
dentro do tema ambiental e afastado dos interesses dos países desenvolvidos. Na Cúpula Mundial
sobre Desenvolvimento Sustentável, ocorrida em Joanesburgo no ano de 2002, o país defendeu a
assinatura do Protocolo de Quioto por todos os países, cobrou o fim do protecionismo dos países
ricos e argumentou em favor das “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”.
A grande preocupação brasileira em Joanesburgo foi tentar manter o compromisso da
transferência de 0,7% do PNB dos países desenvolvidos para o desenvolvimento dos demais e a
reafirmação do principio das “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”. Mesmo
116

reconhecendo que houve poucas vitórias ao fim da Conferência, o país contabilizou como êxito a
manutenção desse princípio da RIO-92.
Dentro da Cúpula, a “Proposta Brasileira de Energia” teve um papel relevante nas
negociações. Ela sugeria que os países aumentassem suas matrizes energéticas renováveis para
pelo menos 10% de seus totais, mas não foi aceita. Nesse caso ficou decidido que cada país
ficaria livre para atingir uma meta, sem qualquer prazo, para adoção de fontes de energia
renováveis.
O Brasil saiu fortalecido de Joanesburgo, apesar de a Conferência ser considerada por
muitos um fracasso em termos de avanço nas questões ambientais. O país se fez presente através
de uma diplomacia forte que tinha o intuito de utilizar as vantagens de sua posição como potência
média para a projeção do país como uma “potência verde” conseguindo maior espaço no cenário
internacional. Sua posição em torno do desenvolvimento foi mantida, mas direcionada ao
desenvolvimento sustentável e com um tom válido tanto para países do Norte como para países
do Sul.
Atualmente, o país vive um momento político-econômico favorável para um
desenvolvimento ambientalmente sustentável e socialmente justo. A renda per capita dos
brasileiros no ano de 2009 foi de R$ 16.416,00; isto significa que tivemos um PIB de 3,14
trilhões de reais, para uma população de 191 milhões de habitantes. De acordo com a publicação
do CONFEA, Propostas para o Desenvolvimento Sustentável Brasileiro,
Felizmente, há, hoje, a percepção de que a sociedade em geral entende que as questões associadas
à ocupação e integração do território nacional, necessárias para garantir o desenvolvimento que é
sinalizado e desejado por todos, devem ser efetivadas com a garantia dos pressupostos da
sustentabilidade plena: justa distribuição de riquezas; redução das desigualdades sociais e
regionais; e respeito ao meio ambiente. (2010, p.5).

O Índice de Desenvolvimento Humano brasileiro aumentou de 0,757 no ano 2000 para


0,777 no ano de 2010 e o Índice de Gini63, ainda mostra uma elevada concentração de renda no
desenvolvimento brasileiro. O país é o terceiro mais desigual da América Latina, porém a relação
de desigualdade veio diminuindo paulatinamente ao longo da década de 2000, passando de 0,607
para 0,560 em 2010. Estes parâmetros estão no centro da discussão para se construir um modelo
de desenvolvimento que não leve em conta somente a produção de riquezas definidas no PIB,
mas também novos parâmetros de sustentabilidade ambiental e social.
63
Medida do grau de concentração de renda em um país. Ele consiste em um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa
igualdade de renda (onde todos têm a mesma renda) e 1 corresponde à completa desigualdade (onde uma pessoa tem toda a renda,
e as demais nada têm). O índice de Gini é o coeficiente expresso em pontos percentuais (é igual ao coeficiente multiplicado por
100).
117

Ainda segundo a publicação do CONFEA,


as diretrizes gerais que devem nortear os programas de governo, essenciais à transformação
sustentável da natureza para assegurar o nosso desenvolvimento, são: políticas públicas
continuadas e adequadas às realidades regionais dentro de uma identidade territorial nacional,
formuladas com a participação da sociedade; planejamento e intervenções de integração
considerando a sustentabilidade ambiental; interiorização do desenvolvimento com ocupação
racional e equilibrada de grandes áreas ociosas e desabitadas; projetos de infraestrutura que
compatibilizem a ocupação territorial com os meios de produção; utilização de novas tecnologias,
prioritariamente nacionais, para produção das infraestruturas necessárias ao desenvolvimento e
crescimento almejados; conservação e uso racional dos recursos naturais, com o gerenciamento
integrado de bacias hidrográficas visando à racionalização do uso da água, do solo, da energia e
dos modais de transportes; e garantia da capacidade de gestão do patrimônio ambiental, da
independência científica, técnica e tecnológica, tanto na administração pública como no setor
produtivo, para assegurar a soberania nacional. (2010, p. 7)

3.2.1 Incentivos brasileiros ao desenvolvimento sustentável

A sustentabilidade da economia brasileira deve ser composta por vários temas setoriais
que formam a base do desenvolvimento do país. Dentre os quais podemos citar o direcionamento
do setor de energia para a obtenção de uma matriz energética cada vez mais limpa, investindo em
combustíveis oriundos de fontes renováveis. A matriz energética brasileira apresentou em 2009
uma proporção de energia renovável ainda maior que aquela observada nos anos recentes,
atingindo 47,3%. Segundo o CONFEA,
A oferta interna bruta de energia em 2007, produzida a partir de fontes renováveis, foi equivalente
a 46% – biomassa = 31,1%; e hidráulica = 14,9%. Para se estabelecer a comparação, em todo o
mundo a participação das fontes renováveis é limitada a 12,9%; nos países da OCDE atinge, no
máximo, 6,7%. (2010, p. 15).

A hidroeletricidade tem sido a vocação histórica do Brasil e ainda é possível, pelo menos,
triplicar a atual capacidade instalada, respeitando os modernos princípios de preservação
ambiental e os direitos dos residentes nas áreas atingidas pelas barragens. O Brasil é o terceiro
país do mundo com maior potencial hidroelétrico ainda aproveitável, ficando abaixo apenas da
China e dos EUA. Todavia, hoje, sem prejuízo à expansão da hidroeletricidade, deve-se dar
crescente ênfase a outras formas de energia renováveis.
Para diversificar as suas fontes de energia renovável, o Brasil tenta aumentar o uso de
biomassa proveniente da cana-de-açúcar. Os investimentos na área são em função do aumento de
produtividade e diminuição dos gargalos nos insumos de produção da lavoura canavieira;
Eliminação das queimadas na fase da colheita; aumento do aproveitamento da biomassa sólida
(bagaço e palhas) na produção de etanol (hidrólise) e energia elétrica (cadeiras de maior pressão e
118

gaseificação); e estímulo do recebimento de créditos de carbono pelos efeitos positivos do uso da


cana-de-açúcar no setor energético.
Em relação aos combustíveis, o Brasil procura estimular o uso de biodiesel em sua frota
de transporte. Para tanto investe em pesquisa e desenvolvimento de combustíveis provenientes de
oleaginosas. Além disso, estimula o uso dos resíduos urbanos para produção de biodiesel, óleos
vegetais residuais e esgotos urbanos e resíduos agrícolas para produção de biodiesel, com ênfase
no uso de gorduras animais (sebo bovino, gordura de frango e porco), resíduos orgânicos da
suinicultura para biodiesel e biogás.
Em relação aos combustíveis fósseis, a participação brasileira na matriz mundial tem
crescido consideravelmente nos últimos anos, em função do aumento da produção de petróleo e
gás natural, com destaque para a produção off-shore. A autossuficiência do petróleo foi
confirmada em 2009. Pelo terceiro ano consecutivo, o balanço físico (quantidades) da conta
petróleo foi positivo. A produção de óleo cru cresceu, em 2009, 7,3%, colocando o Brasil entre os
15 maiores produtores mundiais.
O uso dos combustíveis fósseis deve ser feito com uma maior cautela por estes serem
altamente poluentes. O Brasil necessita rever riscos ambientais da produção de petróleo off-shore
e implementar novos instrumentos de controle. Nesse caminho, a utilização do pré-sal deve ser
feita de forma a garantir uma exploração sustentável com soberania nacional sobre os recursos
minerais e destinação dos recursos financeiros do Fundo Social proposto pelo Governo,
principalmente à mitigação dos eventuais danos ao ambiente.
Mesmo considerando-se a ampliação das fontes energéticas renováveis, o petróleo
continuará tendo papel essencial nos próximos 20 anos. No Brasil, o consumo de petróleo
evoluirá de 1,95 milhão (2008) para cerca de 3,0 milhões (2030) de barris por dia (bpd). O acesso
às reservas de petróleo é uma das principais causas de crises, conflitos e guerras internacionais,
principalmente porque os países desenvolvidos são fortemente dependentes da importação.
Segundo a publicação do CONFEA,
Em 1977, entre o primeiro e o segundo choque do petróleo, Henry Kissinger (professor da
Universidade de Havard, diplomata e ex-secretário de Estado norte-americano) já previa: “Os
países industrializados não poderão viver da maneira como existiram até hoje, se não tiverem à sua
disposição os recursos naturais não renováveis do planeta, a um preço próximo do custo de
extração e transporte e, se elevados, sem perda de relação de troca pelo reajustamento
correspondente nos seus produtos de exportação. Para tanto, terão os países industrializados que
montar um sistema mais requintado e eficiente de pressões e constrangimentos políticos,
econômicos ou mesmo militares, garantidores da consecução dos seus intentos. (Folha de São
Paulo 29/06/1977, apud. CONFEA/CREA, 2010, p.31).
119

O Brasil se encontra numa posição altamente privilegiada. É um país com grande mercado
consumidor, matriz energética diversificada, sólido parque industrial, alta tecnologia petrolífera,
além de estabilidade institucional, econômica e jurídica. Graças às descobertas no Pré-Sal,
continuará autossuficiente por muitos anos e, futuramente, será um importante ator no cenário
petroleiro mundial, como exportador de derivados e de petróleo bruto.
Para o Brasil, esse cenário aponta: segurança energética e blindagem quanto a eventuais
crises energéticas mundiais; geração de divisas com exportação, aumentando o superávit da
balança comercial; diversificação da economia, incluindo a aplicação de mais recursos em saúde,
educação, habitação, pesquisa tecnológica e infraestrutura, apenas com as receitas geradas pela
renda petrolífera governamental; criação e desenvolvimento de tecnologia de ponta, consolidando
a liderança em exploração e produção (E&P) off-shore; e aumento da importância econômica e
geopolítica no cenário latino-americano e mundial.
Um dos pontos centrais do desenvolvimento sustentável, além da questão energética é o
setor de transportes. Hoje, o transporte é um fator preponderante para a integração entre nações
do mundo globalizado. O custo de transporte representa a maior parte do custo logístico total das
empresas e o desempenho em custo da logística de transporte está relacionado à qualidade e à
oferta de infraestrutura viária, de veículos e de terminais.
A questão dos transportes também pode ser pensada em termo sustentáveis ao se fazer um
esforço na mudança da base hoje eminentemente rodoviária, com a construção de mais ferrovias
e hidrovias, inclusive como elementos de integração continental, além da melhoria dos portos
para resgatar o potencial marítimo, visando à redução do consumo de energia e de emissões.
Seria necessário priorizar o transporte coletivo, assegurando modos adequados à realidade das
cidades, em contraponto a ótica vigente de se financiar o transporte individual motorizado.
Atualmente, o Brasil conta com uma rede de infraestrutura que não opera de forma
eficiente os modais em todas as regiões, o que leva a um grave desequilíbrio na matriz de
transporte. A falta de políticas direcionadas para o transporte urbano e o incentivo cada vez maior
do uso de transporte individual gera um aumento significativo do número de veículos nas
avenidas e ruas dos grandes centros gerando congestionamentos e poluição. Com isso aumentam
o tempo e os custos das viagens. De acordo com o CONFEA,
O pífio investimento estatal em transportes – média de 0,2% do PIB ao longo dos últimos anos –
tem se concentrado no modal rodoviário, ultrapassando 4/5 do total, o que tende a manter e
reproduzir o quadro atual. A malha ferroviária apresenta uma série de gargalos físicos e logísticos.
Esses entraves comprometem a competitividade, a eficiência e a capacidade da malha nacional e
120

dos corredores de transporte ferroviários. [...] O modal aquaviário é pouco competitivo. A bandeira
brasileira é cada vez menos significativa na navegação internacional, com o sucateamento da
marinha mercante, impulsionado pelo processo de privatização, acarretando maior dispêndio de
divisas para pagamento de fretes no comércio exterior – cerca de R$ 6,5 bilhões por ano. Já a
navegação de cabotagem, que deve ser fundamental para os transportes de cargas no Brasil e na
América do Sul, é pouco utilizada e se ocupa essencialmente de granéis líquidos e sólidos. Os
portos brasileiros enfrentam uma série de problemas de curto, médio e longo prazo para a operação
eficiente. O setor privado não reúne condições ou interesse de realizar os investimentos
necessários. (2010, p. 45)

São necessários investimentos anuais da ordem de 2% do PIB, no mínimo, para mudar em


quatro anos a infraestrutura de transportes do país, iniciando a reestruturação da matriz de
transportes. A intermodalidade dá a opção de usar o modal mais barato no transporte de
mercadorias no momento adequado. Esses investimentos podem ser contados como parte dos
investimentos em desenvolvimento sustentável, já que procuram matrizes mais limpas como a
navegação e o transporte ferroviário, diminuindo o impacto do setor de transporte na poluição
ambiental.
Os impactos ambientais ocasionados pelo sistema de transportes são expressivos e intensivamente
abordados no meio técnico-científico. Quando se observa a falta de infraestrutura adequada para o
transporte de cargas e passageiros ou a operação ineficiente do sistema, agravados pela baixa taxa
de renovação de frota, os problemas ambientais e energéticos são multiplicados, o que se configura
como um problema ambiental com sérias consequências. (CONFEA/CREA, 2010, p.50)

Outro foco do desenvolvimento sustentável está no fornecimento de habitações e


saneamento à população. No caso brasileiro, o modelo de desenvolvimento adotado induziu o
crescimento desordenado das cidades, provocando um desequilíbrio brutal na ocupação do
espaço territorial. As questões como habitação e saneamento devem ser resolvidas para que a
população consiga de fato usufruir de verdadeira qualidade de vida, um dos propósitos do
desenvolvimento sustentável. O planejamento urbano é um investimento social progressivo a
longo prazo, que possibilita a instalação de infraestrutura que atenda as reais demandas da
população, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida de seus habitantes. Atualmente em
torno de 85% da população brasileira mora nas cidades.
A sustentabilidade está diretamente relacionada com a questão habitacional, já que é
através de políticas habitacionais e de saneamento que se eleva a qualidade de vida da população
e se protege o meio ambiente. Uma política que vise eliminar o déficit habitacional é capaz de
assegurar, ao mesmo tempo, que as áreas de riscos ocupadas por moradias não adequadas possam
ser reflorestadas, ou seja, há um ganho duplo em termos sociais e ambientais.
O saneamento é apontado como o item mais importante para a sustentabilidade ambiental
e social dentro da questão habitacional brasileira. A universalização do tratamento e distribuição
121

de água, da coleta, tratamento e destinação dos esgotos e resíduos sólidos e da drenagem nas
cidades brasileiras, um dos objetivos do milênio, exigirão o investimento mínimo de nove bilhões
de reais ao ano, durante os próximos 20 anos.
Segundo o CONFEA, as primeiras análises realizadas a partir dos dados da PNAD 2007 –
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, conclui que há muitas desigualdades regionais,
setoriais (urbano x rural), raciais e socioeconômicas nos serviços de abastecimento de água; as
mesmas conclusões se aplicam ao esgotamento sanitário, onde as desigualdades são mais
profundas. (2010, p. 86). Diferentemente das outras políticas públicas, o Brasil não conseguiu
estabelecer um Sistema de Saneamento, dificultando a atuação dessa política.
Esses números analisados não dizem respeito a uma questão bem mais grave que é a perda
em torno de 40% da água produzida, a ausência de tratamento de esgotos que atinge no máximo
30% da população, e ausência de tratamento adequado dos resíduos sólidos coletados que ficam
expostos nos lixões presentes na grande maioria dos municípios brasileiros.
A questão ambiental também passa transversalmente pela questão agrária. O setor
agropecuário tem um forte peso na economia brasileira, seja representado pelo agronegócio, pela
exportação de commodities ou pela agricultura familiar que abastece as famílias brasileiras. O
Brasil necessita de uma transformação profunda na estrutura agrária, no sentido de abrir enormes
espaços de manobra para a produção de alimentos, não como prioridade para a exportação de
commodities, mas para suprir a mesa dos brasileiros. O apoio a agricultura familiar entra nesse
contexto não só pela aplicação dos recursos de forma racional, mas também como fixação das
famílias no campo, possibilitando o desenvolvimento igualitário entre o campo e a cidade.
O agronegócio brasileiro é, sem dúvida, de suma importância para a geração de divisas e
para o desenvolvimento da sociedade e um dos principais responsáveis pelo saldo positivo da
balança comercial brasileira. A produção nacional de grãos cresceu mais de 105% na última
década e meia. O Agronegócio Brasileiro representava em 2007, segundo a Organização Mundial
do Comércio, 6,0% do comércio mundial de exportações, enquanto somando todas as
exportações brasileiras, o país atingia 1,6% do total mundial.64
A capacidade da atuação do Estado Brasileiro na área ambiental baseia-se na ideia de
responsabilidades compartilhadas entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios e entre
esses e os demais setores da sociedade. Vários sistemas e entidades foram criados nas últimas

64
Fonte: CONFEA; CREA. Propostas para o Desenvolvimento Sustentável Brasileiro. Agosto de 2010, p. 96.
122

duas décadas para articular e dar suporte institucional e técnico para a gestão ambiental no País.
Mesmo assim, a falta de capilaridade, isto é da capacidade de fazer chegar suas ações o mais
próximo possível dos cidadãos, a escassez de recursos financeiros e de pessoal, assim como a
falta de uma base legal revisada, consolidada e implementada constituem os principais problemas
enfrentados pelo segmento ambiental brasileiro.
Dentre estes, o principal problema repousa na inexistência dos órgãos locais. Em 2002
somente 5,86% dos municípios brasileiros possuíam instâncias municipais dedicadas
exclusivamente às ações ambientais, tais como secretarias de meio ambiente. Já em 2009, ocorreu
uma expansão no setor. Do total das cidades brasileiras, 56,3% já contavam com conselhos de
meio ambiente e 84,5% com algum órgão que exercia ações voltadas para o controle ambiental.
O fato de, pela primeira vez, mais de 50% dos municípios constituírem conselhos de meio
ambiente mostra que a questão está sendo tratada de forma mais integrada65.
Em dezembro de 2009, foi instituída a Política Nacional sobre Mudança do Clima –
PNMC – que estabeleceu cinco instrumentos institucionais para a sua execução: o Comitê
Interministerial sobre Mudança do Clima, a Comissão Interministerial de Mudança Global do
Clima, o Fórum Brasileiro de Mudança do Clima, a Rede Brasileira de Pesquisas sobre Mudanças
Climáticas Globais (Rede Clima) e a Comissão de Coordenação das Atividades de Meteorologia,
Climatologia e Hidrologia.
O Brasil tem um perfil de emissões de gases de efeito estufa (GEE) muito singular,
destoando do perfil mundial, geralmente caracterizado por altas emissões no setor de energia. No
nosso perfil, as questões do desflorestamento e da agropecuária – principalmente a pecuária – têm
importância inusitada devido ao fato de o Brasil ter a maior reserva de floresta tropical mundial, à
importância da agropecuária e ao perfil energético extraordinariamente limpo do Brasil.
Apesar de o Brasil ter resistido durante muito tempo à fixação de metas de redução de
emissões, em 13 de novembro de 2009, um pouco antes da Conferência das Nações Unidas sobre
Mudança do Clima – COP15, o Brasil anunciou sua meta de redução, na faixa entre 36,1% e
38,9% de suas emissões projetadas até 2020.
Destaca-se que, diferentemente das metas dos países desenvolvidos – estabelecidas em
Quioto – que têm como referência a emissão no passado – 1990 – as metas dos países em
desenvolvimento se referem a valores futuros, no caso do Brasil o cenário tendencial é o de 2020.
65
Fonte: CONFEA; CREA. Propostas para o Desenvolvimento Sustentável Brasileiro. Agosto de 2010, p. 102.
123

Essa diferença seria atribuída ao discurso de que os países em desenvolvimento teriam o direito
de alcançar o desenvolvimento pleno, permitindo-lhes certo nível de emissão.
Dentro da questão hidrográfica, o Brasil tem uma posição privilegiada perante a maioria
dos países quanto ao seu volume de recursos hídricos, alcançando uma vazão media superficial
de 179 mil m3/s, aproximadamente 12% da disponibilidade mundial. Porém, mais de 73% da
água doce disponível do País encontra-se na bacia Amazônica. Hoje, o Brasil, conta com uma
população de 191 milhões de habitantes, dentre os quais 18 milhões estão na Amazônia, ou seja,
cerca de 10% da população. A conclusão que se chega é de que apenas 27% dos recursos hídricos
estão disponíveis para 90% da população.
No País, os estados de Pernambuco, Paraíba, Sergipe, Alagoas, Rio Grande do Norte e
Distrito Federal contam com stress hídrico periódico e regular enquanto Rio de Janeiro, Ceará,
São Paulo e Bahia somente ocasionalmente tenderão a sofrer problemas de falta de água. Nas
outras unidades não há observação sobre stress hídrico.
Como as questões ambientais são solucionadas, em sua maioria, através de processos
longos de pesquisa e monitoramento, é importante que a nação cuja intenção seja despontar como
referência na área ambiental invista em ciência, tecnologia e inovação (C,T&I). Seguindo essa
lógica, o Brasil se prepara para, finalmente, consolidar uma política de Estado em C,T&I capaz
de contribuir com o desenvolvimento sustentável, do ponto de vista econômico e socioambiental.
Os investimentos dos anos recentes em Educação e em C,T&I começam a promover uma
inflexão de tendências, pelos recentes resultados do Ideb – Índice de Desenvolvimento do Ensino
Básico, pelos novos campi, Universidades e Institutos Federais de Educação Tecnológica - IFES,
pela melhoria das condições das universidades públicas e pela ampliação substancial do número
de vagas no ensino superior, inclusive na pós-graduação. Dados atuais mostram que os recursos
aplicados em Ciência e Tecnologia no Brasil dobraram na última década. Entretanto, o
investimento privado na pesquisa e desenvolvimento tecnológico ainda é incipiente no país,
comparado com outros.
Em qualquer que seja a atividade científica, tecnologias, produtos e processos devem ser
desenvolvidos dentro de uma ótica de sustentabilidade, assegurando respeito ao meio ambiente.
O Brasil tem vantagens comparativas inequívocas para estar na linha de frente dessa discussão e
tornar-se uma potência no desafiante paradigma do desenvolvimento sustentável. Além de ser
uma das maiores economias em ascensão no mundo, o país possui reconhecido capital intelectual
124

científico e exerce protagonismo em questões básicas tais como uma matriz energética limpa, a
repartição dos benefícios da biodiversidade e as medidas de enfrentamento das mudanças
climáticas.

3.2.2 Aplicação dos indicadores de desenvolvimento sustentável para o caso brasileiro

3.2.2.1 O Indicador de Desenvolvimento Sustentável do IBGE

Um dos desafios da construção do desenvolvimento sustentável é o de criar instrumentos


de mensuração, como indicadores ou índices. Por tratar velhos problemas através de uma nova
abordagem, os indicadores de desenvolvimento sustentável congregam estatísticas e indicadores
já consagrados e amplamente utilizados e indicadores novos, formulados por informações apenas
recentemente associadas ao tema do desenvolvimento, portadores de novos conteúdo. De acordo
com a publicação do IBGE,
O trabalho de construção de indicadores de desenvolvimento sustentável do Brasil é inspirado no
movimento internacional liderado pela Comissão para o Desenvolvimento Sustentável - CDS, das
Nações Unidas (Commission on Sustainable Development - CSD), que [...] pôs em marcha um
programa de trabalho composto por diversos estudos e intercâmbios de informações, para
concretizar as disposições dos capítulos 8 e 40 da Agenda 21 que tratam da relação entre meio
ambiente, desenvolvimento sustentável e informações para a tomada de decisões. Em 1996, a CDS
publicou o documento Indicators of sustainable development: framework and methodologies,
conhecido como “Livro Azul”. Este documento apresentou um conjunto de 134 indicadores,
posteriormente reduzidos em uma lista de 57 indicadores apresentada no ano de 2000 e
consolidada como recomendação da CDS, em 2001, com a divulgação das fichas metodológicas e
diretrizes para sua utilização. O projeto do IBGE toma como referência as recomendações de
2001, adaptando seu conteúdo às particularidades brasileiras. No caso brasileiro, ao desafio de
construir indicadores capazes de caracterizar e subsidiar o processo de desenvolvimento
sustentável em nível nacional acresce-se a exigência de expressar a diversidade característica do
país. (2010, p. 11).

O Indicador de Desenvolvimento Sustentável do IBGE nada mais é do que um compêndio


de indicadores de várias dimensões. Isso traz vantagens e desvantagens para a análise. A
principal vantagem está na possibilidade de se olhar mais a fundo os problemas que prejudicam a
obtenção do grau desejado de desenvolvimento sustentável por cada setor analisado, vendo com
mais clareza o que precisa ser modificado e aprimorado. A desvantagem desse tipo de abordagem
de indicador é que ele não nos fornece um índice para que possa ser medido o desenvolvimento
sustentável em si, mas apenas resultados de suas dimensões que possuem diferentes aspectos e
escalas.
125

Assim ao analisar esse indicador não vamos obter um número que possa servir de
comparação com uma escala de desenvolvimento ou mesmo comparação entre países. O que ele
nos fornece é uma ampla visão do desenvolvimento sustentável através de quatro dimensões:
ambiental, social, econômica e institucional. Cada dimensão se subdivide em certo número de
indicadores. São cinquenta e dois indicadores divididos entre essas dimensões.
A dimensão ambiental do IDS diz respeito ao uso dos recursos naturais e à degradação
ambiental, e está relacionada aos objetivos de preservação e conservação do meio ambiente. Estas
questões aparecem organizadas nos temas atmosfera; terra; água doce; oceanos, mares e áreas
costeiras; de biodiversidade e saneamento. O tema saneamento foi adicionado à lista original da
CDS e reúne os indicadores relacionados ao abastecimento de água, esgotamento sanitário, coleta
e destino de lixo, os quais igualmente expressam pressões sobre os recursos naturais e envolvem
questões pertinentes à política ambiental, além de terem forte influência na saúde e na qualidade
de vida da população.
A dimensão social dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável corresponde,
especialmente, aos objetivos ligados à satisfação das necessidades humanas, melhoria da
qualidade de vida e justiça social. Os indicadores incluídos nesta dimensão abrangem os temas
população; trabalho e rendimento; saúde; educação; habitação e segurança, e procuram retratar o
nível educacional, a distribuição da renda, as questões ligadas à equidade e às condições de vida
da população, apontando o sentido de sua evolução recente.
A dimensão econômica dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável trata do
desempenho macroeconômico e financeiro do país e dos impactos no consumo de recursos
materiais, na produção e gerenciamento de resíduos e uso de energia. É a dimensão que se ocupa
da eficiência dos processos produtivos e das alterações nas estruturas de consumo orientadas a
uma reprodução econômica sustentável a longo prazo.
A dimensão institucional diz respeito à orientação política, capacidade e esforço
despendido por governos e pela sociedade na implementação das mudanças requeridas para uma
efetiva execução do desenvolvimento sustentável. Pode-se mencionar que esta dimensão aborda
temas de difícil conceituação e mensuração, carecendo de mais estudos para o seu
aprimoramento.
Dentro da dimensão ambiental, o indicador de atmosfera se subdivide em emissões de
origem antrópica dos gases associados ao efeito estufa que apresenta a estimativa das emissões de
126

origem antrópica líquidas (emissões menos remoções) dos principais gases causadores do efeito
estufa, por setor de atividade responsável pela emissão. Atualmente, o Brasil emite entre 2 e 2,5
milhões de Gq CO2 eq66 ante a emissão de 1,5 milhões em 1990, sendo a maior quantidade
provocada pela mudança no uso da terra e florestas .
Ainda no subitem atmosfera, temos a medição do consumo industrial de substâncias
destruidoras da camada de ozônio que expressa o consumo industrial anual dos tipos de
substâncias constantes nos anexos do Protocolo de Montreal (1987). O consumo de tais
substâncias vem caindo exponencialmente no país, baixando de 12 mil toneladas PDO67 de
consumo do gás CFC combinado com outros gases em 1999, para menos de dois mil em 2008.
No item atmosfera também é medida a concentração de poluentes no ar em áreas urbanas.
Este expressa a qualidade do ar e fornece uma medida da exposição da população à poluição
atmosférica nos grandes centros urbanos. A poluição do ar nessas áreas é um dos grandes
problemas ambientais da atualidade, com implicações graves na saúde da população. A
concentração de poluentes no ar é o resultado das emissões provenientes de fontes estacionárias
(indústrias, incineradores, etc.) e móveis (veículos automotores) conjugadas a outros fatores, tais
como: clima; geografia; uso do solo; distribuição e tipologia das fontes; condições de emissão; e
dispersão local dos poluentes.
O padrão nacional primário68 de qualidade do ar recomenda uma concentração de
partículas totais na faixa de 240 µg/m³69 num tempo de amostragem de 24h. A máxima
concentração anual observada de alguns poluentes nas regiões metropolitanas brasileiras (Belo
Horizonte, Curitiba, Distrito Federal, Porto Alegre, Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo, Recife e
Vitória) apresentou partículas totais em suspensão no ar concentradas na faixa de mil µg/m³ em
2008.
A dimensão ambiental também congrega o item terra. Dentro deste, encontra-se o subitem
do uso de fertilizantes, o qual demonstra a intensidade de uso de fertilizantes na produção
66
Medida correspondente a gás carbônico equivalente.
67
Potencial de destruição da camada de ozônio.
68
Padrões primários de qualidade do ar são as concentrações de poluentes que, ultrapassadas, podem afetar direta e imediatamente
a saúde da população. Podem ser entendidos como níveis máximos toleráveis de concentração de poluentes atmosféricos,
constituindo-se em metas de controle da qualidade do ar de curto e médio prazos. São valores de referência definidos pela
legislação pertinente que levam em consideração as emissões, as concentrações média e máxima permitidas, as condições e os
limites de saturação de cada poluente atmosférico. Fonte: IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Indicadores de
Desenvolvimento Sustentável: Brasil 2010. Estudos e Pesquisas Informação Geográfica nº 7. Rio de Janeiro: 2010, p. 30.
69
Micrograma por metro cúbico
127

agrícola de um território, em um determinado período. Estes são largamente utilizados para o


aumento da produtividade agrícola, estando associados à eutrofização70 dos rios e lagos, à
acidificação dos solos, à contaminação de aquíferos e reservatórios de água, à geração de gases
associados ao efeito estufa e à destruição da camada de ozônio.
O acompanhamento deste indicador permite avaliar tanto a evolução da produtividade
agrícola do país quanto os riscos à qualidade da água de rios, lagos e aquíferos subterrâneos. A
quantidade de fertilizantes comercializadas por área plantada vem crescendo no país, saindo de
69,4 kg/ha em 1992 para 143,7 kg/ha em 2008. O Brasil é o país que faz mais uso de fertilizantes
no mundo.
Ainda no item terra, está expresso o subitem uso de agrotóxicos, o qual mede a
intensidade de uso de agrotóxicos nas áreas cultivadas de um território, em determinado período.
O aumento da produção de alimentos de maneira sustentável continua sendo o grande desafio do
setor agrícola. Os agrotóxicos estão entre os principais instrumentos do atual modelo de
desenvolvimento da agricultura brasileira, centrado em ganhos de produtividade. Nesta década, o
consumo nacional de agrotóxicos e afins por área plantada ficou oscilando na faixa de 2,5 a 3,5
kg/ha.
O subitem de terras em uso agrossilvipastoril apresenta a proporção de terras
imediatamente disponíveis para a produção agrícola, pecuária e silvicultura, em um determinado
território. As informações utilizadas neste indicador são as áreas de lavoura temporária e
permanentes, as áreas de pastagens naturais e plantadas, as áreas ocupadas pelas florestas
plantadas com essências florestais, bem como a classe outros, que inclui, entre outras, as terras
degradadas (erodidas, desertificadas, salinizadas, etc.).
De acordo com a publicação do IBGE,
É incerta a capacidade da agricultura, da pecuária e da silvicultura em satisfazer a crescente
demanda por alimentos, recursos energéticos (combustíveis) e matérias primas de origem animal e
vegetal, em função do crescimento da população, do aumento dos padrões de consumo, das
pressões ambientalistas e da pressão que outros usos exercem sobre as terras disponíveis para a
agropecuária e a silvicultura. O acompanhamento deste indicador ao longo do tempo mostra as
variações da pressão sobre o recurso solo, e as crescentes disputas entre os diferentes tipos de uso
deste recurso. (2010, p. 61)

Quando comparamos a área total dessas terras nos Censos Agropecuários 1995-1996 e
2006, verifica-se uma redução de 19,9 milhões de hectares (-5,6%) em 2006, ressaltando-se que
as áreas transformadas em unidades de conservação ou em terras indígenas no período
70
Fenômeno causado pelo excesso de nutrientes (compostos químicos ricos em fósforo ou nitrogênio) numa massa de água,
provocando um aumento excessivo de algas.
128

intercensitário estão incluídas nessa análise. Para a área de pastagens plantadas observa-se um
aumento em relação ao total de 2,7 milhões de hectares (2,7%), ocorrendo uma grande
movimentação entre os estados, com deslocamento de áreas de pastagens para o Norte do país.
Assim, observa-se um aumento nas lavouras de 10,4 milhões de hectares (20,9%), distribuídos
por todas as regiões do país.
O período entre meados das décadas de 1990 e 2000 revela uma dinâmica socioeconômica
onde convivem complexos sistemas agroindustriais e cadeias produtivas altamente articuladas à
produção de commodities para o mercado mundial, com sistemas agrícolas simples, muitas vezes,
com discreta inserção no comércio local. Estes resultados têm importantes implicações sobre a
sustentabilidade da atividade agropastoril. Se por um lado a intensificação representa aumento de
produção por unidade de área, o que reduz a pressão sobre o recurso solo, por outro também
significa o aumento no uso de fertilizantes e agrotóxicos, e dos riscos de contaminação ambiental.
O subitem queimadas e incêndios florestais, expressa a ocorrência dos mesmos em um
determinado território. Além de provocar danos à biodiversidade, a exposição do solo à ação de
processos erosivos e o comprometimento dos recursos hídricos, as queimadas provocam a
geração e a transferência para a atmosfera de grandes quantidades de gases de efeito estufa,
especialmente CO2. Estima-se que a destruição da vegetação nativa e as queimadas sejam
responsáveis por 75% das emissões brasileiras de CO2 para a atmosfera.71 No Brasil, as
queimadas têm sido a forma mais usada para a conversão da floresta amazônica e do cerrado em
áreas agropastoris. A espacialização dos focos de calor evidencia a sua concentração em algumas
regiões do país. A mais extensa e recorrente corresponde ao chamado “Arco do Desflorestamento
e das Queimadas”, que abrange o sul e o leste da Amazônia Legal. De uma forma geral, os focos
de calor diminuíram ao longo da última década. Entre os anos de 2001 e 2005, a média de focos
estava acima de 200 mil enquanto que no fim da década esse número caiu para menos de 100 mil.
No item água doce da dimensão ambiental é medida a qualidade de águas interiores,
expressa pela Demanda Bioquímica de Oxigênio - DBO e pelo Índice de Qualidade da Água -
IQA. A falta de saneamento básico é um dos maiores problemas ambientais e sociais do país. O
baixo percentual de tratamento dos esgotos coletados e lançados em corpos d’água se reflete no

71
Além da medição das queimadas, o Indicador de Desenvolvimento Sustentável leva em consideração outros subitens como o
Desflorestamento da Amazônia Legal, a Área remanescente e desflorestamento na Mata Atlântica e nas formações vegetais
litorâneas e a Área remanescente e desmatamento no Cerrado.
129

alto valor de DBO e baixo IQA observado nos trechos dos rios que cortam grandes áreas urbanas,
atravessam zonas industrializadas, ou passam por muitas cidades de médio e grande portes.
A contaminação de rios por efluentes doméstico e industrial e resíduos sólidos encarece o
tratamento de água para abastecimento público e começa a gerar situações de escassez de
disponibilidade de água de qualidade em áreas com abundantes recursos hídricos. A expansão do
saneamento básico, especialmente da coleta e tratamento de esgotos, e a proteção de nascentes,
mananciais, várzeas e áreas no entorno dos rios, são ações urgentes e necessárias para a
conservação dos recursos hídricos das regiões mais densamente povoadas do Brasil. O limite
máximo de DBO estabelecido pelo CONAMA72 é de 5 mg/l. A média anual de DBO, em corpos
d'água selecionados (Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul) entre os anos
de 1992 e 2009, ficou abaixo do limite máximo estabelecido.
Na questão dos mares brasileiros, o indicador de balneabilidade apresenta o estado da
qualidade da água para fins de recreação em algumas praias do litoral num determinado período
de tempo. Além disso, ainda é medida a produção de pescado marítima e continental,
apresentando o volume de produção de pescado por modalidade, em um determinado território e
período de tempo.
A produção atual de pescado no Brasil ultrapassa as mil toneladas, sendo divida entre o
cultivo marítimo e continental e a pesca extrativa. A médio e longo prazos, a aquicultura deve
superar a pesca extrativa, passando a dominar a produção de pescado no país. Embora aquela
alivie a pressão sobre os estoques pesqueiro, marinho e continental, a atividade também gera
impactos ambientais, que vão desde a destruição de mangues e de outras formas de vegetação
nativa (para a instalação dos tanques de criação de peixes e camarões) até a poluição orgânica de
rios e estuários (descarte de efluentes dos criatórios).
Outro indicador utilizado é o que mede a população residente em áreas costeiras,
apresentando a proporção da população residente na zona costeira em relação ao total de
população de um determinado território (densidade populacional da zona costeira). A população
brasileira se concentra nas proximidades da costa. Vários problemas ambientais como o impacto
ambiental decorrente da poluição das águas, da contaminação do solo, da pressão populacional e
da especulação imobiliária, são especialmente verificados nesta região. Nas últimas décadas, tem
havido um movimento de interiorização, embora os percentuais na zona costeira ainda sejam

72
Conselho Nacional do Meio Ambiente
130

altos, entre 20% e 25% do total da população, e tenham se mantido estáveis desde os anos de
1990.
Dentro da dimensão ambiental, um indicador importante é o que mede a biodiversidade
existente. Nesse contexto estão explicitadas as medições do volume de espécies extintas e
ameaçadas de extinção, que apresenta o estado e as variações da biodiversidade, expressos pelo
número estimado de espécies nativas e número de espécies ameaçadas de extinção, nos principais
biomas brasileiros. O Brasil está incluído entre os países dotados da chamada megadiversidade,
grupo de 12 nações que abrigam 70% da biodiversidade total do planeta. Dentre as espécies
animais, o Brasil apresenta mais de seiscentas espécies em risco de extinção. Das espécies
vegetais, 29,7% estão ameaçadas de extinção.
O indicador de áreas protegidas expressa a dimensão e a distribuição dos espaços
territoriais que estão sob estatuto especial de proteção. Estes espaços são destinados à proteção do
meio ambiente, onde a exploração dos recursos naturais é proibida ou controlada por legislação
específica. O desenvolvimento sustentável abrange a preservação do meio ambiente, o que
implica na conservação dos biomas brasileiros. Para alcançar estas metas, a delimitação de áreas
protegidas é fundamental. O Brasil detém em seu território a maior biodiversidade do planeta.
Para proteger este patrimônio, o país destina uma área de mais de 750 000 km² a UCs73 federais,
aproximadamente 9% do Território Nacional. Dentre os biomas brasileiros, a Amazônia detém a
maior área protegida, com quase 17% de sua área total em UCs federais, das quais 7,9% são áreas
de proteção integral. A Caatinga, os Pampas, a Mata Atlântica e o Pantanal apresentam áreas
protegidas em unidades de proteção integral federais em torno ou abaixo de 1%. Para o Cerrado,
este percentual é de 2,2%.
Nos últimos anos, tem havido um forte crescimento do número e da área das Unidades de
Conservação federais, especialmente daquelas de uso sustentável. Este resultado revela dois
aspectos importantes: reflete tanto o esforço que o país tem feito para proteger seus recursos
naturais quanto uma mudança significativa na concepção e na implantação de áreas protegidas. O
aumento do número de área de unidades de uso sustentável, que hoje superam as de proteção
integral, representam o reconhecimento do Estado do fato das populações tradicionais serem
aliadas naturais, e não um obstáculo à conservação da biodiversidade.74

73
Unidades de Conservação
74
Ainda dentro do item biodiversidade temos o subitem de espécies invasoras que apresenta o número de espécies invasoras no
Brasil, informando os locais de origem e as principais formas e consequências da invasão.
131

Outro item adotado pelo Indicador de Desenvolvimento Sustentável é o saneamento. Este


é medido através de subitens como o acesso a serviço de coleta de lixo doméstico que revela a
parcela da população atendida por esse serviço, em um determinado território e período de
tempo. Nas áreas urbanas, os percentuais de atendimento são elevados com perspectiva, mantidas
as taxas atuais de incremento, de universalização a curto prazo, do acesso a esse tipo de serviço.
No Norte e Nordeste, apesar do grande incremento na taxa de atendimento nos últimos anos,
aproximadamente 5% dos domicílios urbanos ainda carecem desse serviço.
Ainda dentro do saneamento, tem-se a medição do acesso ao sistema de abastecimento de
água que expressa a parcela da população atendida pela rede geral de abastecimento. No
perímetro urbano o acesso ao abastecimento de água por rede geral está chegando a sua
universalização com quase cem por cento de abrangência. Já na zona rural, o fornecimento cai
para menos de quarenta por cento.
O indicador de acesso a esgotamento sanitário é um dos mais importantes, tanto para a
caracterização básica da qualidade de vida da população residente em um território, quanto para o
acompanhamento das políticas públicas de saneamento básico e ambiental. O indicador expressa
a relação entre a população atendida por sistema de esgotamento sanitário e o conjunto da
população residente em domicílios particulares permanentes de um território. Em 2008, mais de
80% dos moradores em áreas urbanas eram providos de rede geral de esgotamento sanitário ou de
fossa séptica. Enquanto o percentual de domicílios atendidos por rede coletora tem aumentado
continuamente, o percentual dos atendidos por fossa séptica tem se mantido estável, com
tendência de queda. Na zona rural, a predominância entre os tipos de esgotamento sanitário é da
fossa séptica, que tem crescido ao longo do tempo. A rede coletora tem apresentado valores
baixos e oscilantes.
Após a apresentação dos indicadores da dimensão ambiental são apresentados os
indicadores da dimensão social do IDS. Estes são subdivididos em itens como a medição da taxa
de crescimento da população. A variação da taxa de crescimento populacional é fundamental para
subsidiar a formulação de políticas públicas de natureza social, econômica e ambiental, uma vez
que a dinâmica do crescimento demográfico permite o dimensionamento de demandas, tais como:
o acesso aos serviços e equipamentos básicos de saúde e de saneamento, educação, infraestrutura
social, emprego, entre outras.
132

A partir de 1970, com a contínua queda da mortalidade associada a uma queda acentuada
das taxas de fecundidade, a taxa média de crescimento anual da população brasileira diminui
consideravelmente, chegando a 1,64% ao ano entre 1991 e 2000. A taxa de fecundidade para o
ano de 2000 era de 2,37 filhos por mulher. Ao utilizar um conjunto de estimativas para projetar o
nível da fecundidade, a taxa estimada e correspondente ao ano de 2008 é de 1,86 filho por
mulher. Essa projeção aponta que em 2040 a população brasileira chegará ao nível máximo e
depois decrescerá. Seu nível máximo será de aproximadamente 200 milhões de habitantes.75
Dentro da dimensão social, temos a medição do Índice de Gini que mostra o grau de
concentração na distribuição da renda da população. O índice de Gini é um dos indicadores mais
utilizados com a finalidade de saber se uma sociedade é equitativa através do seu nível de
rendimentos. O combate à desigualdade é fundamental para assegurar a redução da pobreza, um
dos principais desafios do desenvolvimento sustentável. O grau de desigualdade na distribuição
da renda tendeu a redução no período observado, embora ainda seja considerado elevado (0,531
em 2008), apesar do crescimento do PIB. Observa-se que entre 1995 e 2008 a queda tem ocorrido
em ritmo lento, sendo de 0,97% ao ano em média, inferior ao incremento médio anual do PIB per
capita. Entre 1996 e 2006, por exemplo, o PIB per capita aumentou 11,2%, enquanto o índice de
Gini reduziu em apenas 7,1%.
Na dimensão social existe ainda a medição da taxa de desocupação que expressa a
proporção da população de 10 anos ou mais de idade que não estava trabalhando, mas procurou
trabalho no período de referência. Essa taxa vem diminuindo ao longo dos anos saindo de 12,3%
no ano de 2003 para 3,5% em 2009. Outro índice medido é o rendimento familiar per capita que
apresenta a distribuição percentual de famílias por classes de rendimento médio mensal per
capita. A desigualdade na distribuição da renda também pode ser visualizada neste indicador, em
termos de apropriação de salários mínimos.
Enquanto 26,4% das famílias residentes em domicílios particulares recebiam um
rendimento mensal familiar per capita de meio a um salário mínimo em 2008, somente 5,5%
ganhavam mais de cinco salários mínimos. A proporção de famílias com rendimento familiar per
capita de até meio salário mínimo apresentou uma queda nos últimos anos, passando de 31,6%,
em 2004, para 22,8%, em 2008. No ano de 2008, o rendimento médio mensal das pessoas de 10

75
Ainda dentro do item população há a medição de população e terras indígenas. Este indicador expressa o tamanho da população
indígena e a quantidade de parques e terras indígenas com processo de reconhecimento oficial finalizado.
133

anos ou mais de idade alcançou R$ 1019,00, enquanto em 1992 equivalia a R$ 773,00, um


incremento de 32%.
A esperança de vida ao nascer indica a longevidade média esperada para um recém-
nascido de determinado grupo populacional em um determinado período de tempo. Esta alcançou
73 anos de idade no Brasil em 2008. Em países desenvolvidos ela é superior a 80 anos. Houve
um incremento de seis anos na vida média ao nascer do brasileiro entre 1992 e 2008, em razão da
melhoria nas condições gerais de vida e de saúde da população.
Outro indicador importante é a taxa de mortalidade infantil onde o Brasil vem
experimentando um declínio acelerado, passando de 47,0% para 23,3% entre 1990 e 2008,
correspondendo a uma queda de 50,0% neste período, fato que ocorreu principalmente devido à
melhoria geral das condições de vida da população. Esta queda porém, não pode ser considerada
uma taxa baixa, segundo os padrões da OMS76, sendo maior, inclusive, que outros países da
América do Sul, como Colômbia (17,4%), Argentina (11,4%), Uruguai (11,3%) e Chile (7,7%).
Cabe lembrar ainda que as taxas de países desenvolvidos são geralmente inferiores a 10%, tais
como: Canadá (5,0%); Suíça (4,2%); França (3,3%); Japão (2,8%); entre outros.
A desnutrição infantil vem se reduzindo no país, tendo passado de 18,4%, em 1975, para
4,6%, em 2003, correspondendo a uma queda de aproximadamente 75%. Ela pode ser explicada
pelas políticas de saúde e distribuição de alimentos implementadas no Brasil neste período e pela
melhoria das condições de saúde e de alimentação das crianças, embora esta não tenha sido
homogênea para todas.
A oferta de serviços básicos de saúde representa a disponibilidade de recursos humanos
(empregos médicos) e equipamentos físicos (estabelecimentos de saúde e leitos hospitalares) na
área de saúde, para a população residente. No Brasil, a necessidade de leitos hospitalares totais é
de 2,5 a 3 para cada 1 000 habitantes. A relação leito por 1 000 habitantes foi de 2,4 em 2005,
inferior a 2002 (2,7) e ao parâmetro indicado pelo Ministério da Saúde (2,5 a 3,0/1000 hab.).
Somam-se a estes indicadores a estimativa das doenças relacionadas ao saneamento
ambiental inadequado que representa as internações por doenças relacionadas ao saneamento
ambiental inadequado. A precariedade nos sistemas de abastecimento de água, esgotamento
sanitário, coleta e destino final dos resíduos sólidos, drenagem urbana, bem como a higiene
inadequada, constituem risco para a saúde da população, sobretudo para as pessoas mais pobres

76
Organização mundial de saúde
134

dos países em desenvolvimento, que vivem em condições insalubres. Ampliar o acesso ao


saneamento é fundamental para melhorar a qualidade de vida e reduzir a pobreza, objetivos
essenciais do desenvolvimento sustentável.
O acesso aos serviços de saneamento básico vem se ampliando no país, conforme atestam
os indicadores do tema saneamento, da dimensão ambiental. A tendência de queda no período
1993-1998 é observada em quase todas as categorias de doenças, com exceção daquelas
transmitidas por inseto vetor, que apresentam padrão bastante oscilante (aumento e queda
consecutivos).
A educação é medida a partir da taxa de escolarização que representa a proporção da
população infanto-juvenil que frequenta a escola. É importante ressaltar que no Brasil a distorção
idade-série é elevada. Nesse sentido, um determinado percentual de jovens pode declarar estar
frequentando a escola, contudo, não estar no nível de ensino adequado à sua idade. A título de
exemplo, segundo o IBGE, somente 50,6 % dos adolescentes de 15 a 17 anos frequentavam o
ensino médio em 2008, sendo que a taxa de escolarização para essa faixa etária alcançava 84,1%.
O acesso da população à escola vem aumentando gradativamente no Brasil nos últimos
anos em todos os grupos de idade. Porém, alguns problemas educacionais ainda são persistentes,
tais como a elevada taxa de analfabetismo e a baixa escolaridade (média de anos de estudo) da
população. Em 2008, 97,9% das crianças entre sete e quatorze anos de idade frequentavam a
escola, o que sugere que a universalização do ensino fundamental está em vias de ser alcançada.
Na faixa de quinze a dezessete anos de idade, o aumento na taxa foi bastante expressivo. Em
1992, somente 59,7% dos jovens frequentavam a escola, em 2008 o percentual subiu para 84,1%,
o que pode ser resultado da maior oferta de cursos noturnos e da exigência do mercado de
trabalho. Entretanto, esse alto percentual de acesso à escola não garante a qualidade do ensino,
como também não torna evidente a defasagem escolar.
A atenção dispensada à saúde infantil e às famílias como um todo se relaciona à
alfabetização, principalmente das mulheres, que, quando têm acesso à educação, diminuem o
número de filhos e estes são mais saudáveis. Elas também têm maiores possibilidades de inserção
no mercado de trabalho e de incentivar seus filhos à escolaridade. No período entre 1992 e 2006,
houve aumento na taxa de alfabetização, tendo alcançado 89,6% em 2006. No ano de 2007, o
percentual de alfabetizados atingiu 90% da população, mantendo essa taxa em 2008, o que
135

significa dizer que 10,0% da população de 15 anos ou mais de idade ainda é formada por
analfabetos, correspondendo aproximadamente a 14,2 milhões de pessoas.
O indicador de escolaridade apresenta a média de anos de estudo da população de 25 anos
ou mais de idade. Idealmente as pessoas de 25 anos ou mais de idade deveriam ter no mínimo 11
anos de estudo, que corresponde ao ensino médio completo. A análise da escolaridade no Brasil,
no período de 1992 a 2008, revela médias inferiores a 8 anos de estudo, ou seja, mostra que a
media da população não tem sequer a conclusão do ensino fundamental. Em 2008, a escolaridade
média do brasileiro alcançou apenas sete anos de estudo, e a evolução tem sido lenta, pois em dez
anos (1998-2008) ocorreu um incremento de apenas 1,4 ano. Se continuar neste ritmo, o Brasil
levará cerca de 30 anos para alcançar o indicador esperado.
Em relação à dimensão social, ainda constam como indicadores a habitação onde se
verifica a adequação de moradia, através da proporção de domicílios com condições mínimas de
habitabilidade. Um domicílio pode ser considerado satisfatório quando apresenta um padrão
mínimo de aceitabilidade dos serviços de infraestrutura básica, além de espaço físico suficiente
para seus moradores. Considera-se como adequado o domicílio particular permanente com
abastecimento de água por rede geral, esgotamento sanitário por rede coletora ou fossa séptica,
coleta de lixo direta ou indireta e com no máximo dois moradores por dormitório.
O número de domicílios adequados para moradia vem crescendo no Brasil nos últimos
anos, tendo alcançado 57% dos domicílios particulares permanentes em 2008. Este, porém, não é
um percentual satisfatório, pois significa que o país possuía neste ano aproximadamente 25
milhões de domicílios inadequados.
Na questão da segurança, é medido o coeficiente de mortalidade por homicídios,
representando as mortes por causas violentas. Observa-se um incremento em termos absolutos de
6,2 óbitos por homicídios em 100 mil habitantes entre 1992 e 2007, sendo mais acentuado para o
sexo masculino. Entre 1992 e 2003, ocorreu um aumento no coeficiente e a partir de 2004
observa-se uma tendência de queda. Os homens apresentam valores consideravelmente superiores
às mulheres (10 vezes maiores em média). As mortes por homicídios afetam a esperança de vida,
que não é superior devido às mortes prematuras, sobretudo de jovens do sexo masculino.
O coeficiente de mortalidade por acidentes de transporte representa o número de óbitos
neste tipo de acidente. O indicador é a relação entre mortalidade por acidentes de transporte e a
136

população considerada (total, homens e mulheres), expressa em óbitos por 100 000 habitantes. O
Brasil possui uma média de 21 óbitos por cem mil habitantes.
Após expressa a dimensão social, é explicitada a dimensão econômica onde é medido o
PIB per capita. Este indica o nível médio de renda da população em um país ou território. Ele é
normalmente utilizado como um indicador do ritmo de crescimento da economia. Na perspectiva
do desenvolvimento sustentável, costuma ser tratado como uma informação associada à pressão
que a produção exerce sobre o meio ambiente, em consumo de recursos não renováveis e
contaminação. O crescimento do produto, porém, também pode ser condição para minorar
problemas sociais. Entre os países mais pobres ou em desenvolvimento é desejável que estejam
presentes taxas elevadas de crescimento econômico.
Nos últimos 14 anos, o PIB per capita do Brasil, tomado a preços de 1995, passou de R$
4441,00 para R$ 5405,00 (incremento de 21,7%), alternando taxas de crescimento baixas com
situações de queda em alguns anos, com maiores crescimentos verificados nos anos finais da
série, com exceção do ano de 2009, no qual os efeitos da crise internacional também foram
verificados na economia brasileira.
A taxa de investimento mede o incremento da capacidade produtiva da economia em
determinado período como participação do PIB. Ela mede o estímulo ao desenvolvimento
econômico, ao refletir o aporte de bens de capital destinado a ampliar a capacidade de produção
do país. A participação dos investimentos no PIB revela um importante componente da
aceleração do ritmo de crescimento e desenvolvimento econômico. Para países em
desenvolvimento, os economistas preconizam taxas de investimento bem mais altas que as que
têm sido observadas no Brasil. Em nosso país, elas têm flutuado em torno de valores inferiores a
20% e mostraram uma tendência de declínio no período compreendido entre 1995 e 2003, com
uma ligeira recuperação nos anos subsequentes.
A balança comercial mostra a relação de uma economia com outras economias no mundo,
através do saldo das importações e exportações do país, em um determinado período. Os
componentes do indicador refletem as mudanças nos termos de troca e competitividade
internacional, sendo, também, capazes de mostrar dependência econômica e vulnerabilidade
frente ao mercado financeiro internacional.
A Agenda 21 reconhece expressamente que, em geral, o comércio internacional promove
uma alocação mais eficiente dos recursos em nível nacional e mundial, e estimula a transferência
137

de inovações tecnológicas, apresentando efeitos positivos para o desenvolvimento sustentável.


Por outro lado, uma maior liberação comercial pode resultar em um uso mais intensivo e não
sustentável de recursos quando os preços de mercado não internalizam integralmente os custos
ambientais.
No Brasil, o indicador mostra a franca recuperação do saldo comercial a partir da bem-
sucedida desvalorização cambial operada em 1998, a qual foi ampliada pelo esforço exportador
que se seguiu e por circunstâncias favoráveis no mercado internacional, num quadro de
manutenção do baixo dinamismo do mercado interno.
O grau de endividamento expressa a situação do país em relação à sua dívida. Esse
coeficiente mostra a relação entre as obrigações externas e a produção corrente da nação, quanto
mais alto seu valor, maior a parcela do produto que é destinada para o serviço da dívida. Durante
o período analisado, o Brasil experimentou um ritmo de endividamento muito vigoroso, contudo
ele não esteve associado a taxas de crescimento significativas. Este ritmo foi, principalmente,
resultado da estratégia dirigida ao combate da inflação, em parte, apoiada na sobrevaloração da
moeda nacional.
Nos anos mais recentes, após a desvalorização cambial e melhoria da balança comercial, a
tendência de crescimento da dívida externa inverteu-se, com queda acentuada até a situação
verificada nos dois últimos anos da série, nos quais o país mudou sua situação de devedor para
credor. Atualmente o superávit externo liquido do Brasil representa 5% do PIB.
Na dimensão institucional tem-se a medição das ratificações de acordos globais e da
existência de conselhos municipais de meio ambiente. A primeira expressa o envolvimento do
país com a implementação de acordos firmados pela comunidade internacional, através dos
órgãos de governança global. Este indicador é expresso pelo número de acordos internacionais,
relativos à proteção do meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável, que foram ratificados
pelo governo brasileiro. A segunda expressa a existência de conselhos municipais de meio
ambiente ativos. No Brasil, 35% dos municípios possuem conselho de meio ambiente ativo.
Como pôde ser observado através dos dados compilados do Indicador de
Desenvolvimento Sustentável do IBGE, a situação brasileira é típica de um país em
desenvolvimento. Em muitas áreas vê-se uma melhora expressiva, em outras porém o país se
apresenta estagnado ou com uma evolução bastante lenta.
138

As principais mudanças ocorreram nas dimensões sociais e econômicas com significativas


melhoras, mas com um longo caminho a percorrer. A dimensão ambiental apresenta melhoras,
mas a passos mais lentos. Isso se deve a baixa institucionalidade da questão ambiental como uma
causa social. A dimensão institucional permaneceu praticamente estagnada ao longo do tempo,
mostrando a baixa eficácia da iniciativa pública na promoção do desenvolvimento sustentável do
país.
Ainda assim é difícil analisar o grau de desenvolvimento sustentável do país com os dados
abertos como os fornecidos pelo IDS. Com um grau tão elevado de variáveis que se
complementam, o ideal seria ter um índice que condensasse essas informações e apontasse as
falhas dentro de cada dimensão do desenvolvimento sustentável e a direção a ser seguida para
que o objetivo da sustentabilidade brasileira fosse alcançado.

3.2.2.2 Avaliação brasileira pelo Barometer of Sustainability

Uma das formas de sintetizar a compilação de índices referentes ao desenvolvimento


sustentável, que estão explícitos nos IDS é através da aplicação de índices de sustentabilidade
como o Barometer of Sustainability. Tais índices produzem um valor numérico com as
informações que utilizam e, quando comparado a uma escala padrão, fornecem um critério para
avaliar a sustentabilidade. Dessa forma, é possível aplicar a metodologia do Barômetro da
Sustentabilidade (BS) ao Brasil, utilizando Indicadores de Desenvolvimento Sustentável (IDS)
construídos para o país77. De acordo com Kronemberger,
A metodologia para construção do BS é flexível, porque não existe um número fixo de indicadores
na sua composição, e a escolha dos que serão utilizados é feita pelos analistas, de acordo com a
possibilidade de construção de Escalas de Desempenho, da área de estudo e da disponibilidade de
informações. [...] É uma maneira sistemática de combinar diversos indicadores, que, quando
apresentados isoladamente, mostram apenas a situação do tema que eles representam, enquanto o
BS revela a situação do local em relação ao desenvolvimento sustentável, permitindo comparar as
condições socioeconômicas e do ambiente físico-biótico. (2008, p. 26)

Utilizando-se da formulação do IDS do IBGE, fazendo as alterações necessárias e


acrescentando novos indicadores, Kronemberger e seus colaboradores78 elaboraram escalas de

77
Esta avaliação foi retirada do trabalho “Desenvolvimento sustentável no Brasil: uma análise a partir da aplicação do barômetro
da sustentabilidade”, de Denise Maria Penna Kronemberger, Judicael Clevelario Junior, José Antônio Sena do Nascimento, José
Enilcio Rocha Collares e Luiz Carlos Dutra da Silva. 2008.
78
KRONEMBERGER, Denise Maria Penna; CLEVELARIO Jr., Judicael; NASCIMENTO, José Antônio Sena do; COLLARES,
José Enilcio Rocha; SILVA, Luiz Carlos Dutra da. Desenvolvimento sustentável no Brasil: uma análise a partir da aplicação do
barômetro da sustentabilidade. Uberlândia: Revista Sociedade & Natureza, 20 (1): 25-50, jun. 2008.
139

desempenho que condensam o IDS e fornecem um índice dentro da noção do BS para o


desenvolvimento sustentável. Dentre os indicadores foram escolhidos um total de 53, distribuídos
em: 12 ambientais, 23 sociais, 9 econômicos e 9 institucionais. Por essa ótica, percebe-se que foi
dado um peso maior à questão social dentro do desenvolvimento sustentável. Quanto menor o
número de indicadores por tema, menos robusto o resultado do BS. Como o número de temas e
de indicadores usados foi grande (e representativo), o resultado final é bastante robusto.
Ainda dentro da pesquisa foi elaborada a Escala de Desempenho Nacional (EDN) por
analogia à Escala do Barômetro da Sustentabilidade (EBS) sendo dividida em cinco intervalos
definidos por valores que representam condições variando de insustentável a sustentável. Os
limites dos intervalos da EDN para cada indicador têm correspondência com os valores de 0 a
100 da EBS. Tais valores são arbitrariamente definidos e representam metas a serem alcançadas
ou padrões estabelecidos a nível mundial ou nacional. A escala é utilizada para avaliar a situação
do indicador em relação à meta ou padrão, e, aplicada a diferentes períodos, monitora os avanços
e retrocessos em direção ao desenvolvimento sustentável.
Segundo Kronemberger, “Para a maioria dos indicadores sociais, econômicos e
institucionais existe série histórica, todavia, o BS não pode ser calculado para diferentes anos
devido a inexistência de séries históricas consistentes para parte dos indicadores ambientais.”
(2008, p. 39) Devido a este fato, só foi possível mostrar um panorama do país em termos de
desenvolvimento sustentável para o ano de 2002.
A combinação dos indicadores em temas forneceu 17 índices temáticos. Da mesma forma,
há quatro índices dimensionais, e dois para o nível de subsistema: o índice de bem-estar humano
(resultado da média aritmética dos índices social, econômico e institucional) e o índice de bem-
estar ecológico (média aritmética dos temas da dimensão ambiental). Representados em gráfico
bidimensional, estes índices revelam que a situação de sustentabilidade do Brasil, em 2002 era
intermediária, embora muito próxima da condição quase insustentável. A figura 3 evidencia esse
fato.
140

Figura 3
Posição do Brasil no Barômetro de Sustentabilidade
Fonte: “Desenvolvimento sustentável no Brasil: uma análise a partir da aplicação do
barômetro da sustentabilidade”, Denise Maria Penna Kronemberger, Judicael Clevelario
Junior, José Antônio Sena do Nascimento, José Enilcio Rocha Collares e Luiz Carlos
Dutra da Silva. 2008, p. 39

No quadro abaixo é apresentada a situação brasileira em termos de valores ou graus (0 a 100) e


de situação em relação à escala. Os dados são para o ano de 2002.

Dimensões Graus Situação Subsistemas Graus Situação


Bem-Estar
Ambiental Intermediária 40,3 Intermediária
40,3 Ecológico

Social Intermediária
55,0
Pontencialmente
Econômica Bem-Estar Humano 44,0 Intermediária
38,0 Insustentável
Pontencialmente
Institucional
40,0 Insustentável
Quadro 9
Situação do Brasil Relativa ao Desenvolvimento Sustentável, segundo Dimensões e Subsistemas
Fonte: Desenvolvimento sustentável no Brasil: uma análise a partir da aplicação do barômetro da sustentabilidade”, de Denise Maria Penna
Kronemberger, Judicael Clevelario Junior, José Antônio Sena do Nascimento, José Enilcio Rocha Collares e Luiz Carlos Dutra da Silva. 2008, p.
39

O Brasil tem um grande capital natural, mas o uso destes recursos é, de forma geral,
insustentável, ou seja, vem sendo rapidamente dilapidado sem trazer expressivos ganhos sociais
ou econômicos. Em 2002 a dimensão ambiental se encontrava numa posição intermediária
141

margeando o nível quase insustentável, devido principalmente aos indicadores de Oceanos,


Biodiversidade e Saneamento que possuíam os níveis mais baixos dentro da dimensão. Este
resultado mostra a situação crítica do país em relação especialmente ao tema Oceanos. Os sinais
de sobre-exploração dos estoques pesqueiros deram ao indicador “produção de pescado” o
segundo pior grau entre os indicadores analisados79. Para a Biodiversidade, o percentual de áreas
protegidas ainda era pequeno, além de concentrado na Amazônia.
Na dimensão social, o país encontrava-se na posição intermediária, com alguns
indicadores que alcançaram a sustentabilidade (razão de alfabetização por sexo) ou estão
próximos (domicílios com iluminação elétrica e imunização contra doenças infecciosas infantis),
e outros que se mantinham em situação insustentável (esgotamento sanitário no domicílio) ou
quase insustentável (indicadores de segurança).
De acordo com Kronemberger,
Educação e saúde são os temas que mais se aproximam da sustentabilidade. [...] Este fato deve ser
interpretado com cautela, pois não estão incluídos todos os indicadores de eficiência em saúde e
educação. Esta observação serve para todos os temas e dimensões, e mostra a fragilidade dos
índices dos trabalhos com IDS80, um assunto complexo por natureza. Não há como introduzir
indicadores para todos os aspectos associados ao desenvolvimento pela inexistência de dados para
muitos. Além disso, há sobreposição entre os indicadores. Assim, ao usarmos um grande número
deles alguns aspectos são sobrevalorizados no valor final do índice, por estarem presentes em
vários indicadores. (2008, p. 43)

O tema segurança apresentou o pior desempenho, sendo classificado como potencialmente


insustentável. Isto se deve tanto à violência urbana quanto no trânsito. Quanto a habitação,
observa-se que há necessidade de investimentos em saneamento básico, sobretudo esgotamento
sanitário. Em 2002 68% dos domicílios possuíam rede geral de esgoto ou fossa séptica,
colocando este indicador no nível de ‘insustentável’ do BS e o índice para habitação como
intermediário.
O Brasil estava em situação intermediária (grau 55) em termos de equidade no ano de
2002, ou seja, longe da sustentabilidade social. Entre os indicadores de equidade, o melhor
desempenho coube à alfabetização, que naquele ano era igual entre homens e mulheres (88%),
embora ainda seja uma taxa baixa. O pior desempenho coube ao esgotamento sanitário no
domicílio.

79
Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior/ Secretaria de Desenvolvimento da Produção
(MDIC/SDP, s/d).
80
Indicadores de Desenvolvimento Sustentável
142

Na dimensão econômica o Brasil se encontrava em situação intermediária em 2002, sendo


que no tema quadro econômico, a situação era intermediária e no tema padrões de produção e
consumo era potencialmente insustentável. Segundo Kronemberger,
Os demais indicadores do quadro econômico refletem os problemas estruturais da economia
brasileira. A taxa de investimento, que representa a formação bruta de capital fixo como proporção
do PIB a preços correntes, era baixa (18,3%). Se comparada aos demais países em
desenvolvimento, era potencialmente insustentável, criando dificuldades em se alcançar um ritmo
de crescimento econômico compatível com uma trajetória sustentável de desenvolvimento. (2008,
p. 44)

A participação das fontes renováveis na oferta de energia (41%) mostra o Brasil na


vanguarda, com percentual bastante superior aos países desenvolvidos e a média mundial, devido
a ampla utilização do potencial hidrelétrico e da biomassa, notadamente álcool combustível.
Naquele ano, o percentual médio de reciclagem (49,3%) foi fortemente influenciado pela
reciclagem do alumínio, que atingiu valor de 87%. Os outros materiais (papel, vidro, embalagens
PET – Politereftalato de Etila – e latas de aço), raramente alcançam os 40% de reciclagem.
Assim, o grau deste indicador na escala do BS estava em situação intermediária.
Quanto à dimensão institucional, o Brasil era potencialmente insustentável no ano de
2002, com os temas Estrutura Institucional e Articulação Institucional em situação intermediária,
enquanto os temas Capacidade Institucional e Agenda 21 eram potencialmente insustentáveis. O
desempenho dos indicadores desta dimensão deverá melhorar sensivelmente, após o Brasil aderir
a um maior número de acordos multilaterais, notadamente os de poluição atmosférica, e se os
municípios brasileiros instalarem mais conselhos não vinculados, fortalecendo sua estrutura
institucional.
No estudo de Kronemberger o índice de bem estar humano apresentou resultados
melhores do que o índice de bem estar ecológico. Isto significa que os indicadores sociais e
econômicos apresentam melhores resultados que os ambientais, embora exista ainda um grande
passivo social no Brasil. O BS possibilitou reunir indicadores em índices temáticos e
dimensionais, e avaliar que o Brasil tem condição próxima de quase insustentável nos aspectos
sociais e ambientais.
Essa avaliação através de índices sintéticos aparece como uma maneira mais confiável de
analisar os resultados no campo do desenvolvimento sustentável. A avaliação separada dos
indicadores não auxilia a esclarecer muito sobre o desenvolvimento sustentável, pois os diversos
fatores estão intrinsecamente relacionados. O que é sustentável para uma dimensão pode não ser
143

para outra, e existem questões ocultas, resultantes dos relacionamentos entre os fatores do
desenvolvimento.
De acordo com Kronemberger,
Para que o Brasil avance na direção da sustentabilidade (social, econômica e ambiental) os
maiores investimentos deverão ser feitos nos setores de proteção aos estoques pesqueiros,
ampliação de áreas protegidas e saneamento (dimensão ambiental), distribuição de renda,
condições de habitação e segurança (dimensão social), aumento do investimento e mudança nos
padrões de consumo (dimensão econômica) e aumento dos gastos com pesquisa e
desenvolvimento (dimensão institucional). (2008, p. 48)

O processo de construção do Barometer of Sustainability, desde a escolha dos indicadores


até a agregação final dos temas, resulta na apresentação sintetizada de informações importantes à
sociedade e a tomadores de decisão. Assim, o BS pode ser por si só uma alavanca do progresso
em direção ao desenvolvimento sustentável. Ele facilita a percepção geral de que ações devem ser
integradas, atuando em todas as dimensões do desenvolvimento, e de quais setores devem ser
prioritários na aplicação dos recursos públicos e privados.

3.2.2.3 Aplicação do Dashboard of Sustainability para o caso brasileiro

O Dashboard of Sustainability consiste em um pacote de software livre não-comercial que


ilustra as complexas relações entre as questões econômicas, sociais, ambientais e institucionais. O
formato visual é adequado para os tomadores de decisão e outros interessados no
desenvolvimento sustentável. Sua nova edição promove os indicadores dos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio81 (ODM), especialmente para os países em desenvolvimento. Estes
indicadores ajudam a definir estratégias de redução da pobreza e monitorar a realização dos
objetivos.
O Dashboard of Sustainability, analisado dessa maneira, dá maior ênfase ao lado social do
desenvolvimento sustentável, já que a maior parte dos ODM estão diretamente relacionados à
essa dimensão. Ainda assim, ele apresenta uma excelente análise da evolução do país em direção
ao desenvolvimento sustentável. A dimensão ambiental está restrita aos indicadores de qualidade
de vida e respeito ao meio ambiente que congregam o item de sustentabilidade da análise. Já o
peso institucional é dado pela parceria pelo desenvolvimento. A dimensão econômica da análise
81
Em 2000, a ONU – Organização das Nações Unidas, ao analisar os maiores problemas mundiais, estabeleceu 8 Objetivos do
Milênio – ODM, que no Brasil são chamados de 8 Jeitos de Mudar o Mundo. São eles: acabar com a fome e a miséria; educação
básica de qualidade para todos; igualdade entre sexos e valorização da mulher; reduzir a mortalidade infantil; melhorar a saúde
das gestantes; combater a AIDS, a malária e outras doenças; qualidade de vida e respeito ao meio ambiente; e a parceria pelo
desenvolvimento. Disponível em: http://www.objetivosdomilenio.org.br/ Acesso em: 9/11/2011.
144

está diluída em alguns itens da ODM, enquanto a dimensão social compõe o cerne dos outros seis
itens analisados.
Dessa forma, ao se pensar o desenvolvimento sustentável como um todo, o DS não chega
a ser a ferramenta mais completa, apesar do mesmo considerar as complexas interações entre as
quatro dimensões do desenvolvimento sustentável. Com ele conseguiremos ter uma ótima
avaliação do desenvolvimento social, mas como o peso dessa dimensão é demasiado, as outras
dimensões ficam prejudicadas.
O DS tem a propriedade de agregar vários indicadores dentro de cada item do ODM. E
esses indicadores (primeira esfera de análise) são obtidos a partir da agregação de outro conjunto
de indicadores (segunda esfera de análise). Dessa forma fica evidenciada a complexidade do
cálculo elaborado para a obtenção de uma medida do desenvolvimento sustentável. Para fins
dessa dissertação, serão considerados para a análise os oito itens que compõem o ODM e os
indicadores que os constituem, não sendo aprofundado o estudo para a segunda esfera de análise
que dão forma aos primeiros indicadores.
De acordo com Krama,
O desempenho do sistema é apresentado por meio de uma escala de cores que varia do vermelho-
escuro (crítico), passando pelo amarelo (médio), até o verde-escuro (positivo) [como ilustrado no
quadro abaixo]. [...] Para transformar esses dados em informações, foi construído um algoritmo de
agregação e de apresentação gráfica. Este software utiliza um sistema de pontos de 0, pior caso,
até 1000, melhor experiência existente para cada um dos indicadores de cada uma das dimensões.
Todos os outros valores são calculados através de interpolação linear entre estes extremos e, em
alguns casos onde não existam dados suficientes, utilizam-se esquemas de correção. (2009, p. 74).

Escala de Cores Grau de Sustentabilidade Intervalo de pontos


Excelente 889 - 1000
Muito bom 778 - 888
Bom 667 - 777
Razoável 556 - 666
Médio 445 - 555
Ruim 334 - 444
Muito ruim 223 - 333
Atenção severa 111 - 222
Estado crítico 0 -110
Sem dados
Figura 4
Escala de Cores do Dashboard of Sustainability
Fonte: KRAMA, Márcia Regina. Análise dos indicadores de desenvolvimento sustentável no Brasil,
usando a ferramenta painel de sustentabilidade. Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Curitiba,
2009. p. 74
145

Um dos pontos positivos do DS é o fato da ferramenta apresentar a possibilidade de


observar individualmente a performance de cada um dos indicadores representados, ao mesmo
tempo em que revela medidas agregadas que fornecem uma visão mais geral de cada dimensão.
Porém, o método do DS ainda apresenta muitas limitações, mesmo tendo maior consistência e
transparência quando comparado aos demais modelos existentes. A ferramenta deve ser usada
para a comparação entre nações, mas também pode ser aplicada para índices urbanos e regionais.
O DS utilizou as metas do milênio das Nações Unidas como referência para seu indicador.
Dentro deste índice o Brasil tem 747 pontos de um total de 1000 para dados de 2009, o que o
coloca no nível bom da escala de pontuação do DS. O país ocupa a posição 29 num ranking de
178 países.
Com relação à erradicação da pobreza extrema e da fome o país possuía 734 pontos no
mesmo ano. De acordo com o gráfico abaixo, a situação do país pode ser considerada boa. A
evolução da erradicação da pobreza se manteve em uma onda ascendente até o ano de 1996,
quando houve uma ligeira queda. Tal fato pode ser explicado pelo comportamento descendente
do indicador de trabalho decente, o qual veio se recuperando somente a partir do ano de 2004. A
partir desse mesmo ano é possível observar a melhora no indicador de renda, que vem crescendo
no país. O indicador de nutrição sempre se manteve em patamares elevados e dentro da escala de
excelente do DS. Atualmente o indicador de erradicação da pobreza se mantém estável na faixa
de bom da escala.
146

Dentro dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, o próximo indicador analisado


pelo DS é a educação primária universal. Nesse indicador o Brasil se encontrava com 855 pontos
e na faixa de muito bom da escala do DS. Tal indicador vem oscilando entre quedas expressivas e
avanços lentos. Entre os anos de 2002 e 2003, houve uma queda no indicador que, a partir de
então, se manteve estável. Essa queda se deve ao indicador dos estudantes que começam a
estudar no 1º ano e completam o primeiro ciclo escolar (até o 5º ano), que caiu de 84,4% para
75,6%. A taxa de alfabetização da população com idade entre 15 e 24 anos vem crescendo
paulatinamente e quase atinge a universalização. Já a proporção de matrículas no ensino
fundamental atingiu os 95% em 2009.

O terceiro dado analisado pelos ODM é a equidade de gênero. De acordo com as


medições do DS, essa equidade atingiu os 508 pontos em 2009 ficando no nível médio da escala.
Este não foi o melhor resultado para o dado que chegou a 571 pontos em 1999. O salário da
mulher empregada no setor não agrícola vem crescendo lentamente e não ultrapassou os 41,6%
do salário dos homens. A participação das mulheres na vida política também vem crescendo, mas
continua pífia com nove cadeiras parlamentares ocupadas por elas em 2009.
Já na área da educação há uma expressiva melhora no quadro feminino, o que pode
acarretar melhoras nos níveis salariais e na participação política no futuro. A proporção de
meninas em relação aos meninos matriculados no ensino fundamental se manteve estável desde o
147

começo da aferição da série, acima dos 90%. Mas quando olhamos proporção delas no nível
médio e no nível superior vemos que são a grande maioria dos estudantes. Para cada 100 homens
estudando no ensino médio e superior temos 111 e 129 mulheres respectivamente.

Como quarto objetivo de desenvolvimento do milênio, temos a redução da mortalidade


infantil. Nesse quesito o Brasil ocupa a parte superior da escala com o nível excelente e uma
pontuação de 924 em 2009. Isso se deve ao grande esforço que tem sido desenvolvido ao longo
do tempo, tanto por governo e sociedade civil em prol da diminuição da mortalidade infantil. A
taxa de mortalidade infantil vem caindo exponencialmente durante o período analisado, ficando
em 20,6 crianças de até 5 anos e 18 crianças de até 1 ano para cada 1000. Outro indicador que é
somado a este é a imunização contra o sarampo que no Brasil é universal.
148

A saúde materna também é requisito para os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio


das Nações Unidas. Depois de uma grave queda do indicador de melhoria da saúde materna em
1991, o Brasil vem crescendo paulatinamente e possui 922 pontos na escala do DS, ficando no
nível excelente. Esse indicador é composto por outros dois indicadores que são a diminuição da
mortalidade materna e a saúde reprodutiva. Ambos os indicadores vem crescendo ao longo do
tempo e atingem a escala de excelente e muito bom no DS respectivamente.
149

O indicador de combate ao HIV, malária e tuberculose é prejudicado pela falta de dados


do combate a AIDS. Esse indicador apresentado é representado praticamente pelo combate à
tuberculose e à malária. Foi elaborada uma linha de tendência com uma relação linear para os
dados que mostrou uma direção ascendente para o indicador, mas numa velocidade lenta. O nível
do indicador no ano de 2008 era de 649 pontos, colocando o país no nível razoável da escala do
DS.

O sétimo Objetivo de Desenvolvimento do Milênio se refere à defesa da sustentabilidade


ambiental. Esse é o indicador mais importante para o enfoque do desenvolvimento sustentável.
De acordo com as medições do DS, o Brasil é satisfatório no quesito de assegurar a
sustentabilidade ambiental. Ao longo do tempo, o pais ficou oscilando na faixa dos 500 aos 700
ponto. Em 2008, o país ficou com 680 pontos, ficando no início da escala de bom do DS.
Por se tratar da maior biodiversidade do planeta, esse ponto em que se encontra na escala
não é satisfatório. O país busca se posicionar como uma potência que está à frente das políticas
de sustentabilidade por possuir a vantagem de ter uma matriz energética limpa, um grande
potencial em reservas de agua doce e maior floresta tropical do mundo. Para tanto, a nação
precisa se empenhar mais em políticas que assegurem a proteção da sustentabilidade e tornem o
desenvolvimento sustentável viável.
150

Ao analisar os indicadores que compõem esse quesito, é possível ver que o país vem
melhorando. O indicador de biodiversidade vem crescendo desde 1991 e passou de 245 para 555
pontos nível em que permanece desde 2006. O indicador de políticas de desenvolvimento
sustentável e recursos naturais vem oscilando entre altos e baixos ao longo da série. No ano de
2008 estava com 685 pontos e seu maior valor foi em 1997: 721 pontos. Já o índice de habitação
digna vem crescendo ao longo da série e numa velocidade maior a partir de 2005, atingindo 820
pontos em 2008 e o nível de muito bom na escala do DS.

As dimensões institucional e econômica estão representadas pelo indicador de parceria


mundial para o desenvolvimento. Nesse quesito, o indicador brasileiro vem crescendo fortemente
depois de um grande queda no ano de 1999. Em 2008, o indicador marcava 504 pontos o que não
coloca o Brasil numa posição favorável. O país está no nível médio da escala do DS com esse
resultado. Para uma nação que quer ser reconhecida como potência internacionalmente, esse nível
ainda é muito baixo, apesar de vir se elevando.
O índice é composto por dois outros indicadores que são: acesso a mercado e acesso a
tecnologia. Na questão de acesso a mercado o país vem se recuperando após grandes quedas na
década de 1990, mas ainda não conseguiu atingir o patamar de 815 pontos obtidos em 1991. O
nível desse indicador em 2008 estava 583 pontos, razoável para a escala do DS.
151

Na questão de acesso à tecnologia, o índice cresceu vertiginosamente, passando de 25


pontos em 1990 para 326 pontos em 2008. Apesar disso, esse é um índice ainda inexpressivo para
uma nação que deseja alcançar o desenvolvimento e é considerado muito ruim na escala do DS.
Acesso à tecnologia é um requisito fundamental para se chegar ao desenvolvimento de uma
nação e para manter o patamar de desenvolvimento. Em um país que deseja convergir para o
desenvolvimento sustentável, a tecnologia deve ser preponderante, pois esta se faz necessária na
obtenção de melhores formas de produção com o mínimo de impacto ambiental, seja em produzir
o mínimo de resíduos possíveis ou em novos usos para materiais antes descartados.

Por ultimo, o Dashboard of Sustainability congrega todos os indicadores citados em um


único índice que pretende mostrar a evolução do país em direção aos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio. Esse índice é uma boa medida para o desenvolvimento social do
país. Novamente foi criada uma linha de tendência com função linear entre os parâmetros da
série. E nela é possível verificar a tendência de crescimento do índice de uma forma acelerada.
O gráfico em si, nos mostra um grande crescimento do Brasil entre os anos de 1998 e
1999 e depois outro crescimento menos intenso entre 2000 e 2001. A partir de então o índice
apresenta uma ligeira queda, mantendo-se estável com 752 pontos no ano de 2007. Essa
pontuação dá ao Brasil uma posição de bom na escala do DS, mas é preocupante a ligeira
tendência de queda. Para se alcançar as metas de desenvolvimento do milênio o país deve
152

redobrar os esforços com o intuito de estancar a queda e se possível promover uma curva
ascendente em direção ao maior desenvolvimento.

Após a análise dos indicadores, com seus diferentes pontos positivos e negativos, é
possível obter uma visão ampliada do país e das áreas em que é necessário investir para que se
possa convergir não só a economia, mas a sociedade ao desenvolvimento sustentável. Os
diferentes aspectos os indicadores apresentaram mostram um país na direção correta, mas com
pouco investimento na sustentabilidade ambiental.
A aplicação dos indicadores é importante pois nos fornece a direção das políticas
aplicadas, tanto interna quanto externa, necessárias ao alcance dos objetivos definidos pelo
Estado. Um país que busca uma inserção externa baseada na figura de uma potência preocupada
com a sustentabilidade necessita de investimentos maiores nas áreas ambiental e tecnológica, sem
descuidar do bem-estar da população. O estudo acima demonstrado, apesar de tratar de questões
internas é de suma importância na elaboração da política externa, ao expor um perfil de sociedade
que somos e ao indicar o que queremos como nação.
153

4 CONCLUSÃO

A ideia do desenvolvimento sustentável é algo relativamente recente dentro das ciências


sociais. Sua concepção está imbricada com a trajetória do conceito de desenvolvimento e do
conceito de sustentabilidade dentro da sociedade. Até a década de 1970, a ideia de preservação
ambiental estava presente na arena internacional como contraponto ao desenvolvimento. Só a
partir desse momento foi que a escala da problemática ecológica deslocou-se, gradualmente, do
regional e do nacional em direção ao internacional.
Esse período relativamente recente para a formulação e sedimentação de um conceito
dentro da sociedade, provoca uma série de divergências que não nos permite trabalhar com uma
ideia sólida. Tal fato acarreta normatizações e aplicações políticas variadas do conceito e não
permite que se chegue a um equacionamento único em torno de uma ideia central do
desenvolvimento sustentável que possa se tornar um padrão internacional, facilitando as
negociações em torno do tema ambiental no sistema internacional. Estudar a trajetória desse
conceito torna-se então premente para que possa surgir um embasamento teórico que permita a
aplicabilidade do conceito ao mundo real.
A primeira conclusão a que chegamos quando começamos a analisar o conceito de
desenvolvimento sustentável é que este precisa necessariamente de outros dois conceitos tão
difíceis e maleáveis quanto o próprio. A trajetória que se observa a partir das Conferências
Ambientais promovidas pelas Nações Unidas é de, inicialmente, uma oposição clara entre
desenvolvimento e sustentabilidade e nenhum consenso entre os países quanto ao que seria ideal
para o planeta em termos de preservação.
Para os países em desenvolvimento, a agenda ambiental estava sendo transposta ao plano
internacional pelos países desenvolvidos impondo grandes restrições ao crescimento dessas
nações. Esses não poderiam seguir normas tão rígidas quanto ao crescimento demográfico ou a
utilização de seus recursos naturais se quisessem chegar a um patamar de desenvolvimento
elevado. O tipo de problema ambiental que era enfrentado nos países em desenvolvimento era
aquele que pode ser superado pelo próprio processo de desenvolvimento.
A ligação conceitual entre desenvolvimento e meio ambiente começaria a se tornar
realidade na Conferência de Estocolmo, marcando o tratamento multilateral do meio ambiente.
154

No contexto das profundas mudanças por que passaram as Relações Internacionais ao longo do
tempo, o meio ambiente foi adquirindo potencial importante de transformação das cenas políticas
e econômicas mundiais.
O primeiro consenso em torno da questão ambiental era o de que o problema central a ser
resolvido pela comunidade internacional era a má distribuição e mau uso dos recursos, do ponto
de vista econômico e social. A tarefa dos estadistas seria a de orientar seus países em direção a
um sistema produtivo capaz de satisfazer as necessidades humanas básicas sem violar os limites
externos dos recursos e do meio ambiente do planeta. Era o primeiro sinal da formulação do
conceito de desenvolvimento sustentável.
Um passo definitivamente importante para a construção de um consenso ambiental
internacional foi a publicação do Relatório Brundtland. A partir desta publicação, o conceito de
desenvolvimento sustentável ganhou sua mais famosa definição: “o desenvolvimento que satisfaz
as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas
próprias necessidades.” Essa definição é abrangente a abarca as mais variadas visões e os mais
variados critérios para a aplicação de uma política efetiva em torno da preservação ambiental.
A nível internacional, o relatório foi capaz de movimentar a vontade política da
comunidade internacional que propôs metas como a adoção da estratégia de desenvolvimento
sustentável por órgãos e instituições internacionais de financiamento ao desenvolvimento. O
financiamento ao desenvolvimento sustentável porém nunca saiu do papel. Entre a década de
1970 e 1990 pouca coisa foi feita nesse sentido, ressaltando que os acordos internacionais sobre o
tema sempre foram abrangentes, permitindo diversas interpretações. Dessa forma era possível
abarcar vários interesses conflitantes dentro de poucas resoluções que efetivamente não surtiam
efeito algum.
A retomada do tema ambiental pela comunidade internacional surgiria na década de 1990
com a CNUMAD. Tal evento caracterizou-se pela busca por uma melhor compreensão sobre o
conceito e o significado do desenvolvimento sustentável, paralelamente às tendências crescentes
em direção à globalização, especialmente no que diz respeito ao comércio e à tecnologia. Foi
nesse período que o conceito de desenvolvimento sustentável passou a ser definido com base em
três pilares: o econômico, o social e o ambiental.
O conceito de desenvolvimento sustentável sempre foi definido por uma abordagem mais
política e essa noção não mudou ao longo do tempo. A adoção dos três pilares só confirmaria
155

esse fato, já que imputava a necessidade de crescimento dos países em desenvolvimento ao


mesmo tempo em que deixava uma margem para os países desenvolvidos e seu argumento de
preservação ambiental acima do desenvolvimento econômico. O desenvolvimento estava atrelado
de uma vez ao meio ambiente e seria necessário lidar com esse fato, mesmo sem saber como
aplicar tal conceito na prática. Na Rio-92, os debates sobre o desenvolvimento sustentável
permaneceram sob o domínio de fatores econômicos, demográficos e institucionais e o grande
fator de discórdia era a situação dos financiamentos para os projetos ambientais que estavam
sendo desenvolvidos na Conferência.
Após a Conferência, o desenvolvimento sustentável ganhou uma base na qual se sustentar,
pelo menos politicamente que foi a criação da Agenda 21. Tal fato foi um avanço para a
construção do desenvolvimento sustentável. A partir de seus preceitos, toda uma pauta
substancial de ações foi tomada na década de 1990 tanto no terreno nacional quanto no
internacional.
Foi a partir da assinatura do documento referente a Agenda 21, que se levantou a
necessidade de desenvolver indicadores capazes de avaliar a sustentabilidade, já que os
instrumentos disponíveis, entre eles o PIB, não forneciam dados suficientes para análise. Esse
documento deu frutos primeiro com a conferência Rio+5; posteriormente com a adoção de uma
agenda complementária denominada Metas do Desenvolvimento do Milênio (Millenium
Development Goals), com ênfase particular nas políticas de globalização e na erradicação da
pobreza e da fome; e mais recentemente, a Cúpula de Joanesburgo, em 2002, terceira e última
grande Conferência sobre meio ambiente e desenvolvimento promovida pelas Nações Unidas.
Para ajudar os países a formularem suas normas sobre a sustentabilidade e a controlar seus
efeitos, a Agenda 21 reconhece a necessidade de se estabelecer uma série de indicadores do
desenvolvimento sustentável de aceitação internacional. Mesmo assim, a operacionalização do
desenvolvimento sustentável continuou insuficiente, com muitas dificuldades para superar
interesses estabelecidos. Nos cinco anos desde a CNUMAD, a pobreza e os padrões de consumo
e produção permaneceram insustentavelmente altos. As desigualdades de renda se ampliaram
entre e dentro de nações, e houve deterioração continuada do meio ambiente global.
Operacionalizar um conceito tão abrangente e com diferentes facetas nos diversos países
não se mostrou uma tarefa fácil. Embora a CNUMAD tenha sido o mais importante acordo de
cúpula ambiental de todos os tempos, a maioria dos países não cumpriram os acordos nela
156

firmados. Os indicadores de desenvolvimento sustentável criados posteriormente à Conferência


não conseguiram extrapolar o nível local e nacional devido às barreiras conceituais impostas por
cada sociedade. Assim, a aferição do desenvolvimento sustentável continua a ser feita dentro das
fronteiras nacionais e sem um parâmetro único que permita fazer uma avaliação crítica para as
diferentes nações.
No inicio deste século, o quadro era o de dificuldades nas negociações internacionais, e o
tema ambiental, principalmente no que tange ao desenvolvimento sustentável, estava
enfraquecido. A pauta da agenda internacional ficou marcada no começo do século XXI pela
guerra ao terrorismo e pelo enfraquecimento das Nações Unidas. Assim, a última grande
Conferência da ONU não acrescentou muito embasamento ao tema do desenvolvimento
sustentável. A grande discussão de Joanesburgo foi a questão financeira entre países
desenvolvidos e em desenvolvimento, e que nunca conseguiu ser resolvida.
O que Joanesburgo ofereceu à questão ambiental foi uma forma mais pragmática de lidar
com o desenvolvimento sustentável. Cada governo desde então lida com a questão ambiental
dentro de suas fronteiras e do seu modo de vista. A configuração de mundo hoje, quase dez anos
após a última Conferência sobre Desenvolvimento Sustentável, mostra que as ações unilaterais
ainda são predominantes.
A necessidade de um consenso a respeito da questão ambiental ainda é bloqueada pelos
interesses unilaterais dos países, restando à comunidade internacional tentar um novo esforço
para que se chegue a um acordo com parâmetros claros e responsabilidades definidas entre os
participantes, alcançando com isso um novo patamar dentro da produção capitalista. Enquanto
isso não é possível, tem-se como base as ações unilaterais em torno do meio ambiente, onde os
países vão direcionando seus esforços em prol de um desenvolvimento sustentável definido
dentro de suas fronteiras.
O conceito de desenvolvimento sustentável não consegue ser operacionalizado em escala
global devido às divergências entre os países em torno de dois conceitos chaves: o
desenvolvimento e a sustentabilidade. Sem uma definição clara do que significam esses dois
conceitos para a comunidade internacional, não é possível definir o conceito derivado de
desenvolvimento sustentável.
A conceituação de desenvolvimento, por se tratar de uma problemática ampla e de escala
global, possui característica interdisciplinar e é atravessada por polêmicas de caráter ideológico e
157

teórico. Alguns teóricos adotam o conceito de desenvolvimento como resultado do crescimento


econômico. Essa conceituação, além de ultrapassada não reflete o verdadeiro objetivo do
desenvolvimento que é a obtenção de qualidade de vida para as populações de determinada
região.
É evidente que para se obter uma melhor medida do desenvolvimento necessitamos saber
qual é a verdadeira distribuição de renda e qualidade de vida de uma população. Ou seja, para se
configurar como desenvolvido, um país tem que oferecer um determinado nível de condições
básicas – saúde, educação, segurança e oportunidade de escolha – a seu povo. Ainda assim, esse
sentido de desenvolvimento não configura nenhuma relação com o meio ambiente. Um país pode
ser desenvolvido mesmo que possua altos níveis de degradação ambiental, não respeitando a
sustentabilidade ambiental.
O desenvolvimento sustentável aparece nesse cenário como uma forma diferente de se
pensar o desenvolvimento, no qual estão inseridas as noções de desenvolvimento somadas às
questões da sustentabilidade, tanto a sustentabilidade ambiental quanto a social, a econômica e a
institucional. A faceta ambiental ganha um peso importante no conceito desenvolvimento, ao
mesmo tempo em que não é conflitante com o crescimento econômico, o primeiro conceito de
desenvolvimento adotado pelos especialistas.
A sociedade percebeu a importância de refletir sobre a natureza do desenvolvimento que
se desejava, isso inclui as visões ambientalista, cultural, social e institucional do
desenvolvimento. As políticas de desenvolvimento deveriam ser estruturadas por valores que não
seriam somente os da dinâmica econômica.
O modelo de pensamento dominante na ciência econômica é baseado na ideia de
equilíbrio. Tal modelo ignora a união entre os sistemas econômicos e bióticos, além de não se
preocupar com a existência de limites naturais. No sistema econômico convencional os fatores a
serem maximizados são utilidades individuais, e não as necessidades de um sistema biótico.
Assim, as políticas econômicas não dão a devida atenção a quaisquer condicionantes de ordem
ecológica.
O desenvolvimento deve ser definido como uma mudança qualitativa, e não quantitativa.
Ele não ocorre de forma linear, mas opera como uma rede de co-desenvolvimentos
independentes. Na visão evolucionista, o desenvolvimento econômico utiliza os mesmos
princípios universais utilizados pelo resto da natureza. Em outras palavras, o desenvolvimento
158

econômico seria uma versão do desenvolvimento natural. O interesse prático dessa ideia está na
necessidade de entender que o desenvolvimento não é um conjunto de coisas, mas um processo
que produz essas coisas.
O conceito de desenvolvimento que preenche melhor a necessidade da preservação
ambiental leva em conta a combinação de sustentabilidade e respeito às instituições e acordos
multilaterais, além da participação estatal como provedor das condições para que as instituições
privadas se desenvolvam e também provedor da proteção social necessária para sua população.
Como a organização econômica é basicamente condicionada pelo Estado, o desenvolvimento
seria promovido pela vontade do mesmo, de acordo com sua ideologia, levando em conta sua
própria noção de desenvolvimento e respeitando as instituições, tanto aquelas em âmbito
nacional, quanto as regras internacionais ao qual o próprio Estado se dispôs a seguir.
Esse processo impede que seja elaborada uma noção fixa para o desenvolvimento, que
dependeria da formação histórica cultural e institucional de cada região. Tal fato nos leva a uma
definição ampla para o desenvolvimento, com algumas diretrizes que podem ser consideradas
padrão pelas nações, mas o caminho a percorrer para alcançar o objetivo é dinâmico, não sendo
possível configurar uma conceituação estática do mesmo. Só por esta afirmação já não se torna
mais possível criar um conceito estático de algo que deriva da idéia de desenvolvimento como o
desenvolvimento sustentável, cabendo aos formuladores de políticas se adaptar as noções
existentes.
A segunda conceituação chave para o desenvolvimento sustentável é a noção de
sustentabilidade, algo muito mais complexo de ser definido que o próprio desenvolvimento. Não
se pode pensar o desenvolvimento sem levar em consideração a questão da sustentabilidade do
ambiente em que esse desenvolvimento está inserido. Para tal, é necessário conhecer a noção de
sustentabilidade que é adotada nas mais diferentes regiões. Sendo esta uma noção mais política
que científica, o desenvolvimento sustentável fica condicionado a duas vertentes de escolhas
normativas financiadas pela política adotada em cada região.
A concepção de sustentabilidade pode abarcar desde a total preservação ambiental, onde o
homem seria refém do meio, não podendo modificá-lo e enfrentando uma situação que
prejudicaria seu bem-estar até a noção de que o ambiente pode ser utilizado a exaustão desde que
o homem consiga fornecer novos níveis tecnológicos que possam dar uso a elementos antes
considerados descartáveis. Neste caso não existiria limites para o desenvolvimento.
159

A concepção de sustentabilidade que mais se encaixaria na idéia de desenvolvimento


sustentável é aquela que aceita a existência de limites naturais que impedem o desenvolvimento
desenfreado do planeta. A atividade humana não pode ultrapassar a capacidade de renovação da
natureza. Esse fato nos leva ao dilema da troca do crescimento econômico quantitativo pelo
qualitativo. O que estaria em pauta não seria um número cada vez maior de PIB, mas o que esse
número representa de fato dentro da sociedade, modificando a qualidade de vida das pessoas.
As definições de sustentabilidade devem incorporar aspectos da sustentabilidade
econômica e ecológica somada ao bem-estar humano. Sob esse prisma, é necessário que se olhe a
sustentabilidade por diferentes óticas. Assim, não há sustentabilidade em sentido amplo, se não
houver a combinação de desenvolvimento econômico, preservação ambiental e justiça social. A
sustentabilidade econômica abrange a alocação e distribuição eficiente dos recursos naturais,
respeitando uma escala apropriada. Na perspectiva social, a sustentabilidade é vista como um
processo de desenvolvimento que leve a um crescimento estável com distribuição equitativa de
renda, ocasionando a diminuição das diferenças entre os vários níveis de classes e a melhoria das
condições de vida da população de um país. Pela perspectiva da sustentabilidade ambiental, a
principal preocupação é a dos impactos sobre o meio ambiente decorridos da atividade humana.
A fraqueza, a imprecisão e a ambivalência que o conceito de sustentabilidade ganhou ao
longo do tempo, foram as razões de sua força e aceitação quase total. Apesar de toda a discussão
sobre sustentabilidade, ainda não se sabe qual o seu verdadeiro poder de alcance, apenas se sabe
que é necessário manter o nível de capital natural para que as futuras gerações possam se
desenvolver. A definição de sustentabilidade atualmente estaria no uso racional dos recursos
escassos e no processo de reaproveitamento desses recursos.
Contrariamente às projeções e às previsões quantitativas, a sustentabilidade também deve
ser analisada de forma qualitativa, procurando lidar com as mais prováveis mudanças de rumo no
planeta. Ela é o carro-chefe do processo de institucionalização que insere o meio ambiente na
agenda política internacional, além de fazer com que esta dimensão passe a permear a formulação
e a implantação de políticas públicas em todos os níveis nos Estados nacionais e nos órgãos
multilaterais de caráter supranacional.
Dessa forma são obtidos dois conceitos dinâmicos que devem ser medidos em caráter
qualitativo para a obtenção de um conceito derivado, o desenvolvimento sustentável. Este
também deverá ser dinâmico e possuir uma faceta qualitativa. Mesmo que nos forneça
160

parâmetros quantitativos, sua interpretação depende de julgamento de valores totalmente


qualitativos que não podem ser dissociados do parâmetro quantitativo apresentado.
Graças a dependência dos outros dois conceitos de desenvolvimento e sustentabilidade,
existem diferentes definições para desenvolvimento sustentável, de acordo com os mais
diferentes critérios políticos, econômicos e sociais, o que provoca uma grande indefinição do
conceito, não se sabendo exatamente o que o termo significa. Um dos fatores preocupantes para o
desenvolvimento sustentável é exatamente essa manipulação do termo de acordo com o grupo de
interesse que o utiliza. Cada grupo social incorpora um conteúdo ao conceito, para que este possa
se encaixar em seus propósitos.
Tendo como princípio conciliar crescimento e conservação ambiental, o conceito de
desenvolvimento sustentável, por ser um termo vago, passou a servir a diferentes interesses. De
nova ética do comportamento humano, passando pela proposição de uma revolução ambiental até
ser considerado um mecanismo de ajuste da sociedade capitalista (capitalismo soft), o
desenvolvimento sustentável tornou-se um discurso poderoso, promovido por organizações
internacionais, empresários e políticos, repercutindo na sociedade civil internacional e na ordem
ambiental internacional.
O fato de existirem diferentes concepções sobre a ideia de desenvolvimento sustentável
possivelmente explica as diferentes versões para o conceito. Essa variedade de concepções faz
com que este conceito deixe de ser operacionalizado, prejudicando a implementação dos
processos para um novo modelo de desenvolvimento.
Desde a criação do Relatório Brundtland, ocorre o processo de legitimação e
institucionalização normativa da expressão “desenvolvimento sustentável”. Este foi caracterizado
por ser um conceito político e amplo para o progresso econômico e social. A definição adotada
pelas Nações Unidas dá uma maior ênfase à questão social. Seu objetivo primeiro seria alcançar
um nível de bem-estar econômico razoável e equitativamente distribuído que possa ser
perpetuamente continuado por muitas gerações humanas. Isto implica usar os recursos naturais de
maneira a não degradá-los ou eliminá-los, ou diminuir sua utilidade para as gerações futuras.
O conceito de desenvolvimento sustentável defendido tanto no Relatório Brundtland
quanto na Agenda 21 se baseia em dois pilares: a prioridade na satisfação das necessidades das
camadas mais pobres da população e as limitações que o estado da tecnologia e da organização
social impõe ao meio ambiente. Um dos aspectos positivos da argumentação que está por trás do
161

conceito de desenvolvimento sustentável é a tentativa de resolver as contradições entre o


crescimento econômico, a distribuição de renda e a necessidade de conservar os recursos
ambientais, não só em beneficio das gerações atuais, mas também das gerações futuras.
Uma das maiores dificuldades da definição do desenvolvimento sustentável é o fato de
que a sociedade necessita saber aonde quer chegar para depois poder medir se esses objetivos
estão sendo alcançados. Ao assumir as limitações que a tecnologia e a organização social impõe
sobre o meio ambiente, o conceito de desenvolvimento sustentável se torna um conceito
dinâmico pois a sociedade e o meio ambiente estão em contínua transformação. As tecnologias,
culturas e valores se modificam constantemente e uma sociedade sustentável deve levar em
consideração essas transformações.
Existem várias críticas ao desenvolvimento sustentável e sua aplicabilidade como aquela
que aponta a proposta do Relatório Brundtland por não dar ênfase às condições internacionais
que o desenvolvimento sustentável enfrentaria. Essa proposta ignora as relações de forças
internacionais, os interesses dos países industrializados em dificultar o acesso dos países em
desenvolvimento à tecnologia, as relações desiguais no comércio entre os países, e a oposição de
multinacionais a propostas tecnológicas contrárias aos seus interesses globais.
A segunda maior crítica está na crença nas forças de mercado para solucionar os
problemas ambientais. A postura adotada se aproxima da economia neoclássica, para a qual os
problemas ambientais são considerados externalidades nos projetos de desenvolvimento. Seria
necessário ter o planejamento como instrumento para resolver as contradições entre o
crescimento econômico e a conservação do meio ambiente. No entanto, essas questões não são
somente técnicas, mas também políticas e dizem respeito a visões e interesses dos vários grupos
que compõem a sociedade, que possuem interesses divergentes sobre o acesso e o uso dos
recursos ambientais.
O grande paradoxo do desenvolvimento sustentável é manter a sustentabilidade, uma
noção das ciências da natureza, com o permanente avanço na produção exigida pelo
desenvolvimento, cuja matriz está na sociedade. Essa contradição não é uma equação fácil de se
resolver ainda mais somada aos conflitos de interesses entre os países dentro da área ambiental.
Seria necessário um grande esforço político internacional para que se criasse um marco
teórico para o desenvolvimento sustentável que pudesse ser adotado por toda a comunidade
internacional. Enquanto isso não é possível, os países agem unilateralmente, cada um com sua
162

perspectiva de desenvolvimento e com um objetivo de crescimento, podendo este estar ou não


ligado à questão da sustentabilidade.
É consenso que uma política de desenvolvimento sustentável não é possível sem
indicadores. Entretanto, os obstáculos para a criação desses indicadores passam por parâmetros
de conceituação, implementação e monitoramento de um sistema local, nacional ou internacional.
A dificuldade em se implantar um indicador de desenvolvimento sustentável está na sua aceitação
perante toda a comunidade global.
Os melhores indicadores são aqueles que resumem ou simplificam as informações brutas,
de modo que possam ser entendidos e assimilados tanto pelos formuladores de políticas quanto
pela sociedade em geral. Dentro desses indicadores, seria importante se levar em conta mais as
variáveis qualitativas, tornando o indicador com um viés qualitativo. A dificuldade nesse
processo está na assimilação dos dados qualitativos, pois nada garante que não haverá alguma
perda de valor nos dados na hora de calcular o indicador. Entretanto, um indicador somente
quantitativo não seria capaz de mostrar toda a abrangência do desenvolvimento sustentável
devido as suas limitações implícitas ou mesmo explícitas.
Os problemas complexos do desenvolvimento sustentável requerem sistemas interligados,
indicadores inter-relacionados ou a agregação de diferentes indicadores. Devido a essa
complexidade, existem poucos indicadores que lidam especificamente com o desenvolvimento
sustentável, geralmente desenvolvidos com o propósito de entender melhor os fenômenos
relacionados à sustentabilidade.
Os indicadores devem ter a capacidade de captar as mudanças da sociedade ao longo do
tempo a fim de indicar com precisão a convergência da mesma para a meta de desenvolvimento
sustentável. É isso que irá permitir aos países definir um modelo de desenvolvimento para uma
sociedade futura, bem como relatar onde estão acontecendo progressos em direção à
sustentabilidade e em que taxa. A necessidade de indicadores com certo grau de agregação é
imprescindível para o monitoramento da questão da sustentabilidade. Para resolver o problema da
agregação, os dados devem ser estratificados em termos de grupos sociais ou setores industriais
ou ainda distribuição espacial.
Alguns sistemas de indicadores foram desenvolvidos para a utilização em escala nacional,
mas uma das barreiras ao seu uso é justamente a heterogeneidade entre as nações. Alguns
elementos essenciais dentro do cálculo dos indicadores como nível de industrialização, estrutura
163

econômica, espaço geográfico, entre outros diferem muito de país para país. Para países em
desenvolvimento, a pesquisa em torno dos indicadores ainda é incipiente. Os estudos sobre
sustentabilidade ainda ocorrem em âmbito nacional e a comparabilidade das nações é reduzida e
prejudicada pelas disparidades entre os países. Nesse caso é grande a heterogeneidade entre os
diversos países em relação a alguns elementos essenciais específicos, como nível de
industrialização, estrutura econômica, espaço geográfico e outros.
A utilização de indicadores é indispensável para que o conceito de desenvolvimento
sustentável se torne operacional. São eles que ajudam os tomadores de decisão e a sociedade em
geral a definirem suas metas de desenvolvimento e permitem avaliar o alcance dos objetivos
traçados. Os indicadores também auxiliam na escolha entre alternativas políticas e na correção da
direção de uma política, em resposta a uma realidade dinâmica.
Apesar de toda a importância dos indicadores para medir a extensão da evolução de uma
região ao desenvolvimento sustentável, estes possuem várias limitações. Uma das principais é a
perda de informação vital ao se agregar inúmeros dados distintos. No mundo real seria necessário
mais do que um indicador para capturar os aspectos mais importantes de um fato ocorrido. Desse
modo o indicador faz uma simplificação da realidade que é útil como medida, mas que deve ser
acompanhada de outras informações para uma análise mais precisa da realidade.
Os indicadores podem ser importantes e perigosos ao mesmo tempo, já que funcionam
como ferramenta e estão simultaneamente no centro do processo decisório. O indicador não mede
precisamente um sistema, apenas faz uma aproximação do mesmo, utilizando informações
passadas e projetando um cenário aproximado. É difícil apurar sua tendência, por isso o indicador
pode ser deliberada ou acidentalmente desviado. Os indicadores também podem levar a sociedade
a uma percepção falsamente positiva da realidade quando são mal formulados ou mal utilizados,
ou ainda baseados em modelos não confiáveis. Daí a necessidade de se trabalhar com indicadores
reconhecidos internacionalmente e que tenham um aval da comunidade científica.
Quando um indicador de desenvolvimento sustentável é formulado, este pode ter um viés
que influencia no seu resultado devido à arbitrariedade dos valores de sua ponderação. Assim,
permanece o desafio de interpretar os dados e apontar as necessidades reais de mudanças. As
tendências dos índices podem se mostrar contraditórias: diferentes valores levam a diferentes
ponderações e interpretações alternativas dos mesmos dados. Assim, um modelo conceitual é
necessário para organizar os diferentes tipos de indicadores existentes, relevantes ao
164

desenvolvimento sustentável. Como o modelo conceitual não consegue se dissociar de um viés


político, os indicadores não podem ser considerados puramente técnicos, devendo ter sempre um
cuidado maior ao analisar os dados fornecidos.
Para se conhecer melhor uma ferramenta de avaliação deve-se observar quais dimensões
são utilizadas e de que forma. Além disso, é necessário que se saiba qual o campo de aplicação da
ferramenta, onde esta pode e deve ser aplicada, já que existem diferentes esferas de utilização de
um sistema de indicadores e o uso dessas ferramentas em um nível não correspondente ao seu
potencial pode levar a um resultado viesado da realidade. A utilização dos indicadores é restrita à
esfera espacial para a qual foram desenvolvidos.
Alguns países começaram a desenvolver seus próprios indicadores no final da década de
1990. O que temos atualmente é um compêndio de índices e classificações nos quais cada nação
atribui seus valores e necessidades na formulação dos mesmos. Esse movimento não permite que
se equalize ou torne a noção de desenvolvimento sustentável homogênea, prejudicando sua
avaliação. Existem indicadores formulados por organismos internacionais, que teoricamente
seriam menos impactados pela participação de atores locais no processo. Ainda assim esses não
são unanimidades no campo científico.
Alguns indicadores formulados por países a nível nacional podem apresentar um grau de
agregação mais completo que os fomentados pelos organismos internacionais. Por isso existe a
necessidade de uma análise criteriosa entre os indicadores apresentados para que se escolha o
mais completo e o que se adapte melhor aos objetivos traçados.
Entre os projetos de indicadores de desenvolvimento sustentável formulados pelos
organismos internacionais, o EVI parece ser o mais completo dentro da definição mais ampla de
desenvolvimento sustentável. Ele oferece um método padronizado para caracterizar a
vulnerabilidade ambiental e reconhecer questões que possam exigir enfrentamento específico no
contexto de cada um dos três pilares da sustentabilidade, isto é, aspectos ambientais, econômicos
e sociais do desenvolvimento de um país. Seus cinquenta indicadores abarcam diversos aspectos
da sustentabilidade e do bem-estar humano.
Dentre os indicadores formulados pelas nações por iniciativa própria, essa dissertação
destacou alguns que são considerados importantes do ponto de vista da comunidade
internacional. São eles o EFM, o DS e o BS. O EFM aborda a questão da relação da sociedade
com o meio ambiente. De acordo com esse método, o crescimento econômico ilimitado não é
165

passível de realização. Para o EFM, o desenvolvimento sustentável depende da redução da


destruição ecológica. Ele captura de maneira muito eficiente a esfera ambiental da
sustentabilidade que é afetada pela atividade econômica humana, mas não consegue alcançar o
sistema na dimensão social da sustentabilidade. Além disso, é uma ferramenta estática, não
permitindo extrapolações temporais. A sustentabilidade forte é o eixo central da ferramenta.
Como as questões dos países em desenvolvimento, envolvem muito mais do que apenas a
preservação pura e simples do estado natural do sistema ecológico, esta ferramenta não é a mais
indicada para uma análise dessas nações.
O Dashboard of Sustainability (DS) é um índice agregado de vários indicadores de
desempenho econômico, social e ambiental que mostra, visualmente, os avanços dos países em
direção à sustentabilidade. O indicador foi construído a partir de uma visão holística com uma
abordagem relacionada à teoria dos sistemas, onde dois sistemas são considerados: o humano e o
circundante ecossistema, ao contrário de modelos mais específicos em que a economia e as
instituições sociais são consideradas sistemas separados.
Uma das desvantagens do DS é que ele pode mascarar a sustentabilidade efetiva do
desenvolvimento. Dentro do conceito de diferentes dimensões que o DS apresenta, é possível que
a dificuldade em avaliar o desenvolvimento surja não pela falta de parâmetros, mas sim pela
abundância de indicadores potenciais que seriam úteis. O que deve ou não ser medido depende da
visão sobre sustentabilidade dentro de cada país, ou de um consenso existente na esfera
internacional. Como esse consenso está longe de acontecer, os indicadores como o DS, por mais
completos que sejam nos trarão a noção de sustentabilidade individualizada das nações, podendo
um país ser mais bem avaliado que outro dependendo das variáveis utilizadas e de suas
ponderações.
Já o BS é um índice que compara o bem-estar humano e o do ecossistema dentro das
sociedades. Uma das características mais importantes do Barometer of Sustainability é sua
capacidade de combinar indicadores, permitindo aos usuários chegarem a conclusões a partir
dados considerados contraditórios. Na formulação do BS, indicadores puramente descritivos são
ignorados, já que são partes do contexto e não podem ser modificados. Essa predileção por
índices numéricos acaba sendo prejudicial por não levar em consideração questões qualitativas da
sustentabilidade, prejudicando a ferramenta. As duas dimensões da ferramenta (humana e
ecológica) têm peso igual e são mensuradas separadamente.
166

O BS não é considerado um sistema absoluto e sim uma abordagem relativa. A partir dos
processos deve-se decidir quais indicadores ou índices devem ser abordados pela ferramenta.
Esse fato dá um peso mais político para a ferramenta, já que o usuário pode escolher os
indicadores como ele achar conveniente. Uma de suas desvantagens é que a ferramenta ainda não
foi testada para medir a sustentabilidade em condições culturais e ecológica diferentes. Seu
sistema só está disponível para 37 países, o que deixa um grande escopo de nações fora das
medições e enfraquece a confiabilidade da ferramenta.
Além dessas três ferramentas de medição do desenvolvimento sustentável, a dissertação
procurou dar ênfase as ferramentas criadas pelo Brasil já que o país era o nosso objeto de estudo
central. Sendo um país em desenvolvimento empenhado em demonstrar seu comprometimento
com o desenvolvimento sustentável, o Brasil desenvolveu índices com o objetivo de medir a
sustentabilidade no plano nacional. Dentre eles, podemos destacar o DNA Brasil, elaborado pela
Unicamp e o IDS, elaborado pelo IBGE.
O DNA Brasil tem o intuito de comparar a realidade brasileira com expectativas de futuro
e a situação de outros países e balizar a mobilização de atores, públicos e privados, envolvidos
em projetos de desenvolvimento. Ele se dedica mais aos indicadores sociais do que os
propriamente ambientais, constando nele apenas dados sobre saneamento básico, o que não o
qualifica como bom estimador para o desenvolvimento sustentável.
O país possui como indicador de desenvolvimento sustentável oficial o IDE formulado
pelo IBGE. Ele possui informações sobre a realidade brasileira que integram as dimensões social,
ambiental, econômica e institucional. O IDS nada mais é do que um compêndio de indicadores de
várias dimensões. Isso traz vantagens e desvantagens para a análise. A principal vantagem está na
possibilidade de se olhar mais a fundo os problemas que prejudicam a obtenção do grau desejado
de desenvolvimento sustentável por cada setor analisado, vendo com mais clareza o que precisa
ser modificado e aprimorado. A desvantagem desse tipo de abordagem de indicador é que ele não
nos fornece um índice para que possa ser medido o desenvolvimento sustentável em si, mas
apenas resultados de suas dimensões que possuem diferentes aspectos e escalas.
O Brasil se encontra numa posição altamente privilegiada. É um país com grande mercado
consumidor, matriz energética diversificada, sólido parque industrial, alta tecnologia petrolífera,
além de estabilidade institucional, econômica e jurídica. O país está incluído entre os países
dotados da chamada megadiversidade, grupo de 12 nações que abrigam 70% da biodiversidade
167

total do planeta. O Brasil tem grande potencial em direcionar sua economia para o
desenvolvimento sustentável e tem buscado ativamente ser um expoente nessa área dentro da
comunidade internacional.
A capacidade da atuação do Estado Brasileiro na área ambiental baseia-se na ideia de
responsabilidades compartilhadas entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios e entre
esses e os demais setores da sociedade. Vários sistemas e entidades foram criados nas últimas
duas décadas para articular e dar suporte institucional e técnico para a gestão ambiental no país.
Mesmo assim, a falta de capilaridade, isto é da capacidade de fazer chegar suas ações o mais
próximo possível dos cidadãos, a escassez de recursos financeiros e de pessoal, assim como a
falta de uma base legal revisada, consolidada e implementada constituem os principais problemas
enfrentados pelo segmento ambiental brasileiro.
Através dos dados analisados pelo IDS nessa dissertação é possível constatar que a
situação brasileira é típica de um país em desenvolvimento. Em muitas áreas vê-se uma melhora
expressiva em termos de desenvolvimento sustentável, em outras porém o país se apresenta
estagnado ou com uma evolução bastante lenta. As principais mudanças ocorreram nas
dimensões sociais e econômicas com significativas melhoras, mas com um longo caminho a
percorrer. Ainda assim é difícil analisar o grau de desenvolvimento sustentável do país com os
dados abertos como os fornecidos pelo IDS. O ideal seria ter um índice que condensasse essas
informações e apontasse as falhas dentro de cada dimensão do desenvolvimento sustentável e a
direção a ser seguida para que o objetivo da sustentabilidade brasileira fosse alcançado.
A análise do caso brasileiro pelo BS nos fornece uma amostra sintética dos índices
referentes ao desenvolvimento sustentável que estão explícitos nos IDS. Ele produz um valor
numérico com as informações que utilizam e, quando comparado a uma escala padrão, fornecem
um critério para avaliar a sustentabilidade. Infelizmente, por falta de dados para a ferramenta, só
foi possível analisar o ano de 2002, o que nos deixa com uma defasagem de dez anos e não
conseguimos absorver a verdadeira realidade brasileira pela ferramenta. O que foi possível foi
observar o processo da ferramenta utilizada na prática. As conclusões retiradas do BS é que o
país era potencialmente insustentável no ano de 2002, possuindo uma situação intermediária
limítrofe. O estudo, no entanto, aponta que os indicadores sociais e econômicos apresentam
melhores resultados que os ambientais, embora exista ainda um grande passivo social no Brasil.
168

Ainda foi aplicado o DS no caso brasileiro, utilizando-se como parâmetro os objetivos de


desenvolvimento do milênio idealizados pelas Nações Unidas. A ferramenta analisada, dessa
maneira, dá maior ênfase ao lado social do desenvolvimento sustentável, já que a maior parte dos
ODM estão diretamente relacionados a essa dimensão.
Ao se pensar o desenvolvimento sustentável como um todo, o DS não chega a ser a
ferramenta mais completa, apesar do mesmo considerar as complexas interações entre as quatro
dimensões do desenvolvimento sustentável. Com ele conseguiremos ter uma ótima avaliação do
desenvolvimento social, mas como o peso dessa dimensão é demasiado, as outras dimensões
ficam prejudicadas.
Um dos pontos positivos do DS é o fato da ferramenta apresentar a possibilidade de
observar individualmente a performance de cada um dos indicadores representados, ao mesmo
tempo em que revela medidas agregadas que fornecem uma visão mais geral de cada dimensão.
Dentro da análise do DS, o Brasil obteve uma pontuação que o coloca no nível bom da escala de
pontuação para os dados de 2009. Isso significa dizer que o esforço em direção ao
desenvolvimento sustentável do país está surtindo efeito.
A análise das diferentes ferramentas de desenvolvimento sustentável aponta para as
dificuldades de se mensurar o mesmo. Pela comparação das duas ferramentas agregadas, o Brasil
possui posições diferentes em relação ao desenvolvimento, sendo potencialmente insustentável
pelo BS e com um nível bom na busca da sustentabilidade pelo DS. A análise é prejudicada
devido aos dados do BS se reportarem a 2002 e os do DS a 2009. O que se pode concluir é que,
atualmente o país está conseguindo atingir seus objetivos e que possivelmente estava longe de
alcançá-los em 2002.
A principal conclusão a que se queria chegar era a funcionalidade dos indicadores, e após
sua análise, com seus diferentes pontos positivos e negativos, foi possível obter uma visão
ampliada do desenvolvimento sustentável como um conceito aberto que necessita internalizar
diferentes visões da sociedade e do meio ambiente. Os indicadores nos fornecem apenas as
fotografias desses conceitos. O IDS fornece uma visão aberta do país, expondo suas falhas e
virtudes, mas por ser um indicador amplo talvez ele não se torne operacional e de fácil
divulgação. De toda a forma, os diferentes indicadores apresentados mostram um país na direção
correta, mas com pouco investimento na sustentabilidade ambiental.
169

A aplicação dos indicadores é importante pois eles fornecem a direção das políticas
aplicadas, tanto interna quanto externa, necessárias ao alcance dos objetivos definidos pelo
Estado. Mas não podemos nos apoiar apenas nos indicadores como ponto central de uma política
direcionada ao desenvolvimento. Eles servem para apontar a direção correta e expor as falhas das
políticas adotadas.
Um país que busca uma inserção externa baseada na figura de uma potência preocupada
com a sustentabilidade necessita de grandes investimentos nas áreas ambiental e tecnológica, sem
descuidar do bem-estar da população. O esforço para se alcançar o objetivo do desenvolvimento
sustentável passa pela consolidação de conceitos, formulação de políticas positivas e,
posteriormente, consenso entre as nações da melhor prática a ser adotada. Esse consenso parece
longe de ser alcançado, apesar de todo o esforço expendido para tal. Cabe as nações definirem
suas posições e buscarem seu espaço dentro do campo do desenvolvimento sustentável, algo que
irá, cedo ou tarde, intervir no crescimento e na projeção de todas os países do globo.
170

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