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Universidade do Sul de Santa Catarina

Processos de Engenharia Biológica


Disciplina na modalidade a distância

Palhoça
UnisulVirtual
2010
Créditos
Universidade do Sul de Santa Catarina – Campus UnisulVirtual – Educação Superior a Distância
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Reitor Unisul Phelipe Luiz Winter da Silva Secretaria de Ensino a Distância Maria Lina Moratelli Prado Gerência de Produção
Ailton Nazareno Soares Priscila da Silva Karine Augusta Zanoni Mayara de Oliveira Bastos Arthur Emmanuel F. Silveira (Gerente)
Rodrigo Battistotti Pimpão (Secretária de Ensino) Patrícia de Souza Amorim Francini Ferreira Dias
Giane dos Passos Poliana Morgana Simão
Vice-Reitor Coordenação dos Cursos (Secretária Acadêmica) Priscila Machado Design Visual
Sebastião Salésio Heerdt Alessandro Alves da Silva Pedro Paulo Alves Teixeira (Coord.)
Auxiliares das coordenações Andréa Luci Mandira Adriana Ferreira dos Santos
Fabiana Lange Patricio Cristina Mara Shauffert Gerência de Desenho Alex Sandro Xavier
Chefe de Gabinete da Maria de Fátima Martins Djeime Sammer Bortolotti e Desenvolvimento de Alice Demaria Silva
Tânia Regina Goularte Waltemann Douglas Silveira Materiais Didáticos Anne Cristyne Pereira
Reitoria
Fabiano Silva Michels Márcia Loch (Gerente) Diogo Rafael da Silva
Willian Máximo Coordenadores Graduação Felipe Wronski Henrique Edison Rodrigo Valim
Adriana Santos Rammê Janaina Conceição Acessibilidade Frederico Trilha
Adriano Sérgio da Cunha Jean Martins Vanessa de Andrade Manoel (Coord.) Higor Ghisi Luciano
Pró-Reitora Acadêmica Aloísio José Rodrigues Luana Borges da Silva Bruna de Souza Rachadel Jordana Paula Schulka
Miriam de Fátima Bora Rosa Ana Luisa Mülbert Luana Tarsila Hellmann Letícia Regiane Da Silva Tobal Nelson Rosa
Ana Paula R. Pacheco Maria José Rossetti Patrícia Fragnani de Morais
Bernardino José da Silva Miguel Rodrigues da Silveira Junior Avaliação da aprendizagem
Pró-Reitor de Administração Carmen Maria C. Pandini Monique Tayse da Silva Lis Airê Fogolari (coord.) Multimídia
Fabian Martins de Castro Catia Melissa S. Rodrigues Patricia A. Pereira de Carvalho Gabriella Araújo Souza Esteves Sérgio Giron (Coord.)
Charles Cesconetto Patricia Nunes Martins Cristiano Neri Gonçalves Ribeiro
Diva Marília Flemming Paulo Lisboa Cordeiro Desenho Educacional Dandara Lemos Reynaldo
Pró-Reitor de Ensino Eduardo Aquino Hübler Rafaela Fusieger Carmen Maria Cipriani Pandini Fernando Gustav Soares Lima
Mauri Luiz Heerdt Eliza B. D. Locks Rosângela Mara Siegel (Coord. Pós) Sérgio Freitas Flores
Fabiano Ceretta Silvana Henrique Silva Carolina Hoeller da S. Boeing
Horácio Dutra Mello Vanilda Liordina Heerdt (Coord. Ext/DAD) Portal
Campus Universitário de Itamar Pedro Bevilaqua Silvana Souza da Cruz (Coord. Grad.) Rafael Pessi (Coord.)
Tubarão Jairo Afonso Henkes Ana Cláudia Taú Luiz Felipe Buchmann Figueiredo
Diretora Janaína Baeta Neves Gerência Administrativa e Carmelita Schulze
Milene Pacheco Kindermann Jardel Mendes Vieira Financeira Cristina Klipp de Oliveira Comunicação
Joel Irineu Lohn Renato André Luz (Gerente) Eloisa Machado Seemann Marcelo Barcelos
Jorge Alexandre N. Cardoso Naiara Jeremias da Rocha Flávia Lumi Matuzawa Andreia Drewes
Campus Universitário da José Carlos N. Oliveira Valmir Venício Inácio Geovania Japiassu Martins Carla Fabiana Feltrin Raimundo
Grande Florianópolis José Gabriel da Silva Jaqueline Cardozo Polla
José Humberto D. Toledo Lygia Pereira Produção Industrial
Diretor Joseane Borges de Miranda Gerência de Ensino, Pesquisa Francisco Asp (Coord.)
Luiz Henrique Milani Queriquelli
Hércules Nunes de Araújo Luciana Manfroi e Extensão Marina Cabeda Egger Moellwald Ana Paula Pereira
Marciel Evangelista Catâneo Moacir Heerdt (Gerente) Marina Melhado Gomes da Silva Marcelo Bittencourt
Maria Cristina Veit Aracelli Araldi Melina de la Barrera Ayres
Campus Universitário Maria da Graça Poyer Michele Antunes Correa
UnisulVirtual Mauro Faccioni Filho Elaboração de Projeto e Nágila Cristina Hinckel Gerência Serviço de Atenção
Diretora Moacir Fogaça Reconhecimento de Curso Pâmella Rocha Flores da Silva Integral ao Acadêmico
Jucimara Roesler Myriam Riguetto Diane Dal Mago Rafael Araújo Saldanha James Marcel Silva Ribeiro (Gerente)
Nélio Herzmann Vanderlei Brasil Roberta de Fátima Martins
Onei Tadeu Dutra Sabrina Paula Soares Scaranto Atendimento
Equipe UnisulVirtual Raulino Jacó Brüning Extensão Viviane Bastos Maria Isabel Aragon (Coord.)
Rogério Santos da Costa Maria Cristina Veit (Coord.) Andiara Clara Ferreira
Rosa Beatriz M. Pinheiro André Luiz Portes
Diretora Adjunta Tatiana Lee Marques Pesquisa Gerência de Logística Bruno Ataide Martins
Patrícia Alberton Thiago Coelho Soares Daniela E. M. Will Jeferson Cassiano A. da Costa Holdrin Milet Brandao
Valnei Campos Denardin (Coord. PUIP, PUIC, PIBIC) (Gerente) Jenniffer Camargo
Roberto Iunskovski Mauro Faccioni Filho Andrei Rodrigues Maurício dos Santos Augusto
Secretaria Executiva e Cerimonial Rose Clér Beche (Coord. Nuvem) Maycon de Sousa Candido
Jackson Schuelter Wiggers (Coord.) Rodrigo Nunes Lunardelli Logística de Encontros Presenciais Sabrina Mari Kawano Gonçalves
Bruno Lucion Roso Pós-Graduação Graciele Marinês Lindenmayr (Coord.) Vanessa Trindade
Marcelo Fraiberg Machado Coordenadores Pós-Graduação Clarissa Carneiro Mussi (Coord.) Ana Paula de Andrade Orivaldo Carli da Silva Junior
Tenille Catarina Aloisio Rodrigues Cristilaine Santana Medeiros
Anelise Leal Vieira Cubas Biblioteca Daiana Cristina Bortolotti Estágio
Assessoria de Assuntos Bernardino José da Silva Soraya Arruda Waltrick (Coord.) Edesio Medeiros Martins Filho Jonatas Collaço de Souza (Coord.)
Internacionais Carmen Maria Cipriani Pandini Paula Sanhudo da Silva Fabiana Pereira Juliana Cardoso da Silva
Murilo Matos Mendonça Daniela Ernani Monteiro Will Renan Felipe Cascaes Fernando Oliveira Santos Micheli Maria Lino de Medeiros
Giovani de Paula Rodrigo Martins da Silva Fernando Steimbach Priscilla Geovana Pagani
Assessoria DAD - Disciplinas a Karla Leonora Nunes Marcelo Jair Ramos
Distância Luiz Otávio Botelho Lento Capacitação e Assessoria ao Prouni
Patrícia da Silva Meneghel (Coord.) Thiago Coelho Soares Docente Logística de Materiais Tatiane Crestani Trentin (Coord.)
Carlos Alberto Areias Vera Regina N. Schuhmacher Enzo de Oliveira Moreira (Coord.) Carlos Eduardo D. da Silva (Coord.) Gisele Terezinha Cardoso Ferreira
Franciele Arruda Rampelotti Adriana Silveira Abraão do Nascimento Germano Scheila Cristina Martins
Luiz Fernando Meneghel Gerência Administração Alexandre Wagner da Rocha Fylippy Margino dos Santos Taize Muller
Acadêmica Cláudia Behr Valente Guilherme Lentz
Assessoria de Inovação e Angelita Marçal Flores (Gerente) Elaine Cristiane Surian Pablo Farela da Silveira
Qualidade da EaD Fernanda Farias Juliana Cardoso Esmeraldino Rubens Amorim
Dênia Falcão de Bittencourt (Coord.) Simone Perroni da Silva Zigunovas
Rafael Bavaresco Bongiolo Financeiro Acadêmico
Marlene Schauffer Monitoria e Suporte Gerência de Marketing
Assessoria de Relação com Poder Rafael Back Enzo de Oliveira Moreira (Coord.) Fabiano Ceretta (Gerente)
Público e Forças Armadas Vilmar Isaurino Vidal Anderson da Silveira Alex Fabiano Wehrle
Adenir Siqueira Viana Angélica Cristina Gollo Márcia Luz de Oliveira
Gestão Documental Bruno Augusto Zunino Sheyla Fabiana Batista Guerrer
Assessoria de Tecnologia Lamuniê Souza (Coord.) Claudia Noemi Nascimento Victor Henrique M. Ferreira (África)
Osmar de Oliveira Braz Júnior (Coord.) Clair Maria Cardoso Débora Cristina Silveira
Felipe Jacson de Freitas Janaina Stuart da Costa Ednéia Araujo Alberto  Relacionamento com o Mercado
Jefferson Amorin Oliveira Josiane Leal Francine Cardoso da Silva Eliza Bianchini Dallanhol Locks
José Olímpio Schmidt Marília Locks Fernandes Karla F. Wisniewski Desengrini Walter Félix Cardoso Júnior
Marcelo Neri da Silva Ricardo Mello Platt Maria Eugênia Ferreira Celeghin
Denise Esteves Moritz

Processos de Engenharia Biológica


Livro didático

Design instrucional
Melina de la Barrera Ayres

Palhoça
UnisulVirtual
2010
Copyright © UnisulVirtual 2010
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio sem a prévia autorização desta instituição.

Edição – Livro Didático


Professor Conteudista
Denise Esteves Moritz

Design Instrucional
Melina de la Barrera Ayres

Projeto Gráfico e Capa


Equipe UnisulVirtual

Diagramação
Oberdan Piantino

Revisão
Amaline Boulos Issa Mussi

620
M85 Moritz, Denise Esteves
Processos de engenharia biológica : livro didático / Denise Esteves
Moritz; design instrucional Melina de la Barrera Ayres. – Palhoça :
UnisulVirtual, 2011.
270 p. : il. ; 28 cm.

Inclui bibliografia.

1. Biotecnologia. 2. Biodegradação. I. Ayres, Melina de la Barrera


II. Título.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universitária da Unisul


Sumário

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .7
Palavras da professora. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .9
Plano de estudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11

UNIDADE 1 - Agentes biológicos envolvidos na qualidade ambiental. . . 17


UNIDADE 2 - Micro-organismos importantes nos processos da qualidade
ambiental. Processos clássicos e biotecnológicos de
identificação destes agentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
UNIDADE 3 - Processos naturais e tecnológicos de remediação . . . . . . . 129
UNIDADE 4 - Avaliação Tecnológica dos Contaminantes orgânicos e
Biológicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 189

Para concluir o estudo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 241


Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 243
Sobre a professora conteudista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 247
Respostas e comentários das atividades de autoavaliação . . . . . . . . . . . . . 249
Biblioteca Virtual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 255
Anexo - Imagens Coloridas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 257
Apresentação

Este livro didático corresponde à disciplina Processos de


Engenharia Biológica.

O material foi elaborado visando a uma aprendizagem autônoma


e aborda conteúdos especialmente selecionados e relacionados
à sua área de formação. Ao adotar uma linguagem didática
e dialógica, objetivamos facilitar seu estudo a distância,
proporcionando condições favoráveis às múltiplas interações e a
um aprendizado contextualizado e eficaz.

Lembre-se de que sua caminhada, nesta disciplina, será


acompanhada e monitorada constantemente pelo Sistema
Tutorial da UnisulVirtual. Na relação de aprendizagem,
professores e instituição estarão sempre conectados com você. A
indicação ‘a distância’ caracteriza tão-somente a modalidade de
ensino por que você optou para a sua formação.

Então, sempre que sentir necessidade entre em contato. Você tem


à disposição diversas ferramentas e canais de acesso tais como:
telefone, e-mail e o Espaço Unisul Virtual de Aprendizagem,
que é o canal mais recomendado, pois tudo o que for enviado e
recebido fica registrado para seu maior controle e comodidade.
Nossa equipe técnica e pedagógica terá o maior prazer em lhe
atender, pois sua aprendizagem é o nosso principal objetivo.

Bom estudo e sucesso!

Equipe UnisulVirtual

7
Palavras da professora

Caro(a) aluno(a),

É com imenso prazer que lhe dou as boas-vindas ao livro


didático da disciplina Processos de Engenharia Biológica.

Para iniciar o estudo desta disciplina, é importante que, em


muitos momentos, recorde os conteúdos de outras disciplinas
já cursadas por você. É que, como o próprio nome indica,
serão abordados com maior ênfase os processos ambientais que
envolvem vida (Bio – prefixo grego, bios – significa vida).

As estratégias didáticas utilizadas neste livro preconizam


os casos clássicos da aplicação dos princípios de biologia e
da engenharia ao processamento de materiais, através de
agentes biológicos, para prover bens e assegurar serviços, e,
também, os da utilização de organismos vivos para a produção
biotecnológica.

A Engenharia Biológica (e seus Processos) está na interface


entre as Ciências da Vida e de Engenharia. Isto é, a
Engenharia Biológica é a integração das Ciências Naturais e
das Ciências de Engenharia com vista à aplicação industrial
de organismos, células, partes de células e seus constituintes
moleculares, para a obtenção de produtos e serviços.

As sequências didáticas propostas aqui foram planejadas para


que você consiga obter sucesso na aplicação de processos
que envolvam seres vivos ou parte deles de modo a reduzir
os impactos causados pelo homem ao meio ambiente. Para
auxiliar neste processo, no final do livro você encontrará um
anexo com as imagens apresentadas nas unidades, coloridas.
Utilize-as para ver os detalhes de cada uma!
Desejo compartilhar com você mais um desafio: se você gosta de
questionar, explorar, inventar, descobrir e criar, esta disciplina
será um sucesso com certeza.

Desejo a você um excelente estudo.

Profª. Denise Esteves Moritz

10
Plano de estudo

O plano de estudos visa a orientá-lo no desenvolvimento da


disciplina. Ele possui elementos que o ajudarão a conhecer o
contexto da disciplina e a organizar o seu tempo de estudos.

O processo de ensino e aprendizagem na UnisulVirtual leva


em conta instrumentos que se articulam e se complementam,
portanto, a construção de competências se dá sobre a
articulação de metodologias e por meio das diversas formas de
ação/mediação.

São elementos desse processo:

 o livro didático;

 o Espaço UnisulVirtual de Aprendizagem (EVA);

 as atividades de avaliação (a distância, presenciais e de


autoavaliação);

 o Sistema Tutorial.

Ementa
Estrutura dos contaminantes orgânicos. Organismos
patogênicos e decompositores. Micro-organismos
importantes nos processos de controle da qualidade
ambiental. Biodegradação. Processos naturais e tecnologias de
remediação. Definição de processos aplicados em tratamento
de líquidos, sólidos e gases. Reatores biológicos aeróbios e
anaeróbios. Processos avançados de biotecnologia. Reutilização
de efluentes. Fundamentos econômicos.
Universidade do Sul de Santa Catarina

Objetivos

Geral:
Analisar os processos biológicos na resolução dos problemas
ambientais a partir do conhecimento de tecnologias ligadas ao
tratamento de efluentes e águas residuárias, para preservação,
controle e recuperação do meio ambiente.

Específicos:
 Conhecer a macro e microbiologia no saneamento
ambiental, particularmente no uso de tecnologias de
reatores e sistemas de preservação e recuperação de
ecossistemas aquáticos e terrestres.

 Conhecer as tecnologias de tratamento de águas


residuárias e resíduos sólidos, através de metodologias
específicas como o Biotratamento (biorreatores) e a
Biorremediação, sob os aspectos técnicos, legislativos e
ambientais.

 Avaliar e diferenciar os principais poluentes tóxicos.

 Conhecer os destinos alternativos dos efluentes orgânicos


(biorresíduos), com ênfase aos tratamentos biológicos
(biorremediação, compostagem, biometanização ou
digestão anaeróbia).

 Relacionar as tecnologias clássicas do tratamento


de efluentes com a Biotecnologia Ambiental, sob os
seguintes aspectos: preservação, recuperação e utilização
racional dos recursos naturais.

 Avaliar os aspectos econômicos e sociais do uso das


tecnologias aplicadas nos processos biológicos.

12
Processos de Engenharia Biológica

Carga Horária
A carga horária total da disciplina é de 60 horas-aula.

Conteúdo programático/objetivos
Veja, a seguir, as unidades que compõem o livro didático desta
disciplina e os seus respectivos objetivos. Estes se referem aos
resultados que você deverá alcançar ao final de uma etapa de
estudo. Os objetivos de cada unidade definem o conjunto de
conhecimentos que você deverá possuir para o desenvolvimento
de habilidades e competências necessárias à sua formação.

Unidades de estudo: 4

Unidade 1 – Agentes biológicos envolvidos na qualidade ambiental


Nesta unidade, você estudará as características dos organismos,
em particular as células microbianas. Verá como elas interagem
com os seres humanos e com o ambiente. Conhecerá as
suas propriedades nutricionais, metabólicas e evolutivas, e,
principalmente, de que forma elas podem alterar quimicamente o
ambiente.

Unidade 2 – Micro-organismos importantes nos processos da


qualidade ambiental. Processos clássicos e biotecnológicos de
identificação destes agentes
Nesta unidade, você conhecerá os principais agentes biológicos e
grupos de micro-organismos indicadores. Também identificará
os efeitos da poluição nas comunidades microbianas e aprenderá
os princípios teóricos das técnicas de avaliação da qualidade
ambiental.

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Universidade do Sul de Santa Catarina

Unidade 3 – Processos naturais e tecnológicos de remediação


Nesta unidade, você conhecerá alguns processos biológicos, os
processos de remediação, que são aqueles que, uma vez instalado
o problema ambiental, devem ser aplicados para reverter os
impactos ambientais. Além disso, discutiremos os mecanismos
(e equipamentos) utilizados para este fim (reatores biológicos)
e veremos, finalmente, através de alguns exemplos práticos
(estudos de caso), alguns dos processos biotecnológicos utilizados
atualmente para tratar ou reduzir os impactos ambientais.

Unidade 4 – Avaliação tecnológica dos contaminantes orgânicos e


biológicos
Nesta unidade, você estudará os principais contaminantes
orgânicos, os COPs (Contaminantes Orgânicos Persistentes),
suas formulações, impactos ambientais, aspectos legais,
tecnologias e processos de remoção e recuperação destes
compostos no ambiente. Também conhecerá aspectos tanto na
área econômica (custos de produção nos setores hidrointensivos)
quanto na área de promoção, recuperação, preservação e
conservação dos recursos hídricos e dos ecossistemas urbanos.
Neste contexto, serão abordados os aspectos legais de reuso de
águas, com ênfase em unidades industriais.

Agenda de atividades/ Cronograma

 Verifique com atenção o EVA, organize-se para acessar


periodicamente a sala da disciplina. O sucesso nos seus estudos
depende da priorização do tempo para a leitura, da realização
de análises e sínteses do conteúdo e da interação com os seus
colegas e professor.

 Não perca os prazos das atividades. Registre no espaço


a seguir as datas com base no cronograma da disciplina
disponibilizado no EVA.

 Use o quadro para agendar e programar as atividades relativas


ao desenvolvimento da disciplina.

14
Processos de Engenharia Biológica

Atividades obrigatórias

Demais atividades (registro pessoal)

15
1
UNIDADE 1

Agentes biológicos envolvidos


na qualidade ambiental

Objetivos de aprendizagem
 Conhecer as principais características dos sistemas vivos.

 Compreender a importância dos micro-organismos e


relacioná-los aos ambientes naturais.
 Conhecer e distinguir os elementos da estrutura celular
e viral.

 Diferenciar organismos procariotos de organismos


eucariotos, conhecer a sua importância sistemática e
estabelecer uma relação com os outros organismos.

 Identificar os principais agentes químicos e físicos


utilizados no controle de micro-organismos.

Seções de estudo
Seção 1 Introdução: Seres vivos. Micro-organismos
e seus ambientes naturais.

Seção 2 Classificação dos micro-organismos e


morfologia microbiana.

Seção 3 Controle dos micro-organismos.


Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


Você deve estar perguntando-se: por que devo estudar Engenharia
Biológica? O que preciso saber para compreender bem o que será
estudado?

Para que possamos delimitar o campo de estudo em engenharia


biológica, devemos, em primeiro lugar, compreender os três
conceitos centrais desta disciplina: a biologia, a engenharia e a
biotecnologia. Estes conceitos, juntos, contemplam o que será
abordado nesta disciplina: a aplicação dos princípios da biologia e
da engenharia ao processamento de materiais, através de agentes
biológicos, para prover bens e assegurar serviços.

Sendo clássica ou moderna, a engenharia biológica impacta os


setores mais diversos como a produção de alimentos, bebidas,
produtos químicos, energia, produtos farmacêuticos, pesticidas,
purificação da água, tratamentos de resíduos, controle de
poluição.

Não desejo trazer apenas a ‘informação’ com a experiência dos


fatos passados ou com as soluções específicas dos fatos de hoje. É
que isto gera a falsa impressão de já existirem, em algum lugar,
soluções prontas e acabadas para os problemas que enfrentamos:
basta encontrá-los e aplicá-las. Uma grave consequência deste
pressuposto é a supressão da criatividade e o estabelecimento de
um comportamento passivo e subserviente. Tem-se a figura do
“profissional de manual”, despreparado para o enfrentamento de
situações inéditas.

Desejo trazer, sim, além da informação, a ‘formação’, pois,


somente com ela, será possível desenvolver a capacidade de
pensar. O mero adestramento em técnicas e processos assegura
a obsolescência precoce do profissional da área ambiental. Mas a
informação também é importante, para ilustração e justificação
dos conceitos fundamentais, como ferramenta do processo
formativo.

Vamos, então, à Seção 1 desta unidade!

18
Processos de Engenharia Biológica

Seção 1 – Introdução: Seres vivos. Micro-organismos e


seus ambientes naturais
Antes de iniciar o estudo da Engenharia Biológica, vamos
dar uma olhada nos conceitos de Biologia, Engenharia e
Biotecnologia.

Biologia
A biologia é o ramo da Ciência que estuda os seres vivos (do
grego βιος - bios = vida e λογος - logos = estudo, ou seja, o
estudo da vida). Debruça-se sobre o funcionamento dinâmico dos
organismos desde uma escala molecular, subcelular, até o nível
populacional e interacional, tanto intraespecificamente quanto
interespecificamente, bem como sobre a interação da vida com
seu ambiente físico-químico. O estudo destas dinâmicas ao longo
do tempo é chamado, de forma geral, de biologia evolutiva e
contempla o estudo da origem das espécies e populações e, ainda,
das unidades hereditárias mendelianas, os genes.

Engenharia
Engenharia é a aplicação criteriosa dos conhecimentos
obtidos nos campos das ciências exatas, naturais, e humanas
e sociais, através da teoria, da experimentação e da prática,
no desenvolvimento de meios para a utilização econômica de
recursos em benefício da humanidade. O ramo da engenharia
aproveita também a aplicação de conhecimentos de matemática,
química, física e economia, entre outros, à concepção,
desenvolvimento e operação de instalações ou instrumentos
que permitem a utilização de organismos vivos para a produção
biotecnológica.

Biotecnologia
É todo um conjunto de atividades tecnológicas abrangendo a
aplicação de organismos, sistemas e/ou processos biológicos a
indústrias primárias, secundárias e de serviços. Neste sentido,
a aplicação da biotecnologia é tão abrangente que pode ser feita
em áreas como a agricultura, o meio ambiente, a extração de
minérios, as indústrias alimentares, etc.

Unidade 1 19
Universidade do Sul de Santa Catarina

Seres vivos
Elementos químicos em número reduzido, sobretudo carbono,
hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, respondem pela maior parte
da composição dos seres vivos, comparecendo como elementos
fundamentais em todas as biomoléculas.

Conforme Charbel Niño El-Hani,

Os sistemas vivos em nosso planeta trazem em si os


indícios de uma origem única. Toda a vida na Terra é
baseada no DNA (Ácido Desoxirribonucleico) como
molécula informacional, com exceção apenas dos vírus
de RNA (Ácido Ribonucleico), se eles forem admitidos
como seres vivos. Além disso, há uma notável unidade
metabólica entre os seres vivos, com os processos
metabólicos cruciais sendo muito conservados ao longo
das várias linhagens evolutivas A glicólise, por exemplo,
é a via central do metabolismo (catabolismo) desde a mais
antiga das bactérias até o ser humano. (Disponível em:
<http://www.qualibio.ufba.br/001.html>. Acesso em: 23
jun. 2010).

De onde surgiram as primeiras células? De algum modo, a primeira


célula originou-se a partir de uma estrutura de natureza acelular.
Embora a evolução da primeira célula, há 3,8 bilhões de anos,
constitua um evento improvável, uma série de eventos prováveis
aconteceu a partir do seu surgimento. Estes eventos incluíram
crescimento e divisão celular, que originaram populações
celulares e, consequentemente, uma seleção evolutiva.

A célula corresponde à unidade fundamental do ser vivo. Uma


única célula corresponde a uma entidade, separada das outras
células por uma membrana (e, algumas vezes, por uma parede
celular), a qual contém uma variedade de compostos químicos e
estruturas subcelulares em seu interior.

Uma vez que as células são compostas por quatro


macromoléculas químicas básicas – proteínas, ácidos
nucleicos (RNA e DNA), lipídeos e polissacarídeos –,
há uma hipótese que postula serem todas as células
originárias de um ancestral comum a todos os seres
vivos: o RNA.

20
Processos de Engenharia Biológica

Embora cada tipo de célula exiba estrutura e tamanho definidos,


as células são unidades dinâmicas que, constantemente, sofrem
alterações e trocam seus componentes. Mesmo quando não está
em processo de crescimento, uma célula pode estar captando
e incorporando material do meio ambiente. Simultaneamente,
está eliminando produtos de excreção em seu meio ambiente.
Desta maneira, a célula é considerada um sistema aberto, sempre
sofrendo alterações, mas, geralmente, mantendo-se a mesma.

Características dos seres vivos

Quais são as características essenciais dos seres vivos?


O que diferencia as células e os objetos inanimados?

A partir dos conhecimentos biológicos acumulados até hoje,


podem-se identificar várias características comuns à maioria dos
sistemas vivos. A seguir falaremos de cada uma delas.

Metabolismo

Figura 1.1 – Metabolismo celular.


Fonte: Elaboração do autor, 2010.

Os micro-organismos captam compostos químicos a partir


do meio ambiente, transformando-os no interior da célula e
eliminando os produtos de excreção no meio.

Todos os organismos celulares correspondem a estruturas que


apresentam alguma forma de metabolismo, ou seja, as células
são capazes de captar substâncias químicas do meio ambiente,

Unidade 1 21
Universidade do Sul de Santa Catarina

transformando-as, conservando parte da energia destas


moléculas em uma forma que possa ser utilizada pela célula, e,
posteriormente, excretando os produtos finais deste processo.

Reprodução

Figura 1.2 – Reprodução celular.


Fonte: BROCK, 2004, adaptação do autor.

Os compostos químicos do ambiente servem para desenvolver


novas células e manter saudáveis as pré-existentes. Os micro-
organismos quebram os nutrientes para obter energia e com eles
usam esta energia para a síntese de compostos da célula.

Todas as células exibem algum processo de reprodução, ou seja,


são capazes de realizar uma série de eventos bioquímicos que
resultam em sua própria síntese. Como resultado dos processos
metabólicos, uma célula aumenta de tamanho e se divide,
originando duas outras.

Diferenciação

Figura 1.3 – Diferenciação celular.


Fonte: BROCK, 2004, adaptação do autor.

Muitas células sofrem processo de diferenciação, pelo qual


novas substâncias ou estruturas são formadas (ou diferenciadas
de acordo com a especialidade, como células de reprodução,
dispersão ou sobrevivência). Assim, forma-se uma nova estrutura
celular (como um esporo), normalmente como parte do ciclo de
vida celular.

22
Processos de Engenharia Biológica

Comunicação

Figura 1.4 – Comunicação celular.


Fonte: BROCK, 2004, adaptação do autor.

As células respondem aos sinais químicos do ambiente e são


capazes de se comunicar, papel desempenhado por pequenas
moléculas difusíveis que trafegam entre as células. As células
se comunicam e interagem por meio de compostos químicos
(enzimas, fontes de carbono, hormônios, etc.), liberados ou
captados.

Movimentação

Figura 1.5 – Movimentação celular.


Fonte: BROCK, 2004, adaptação do autor.

Os organismos vivos são também capazes de se movimentarem


por mecanismos diversos, tais como a autopropulsão (se auto-
arremessam) ou através de organelas, como cílios, flagelos, etc.

Unidade 1 23
Universidade do Sul de Santa Catarina

Evolução

Figura 1.6 – Evolução celular.


Fonte: BROCK, 2004, adaptação do autor.

As células são capazes de evoluir. Através do processo de


evolução, as células podem alterar permanentemente suas
características genéticas e transmiti-las a seus descendentes.
(MADIGAN, Michael T.; MARTINKO, John M.; PARKER,
Jack, 2008. p. 3-11).

Micro-organismos e seus ambientes naturais


Na natureza, as células são encontradas associadas a outras
células, formando grupos denominados populações. A localização
ambiental onde a população vive é denominada habitat.

Os micro-organismos formam populações que interagem entre


si nos mais variados ambientes (aquáticos, aéreos ou terrestres).
Os organismos também interagem com os componentes físicos e
químicos do meio.

Por meio de atividades metabólicas, os micro-organismos


removem nutrientes do meio e os utilizam na biossíntese de
novas células. Além disso, excretam uma grande quantidade de
produtos finais do metabolismo no meio em que se encontram.
Assim, estão constantemente modificando o ecossistema.

Muitos compostos tóxicos podem ser degradados por micro-


organismos, dentre eles, policlorados, DDT, pesticidas. Outra

24
Processos de Engenharia Biológica

abordagem que se tem mostrado de grande valia para o homem


refere-se à introdução de genes bacterianos em outros organismos
(ditos transgênicos), tais como plantas. Assim, está em franco
desenvolvimento a obtenção de plantas transgênicas resistentes a
pesticidas ou ao ataque de insetos.

As células microbianas são muito pequenas para serem


observadas a olho nu, o conhecimento que possuímos sobre estes
seres só foi possível através do uso de microscópios. A análise do
solo ou da água, por exemplo, sempre revela a presença de micro-
organismos.

Os princípios da Biologia podem ser demonstrados através do


estudo da Microbiologia, pois os micro-organismos têm muitas
características que os tornam instrumentos ideais para a pesquisa
dos fenômenos biológicos. Algumas destas características são:

 fornecem sistemas específicos para a investigação das


reações fisiológicas, genéticas e bioquímicas, que são a
base da vida;

 podem crescer, de maneira conveniente, em tubos de


ensaio ou frascos, exigindo, assim, menos espaço e
cuidados de manutenção do que as plantas superiores e
os animais;

 crescem rapidamente e se reproduzem num ritmo


muito alto.

Algumas espécies bacterianas demonstram quase 100


gerações num período de 24 horas.

Os processos metabólicos dos micro-organismos seguem os


padrões que ocorrem nos vegetais superiores e nos animais.
As leveduras, por exemplo, utilizam a glicose, basicamente do
mesmo modo que as células dos tecidos de mamíferos, revelando
que o mesmo sistema enzimático está presente nestes organismos
tão diversos.

Os micro-organismos se encontram em praticamente todos


os lugares da natureza. São transportados por correntes de ar

Unidade 1 25
Universidade do Sul de Santa Catarina

da superfície até as camadas superiores da atmosfera. Mesmo


os micro-organismos típicos dos oceanos podem ser achados
em sedimentos no fundo do mar, em grandes profundidades,
ou a muitos quilômetros de distância, no alto de montanhas.
Eles são carregados por correntes fluviais e até mares. Se, por
exemplo, dejetos humanos contendo bactérias patogênicas forem
despejados em correntes de água, a doença pode disseminar-se
de um lugar para outro.

Os principais grupos de micro-organismos são os


protozoários, fungos, algas e bactérias. Os vírus,
apesar de não serem considerados vivos, têm
algumas características de células vivas e, por isso, são
estudados como micro-organismos.

Os micro-organismos ocorrem mais abundantemente onde


puderem encontrar alimentos, umidade e temperatura adequada
para seu crescimento e multiplicação. Uma vez que as condições
que favorecem a sobrevivência e o crescimento de muitos micro-
organismos são as mesmas sob as quais vivem as populações
humanas, é inevitável que vivamos entre grande quantidade
de micro-organismos. Eles estão no ar que respiramos, nos
alimentos que ingerimos, na superfície de nosso corpo, em nosso
trato digestivo, na boca, no nariz e em outros orifícios naturais.
Felizmente, a maioria dos micro-organismos é inócua para o
homem, pois ele possui meios de resistir à invasão daqueles que
são potencialmente patogênicos.

Ao falar de processos metabólicos, é fundamental falar em


nutrição. Os nutrientes são definidos como as substâncias
encontradas no ambiente, que participam do anabolismo (síntese
de compostos) e catabolismo (quebra de compostos) celular.
Podem ser divididos em dois grandes grupos: macronutrientes,
que são necessários em grandes quantidades, e micronutrientes,
necessários em pequenas quantidades.

Alguns nutrientes são utilizados como fonte de material para


a biossíntese das moléculas (via anabólica), enquanto outros
correspondem a fontes de energia (via catabólica), necessária
aos processos biossintéticos e de manutenção dos organismos.

26
Processos de Engenharia Biológica

Muitas vezes, diferentes nutrientes podem apresentar os dois


papéis descritos acima.

Gostaria de ressaltar que TODOS os seres vivos necessitam


de algumas moléculas essenciais mínimas, porém alguns
deles, conhecidos como “fastidiosos”, necessitam de compostos
especiais, como vitaminas (biotina, por exemplo) ou aminoácidos
(lisina, por exemplo). Veremos abaixo quais são os nutrientes
COMUNS à maioria dos seres vivos.

Principais Macronutrientes
Carbono: corresponde à base de todas as moléculas orgânicas.
Entre os procariotos, a maioria requer algum tipo de composto
orgânico como fonte de carbono, o qual pode ser de diferentes
variedades (aminoácidos, ácidos orgânicos, açúcares, bases
nitrogenadas, etc.).

Nitrogênio: corresponde ao segundo elemento mais


abundante nas células, compondo proteínas, ácidos nucleicos e
peptideoglicano. Podemos encontrar o nitrogênio sob a forma
de compostos orgânicos ou inorgânicos, sendo ambas as formas
prontamente utilizadas por um grande número de procariotos.
Assim, a partir da degradação de proteínas e ácidos nucleicos,
bem como a partir de amônia e nitrato, os organismos utilizam
o nitrogênio presente na natureza. Embora o nitrogênio esteja
em grandes concentrações na atmosfera, este não é amplamente
utilizado, exceto por aqueles organismos denominados fixadores
de N2.
Hidrogênio: elemento presente em proteínas, açúcares e demais
moléculas orgânicas.
Fósforo: encontrado em compostos orgânicos (ácidos nucleicos)
ou inorgânicos (fosfatos), sendo importante na composição de
ácidos nucleicos e fosfolipídeos. Em sua maioria, os micro-
organismos utilizam o fósforo sob a forma de compostos
inorgânicos.
Enxofre: compõe a cisteína e metionina, estando presente
também em várias vitaminas (tiamina, biotina). Na natureza,
o enxofre sofre uma série de transformações, as quais são

Unidade 1 27
Universidade do Sul de Santa Catarina

exclusivamente realizadas por micro-organismos. A principal


fonte de enxofre para os micro-organismos corresponde aos
sulfatos inorgânicos ou H2S.
Potássio: necessário a todos os micro-organismos, devido ao seu
papel ativador de várias enzimas, tais como aquelas envolvidas na
síntese proteica.
Magnésio: necessário geralmente em grandes quantidades,
uma vez que tem papel na estabilização de ribossomos,
membranas e ácidos nucleicos, sendo também importante para
o funcionamento de diferentes enzimas, especialmente aquelas
envolvidas na transferência de fosfato.
Cálcio: embora não seja essencial ao crescimento da maioria dos
micro-organismos, tem papel de estabilização da parede celular e
de termorresistência nos esporos.
Sódio: importante, especialmente para micro-organismos
marinhos e certas archaea halófilas.
Ferro: presente em um grande número de proteínas,
especialmente aquelas envolvidas na respiração.

Principais Micronutrientes
Embora necessários em pequenas quantidades, têm papel tão
importante quanto os macronutrientes. São eles:
Cobalto: necessário apenas para a formação da vitamina B12;
Zinco: tem papel estrutural em várias enzimas (DNA e RNA
polimerases) e outras proteínas de ligação ao DNA;
Molibdênio: presente em certas enzimas como a nitrato redutase
assimilativa;
Cobre: importante para enzimas respiratórias;
Manganês: ativador de muitas enzimas;
Níquel: presente em hidrogenases (uma classe de enzimas).

28
Processos de Engenharia Biológica

Impacto dos micro-organismos na vida humana


Compreender e utilizar os micro-organismos (melhorando seus
efeitos benéficos e minimizando suas atividades danosas) é uma
das tarefas da Microbiologia. Uma visão geral do impacto dos
micro-organismos na vida humana é apresentada a seguir.

Agricultura Alimentos

Preservação dos alimentos (calor,


Fixação de N2 (N2 2NH3)
frio, radiação, compostos
Ciclo de nutrientes químicos)
NH3 H2S Alimentos fermentados

NO3 S0
N2 SO42
Aditivos alimentícios

Criação de animais (glutamato monossódico, ácido


cítrico, leveduras)

Doenças Energia / Meio ambiente

Identificação de novas Bicombustíveis (CH4)


doenças (Milho fermentação
etanol)
Tratamento, cura e
prevenção Biorremediação
O
(óleo derramado CO2)

Biotecnologia
Organismos geneticamente modificados
Síntese de produtos farmacêuticos
Terapia gênica para algumas doenças

(indivíduo doente correção da lesão genética

Figura 1.7 – Os micro-organismos afetam as nossas vidas de várias maneiras, além de


desempenharem papel como agentes causadores de doenças.
Fonte: BROCK, 2004, adaptação do autor.

Unidade 1 29
Universidade do Sul de Santa Catarina

Ao longo da disciplina, o papel central dos micro-organismos nas


atividades humanas e em toda a rede da vida na terra irá tornar-
se aparente.

Na ausência de micro-organismos, as formas superiores


nunca poderiam ter surgido e se mantido, visto que a
maior parte do oxigênio que respiramos é resultante
das atividades microbianas (Cianobactérias, primeiros
micro-organismos produtores de O2).

Veremos ainda como nós, os animais e as plantas estamos


intimamente associados às atividades microbianas, tanto na
reciclagem de nutrientes-chave como na degradação da matéria
orgânica.

Assim, nenhuma outra forma de vida tem tanta importância


na sustentação e manutenção da vida na Terra como os micro-
organismos. Iniciaremos conhecendo a morfologia e classificação
destes organismos.

Seção 2 – Classificação dos micro-organismos e


morfologia microbiana.
A enorme influência dos micro-organismos na sociedade humana
é evidente. Como foi dito anteriormente, o ramo da ciência
que se preocupa com o seu estudo é a Microbiologia. Antes
de estudá-la, no entanto, vejamos um breve histórico desta
importante ciência.

30
Processos de Engenharia Biológica

Um pouco de história

Figura 1.8 – Réplica do microscópio usado por Leeuwenhoek.


Fonte: Disponível em: <http://algol.fis.uc.pt/index.html/viewtopic.php?f=
10&t=483&start=0&st=0&sk=t&sd=a>. Acesso em: out. 2010.

A descoberta dos micro-organismos está associada à invenção do


microscópio. A primeira pessoa a observá-los em detalhe foi o holandês
Antonie van Leeuwenhoek, em 1684, a partir de um microscópio
bastante simples (veja a figura 1.8).
O aperfeiçoamento dos microscópios permitiu o desenvolvimento de
novas técnicas laboratoriais e, com isso, da Microbiologia. Por séculos,
os pensadores se debatiam sobre a ideia de que materiais inanimados
poderiam dar origem a seres vivos, segundo a teoria da geração
espontânea, e a origem de doenças infecciosas.
A ideia da geração espontânea é facilmente entendida. Quando um
alimento é mantido em ambiente aberto, após certo tempo apodrecerá.
Se analisarmos este alimento no microscópio, poderemos visualizar uma
enorme quantidade de bactérias.

De onde vieram estas bactérias?

Segundo a teoria da geração espontânea, estas bactérias surgiriam


a partir de matéria inanimada, ou seja, espontaneamente. Alguns
pensadores, no entanto, se opunham a essa teoria.
Um deles foi o químico francês Louis Pasteur (1822-1895), o qual
demonstrou que o ar apresentava uma grande quantidade de células
microbianas que se assemelhavam bastante com os micro-organismos
presentes no alimento deteriorado. Com isso, Pasteur concluiu que os
organismos encontrados em material em decomposição provinham do ar.
Um contemporâneo de Pasteur, Robert Kock, demonstrou que a
existência das bactérias levava à ocorrência de doenças em seres
infectados. Coletando uma pequena quantidade de sangue de um
camundongo doente e injetando-o em outro camundongo, este ficava
também doente e morria. A análise ao microscópio evidenciava uma
grande quantidade de bactérias no sangue do animal doente. Kock é
responsável, também, por provar a origem bacteriana da tuberculose, o
que lhe rendeu o prêmio Nobel de fisiologia e medicina em 1905.
Com o avanço da microbiologia a partir do século XIX, nossa
compreensão da diversidade microbiana foi aumentando, inclusive com
o surgimento da microbiologia molecular e aplicação dos conhecimentos
nas mais variadas áreas (agrícola, industrial, médica, genética, etc.),
possibilitando verdadeiros avanços na área, até os dias de hoje. Muito há
que se descobrir ainda, e as pesquisas na área crescem a cada dia.

Unidade 1 31
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Classificação dos micro-organismos


A árvore filogenética dos seres vivos é definida a partir de
comparações entre as características genéticas. Esta árvore
consiste em três domínios: Bacteria e Archae, compostos por
células procarióticas, e Eukarya (eucariotos). Alguns exemplos são
mostrados na figura a seguir.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.9 – Árvore filogenética de organismos: Bacteria, Archaea e Eukaria.


Fonte: Disponível em: <http://www.portaleducacao.com.br/forum/forum_posts.asp?TID=637>.
Acesso em: ago. 2010.

Existe um ramo da biologia que estuda as características


hereditárias dos seres vivos, a Filogenia ou Taxonomia. Nesta
disciplina, não entraremos em detalhes sobre esta classificação,
no entanto é imperativo que você acompanhe a evolução
destes micro-organismos e consiga diferenciar os organismos
procariotos (micro-organismos desprovidos de núcleo celular
e estruturas internas revestidas por membrana) dos eucariotos
(micro-organismos que apresentam membrana nuclear).

32
Processos de Engenharia Biológica

Todas as bactérias são procariotos, apesar de serem


classificadas no domínio BACTERIA (antigamente
conhecido como Monera). Os protozoários, fungos e
algumas algas são eucariotos e pertencem ao domínio
EUKARYA.

Vejamos agora as características das células eucarióticas,


representadas pelos fungos, protozoários e algas. Ressalta-se que
fazem parte ainda deste grupo os vegetais e os animais.

Como vimos anteriormente, todas as células procarióticas são


unicelulares e, apesar de alguns representantes dos organismos
eucariotos também serem unicelulares (leveduras), estes dois tipos
de células são diferentes em outros aspectos importantes.

Nas células eucarióticas, o DNA está em um núcleo


circundado por um envoltório nuclear; já, nas células
procarióticas, o DNA está em uma região nuclear não
circundada por uma membrana.

As células internas, chamadas de organelas, também


estão circundadas por uma ou mais membranas. As células
procarióticas geralmente não possuem organelas deste tipo.
Resumindo: de uma forma geral, as células eucarióticas são
maiores e mais complexas do que as procarióticas.

Como qualquer coleção de organismos, os micro-organismos


podem ser arranjados em grupos maiores, com base em
certos aspectos. Como as várias espécies de gatos e insetos se
assemelham entre elas de alguma forma, os micro-organismos
compartilham características com outros do seu tipo.
Os principais grupos são:

2.1 Bactérias
2.2 Vírus
2.3 Fungos
2.4 Protozoários
2.5 Algas

Vejamos a seguir as suas principais características:

Unidade 1 33
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2.1 Bactérias
As bactérias (do grego bakteria, bastão) são organismos
unicelulares, procariontes (não possuem envoltório nuclear, nem
organelas membranosas). Podem ser encontradas na forma isolada
ou em colônias. Podem viver na presença de ar (aeróbias), na
ausência de ar (anaeróbias), ou ainda ser anaeróbias facultativas.

Veja um exemplo de uma bactéria na figura a seguir.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.10 – Invasão de uma bactéria em um tecido epitelial.


Fonte: Disponível em: <http://forums.tibiabr.com/showthread.php?t=271278>.
Acesso em: 22 ago 2010.

2.1.1. Classificação
Há diversas formas de classificar as bactérias. Elas podem ser
divididas de acordo com as suas exigências nutritivas, de acordo
com as condições necessárias para o seu crescimento, de acordo
com a classificação de Gram e de acordo a sua forma ou grau de
Veja nas páginas a seguir agregação.
todas as informações
referentes a esta Com base em suas exigências nutritivas. Todas as células
classificação. necessitam de energia. Esta pode ser obtida de três maneiras, a
partir de compostos químicos orgânicos (quimiorganotróficos),
de compostos químicos inorgânicos (quimiolitotróficos) ou da
energia luminosa (fototróficos).

34
Processos de Engenharia Biológica

A oxidação dos compostos


orgânicos leva à síntese
de ATP (um composto rico
em energia, que significa
Adenosina Trifosfato –
Nucleotídeo e que fornece
a energia química usada
para trabalho químico,
osmótico e mecânico, etc.).

Figura 1.11 – Formas metabólicas para obtenção de energia.


Fonte: BROCK, 2004, adaptação do autor.

Bactérias autotróficas: para estas bactérias, o CO2 é a principal


fonte de carbono. Estas bactérias podem ser:

 Quimioautotróficas ou Quimiolitotróficas: quando


utilizam compostos inorgânicos como fonte de energia.

 Fotoautotróficas ou fotolitotróficas: quando utilizam a luz


e compostos inorgânicos como fonte de energia.

Bactérias auxotróficas: são organismos que requerem fatores de


crescimento especiais (como vitaminas, aminoácidos, etc.). Ex.
Bactérias fastidiosas (Mycobacterium sp.)

Bactérias heterotróficas: utilizam compostos orgânicos como


fonte de carbono. Estas bactérias classificam-se em:

 Quimio-heterotróficas ou Quimio-organotróficas:
quando utilizam o carbono de compostos orgânicos
como fonte de energia.

Unidade 1 35
Universidade do Sul de Santa Catarina

 Foto-heterotróficas ou Foto-organotróficas: quando


utilizam a luz e os compostos orgânicos como fonte de
energia.

Assim como as bactérias variam com relação às exigências


nutritivas, também demonstram respostas diversas às condições
físicas do ambiente.

O crescimento bacteriano pode ter seu ritmo e quantidade


determinados pela temperatura, uma vez que esta influencia as
reações químicas do processo de crescimento. Cada espécie de
bactéria cresce sob temperaturas situadas em faixas características
e, sendo assim, são classificadas nos seguintes grupos:

 Bactérias psicrófilas: são capazes de crescer a 0° C ou


menos, embora seu ótimo seja entre 15° C ou 20° C

 Bactérias mesófilas: crescem melhor numa faixa de 25


a 40° C

 Bactérias termófilas: crescem melhor a temperaturas de


45 a 60° C

 Bactérias hipertermófilas: a temperatura ótima de


crescimento é superior a 80° C

Temperatura ótima de crescimento é a temperatura


de incubação que possibilita o mais rápido crescimento
durante curto período de tempo (12 a 24 horas).

As exigências atmosféricas também interferem no crescimento


bacteriano. Os gases que mais afetam o crescimento bacteriano
são o oxigênio e o dióxido de carbono. Como as bactérias
apresentam grande variedade de resposta ao oxigênio livre, elas
são divididas em:

 Bactérias aeróbias: crescem na presença de oxigênio livre;

 Bactérias anaeróbias: crescem na ausência de oxigênio


livre;

36
Processos de Engenharia Biológica

 Bactérias anaeróbias facultativas: crescem tanto na


presença como na ausência de oxigênio;

 Bactérias microaerófilas: crescem na presença de


quantidades pequenas de oxigênio livre.

Além das exigências atmosféricas, a acidez e alcalinidade (pH)


também influenciam o crescimento das bactérias. Para a maioria,
o pH ótimo de crescimento localiza-se entre 6,5 e 7,5. Embora
poucos micro-organismos possam desenvolver-se nos limites
extremos de pH, as variações mínimas e máximas, para a maior
parte das espécies, estão entre pH 4 e pH 9.

A classificação de Gram é muito usada para


identificar bactérias. É feita com base em uma técnica
de coloração desenvolvida pelo microbiologista
dinamarquês Hans Christian Gram, dividindo as
bactérias em dois grupos:

 Gram-positivas: bactérias que possuem uma


parede celular com uma única e espessa camada de
peptidoglicanos. Pelo emprego da coloração de Gram,
tingem-se na cor púrpura ou azul quando fixadas com
cristal violeta, porque retêm esse corante mesmo sendo
expostas a álcool;

 Gram-negativas: bactérias que possuem uma parede


celular mais delgada e uma segunda membrana lipídica
– distinta quimicamente da membrana plasmática – no
exterior desta parede celular. No processo de coloração,
o lipídio dessa membrana mais externa é dissolvido
pelo álcool e libera o primeiro corante: cristal violeta.
Ao término da coloração, essas células são visualizadas
com a tonalidade rosa-avermelhada do segundo corante,
safranina, que lhes confere apenas a coloração vermelha.

Unidade 1 37
Universidade do Sul de Santa Catarina

Quanto à forma, as bactérias classificam-se em:

 Coco: de forma esférica ou subesférica;

 Bacilo: em forma de bastonete (do gênero Bacillus);

 Vibrião: em forma de vírgula (do gênero Vibrio);

 Espirilo: de forma espiral/ondulada (do gênero


Spirillum);

 Espiroqueta: em forma acentuada de espiral.

Veja cada uma destas formas na imagem a seguir:

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.12 – Classificação bacteriana de acordo com a forma.


Fonte: Disponível em: <http://www.infoescola.com/biologia/reino-monera-bacterias-cianobacterias/>.
Acesso em: 15 jun. 2010.

De acordo com o grau de agregação, as bactérias dividem-se em:

 Diplococos: de forma esférica ou subesférica e agrupadas


aos pares;

 Estreptococos: formam cadeia semelhante a um “colar”;

 Estafilococos: uma forma desorganizada de


agrupamento, em cachos;

 Sarcina: de forma cúbica, com 4 ou 8 cocos


simetricamente postos;

 Diplobacilos: bacilos reunidos dois a dois;

 Estreptobacilos: bacilos alinhados em cadeia.

38
Processos de Engenharia Biológica

Veja na imagem abaixo cada um dos tipos de bactérias conforme


o seu grau de agregação.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.13 – Classificação bacteriana de acordo com o grau de agregação.

Fonte: Disponível em: <http://www.infoescola.com/biologia/reino-monera-bacterias-


cianobacterias/>. Acesso em: 15 jun. 2010.

2.1.2 Fases do crescimento bacteriano


Fase de latência (Lag)

Durante o período de tempo que se segue à inoculação do meio


de cultura, as células do micro-organismo têm normalmente que
se adaptar ao novo meio. Durante este período inicial, verifica-
se, por exemplo, a síntese de novas enzimas. Esta fase, dita de
latência, pode ter uma duração mais ou menos extensa consoante
o estado fisiológico da cultura usada como inóculo e as condições
de crescimento. Por exemplo, a presença de uma porcentagem
elevada de células não viáveis no inóculo, um meio de cultura
contendo um nutriente essencial difícil de metabolizar ou a
incubação em condições ambientais de estresse a que o organismo
não se encontra adaptado conduzem, normalmente, a fases de
latência extensas.

Unidade 1 39
Universidade do Sul de Santa Catarina

Você sabia?

Os meios de cultura são meios aquosos, adicionados de


nutrientes e, eventualmente, de ágar (polissacarídeo = éster
sulfato de galactana, retirado de algas – Gelidium), caso se deseje
a consistência sólida. Podem ser classificados em: sintéticos
complexos; líquidos e sólidos.
Cultura pura: corresponde à cultura que contém um único tipo
de organismo. Esta é importante, uma vez que permite o estudo
dos micro-organismos isoladamente. Para isso, precisamos
conhecer as necessidades nutricionais e ambientais dos micro-
organismos e as metodologias de garantirmos que estas
culturas sejam realmente “puras”. Um dos métodos é através do
“controle de micro-organismos”, especialmente pelo método de
esterilização.

Fase exponencial (Log): período em que as células são mais


saudáveis, ou seja, fase mais indicada para estudos enzimáticos
e estruturais. Após um curto período de aceleração, a taxa de
crescimento da população microbiana torna-se constante, isto
é, as células sofrem divisão e o seu número duplica após um
determinado intervalo de tempo. Durante esta fase em que todos
os nutrientes estão presentes em excesso, os micro-organismos
dividem-se e a população cresce com uma taxa específica de
crescimento máxima, a qual depende do potencial genético
do micro-organismo, da composição do meio de cultura e das
condições de crescimento (temperatura, pH, disponibilidade de
água, etc.).

Fase estacionária: fator limitante, o nutriente é esgotado levando


a que a divisão da população pare. Ocorre o acúmulo de produtos
metabólicos em níveis inibitórios. No entanto, em carência de
nutrientes, as células podem manter-se viáveis durante períodos
de tempo mais ou menos longos, à custa das reservas endógenas
que usam em processos de manutenção. Contudo, mais cedo ou
mais tarde, verifica-se um declínio da concentração de células
viáveis durante a fase de morte celular.

40
Processos de Engenharia Biológica

Fase de desaceleração e morte (declínio): durante esta fase,


ocorre um declínio da taxa específica máxima de crescimento,
em resultado da diminuição para valores limitantes do
crescimento da concentração de um ou mais nutrientes essenciais
ao metabolismo celular e/ou do aumento da concentração de
produtos do metabolismo tóxicos para as células. Durante a
fase de morte, ocorre a perda irreversível da capacidade de
divisão celular (morte celular). Tal origina um decréscimo da
concentração de células viáveis na população microbiana ao longo
do tempo.

O gráfico abaixo representa cada uma dessas fases do crescimento


bacteriano:

Gráfico 1.1 – Curva de crescimento demonstrando as fases lag (adaptação), log (logarítmica de
crescimento acelerado), estacionária (desaceleração), e declínio (morte celular).
Fonte: Elaboração do autor, 2010.

2.2 Vírus
Os vírus são estruturas que representam o limite entre as
formas vivas e as inanimadas. Eles apresentam as estruturas
mais simples, são muito menores que as bactérias (20 – 300
nanômetros; 1nm=1/1.000 μm; 1μm= 1/1000000 ), e ainda assim,
podem inserir-se no material genético da célula hospedeira e
causar grandes danos. Resfriado comum, herpes, poliomielite
e hepatite são exemplos de doenças virais, assim como a febre
aftosa em animais.

Unidade 1 41
Universidade do Sul de Santa Catarina

Os cientistas dizem que os vírus são “parasitas intracelulares


obrigatórios”. Isto quer dizer que os vírus só conseguem viver
quando estão morando dentro de uma célula.

Mas, espera aí: como é que eles podem “viver”,


se não são seres vivos? É justamente aí que fica a
maior esquisitice dos vírus. Quando estão fora das
células, eles não têm nenhuma atividade: não se
movem, não se reproduzem, não se alimentam e
nem respiram. Essa forma “catatônica” dos vírus é
chamada de vírion.

Mas, quando um vírion dá de cara com uma célula, a


coisa muda de figura. Rapidinho ele se enfia dentro da
célula e, hospedado nela, o vírion vira vírus (isso está
parecendo um trava-línguas) e começa a se comportar
como um ser vivo!

Disponível em: <http://www.canalkids.com.br/cultura/


ciencias/biologia/vocesabia/index.htm>. Acesso em:
ago. 2010.

Diferentemente das células, os vírus contêm somente um tipo de ácido


nucleico, RNA ou DNA, que é circundado por um envelope proteico
ou capa (envelopados). Devido à ausência de componentes celulares
necessários para o metabolismo ou reprodução independente, os vírus
podem multiplicar-se somente dentro de células vivas. Após invadir
uma célula vegetal, animal ou um micro-organismo, o vírus tem a
habilidade de induzir a maquinaria genética da célula hospedeira a
fazer muitas cópias suas. Apesar de sua simplicidade estrutural, os
vírus apresentam-se sob várias formas (PELCZAR, 2009). Veja nas
imagens abaixo a estrutura morfológica de um vírus e um exemplo de
infecção e multiplicação do vírus influenza em uma célula humana.

42
Processos de Engenharia Biológica

Veja aqui a referência da


imagem:
[1] Ácido nucleico:
molécula portadora do
genoma viral.
[2] Capsídeo: envoltório
proteico que envolve o
material genético dos
vírus.
[3] Nucleocapsídeo:
estrutura formada pelo
capsídeo associado ao
ácido nucleico que ele
engloba.
Figura 1.14 – Representação esquemática do vírus, demonstrando as principais estruturas
morfológicas. Fonte: Disponível em: <http://html.rincondelvago.com/virus-biologico.html>. [4] Capsômeros:
Acesso em: 13 out. 2010. subunidades proteicas
(monômeros) que,
agregadas, constituem o
capsídeo.
[5] Envelope: membrana
rica em lipídios que
envolve a partícula viral
externamente.
[6] Peplômeros (espículas):
estruturas proeminentes,
geralmente constituídas
de glicoproteínas e
lipídios, encontradas
ancoradas ao envelope,
expostas na superfície.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
Figura 1.15 – Forma de infecção e multiplicação do vírus Influenza em uma célula humana. colorida ao final do livro
Fonte: Disponível em: <http://www.qmc.ufsc.br/qmcweb/artigos/virus_container/virus.html>. didático no anexo.
Acesso em: 20 ago. 2010.

Unidade 1 43
Universidade do Sul de Santa Catarina

O nome “vírus” vem do Latim e significa "veneno".


Poucos anos antes de 1900, dois cientistas, o russo D.I.
Ivanovsky e o alemão Beijerink, descobriram que uma
doença comum às folhas do tabaco era transmitida por
um “agente de infecção”, hoje conhecido como “vírus
mosaico do tabaco”. Eles perceberam que este agente
era menor do que uma bactéria e que, se isolado, não
se reproduzia e não era visível no microscópio ótico.

Alguns anos mais tarde, o inglês F.W. Twort chegou a conclusões


parecidas estudando outro agente, capaz de infectar bactérias e,
por isso, chamado de bacteriofage (comedor de bactérias).

Vários outros cientistas encontraram relações entre moléstias


comuns aos humanos e outros seres vivos e determinados agentes,
que possuíam as características observadas por Ivanovsky e
Beijerink. Logo a comunidade científica aprendeu a fazer
culturas de viroses, em células, e a usar esta técnica para a
preparação de vacinas.
Formulações usadas
para promover a
imunidade biológica ao
Os vírus são parasitas, dependem da célula
agente, tal como a vacina
hospedeira (células que abrigam os vírus “hospedam”)
da poliomelite.
para todas as suas funções biológicas. Eles podem se
replicar somente com o auxílio da célula hospedeira.
Embora os mecanismos para isto variem de acordo
com o tipo de virose, certos princípios são similares.

Em todos os vírus, existe uma camada proteica protetora em


torno do material genético, chamada de cápside. Alguns vírus
possuem também outras proteínas, que agem como enzimas,
catalisando reações e processos necessários ao ataque do vírus às
células hospedeiras.

O que determina a forma e o tamanho de um vírus


são as quantidades e arranjos de proteínas e ácidos
nucleicos que o compõem.

Vejamos agora o passo a passo de um ciclo de infecção através de


um vírus, representado pela figura a seguir:

44
Processos de Engenharia Biológica

Figura 1.16 – Infecção do bacteriófago, um vírus que infecta bactéria.


Fonte: Disponível em:<http://moodle.unipar.br/mod/book/view.php?id=438&chapterid=549>.
Acesso em: 22 ago. 2010.

Na figura acima, o número 1 representa o primeiro passo no


ciclo de infecção. Trata-se do ‘vírus mãe’ (virion) que se liga
à superfície da célula a ser invadida. O 2 é o segundo passo,
quando o virion penetra no citoplasma ou, em alguns casos,
injeta o material genético do vírus no interior da célula, enquanto
que o cápside permanece fora da célula. O passo 3 ocorre
quando há penetração completa do vírus. Este passo é chamado
desenvelopamento: nele se libera o material genético do capsídeo
e do envelope.

Embora muitas das viroses tenham sido descobertas e


caracterizadas com base nas doenças que provocam, a maioria
não causa nenhum mal. De fato, muitas são até benéficas.
Algumas técnicas para tratamento genético, por exemplo,
envolvem o auxílio de viroses para substituir genes defeituosos
em todas as células de um organismo.

Unidade 1 45
Universidade do Sul de Santa Catarina

A classificação dos vírus ocorre de acordo com o tipo de ácido


nucleico que possuem (RNA ou DNA), as características do
sistema que os envolve e os tipos de células que infectam. De
acordo com este sistema de classificação, existem trinta grupos de
vírus aproximadamente.

Continuando a classificação dos micro-organismos, veremos,


a partir de agora, os seres eucariotos (fungos, protozoários
e algas), cuja organização celular é completamente diferente
dos anteriormente estudados (bactérias e vírus), sob diversos
aspectos, seja na forma de reprodução, alimentação, organização
intracelular, etc.

2.3 Fungos
Os fungos são os membros de um grande grupo de organismos
eucariotos que inclui micro-organismos tais como as leveduras
e bolores, bem como os mais familiares cogumelos. Os fungos
são diferentes dos vegetais, pois as suas células possuem paredes
A palavra “bolor” tem
emprego pouco nítido,
celulares que contêm quitina, ao contrário das células vegetais,
sendo usada para designar que contêm celulose. Veja abaixo um exemplo de fungo
os fungos filamentosos ou Penicillium sp.
comumente conhecidos
como “mofos”, as
ferrugens e o carvão
(doença de gramíneas).

Figura 1.17 – Bolor contaminando a laranja (a). Macromorfologia do fungo causador (Penicillium sp.)
Para melhor compreensão, e (c) estrutura do fungo ao microscópio ótico.
visualize esta figura Fonte: Elaboração do autor, 2010.
colorida ao final do livro
didático no anexo.
Juntamente com as bactérias, os fungos são os
seres encarregados da decomposição na biosfera.
Suas atividades são tão necessárias para existência
permanente do mundo quanto as dos seres produtores
de alimento.

46
Processos de Engenharia Biológica

A decomposição libera gás carbônico na atmosfera e devolve ao


solo compostos nitrogenados e outros materiais que poderão ser
novamente usados por vegetais e, eventualmente, por animais.

Estima-se que os 20 cm superiores da terra fértil


contêm cerca de 5 toneladas de fungos e bactérias
por hectare.

Os fungos constituem um grupo de micro-organismos que são


de grande interesse prático e científico para os microbiologistas.
Suas manifestações são familiares: crescimentos azuis e verdes
em laranjas, limões e queijos; as colônias cotonosas (aspecto de
algodão), brancas ou acinzentadas, no pão e no presunto; os
cogumelos dos campos e os comestíveis, entre tantos outros.

Todas as manifestações representam vários organismos


fúngicos, morfologicamente muito diversificados. De modo
geral, os fungos incluem os bolores e as leveduras. As leveduras
se diferenciam dos bolores por se apresentarem sob a forma
unicelular.

Os fungos podem viver como saprófagos, quando obtêm


seus alimentos decompondo organismos mortos; como
parasitas, quando se alimentam de substâncias que retiram
dos organismos vivos nos quais se instalam, prejudicando-os;
ou podem estabelecer associações mutualísticas com outros
organismos, em que ambos se beneficiam. Em todos os casos,
os fungos liberam enzimas digestivas para fora de seus corpos.
Estas enzimas atuam diretamente no meio orgânico no qual
eles se instalam, degradando moléculas simples, que são, então,
absorvidas pelos fungos.

Os fungos saprófagos são responsáveis por grande


parte da degradação da matéria orgânica, propiciando
a reciclagem de nutrientes.

Os fungos são importantes nas fermentações industriais, tais


como na fabricação da cerveja, do vinho e na produção de
antibióticos (penicilina), de vitaminas e ácidos orgânicos (ácido

Unidade 1 47
Universidade do Sul de Santa Catarina

cítrico). A fabricação de pães e o amadurecimento de queijos


também dependem da atividade saprofítica dos fungos.

Como parasitas, os fungos causam doenças vegetais, humanas


e animais, embora a maior parte das micoses seja menos severa
que as bacterioses ou as viroses. A ciência que estuda os fungos
recebe o nome de Micologia.

2.3.1 Características primárias dos fungos

Os fungos são micro-organismos eucarióticos


quimiorganotróficos. Reproduzem-se, naturalmente,
por meio de esporos, com poucas exceções.
Além disso, a maioria das partes de um fungo é
potencialmente capaz de crescimento. Um minúsculo
fragmento é suficiente para originar um novo
indivíduo.

Os fungos não têm clorofila, são filamentosos em geral e


comumente ramificados. Os filamentos apresentam paredes
celulares constituídas por quitina ou celulose, ou ambas.
Geralmente são imóveis, embora possam demonstrar células
vegetativas móveis.

A grande maioria das classes de fungos produz esporos de dois


modos. Veja como, na sequência.

Sexuadamente: os esporos produzidos sexuadamente têm


núcleos derivados das células parentais, e estas, como os esporos,
são, geralmente, haploides. Dois núcleos de células parentais se
fundem para formar um núcleo diploide zigótico, do qual, por
divisão celular redutora (meiose zigótica), originam-se os núcleos
dos esporos haploides. Os esporos sexuados, e as estruturas que
os contêm, são usualmente distinguíveis, sob o ponto de vista
morfológico, dos esporos assexuados.

Assexuadamente: os esporos assexuados são formados por


simples diferenciação do talo em desenvolvimento (o talo é
o corpo do fungo individual completo, incluindo as porções
vegetativas ou não sexuadas e todas as estruturas especializadas).

48
Processos de Engenharia Biológica

Os esporos são muito importantes na classificação dos fungos,


sendo as classes diferenciadas pelas características morfológicas
dos estágios sexuados e dos esporos.

2.3.2 Morfologia dos fungos


Conforme a sua morfologia, os fungos podem ser divididos em
unicelulares (leveduras) ou pluricelulares (fungos filamentosos).

Fungos unicelulares (leveduras): as leveduras são fungos que


se apresentam, predominantemente, sob a forma unicelular.
Uma levedura típica consta de células ovais, que se multiplicam
assexuadamente, geralmente por brotamento ou gemulação. Veja
na imagem a seguir uma representação da célula leveduriforme.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.18 – Representação esquemática de uma célula leveduriforme.


Fonte: Elaboração do autor, 2010.

Fungos pluricelulares: o talo (ou corpo) de um fungo é


tipicamente composto por filamentos tubulares microscópicos,
chamados hifas. O conjunto de hifas tem o nome de micélio. A
parede das hifas é semirrígida, e os fungos podem apresentar três
tipos morfológicos de hifas:

a) os micélios podem formar uma rede frouxa ou um tecido


compacto, como nos cogumelos;

b) os micélios podem ser vegetativos, sendo estes


responsáveis pela produção de esporos;

c) as hifas deste tipo de micélio podem penetrar no meio,


em busca de nutrientes;

Unidade 1 49
Universidade do Sul de Santa Catarina

d) os micélios podem ser de reprodução, sendo responsáveis


pela produção de esporos. As hifas dos micélios de
reprodução são, em geral, aéreas.

Veja na figura abaixo uma representação esquemática de um


fungo filamentoso:

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.19 – Principais estruturas morfológicas de um fungo filamentoso.


Fonte: Disponível em: <http://www.cientic.com/tema_fungo_img2.html>. Acesso em: 20 jul. 2010.

2.3.3 Nutrição dos fungos


Fungos crescem melhor em habitats úmidos e escuros, porém
são encontrados universalmente onde quer que exista matéria
orgânica disponível. Eles necessitam de umidade para crescer e
podem obter água da atmosfera, bem como do meio sobre o qual
vivem.

Quando o ambiente torna-se muito seco, os fungos sobrevivem


entrando num estado de repouso ou produzindo esporos, que
são resistentes à aridez. Embora o pH ótimo para a maioria das
espécies seja ± 5,6, alguns fungos podem tolerar ambientes onde
o pH varia de 2 a 9 e crescer neles.

50
Processos de Engenharia Biológica

Muitos fungos são menos sensíveis a altas pressões osmóticas que


as bactérias, e podem crescer em soluções de sais concentradas ou
soluções de açúcares, as quais inibem ou previnem o crescimento
bacteriano. Os fungos também crescem num amplo intervalo de
temperatura (0º C a 62º C, estando a temperatura ótima entre
22º C e 30º C).

2.4 Protozoários

2.4.1 Morfologia e Nutrição


Os protozoários são organismos também eucariotos, na maioria
das vezes, unicelulares. Ingerem partículas alimentares, não
apresentam parede celular rígida e não contêm clorofila.

Os protozoários são organismos quimiorganotróficos


(heterotróficos). A maioria dos protozoários são de vida livre e Veja mais detalhes na
aquática, podendo ser encontrados na água doce, salobra ou água Figura 1.11 – Formas
salgada. Levam vida livre também em lugares úmidos rastejando metabólicas para obtenção
pelo solo ou sobre matéria orgânica em decomposição. No de energia.
entanto algumas espécies levam vida parasitária nos organismos
de diversos hospedeiros e, assim, passam a maior parte da vida
parasitando diversas espécies de seres vivos e, dessa forma, lhes
causando muitas doenças.

Quanto a sua morfologia, os protozoários apresentam grandes


variações, conforme sua fase evolutiva e meio a que estejam
adaptados. Podem ser esféricos, ovais ou mesmo alongados.
Alguns são revestidos de cílios, outros possuem flagelos, e
existem ainda os que não possuem nenhuma organela locomotora
especializada (Figura 1.19).

Dependendo da sua atividade fisiológica, algumas espécies


possuem fases bem definidas. Assim, temos:

Trofozoíto: é a forma ativa do protozoário, na qual ele se


alimenta e se reproduz, por diferentes processos.

Unidade 1 51
Universidade do Sul de Santa Catarina

Cisto: é a forma de resistência ou inativa. O protozoário


secreta uma parede resistente (parede cística) que o protegerá
quando estiver em meio impróprio ou em fase de latência.
Frequentemente, há divisão nuclear interna durante a formação
do cisto.

Gameta: é a forma sexuada, que aparece em algumas espécies.


O gameta masculino é o microgameta, e o feminino é o
macrogameta.

Os protozoários parasitas são de particular interesse nas ciências


da saúde. Muitos vivem em ambientes aquáticos e formam cistos
(estrutura de resistência e latência dos protozoários) quando as
condições ambientais não são favoráveis.

São exemplos de protozoários: Trypanosoma (doença


do sono), Leishmania (lesões cutâneas), Giardia
(causam diarreia) Trichomonas (inflamações vaginais),
Entamoeba (disenterias amebianas), Cryptosporidium
spp. Plasmodium (malária).

2.4.2 Classificação
A classificação dos protozoários se baseia em sua reprodução,
alimentação (ou nutrição) e, especialmente, em sua locomoção.
Há quatro classes bem definidas:

1. mastigóforos ou flagelados;

2. sarcodinos ou rizópodes;

3. esporozoários;

4. ciliados ou cilióforos.

A locomoção desses micro-organismos no meio aquático é feita


através do batimento de cílios (nos ciliados) ou batimento de
flagelos (nos flagelados), que são estruturas mais adaptadas para
a natação.

52
Processos de Engenharia Biológica

Os rizópodos são protozoários, rastejam com movimento


ameboide. Neste tipo de locomoção, os micro-organismos vão
mudando a forma do seu corpo pela emissão de pseudópodes.
Pseudópodes, do
Outros protozoários não possuem organelas locomotoras grego”pseudo”: em
(esporozoários) e se disseminam pelo ambiente através da português quer dizer
produção de muitos esporos, os quais são levados pela água, pelo falso ou falsos; e do
ar ou através de animais vetores (moscas, mosquitos, carrapatos, grego “podo”: que, em
etc.) que se contaminam com esses protozoários patogênicos, português, significa pé
ou pés. Literalmente
ficam doentes e transmitem essas doenças para outros animais. “pseudópodos” significam
“falsos pés”.
No que diz respeito à reprodução dos protozoários, geralmente é
assexual, acontecendo por divisão múltipla. O micro-organismo
se divide em cópias dele mesmo, alguns deles produzem esporos
para se disseminar pelo ambiente. Porém há, também, em alguns
casos, a reprodução sexual, ocorrendo nítida troca de material
genético entre um micro-organismo e outro.

Quanto ao tipo de alimentação, os protozoários podem ser:

 holofíticos ou autotróficos: são os que, a partir de grãos


ou pigmentos citoplasmáticos (cromatóforos), conseguem
sintetizar energia a partir da luz solar (fotossíntese);

 holozoicos ou heterotróficos: ingerem partículas


orgânicas, digerem-nas (enzimas) e, posteriormente,
expulsam os metabólitos. Essa ingestão se dá por
fagocitose (ingestão de partículas sólidas) ou pinocitose
(ingestão de partículas líquidas);

 saprozoicos: “absorvem” substâncias inorgânicas, já


decompostas e dissolvidas em meio líquido;

 mixotróficos: quando são capazes de se alimentarem por


mais de um dos métodos acima descritos.

2.4.3 Ecologia
Os protozoários servem como indicadores da qualidade
do ambiente. Por exemplo, em águas poluídas por resíduos
industriais normalmente não aparecem muitos protozoários,

Unidade 1 53
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enquanto que, em águas e solos onde existe matéria orgânica


em decomposição, eles aparecem em abundância, fazendo a
decomposição de fezes e qualquer matéria orgânica morta,
colaborando assim, com a limpeza do meio ambiente.
A presença de muitos protozoários indica que aquele ambiente
está ecologicamente saudável.

A figura abaixo mostra a diversidade estrutural e morfológica


de alguns protozoários. Na próxima unidade, retornaremos a
estes micro-organismos, falando sobre a sua importância como
indicadores biológicos.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.20 – Alguns tipos de Protozoários encontrados em água salgada e água doce.
Fonte: Disponível em: <http://www.tratamentodeagua.com.br/r10/Biblioteca_Detalhe.
aspx?codigo=96&topico=654>. Acesso em: 28 ago. 2010.

Estudos mais aprofundados sobre os protozoários serão vistos


na Unidade 2 (Seção 1 – Micro-organismos indicadores e
emergentes).

54
Processos de Engenharia Biológica

2.5 Algas
As algas compreendem vários grupos de seres vivos aquáticos
e autotróficos, ou seja, que produzem a energia necessária ao
seu metabolismo através da fotossíntese. São consideradas
semelhantes às plantas, porque contêm o pigmento verde clorofila
que participa do processo de fotossíntese e apresentam uma
parede celular rígida.

Estes eucariotos podem ser unicelulares (constituídos por uma


célula e microscópicos em tamanho) ou pluricelulares (várias
células e, quanto à visibilidade microscópica ou macroscópica,
podem atingir até vários metros de comprimento). Esses
organismos crescem em muitos ambientes diferentes, sendo, em
sua maioria, aquáticos, e constituem-se em fonte de alimentos
para animais.

As algas causam problemas por obstruir caixas d’água, liberar


substâncias químicas tóxicas nos leitos de água, ou crescer em
piscinas. Algumas ainda possuem valor nobre, são utilizadas em
preparos alimentícios com função espessante e emulsificante, por
exemplo, em sorvetes e pudins; outras ainda são utilizadas em
drogas, em tratamento de úlceras.

2.5.1 Classificação:
As algas classificam-se em procariontes e eucariontes.

Algas Procariontes (do Reino Monera ou Bactéria)

As mais importantes são as “algas azuis” ou cianofíceas,


modernamente classificadas como Cianobactéria, uma divisão
dentro do domínio Eubactéria ou “verdadeiras” bactérias (ou
reino Monera). Foram dos primeiros seres vivos a aparecer
na Terra, com o mais antigo fóssil datado em 3.800 milhões
de anos (Pré-Câmbrico). Acredita-se que tiveram um papel
preponderante na formação do oxigênio da atmosfera.

Unidade 1 55
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Para melhor compreensão,


visualize estas figuras
coloridas ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.21 – Células unicelulares de cianobactérias (ou algas azuis).


Fonte: Disponível em: <http://preservemais.spaces.live.com/?_c11_BlogPart_pagedir=Next&_
c11_BlogPart_handle=cns!CBEAD7CFB4866C0F!560&_c11_BlogPart_BlogPart=blogview&_
c=BlogPart>. Acesso em: ago. 2010.

Figura 1.22 – Intensa poluição do Tejo, vinda de Espanha.


Fonte: Disponível em: <http://gentedelisboa.blogspot.com/2009/05/alerta-de-poluicao-
eutrofizacao-no-tejo.html>. Acesso em: ago. 2010.

Na figura acima, temos um exemplo de poluição que provoca


a eutrofização da água e a multiplicação descontrolada de
algas verdes e de cianobactérias (algas azuis). Este fenômeno
produz efeitos nocivos: a transparência da água diminui, o
que, por sua vez, causa uma diminuição na penetração da luz
e na concentração de oxigênio, levando ao desaparecimento de
espécies aquáticas.

Algas Eucariontes (Reino Protista)

Todos os restantes grupos de algas são eucarióticos (com uma


verdadeira membrana nuclear) e realizam a fotossíntese usando
organelas chamadas cloroplastos – pensa-se que evoluíram a
partir de uma alga mais “primitiva” que era endossimbionte
Endossimbionte: que (possuía cloroplasto e mitocôndria).
possui cloroplasto e
mitocôndria Diversas características são utilizadas para a classificação deste
grupo de algas, incluindo a natureza da(s) clorofila(s) presente(s),
os polímeros de reserva de carbono (amido, por exemplo), a
estrutura da parede celular e tipo de motilidade (forma de
locomoção). Aqui abordaremos os aspectos de importância
ambiental (capacidade de formar toxinas).

56
Processos de Engenharia Biológica

 Dinoflagelados não tóxicos: são algas flageladas,


principalmente marinhas; algumas são de vida livre,
enquanto outras vivem simbioticamente com animais
que formam recifes de coral.

 Dinoflagelados tóxicos: especialmente os gêneros


Gonyaulax e Pfiesteria. O primeiro (Gonyaulax) exibe
coloração vermelha devido à presença de pigmentos
acessórios, as xantofilas. Estes florescimentos
correspondem às clássicas “marés vermelhas”, formadas
em águas mornas, costeiras e em orlas poluídas. Estas
algas estão frequentemente associadas à mortandade
de peixes e ao envenenamento, devido ao consumo de
água ou envenenamento de mariscos contaminados.
A toxicidade é decorrente de uma potente neurotoxina
produzida por esta espécie. O segundo gênero
(Pfiesteria) infecta peixes e raramente pode causar danos
aos seres humanos em contato com esta espécie, mas
pode provocar problemas respiratórios, cefaleias, dores
articulares, desorientação e perda de memória.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 1.23 – O fenômeno causado pela proliferação de algas dinoflageladas.


Fonte: Disponível em: <http://www.mundoeducacao.com.br/biologia/mare-vermelha.htm>.
Acesso em: 22 ago. 2010.

De acordo com Tundisi e Matsumura-Tundisi (1992), o


crescimento da agroindústria em algumas regiões do Brasil tem
sido bastante acelerado nos últimos 20 anos. A grande biomassa
de cultivos monoespecíficos e a necessidade de intensificar o
crescimento vegetal pelo uso extenso de fertilizantes têm causado
uma rápida eutrofização de rios e reservatórios, resultando num
crescimento elevado de macrófitas aquáticas e altas concentrações
de fósforo na coluna d’água ou no sedimento.

Unidade 1 57
Universidade do Sul de Santa Catarina

A taxa de urbanização tem também crescido rapidamente, com


Veja mais informações o consequente aumento de descarga de esgotos sem nenhum
em: Cianobactérias tratamento prévio. Esses dois processos em larga escala são hoje
tóxicas na água para as principais causas da eutrofização de rios, lagos e reservatórios,
consumo humano na
em muitas regiões brasileiras.
saúde pública e processos
de remoção em água
para consumo humano. O conhecimento que você adquiriu até agora permite entender
Brasília. Ministério da que a maneira de conhecer as propriedades de um organismo
Saúde. Fundação Nacional ocorre, na grande maioria das vezes, com a recriação das
de Saúde. 2003. 56 p. características nutricionais, de crescimento, forma, habitat, etc.,
Disponível em: <http://
em laboratório; ou o chamado in vitro, que, na maioria dos casos,
www.cvs.saude.sp.gov.br/
pdf/cianobacterias.pdf>. é através de meios de cultura.
Acesso em: 22 ago. 2010.
Em resumo, a partir do conhecimento dos requerimentos
nutricionais, podem ser confeccionados meios que permitam o
crescimento microbiano de uma única espécie (cultura pura) in
vitro; e, aí sim, conhecer as características já estudadas nesta
seção, embora estime-se que somente 1 a 9% das células viáveis
de micro-organismos presentes no solo são capazes de formar
colônias em meios de cultura laboratoriais. Os outros 91 a 99%
da flora bacteriana do solo correspondem principalmente a células
viáveis (capazes de se reproduzir), mas não cultiváveis.

Seção 3 – Controle dos micro-organismos


A capacidade de controlar eficazmente as populações microbianas
é o que define a condição sanitária de uma dada população
humana. Os processos podem ser muito específicos, como o
fornecimento de medicação eficaz na eliminação dos micro-
organismos infectantes; ou podem ser mais gerais, como as
práticas sanitárias utilizadas no lar e nos hospitais.

Cuidados diários, como a purificação da água, a


pasteurização do leite e a preservação dos alimentos
são muito importantes para o controle das populações
microbianas, trazendo grandes benefícios para a
população.

58
Processos de Engenharia Biológica

Os principais motivos para se desenvolver o controle de micro-


organismos são basicamente:

1. prevenir a transmissão de doenças e infecções;

2. prevenir a contaminação ou crescimento de micro-


organismos nocivos;

3. prevenir a deterioração e dano de materiais por micro-


organismos.

Os micro-organismos podem ser removidos, inibidos ou


mortos por agentes físicos ou químicos. Uma grande variedade
de técnicas e de agentes pode ser utilizada, agindo de modos
diferentes e tendo seu próprio limite de aplicação prática.

Os termos a seguir são usados para descrever os processos


físicos e os agentes químicos destinados ao controle dos micro-
organismos:

esterilização: processo de destruição ou remoção de todas as


formas de vida microscópica de um objeto ou espécime. Um
objeto estéril, no sentido microbiológico, está completamente
livre de micro-organismos vivos. Este termo refere-se à ausência
total ou à destruição de todos os micro-organismos;

desinfetante: é um agente, normalmente químico, que mata


as formas vegetativas, mas não necessariamente, as formas
esporuladas, de micro-organismos patogênicos. O termo
normalmente refere-se às substâncias utilizadas em objetos
inanimados;

bactericida: é um agente que mata as bactérias. De modo


similar, os termos fungicida, viricida e esporocida se referem aos
agentes que matam os fungos, vírus e esporos, respectivamente.
As formas esporuladas não são necessariamente eliminadas por
estes agentes.

Unidade 1 59
Universidade do Sul de Santa Catarina

Controle pelos agentes físicos


Da mesma forma que no crescimento, a morte microbiana é um
evento que ocorre de forma exponencial. Assim, após uma rápida
redução do número, a taxa de morte pode tornar-se mais lenta,
devido à sobrevivência de células mais resistentes.

As condições que afetam a atividade de um agente


antimicrobiano, especialmente se tal agente é de natureza
química, são seis. Observe os detalhamentos respectivos.

1. Tamanho da população: quanto maior a população,


maior o tempo necessário à sua eliminação.

2. Natureza da população: se, nesta população de micro-


organismos, existirem endosporos (esporos dentro da
célula), os quais são muito mais resistentes que formas
vegetativas, sua eliminação não ocorrerá tão facilmente.
No caso de células em diferentes estágios de crescimento
– células mais jovens (fase log) tendem a ser mais
suscetíveis que células em fase estacionária. Havendo
a presença de membros do gênero Mycobacterium, sua
eliminação é mais difícil do que de outras bactérias não
esporuladas, etc.

3. Concentração do agente: geralmente, quanto mais


concentrado, melhor (exceto álcool). A relação entre a
concentração e a eficiência, via de regra, não é linear.

4. Tempo de exposição: de acordo com normas da OMS, o


tempo mínimo de exposição deve ser de 30 minutos. Em
caso de agentes esterilizantes, a exposição deve ser tal
que a chance de haver sobreviventes é de 1 em 106.

5. Temperatura: dentro de limites, o aumento da


temperatura torna o processo mais eficiente. Para agentes
químicos, geralmente o aumento de 10 C da temperatura
aumenta em 10 vezes a eficiência do processo, o que
também permite a diluição do agente.

6. Condições “ambientais”: pH do meio – quando é ácido,


favorece a eliminação térmica; presença de matéria
orgânica – dificulta a ação do produto (necessidade

60
Processos de Engenharia Biológica

de lavagens dos materiais antes do controle por agentes


químicos), seja por proteger o micro-organismo ou
competir pelo produto em uso. Altas concentrações de
açúcar, proteínas ou lipídeos, por exemplo, diminuem a
penetrabilidade do calor, enquanto o sal pode aumentar
ou diminuir a resistência ao calor. A consistência do
material ou solução também interfere.

Há vários métodos de controle de micro-organismos através


de agentes físicos, entre eles destacam-se a aplicação de altas
temperaturas e a incineração.

a. Calor: aplicação das altas temperaturas. Os processos práticos,


nos quais se emprega o calor, dividem-se em duas categorias,
calor úmido e calor seco.

O calor úmido é vapor d’água sob pressão. É o agente mais


prático e seguro para fins de esterilização, proporcionando
temperaturas mais elevadas que as obtidas por ebulição. O
aparelho que usa o vapor de água sob pressão regulada chama-
se autoclave. Consiste em uma câmara de vapor com parede
dupla, equipada com dispositivos que permitem o enchimento da
câmara com vapor.

Esterilização fracionada, água em ebulição e pasteurização são


outros processos de calor úmido, empregados no controle de Pasteurização: é o processo
micro-organismos. usado em alimentos
para destruir micro-
organismos patogênicos
ali existentes. Foi criado
em 1864, levando o nome
do químico francês que o
criou: Louis Pasteur

Figura 1.24 – Autoclave vertical.


Fonte: Disponível em: <http://catalogohospitalar.com.br/autoclave-vertical-linha-av-100.html>.
Acesso em: ago. 2010.

Unidade 1 61
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Indicadores biológicos são suspensões-padrão de esporos


bacterianos submetidos a esterilização juntamente com os
materiais a serem processados em autoclave, estufas e câmera
de radiação. Terminado o ciclo, são colocados em meio de
cultura adequada para o crescimento de esporos. Se não houver
crescimento, isto significa que o processo está validado.

Já o calor seco é a esterilização pelo ar quente. É recomendada


quando o contato direto ou completo do vapor d’água sob
pressão com o material a ser esterilizado é considerado como
indesejável ou improvável, o que é verdadeiro para certos tipos de
vidraria laboratorial (placas de Petri, tubos de ensaio), óleos, pó e
substâncias similares.

A incineração é usada para a eliminação de carcaças infectadas


de animais de laboratório ou de outros materiais contaminados.
A destruição de micro-organismos pelo calor direto é, também,
praticada rotineiramente, quando a agulha de inoculação (ou alça
de platina) é levada à chama de um bico de Bunsen.

b. Filtração: processo muito útil na esterilização de materiais


termolábeis, sendo empregado para líquidos e gases. Estes filtros
são geralmente compostos por celulose, acetato, policarbonato,
teflon, ou outro material sintético. Embora o diâmetro dos
poros possa variar, os mais utilizados são aqueles de 0,2 μm, que
removem os micro-organismos (exceto vírus) das soluções e do ar.

Dentre os principais tipos de filtros, podemos citar:

Filtros de profundidade: correspondem aos filtros mais antigos,


constituídos de malha fibrosa ou granular, à base de papel,
asbestos ou fibra de vidro, arranjados de forma a criar uma série
de camadas aleatórias sobrepostas, formando pequenos canais
sinuosos. Assim, os micro-organismos ficam retidos nas malhas
e/ou adsorvidos à superfície do material.

Estes filtros são feitos também de terra de diatomáceas


(Berkefield) ou porcelana (Chamberlain). Na prática, são usados
como pré-filtros, para a remoção de partículas e também usados
na filtração de ar.

62
Processos de Engenharia Biológica

Membranas Filtrantes: correspondem ao tipo mais comum de


filtro esterilizante, em microbiologia. São membranas porosas
de acetato de celulose, nitrocelulose ou policarbonato, tendo
espessura de ≈ 0,2 mm, contendo poros que varianm de ≈ 0,1 a
0,5 de diâmetro, que ocupam cerca de 80 a 85% da membrana.

Filtros Isopore® (nucleopore): são filmes extremamente delgados


de policarbonato (10 μm de espessura) tratados com radiação
nuclear seguida de cauterização (marcação) química. A radiação
provoca danos localizados na membrana, e o tratamento químico
aumenta essas falhas, formando orifícios cujo tamanho pode ser
controlado pela força da solução cauterizadora e pelo tempo de
tratamento.

Estes filtros funcionam como verdadeiras peneiras, removendo


todas as partículas maiores que os orifícios. Têm, entretanto,
baixa porosidade, sendo muito usados na preparação de amostras
para a microscopia de varredura, onde os organismos são retidos
no filtro, sendo mantidos em um plano uniforme, no topo do
filtro. Veja a figura abaixo.

Figura 1.25 – Exemplo de membrana filtrante.


Fonte: Disponível em: < http://www.microclar.com/Brasil/membranas.php>. Acesso em: jul. 2010.

O ar também pode ser filtrado em fluxos laminares que contêm


filtros HEPA (High Efficiency Particulate Air filters), os quais
removem 99,97% de partículas de 0,3 μm.

Unidade 1 63
Universidade do Sul de Santa Catarina

c. Radiações: classificam-se em ionizante e não ionizante.

Radiação não ionizante: é a radiação ultravioleta (de 4 a 400 nm


– sendo 260 nm o comprimento mais eficiente). É bastante letal,
mas exibe baixa penetrabilidade, não atravessando vidros, filmes
sujos e outros materiais. Assim, a radiação UV é extremamente
eficiente na eliminação de micro-organismos presentes em
superfícies.

Como sua maior eficiência dá-se a 260 nm (namômetros), que


correspondem ao comprimento de onda onde se dá a maior
absorção pelo DNA, a radiação UV afeta primariamente este tipo
de molécula (DNA). Por outro lado, não podem ser descartados
outros efeitos deletérios do UV, uma vez que, quando está a
340 nm, observa-se dano celular, sem estar primariamente
relacionado às mutações, uma vez que, neste comprimento de
onda, os ácidos nucleicos não têm mais uma grande capacidade
de absorver este tipo de radiação.

Radiação ionizante: radiações de pequeno comprimento de


onda, portanto, de altíssima energia e penetrabilidade. Os dois
principais tipos são a radiação gama e os Raios X.

Estas radiações são bastante eficientes, uma vez que promovem


a ionização de átomos, fazendo-os perderem elétrons. Como
consequência, são gerados radicais livres extremamente reativos,
os quais podem destruir pontes de hidrogênio, duplas ligações e
estruturas em anel. Quando na presença de oxigênio, este tipo de
radiação gera radicais hidroxila livres, absolutamente tóxicos para
as células.

d. Baixas temperaturas: a refrigeração ou o congelamento são


amplamente utilizados no controle microbiano de alimentos e
produtos biológicos, pois levam a uma diminuição ou interrupção
do metabolismo. Como, na maioria dos casos, os micro-
organismos patogênicos ao homem são mesólicos, estas baixas
temperaturas são eficientes no controle. Entretanto deve-se ter
cuidado, porque células de Clostridium botulinum (agente causador
do botulismo), quando incubadas a 50 C, são ainda capazes de
produzir e secretar a toxina do tipo “E”.

64
Processos de Engenharia Biológica

e. Dessecação: liofilização ou dessecamento natural (retirada


total de “água livre”), que atua diferentemente nos organismos,
dependendo do tipo de meio, do material dessecado e da
intensidade do processo. Via de regra, os cocos Gram-negativos
são mais sensíveis que os Gram-positivos, sendo M. tuberculosis
um dos exemplos clássicos de organismo resistente à dessecação
(várias semanas em secreção humana).

Controle pelos agentes químicos


Durante muito tempo os agentes químicos foram mais
empregados em processos de desinfecção e antissepsia,
entretanto, atualmente, estes vêm sendo cada vez mais utilizados
em processos de esterilização.

Os cuidados prévios no uso de agentes químicos são a lavagem


adequada do material e a garantia de pleno contato com o agente.

Características de um agente químico ideal:


boa atividade antimicrobiana, toxicidade seletiva,
solubilidade, estabilidade, inocuidade, não interação
com a matéria orgânica, temperatura de ação
adequada, alto poder de penetração, sem poder
corrosivo ou tintorial, desprovido de ação danosa ao
meio ambiente.

Principais Tipos de Agentes Químicos


a. Compostos orgânicos:

Fenóis e derivados (cresóis (metil-fenol), xilenóis): primeiros


a serem usados (Lister, 1867 – salas de cirurgia). O fenol
não é mais usado como desinfetante ou antisséptico devido
à sua toxicidade para os tecidos. Os derivados fenólicos
(hexaclorofeno, hexilresorcinol) são empregados principalmente
como antissépticos ou desinfetantes hospitalares. Estes atuam
desnaturando proteínas e rompendo membranas.

Unidade 1 65
Universidade do Sul de Santa Catarina

Hexaclorofeno: associação de fenol a halogênio (Cl), é bastante


eficaz, sendo bastante usado em pastas dentifrícias e sabões. No
passado, pesquisas indicaram que tal composto era cumulativo e
carcinogênico.

Álcoois: muito usados, efetivos, confiáveis e baratos, atuando


como bactericidas, fungicidas e contra vírus envelopados. Os
mais usados são o etanol e isopropanol, nas concentrações entre
70 e 80%. Atuam desnaturando proteínas e dissolvendo lipídeos
de membrana.

Compostos Quaternários de Amônio: são detergentes catiônicos,


moléculas orgânicas derivadas de gorduras, atuando como
umectantes e emulsificadores. Apenas os detergentes catiônicos
são detergentes efetivos, que desnaturam proteínas (Exemplo:
cloreto de benzalcônio, que mata a maioria das bactérias).

b. Halogênios:

Iodo: anti-séptico para a pele a 2%, ou em solução água-etanol


de iodeto de potássio, para procedimentos pré-operatórios. Eficaz
contra bactérias, fungos, vírus e protozoários parasitas. Atua
oxidando componentes celulares e iodinando proteínas. Em
concentrações elevadas elimina esporos. Tem como desvantagens:
danos à pele, mancha e é alergênico.

Iodóforos: Complexaçao de iodo a carreador orgânico (agentes


tensioativos, como a PVP - povidine). Sao solúveis em
água, estáveis, sem propriedades tintoriais, liberando o iodo
lentamente, minimizando a irritação cutânea. Usado na assepsia
pré-operatória e também como desinfetante.

Cloro: Muito utilizado no tratamento de águas e nas indústrias


de laticínios e alimentos. Pode ser aplicado na forma de gás,
hipoclorito de sódio ou de cálcio, que gera ácido hipocloroso
e então O2, promovendo a oxidação de materiais celulares e
causando a morte em cerca de 30 minutos. Eficaz contra fungos,
bactérias e vírus, com a desvantagem ser descorar alguns
materiais.

66
Processos de Engenharia Biológica

É eficiente, barato, de fácil uso, mas altamente reativo


com a matéria orgânica. Como desvantagem, o uso do
cloro em águas pode produzir pequenas quantidades
de compostos organoclorados, particularmente
o trihalometano (THM), um possível agente
carcinogênico. Como alternativa, pode ser usada a
cloramina (monocloramina), que reduz drasticamente
os níveis de THM. A monocloramina pode ser gerada
diretamente na água pela adição simultânea de
amônio e cloro ou hipoclorito.

c. Metais Pesados:

Foram muito usados no passado como germicidas (prata,


mercúrio, zinco e cobre), sendo atualmente substituídos por
compostos menos tóxicos. Os mais usados são compostos
orgânicos de mercúrio, prata, cobre e zinco.

d. Outros:

Peróxidos: principalmente água oxigenada, sobre organismos


anaeróbios, atuando pela sua ação oxidante.

Ozônio: Vem sendo empregado na desinfecção de água, com


sucesso na Europa e Estados Unidos. Embora seja um tratamento
mais caro, tem a vantagem de não produzir compostos
organoclorados. Por outro lado, devido à sua instabilidade, a
água submetida a este tipo de tratamento está mais sujeita à
contaminação do que quando clorada.

Agentes Químicos Esterilizantes:

Aldeídos: Formaldeído e Glutaraldeído, moléculas muito reativas,


combinam-se com proteínas, inativando-as.

Formaldeído 8% dissolvido em água ou álcool (irritante e deixa


resíduos) e glutaraldeído 2% (menos irritante). Em 12 horas,
destroem esporos.

Gases esterilizantes: Óxido de etileno. Atua pela interação


com proteínas, com alta capacidade de penetração. Como é
explosivo, é dissolvido em misturas de 10 a 20% com CO2 ou
freon. Importante a presença de umidade no ambiente e também

Unidade 1 67
Universidade do Sul de Santa Catarina

temperatura. Condições: 38 0C/5-8 h ou 54 0C/3-4 h, com 50%


de umidade e EtO de 400 a 800 mg/litro.

Para finalizar o estudo desta unidade, precisamos


entender a estrita relação dos micro-organismos em
nossa vida diária. Os micro-organismos, como foi
dito anteriormente, interagem conosco, podendo
causar inúmeras ações benéficas ou maléficas que
irão depender de diversos fatores: o tipo de micro-
organismo, as condições de sobrevivência (nutrientes,
temperatura, etc.).

Também é importante destacar três fatores relevantes:

Contaminação: Significa que os micro-organismos estão


presentes em algum local. Objetos inanimados (por isso a
importância do controle dos micro-organismos), na superfície
da pele e nas mucosas. Os comensais não causam danos, mas os
parasitas têm a capacidade de invadir órgãos e tecidos.

Infecção: Refere-se à multiplicação de qualquer organismo


parasita dentro ou sobre o corpo do hospedeiro (o qual habita). Se
uma infecção prejudica o funcionamento normal do hospedeiro,
ocorre a doença.

Doença: É um distúrbio no estado da saúde, acarretando, como


consequência, alterações das funções normais do corpo.

Um profissional da área de limpeza de caixas d’água


está contaminado com uma bactéria – estafilococos
– e não segue os procedimentos de assepsia. Pela
falta de água no local, não consegue finalizar o
procedimento de limpeza de uma escola. Após tentar
efetuar o procedimento, ele lava as mãos e não sofre
os efeitos nocivos. Uma criança com um corte no dedo
lava as suas mãos na pia do banheiro. Em pouco tempo,
a pele ao redor do ferimento torna-se avermelhada e
permanece assim por um dia ou mais. Esta criança foi
contaminada e infectada. Outra criança possuía baixa
imunidade e bebeu desta água. Após algumas horas
apresentava sintomas gastrointestinais e febre. Esta
outra criança sofreu contaminação, infecção e doença.

68
Processos de Engenharia Biológica

Síntese

Tanto as células procarióticas quanto as eucarióticas possuem


membranas que definem as fronteiras da célula viva, e ambas
contêm informações genéticas armazenadas no DNA.

Todos os procariontes são classificados ou no domínio Archaea ou


no domínio Bactéria. Os procariontes são os menores organismos
vivos. As bactérias são agrupadas pela forma (cocos, bacilos,
espirilos, vibriões e espiroquetas) ou por agrupamentos (arranjos),
como pares, tétrades, cacho de uva e em cadeias.

As células eucarióticas são maiores e mais complexas do que


as procarióticas, são a unidade estrutural básica de organismos
microscópicos e macroscópicos dos vegetais, plantas,
fungos, protozoários e algas (com exceção das algas azuis ou
cianobactérias).

Os antigos “protistas”, atualmente procariotos do domínio


bactéria, são importantes para o homem por ser uma peça
importante na cadeia alimentar, principalmente os autotróficos,
que obtêm energia através da luz solar.

Além disso, você aprendeu que as bactérias são um enorme grupo


de procariotos, anteriormente classificados como eubactérias,
representadas pelos organismos patogênicos ao homem, e
bactérias encontradas nas águas, solos, ambientes em geral.
Dentre estas, temos as bactérias fotossintetizantes (cianobactérias)
e outras quimiossintetizantes (E. coli), enquanto outras utilizam
apenas substratos inorgânicos para seu desenvolvimento.

Já a Eukarya: no âmbito microbiológico, compreende as algas,


protozoários e fungos (além das plantas e animais). As algas
caracterizam-se por apresentarem clorofila (além de outros
pigmentos), sendo encontradas basicamente nos solos e
águas. Os protozoários correspondem a células eucarióticas,
apigmentadas, geralmente móveis e sem parede celular, nutrindo-
se por ingestão e podendo ser saprófitas ou parasitas; e os fungos
são também células sem clorofila, apresentando parede celular,
realizando metabolismo heterotrófico, nutrindo-se por absorção.

Unidade 1 69
Universidade do Sul de Santa Catarina

Também destacamos nesta unidade a importância dos vírus


na microbiologia, embora, formalmente, não exibam as
características celulares, no sentido de não apresentarem
metabolismo próprio, de conterem apenas um tipo de ácido
nucleico. Os vírus são estruturas que representam o limite entre
as formas vivas e as inanimadas. Eles apresentam as estruturas
mais simples, são muito menores que as bactérias.

Finalmente, destaca-se a importância para a gestão ambiental, de


compreender e utilizar os micro-organismos, melhorando seus
efeitos benéficos e minimizando suas atividades danosas.

Atividades de autoavaliação
Ao final de cada unidade, você realizará atividades de autoavaliação. O
gabarito está disponível no final do livro didático. Mas esforce-se para
resolver as atividades sem ajuda do gabarito, pois, assim, você estará
promovendo (estimulando) a sua aprendizagem.
1. Você é um agente ambiental e, em visita a um determinado município
de seu estado, depara-se com falta total de condições sanitárias: o
esgoto é a céu aberto, sem calçamento e numerosas crianças brincam
naquele local. Você necessita informar a população sobre os riscos à
saúde. Pesquise sobre a importância do controle dos micro-organismos
e por que, atualmente, esta medida é fundamental para qualquer
atividade que envolva o crescimento de micro-organismos.

70
Processos de Engenharia Biológica

2. Descreva sucintamente as características centrais dos principais grupos


de micro-organismos estudados nesta unidade, com relação a:
 Características nutricionais
 Características morfológicas
 Características filogenéticas (taxonômicas)
 Características respiratórias

Unidade 1 71
Universidade do Sul de Santa Catarina

Saiba mais
Se você desejar, aprofunde os conteúdos estudados nesta unidade
ao consultar as seguintes referências:

MADIGAN, Michael T.; MARTINKO, John M.; PARKER,


Jack. Parte III: Microbiologia evolutiva e diversidade microbiana.
In: MADIGAN, Michael T.; MARTINKO, John M.;

PARKER, Jack. Microbiologia de Brock: Microbiologia evolutiva


e diversidade microbiana. 10.ed. São Paulo: Pearson Prentice
Hall, 2008. Cap. 14, p. 302-449.

PELCZAR, Michael J.; CHAN, E.c.s.; KRIEG, Noel R.


Objetivos da microbiologia. In:

PELCZAR, Michael J. et al. Microbiologia conceitos e


aplicações: características dos grupos de fungos. 2.ed. São Paulo:
Pearson Prentice Hall, 2009. Cap. 3, p. 52-66. (Volume 1).

72
2
UNIDADE 2

Micro-organismos importantes
nos processos da qualidade
ambiental. Processos
clássicos e biotecnológicos de
identificação destes agentes

Objetivos de aprendizagem
 Conhecer os principais bioindicadores.

 Identificar os efeitos da poluição orgânica e química nas


comunidades microbianas.

 Conhecer os princípios teóricos das técnicas de


avaliação de qualidade ambiental através de diferentes
metodologias.

Seções de estudo
Seção 1 Bioindicadores

Seção 2 Micro-organismos emergentes (protozoários e


cianobactérias)

Seção 3 Princípios teóricos das técnicas de avaliação de


qualidade ambiental
Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


Antes de iniciarmos os estudos da unidade 2, vamos relembrar
alguns conceitos básicos já estudados em outras disciplinas.

Agentes biológicos: a biota aquática está constantemente


exposta a um grande número de substâncias tóxicas lançadas no
ambiente, oriundas de diversas fontes de emissão. A descarga de
lixos tóxicos provenientes de efluentes industriais, os processos de
drenagem agrícola, os derrames acidentais de lixos químicos e os
esgotos domésticos lançados em rios e mares contribuem para a
contaminação dos ecossistemas aquáticos, com uma ampla gama
de agentes tóxicos como metais pesados, agrotóxicos, compostos
orgânicos, entre outros.

Os principais contaminantes de origem agrícola são os resíduos


de fertilizantes e os agrotóxicos. Já os contaminantes biológicos
são agentes patogênicos, ou não. As características bacteriológicas
dos esgotos referem-se à presença de diversos micro-organismos,
tais como bactérias inclusive do grupo coliforme, vírus e vermes.
No caso das indústrias, as que operam com o abate de animais
também são grandes emissoras de micro-organismos, bem
como inúmeras produtoras de alimentos. Os micro-organismos
presentes contaminam o solo, inclusive os lençóis subterrâneos
e as águas superficiais, sendo responsáveis pelas doenças de
veiculação hídrica.

Cianobactérias: podem associar-se a fungos, formando líquens.


Estas, além de bioindicadores da qualidade ambiental, criam
condições para que novas espécies colonizem determinados
ambientes, podem fixar nitrogênio e, ainda, ser utilizadas na
fabricação de corantes.

Para avaliar o grau de contaminação de alguma amostra


do ambiente, é necessário analisar os parâmetros físico-
químicos, pH, temperatura, potencial redox e condutividade
e os parâmetros microbiológicos, coliformes totais, coliformes
termotolerantes, Grupo Enterococcus, Clostridium perfringens
(indicadores de contaminação), além de bactérias aeróbias e dos
micro-organismos comumente causadores de infecção hospitalar,
Pseudomonas aeruginosa e Staphylococus aureus.

74
Processos de Engenharia Biológica

Nesta unidade, portanto, você irá conhecer os principais


agentes biológicos e grupos de micro-organismos indicadores;
irá também identificar os efeitos da poluição nas comunidades
microbianas e, principalmente, conhecer os princípios teóricos
das técnicas de avaliação da qualidade ambiental.

Vamos aprofundar?

Seção 1 – Bioindicadores
A geração de resíduos sólidos urbanos (RSU) e o seu adequado
gerenciamento são alguns dos maiores desafios enfrentados pela
sociedade atual e pelas administrações públicas. No Brasil, a
forma predominante de disposição final de RSU é a céu aberto.
Trata-se de uma prática inadequada de destinação dos resíduos,
que traz, como consequência, uma série de impactos negativos,
sendo totalmente condenável do ponto de vista sanitário,
ambiental e social. Os impactos causados tendem a agravar os
aspectos da poluição ambiental e da saúde pública.

Antes de iniciar este estudo vamos aprender como os micro-


organismos podem ser transmitidos e como sua presença é
importante para diagnosticar o ambiente, principalmente quando
ele é identificado.

Os resíduos sólidos urbanos, por conterem grande percentual


de matéria orgânica, em seu processo natural de decomposição
geram “chorume”, também conhecido como percolado ou
líquido lixiviado. Este líquido lixiviado é um foco potencial
de contaminação ambiental devido à sua constituição – alta
concentração de matéria orgânica, bactérias, toxinas de bactérias,
dentre outros, podendo poluir o solo, as águas subterrâneas e
superficiais.

A polêmica sobre o potencial risco biológico atribuído a estes


elementos aliada à escassez de dados sobre a sobrevivência de
micro-organismos patogênicos nos resíduos aterrados e nos

Unidade 2 75
Universidade do Sul de Santa Catarina

líquidos lixiviados, merecem ser discutidas e aprofundadas para


elucidarem esta questão. (MACHADO, 2004).

Segundo Sisinno (2000), muitos são os vetores responsáveis pela


transmissão de doenças ao homem e, dentre os mais importantes,
destacam-se os roedores e os insetos. Isto se deve à alta
capacidade de adaptação, reprodução rápida e diversificado hábito
alimentar destes animais.

As principais espécies de insetos e roedores de interesse sanitário


são a Musca domestica (mosca doméstica); Periplaneta americana,
Periplaneta austrasiae e Blatella germanica (baratas); Rattus rattus
(rato preto, rato de telhado), Rattus norvegicus (ratazana, rato de
esgoto) e Mus musculus (camundongo).

As principais doenças causadas pelos vetores e a forma de


transmissão encontram-se listadas na tabela abaixo:

Tabela 2. 1 – Principais doenças causadas por vetores e a forma de transmissão destas doenças.

Vetores Doenças transmitidas Modo de transmissão

Amebíase, giardíase Água e alimentos


Moscas e Baratas
contaminados
Febre tifoide e disenteria

Mosquito Aedes aegypti Febre amarela e dengue Picada de mosquito

Mosquito do gênero Culex Filariose* Picada de mosquito

Mosquito do gênero
Malária** Picada de mosquito
Anopheles

Pulga Peste bubônica e tifo murino Picada de pulga

Peste bubônica Pulgas infectadas

Fezes de pulgas
Tifo murino
Rato infectadas

Urina de rato, solo ou


Leptospirose
água contaminados

Fonte: MACHADO, 2004. Disponível em: <www.smarh.eng.ufmg.br/defesas/13M.PDF>.


Acesso em: 20 ago. 2010.

76
Processos de Engenharia Biológica

Você sabe o que são os indicadores biológicos


(Bioindicadores)?

Trata-se de micro-organismos ou parte deles (enzimas,


hormônios, DNA, etc.) utilizados na avaliação da qualidade
microbiológica da água e dos alimentos, empregados para definir
as condições sanitárias em que estes se encontram. Existem
bioindicadores moleculares, celulares e em nível do animal
completo.

Quando, por exemplo, lançam-se as substâncias oriundas das


atividades agrícolas no ambiente aquático, elas são capazes de
interagir com o organismo vivo, causando múltiplas alterações as
quais podem gerar graves desequilíbrios ecológicos, dependendo
do grau de contaminação e do tempo de exposição.

Os mecanismos utilizados para medir este impacto são os


chamados indicadores biológicos. Estes são muito úteis devido
a sua especificidade a certos tipos de impacto, já que inúmeras
espécies são comprovadamente sensíveis a um tipo de poluente,
mas tolerantes a outros.

Como exemplo de indicador biológico podemos citar a


enzima acetilcolinesterase (AChE) e os coliformes fecais.

A enzima pode ser utilizada na avaliação da contaminação


ambiental por agentes anticolinesterásicos, pois estes compostos
se ligam à enzima, gerando propagação contínua do impulso
nervoso, e inibem sua atividade. Vários são os agentes
anticolinesterásicos conhecidos, sendo os mais importantes os
organofosforados e carbamantos, pesticidas largamente utilizados
em atividades agrícolas e campanhas de saúde pública como
"mata-mosquitos".

Os coliformes fecais são grupos ou espécies de micro-


organismos indicadores que, quando presentes em um alimento,
podem fornecer informações sobre a ocorrência de contaminação
de origem fecal; presença de provável patógenos; deterioração
potencial do material (água, alimento, medicamento, etc.

Unidade 2 77
Universidade do Sul de Santa Catarina

Pode indicar também condições sanitárias inadequadas, durante


o processamento, produção ou armazenamento.

Em nível individual, os parâmetros mais comuns a serem


levados em conta quando se estudam populações de peixes
são o tamanho e o peso dos peixes, já que podem fornecer um
indicativo da condição geral deles. O fator de condição é um
índice que relaciona peso e tamanho de peixes, sendo, desta
forma, útil para estimar o estado geral de saúde do peixe.

A análise cuidadosa de todos os parâmetros anteriormente


citados possibilita avaliar se os animais estão, ou não, em suas
condições fisiológicas normais em um específico ecossistema.

No nível de organização biológica do organismo, as ferramentas


de análise são chamadas de bioindicadores.

Bioindicadores são definidos como qualquer resposta


a um contaminante ambiental em nível individual,
medidos no organismo ou matriz biológica, indicando
um desvio do status normal que não pode ser
detectado no organismo intacto. Ou seja, são medidas
de fluidos corporais, células, tecidos ou medidas
realizadas sobre o organismo completo, que indicam,
em termos bioquímicos, celulares, fisiológicos,
compartimentais ou energéticos, a presença de
substâncias contaminantes ou a magnitude da resposta
do organismo alvo. (ARIAS, 2006).

As duas características mais importantes dos bioindicadores são:

a) permitem identificar as interações que ocorrem entre os


contaminantes e os organismos vivos;

b) possibilitam a mensuração de efeitos subletais.

Esta última característica permite pôr em prática ações


remediadoras, ou, melhor ainda, ações preventivas. Daí a
importância e o interesse atual de incorporar a análise de
bioindicadores em programas de avaliação da contaminação
ambiental.

78
Processos de Engenharia Biológica

Você já ouviu falar em índice de saprobidade?

Em 1973, o pesquisador Sladecek desenvolveu um sistema de


qualidade ambiental que envolvia a interação entre os fatores
abióticos (inanimados) e as formas bióticas (seres vivos), capaz de
avaliar as condições de qualidade de um ambiente em estudo.

Este sistema, também conhecido como índice de saprobidade,


é utilizado até os dias de hoje, com algumas adaptações e
inovações, é claro. Efetivamente, este índice é considerado o mais
completo, recente e amplamente divulgado para se definir o grau
de saprobidade de ambientes aquáticos.

O termo saprobidade é utilizado para definir o conteúdo de


putrefação orgânica decomposta por micro-organismos aquáticos
que formam as diferentes comunidades na água aberta, ao longo
da vegetação litorânea e no fundo.

O nível de saprobidade consiste em avaliar organismos aquáticos


cuja presença e atividades vitais nos ecossistemas indicam
diferentes níveis de qualidade das águas. (CETEC, 1994). O
estado biológico de um ambiente aquático é típico para cada grau
de contaminação, e a avaliação da composição e abundância das
biocenoses de um hidrossistema possibilita avaliar o seu grau de
pureza ou poluição. O termo “biocenose” (do
grego bios, vida, e koinos,
comum, público) foi criado
Em geral, quanto maior a concentração de pesticidas e pelo zoólogo alemão
mais longo o tempo de exposição, maiores as chances Karl August Möbius,
dos impactos negativos atingirem níveis superiores em 1877, para ressaltar
de organização biológica, como comunidades e a relação de vida em
ecossistemas. Se um estresse dura tempo suficiente comum dos seres que
para levar uma população de organismos à morte, habitam determinada
afetando as taxas de crescimento, de reprodução e região. A biocenose de
impedindo o recrutamento de novas espécies, ela é uma floresta, por exemplo,
capaz de alterar a estrutura da comunidade. compõe-se de populações
de arbustos, árvores,
pássaros, formigas,
O uso de parâmetros biológicos para medir a qualidade da água micro-organismos, etc.,
se baseia nas respostas dos organismos em relação ao meio onde que convivem e se inter-
vivem. Como os sistemas hídricos estão sujeitos a inúmeras relacionam.
perturbações, a biota aquática reage a esses estímulos, sejam

Unidade 2 79
Universidade do Sul de Santa Catarina

eles naturais ou antropogênicos. Assim, o sistema sapróbico


enfatiza que a presença/ausência e abundância de organismos
nas áreas poluídas ocorrem por características fisiológicas e
comportamentais que lhes permitem tolerar tais condições.

A partir dessa primeira tentativa de classificação de ambientes


com base na fauna local, surgiram diversas metodologias, as quais
podem ser divididas em três grandes grupos:

1. Os índices bióticos, os modelos de predição de impacto


e os protocolos (como no exemplo da Tabela 2.2) de
avaliação rápida.
2. Os graus de saprobidade mencionados estabelecem níveis
sapróbicos, correspondentes a diferentes teores de carga
orgânica. (CETEC, 1994).
3. Criou-se, então, a partir de dados do Cetec (1994), uma
adaptação do sistema Sladacek (1973) para ambientes
tropicais, onde se observa a possível utilização de
algumas espécies fitoplanctônicas como indicadores
ambientais.
Entretanto fazem-se necessárias análises qualitativas,
quantitativas e estatísticas mais refinadas para se avaliarem
com clareza a ecologia destes indivíduos e a real importância
dos mesmos nos diferentes ambientes em que estes se fizeram
presentes.

Tabela 2.2 – Tabela do IBE (Índice Biótico Estendido).

Valor IBE*- Classe de Cor de


Avaliação
SORJ qualidade referência
Ambiente não poluído ou
>10 I não alterado em maneira Azul
sensível
Ambiente no qual não
8-9 II aparecem alguns efeitos da Verde
poluição
6-7 III Ambiente poluído Amarelo

4-5 IV Ambiente muito poluído Laranja


Ambiente fortemente
<3 V Vermelho
poluído

Fonte: ARIAS, 2007, p. 68.


80
Processos de Engenharia Biológica

O Índice Biótico Estendido (IBE), abordado na tabela acima,


avalia a qualidade biológica de um corpo de água baseando-se na
sensibilidade de alguns grupos biológicos em relação a diversas
fontes poluentes e na estimativa da riqueza total da comunidade
de macroinvertebrados. O valor IBE é o Índice Biótico
Estendido que vem sendo utilizado na Europa para avaliar os
efeitos da contaminação por agrotóxicos.

O IBE foi adaptado para a região Serrana do Estado de Rio de


Janeiro, utilizando um banco de dados relativo a amostragens
no período entre 1999 e 2004, em três bacias hidrográficas
(Guapimirim, Grande e Macaé), com coletas realizadas em 34
pontos amostrais, quase todas em três diferentes estações do ano.
(ARIAS, 2007).

Tradicionalmente, as técnicas para a avaliação destes impactos


utilizando bioindicadores vêm sendo divididas em duas
abordagens principais:

1. aquelas associadas aos níveis superiores de organização –


tais como populações, comunidades e ecossistemas;
2. no nível individual – que trata de alterações
comportamentais, malformações, mudanças nas taxas
de crescimento, reprodução, alimentação, alterações
bioquímica e fisiológica – que incluem alterações na
integridade da membrana celular, no transporte de íons,
no metabolismo celular e em atividades enzimáticas.
Os componentes dessa última abordagem são também chamados
de bioindicadores, e são definidos como componentes biológicos,
células, processos bioquímicos, estruturas e funções biológicas,
alteradas quando em contato com compostos xenobióticos.

Micro-organismos Indicadores
Para ser um indicador, o micro-organismo deve preencher os
seguintes requisitos:

 estar presente na fase líquida quando da presença de


micro-organismos patogênicos;

Unidade 2 81
Universidade do Sul de Santa Catarina

 estar presente apenas quando a presença de micro-


organismos for um perigo iminente.

E, em conjunto, devem:

 estar em maior número do que os micro-organismos


patogênicos;

 ser mais resistentes à ação dos agentes desinfetantes do


que os micro-organismos patogênicos;

 crescer facilmente em um meio cultural relativamente


simples;

 estar distribuídos randomicamente na amostra a ser


examinada;

 crescer de forma independente em relação a outros


micro-organismos quando inoculados em meio de
cultura artificial.

São Micro-organismos Indicadores:

 Grupos coliformes totais

 Grupos coliformes fecais ou termotolerantes

 Contagem de bactérias heterotróficas

Ainda, existem outros micro-organismos que indicam infecção


hospitalar em ambientes onde são depositados lixos médicos,
como por exemplo, as bactérias Pseudomonas aeroginosa e o
Staphylococcus aureus. Outros ainda, chamados emergentes, serão
estudados mais adiante. Veja na tabela a seguir alguns tipos de
microrganismos e sua importância como indicador.

82
Processos de Engenharia Biológica

Tabela 2.3 – Tipo de micro-organismo pesquisado e sua importância como indicador.

Micro-organismo pesquisado Importância dos micro-organismos


Contagem de Bactérias aeróbias Estima número de micro-organismos na amostra

Coliformes totais e coliformes


Indicação de poluição fecal
termotolerantes
Indicação de poluição fecal e origem da poluição
Grupo Enterococcus fecal

Clostridium perfringens Indicação de poluição ambiental mais remota

Comumente causadores de infecção hospitalar e


Pseudomonas aeroginosa encontrados nos RSS

Comumente causadores de infecção hospitalar e


Staphylococcus aureus encontrados nos RSS

Fonte: MACHADO, 2004, p. 73.

Você sabe o que são coliformes totais e coliformes


termotolerantes?

Coliformes totais: este grupo é composto por bactérias da família


das Enterobactérias. São capazes de fermentar a lactose com
produção de gás, quando incubados a 36,50 C por 48 horas. São
bacilos Gram-negativos e não formadores de esporos. Fazem
parte deste grupo os gêneros: Escherichia, Enterobacter, Citrobacter
e Klebsiella. Destes, apenas a Escherichia coli tem como hábitat
primário o trato intestinal humano e animal. Os demais podem
ser encontrados nas fezes, porém também estão presentes em
outros ambientes (vegetais e solo).

Coliformes termotolerantes: estes coliformes pertencem a


um subgrupo de micro-organismos e são exclusivamente do
trato intestinal. A presença de coliformes termotolerantes
determina a origem fecal da contaminação, indicando risco
da presença de outros micro-organismos patogênicos. A
contagem dos coliformes termotolerantes indica a quantidade
dos micro-organismos oriundos de excreta humana. A pesquisa
de coliformes termotolerantes ou de E.coli (representante do
grupo) no material fornece com maior segurança informações
sobre as condições higiênicas do produto e/ou armazenamento
inadequado.

Unidade 2 83
Universidade do Sul de Santa Catarina

Análise biológica

Você deve estar-se perguntando: se existem tantos


micro-organismos e são invisíveis a olho nu, como
podemos detectá-los no meio ambiente?

Esta pergunta é muito importante, e é o tema principal desta


seção: como analisar diferentes tipos de micro-organismos.
Mas antes...

Por que procurar por micro-organismos no solo,


água ou ar?

Tanto a água, quanto o solo e o ar são veículos para uma série


de micro-organismos. Ter conhecimento e controlar estas
populações ajuda não somente na manutenção de um equilíbrio
do sistema, mas também é fundamental para assegurar a saúde e
a qualidade da vida humana.

Por exemplo, micro-organismos na água podem comprometer


a qualidade (odor, sabor), provocar doenças (dermatites,
problemas gastrintestinais), principalmente em indivíduos
imunologicamente debilitados.

A forma mais comum de contrair doenças contagiosas é a


ingestão de água e de alimentos contaminados, mas algumas
podem ser transmitidas por vetores animais ou contato direto
com a água contaminada.

Organismos do solo e da água


Muitas pesquisas são feitas para se procurar – e algumas vezes
encontrar – novos micro-organismos que habitam nossa biosfera.
Além da procura por micro-organismos patogênicos (como os
citados na tabela abaixo), há, também, uma procura por micro-
organismos úteis, tais como os produtores de antibióticos,
compostos de interesse para a indústria (polímeros, enzimas) e
alimentos.

84
Processos de Engenharia Biológica

Os contaminantes biológicos podem ser agentes patogênicos, ou


não. As características bacteriológicas dos esgotos, por exemplo,
referem-se à presença de diversos micro-organismos, tais como
bactérias, inclusive do grupo coliforme, vírus e vermes.

Vejamos, por exemplo, o caso específico das indústrias, como as


que operam com o abate de animais ou produzem outros tipos
de alimentos: elas são grandes emissoras de micro-organismos
patogênicos. Esses micro-organismos contaminam o solo
(veja tabela 2.4), inclusive os lençóis subterrâneos e as águas
superficiais, sendo responsáveis pelas doenças de veiculação
hídrica.

Os principais grupos de micro-organismos presentes no solo


estão apresentados na Tabela a seguir. As bactérias são mais
numerosas que todos os outros tipos de micro-organismos.
Dentre as bactérias existentes no solo, encontramos as
autotróficas, as heterotróficas, as aeróbicas, as anaeróbicas e,
dependendo da temperatura do solo, as mesófilas e as termófilas.
Ainda, os micro-organismos presentes no solo degradam
substâncias especiais, tais como celulose, proteína, pectina, ácido
butírico e ureia.

Tabela 2.4 – Principais organismos encontrados no solo.

Classificação do Organismo Tipo de Organismo

Artrópodes Insetos, crustáceos, aracnídeos

Cianobactérias, bactérias filamentosas


Bactérias (actinomicetes), outras bactérias não
fotossintetizantes

Fungos Saprofíticos, mutualistas, patogênicos

Protozoários Amebas, ciliados e flagelados

Vida Livre ou parasitas de plantas ou


Nematoides (vermes)
animais

Fonte: BLACK, 2002, p. 674.

Unidade 2 85
Universidade do Sul de Santa Catarina

O gerenciamento ambiental de um processo de tratamento


de efluentes está voltado ao contexto do homem em seu
habitat. Dentro dessa abordagem, tratar o efluente garante a
qualidade dos recursos naturais (água, ar e solo), uma vez que
o gerenciamento ambiental envolve a poluição ambiental, a
conservação dos recursos e a saúde e segurança das pessoas.
Portanto é de grande interesse a análise da eficiência dos
processos de tratamento, a fim de garantir que haja uma redução
deste impacto no ambiente. Para tanto, faz-se necessária a
determinação do Número de Células Viáveis (NVC) no esgoto
bruto e no tratado, pois demonstram as condições de eficiência
no sistema.

O número de células viáveis (NCV) corresponde


ao número total de micro-organismos, ou de uma
espécie determinada, capazes de formar colônias.
Assim, o número total de unidades formadoras de
colônias é detectado em uma quantidade determinada
(geralmente 1 ml) de material de exame, em um meio
de cultura.

Nos exames microbiológicos, os estudos quantitativo e qualitativo


são importantes, pois também servem como indicadores de
qualidade para verificação de eficiência do processo de tratamento
de um determinado efluente. Torna-se ainda relevante um
estudo da quantidade necessária de oxigênio para oxidar a fração
orgânica contida no efluente (representada por DQO – Demanda
Química de Oxigênio) e a quantidade de matéria orgânica (dada
por DBO – Demanda Bioquímica de Oxigênio).

No que diz respeito à água que consumimos, ela possui um


padrão microbiológico de potabilidade que está relacionado
com os indicadores estudados (coliformes totais e coliformes
termotolerantes). A Tabela 2.5 demonstra este padrão
microbiológico de potabilidade da água para consumo humano.

86
Processos de Engenharia Biológica

Tabela 2.5 – Padrão Microbiológico de potabilidade da água para consumo humano.

Parâmetro Valor Mais Provável


Água para consumo humano

Coliformes termotolerantes Ausência em 100 ml

Água na saída do tratamento

Coliformes totais Ausência em 100 ml

Água tratada no sistema de distribuição (Reservatórios e Rede)

Coliformes termotolerantes Ausência em 100 ml

Sistemas que analisam 40 ou mais


amostras por mês:
Ausência em 100 ml em 95% das
amostras examinadas no mês
Sistemas que analisam menos de 40
Coliformes totais amostras por mês:
Apenas uma amostra poderá
apresentar mensalmente resultado
positivo em 100 ml

Fonte: BASTOS, 2000, p. 14.

Conforme a tabela acima, o padrão de potabilidade exige, na


maioria das vezes, a ausência de coliformes totais e coliformes
termotolerantes em cada100 ml de água tratada, na saída do
tratamento e na água potável analisados. Mas você deve estar-se
perguntando: quantas pessoas têm acesso no mundo à água potável?

A resposta você já deve saber, infelizmente muitas famílias ainda


sofrem sem saneamento básico e água potável. Para isso, você terá
de conhecer as técnicas quantitativas e qualitativas utilizadas para
detectar estes micro-organismos.

Tradicionalmente, a qualidade microbiológica da água era aferida


por meio da verificação da presença/ausência de organismos
indicadores de contaminação, mais especificamente as bactérias
do grupo coliforme, conforme foi apresentado até o presente
estudo. Entretanto essa abordagem é hoje reconhecidamente
insuficiente.

Unidade 2 87
Universidade do Sul de Santa Catarina

Na avaliação da qualidade da água tratada, o que se


busca verificar é a eficiência do tratamento, ou seja, a
ausência do organismo indicador significaria a ausência
de patógenos, pela inativação e/ou remoção de ambos
por meio dos processos de tratamento.

Nesse sentido, para que um organismo cumpra o papel de


indicador da eficiência do tratamento, torna-se necessário que,
além de ser mais resistente aos processos de tratamento que os
patógenos, o mecanismo de remoção de ambos seja similar.

Em linhas gerais, bactérias e vírus são inativados por desinfecção,


enquanto cistos (também chamados oocistos) de protozoários
são, preponderantemente, removidos por processos de separação
(decantação e filtração). Quanto à resistência aos agentes
desinfetantes, também em linhas gerais, em ordem crescente
apresentam-se as bactérias, os vírus, os protozoários e os
helmintos, estes praticamente imunes.

Assim sendo, rigorosamente, os coliformes só se


prestam como indicadores da desinfecção e inativação
de bactérias patogênicas. No que toca à avaliação
da qualidade virológica e parasitológica da água
tratada, torna-se necessário o emprego de indicadores
complementares não-biológicos, a exemplo dos
parâmetros de controle da desinfecção (tempo de
contato x cloro residual) e da turbidez (BASTOS et al.,
2001).

Segundo as normas da USEPA (Agência Americana de Proteção


Ambiental – United States Environmental Protection Agency),
bem como as diretrizes da OMS (Organização Mundial de
Saúde) , mantém-se como padrão microbiológico de potabilidade
a ausência de coliformes (no caso da OMS, Escherichia coli) na
água tratada. Entretanto as limitações anteriormente destacadas
são plenamente reconhecidas.

88
Processos de Engenharia Biológica

Você sabia?
Em 2000, o Ministério da Saúde, em parceria com a
Representação no Brasil da OPAS/OMS, coordenou o processo de
revisão e atualização da legislação brasileira sobre potabilidade
da água, resultando na publicação da Portaria MS nº 1469/2000,
que estabelece os procedimentos e responsabilidades relativos
ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo
humano e seu padrão de potabilidade.

Fonte: Diário Oficial, Brasília, 22 fev. 2001. Seção 1.

A USEPA estabelece como VMP (Valor Máximo Permitido)


a ausência de organismos patogênicos. Porém não estabelece
VMD (Valores Máximos Desejáveis) no reconhecimento
das limitações analíticas da pesquisa de patógenos em baixas VMD – Indicador não
concentrações nas amostras de água tratada. (USEPA, 2001). obrigatório e definido
como valor limite de
A abordagem é a de Avaliação Quantitativa de Risco um contaminante na
Microbiológico (AQRM), centrada no controle de qualidade água que, e com certa
margem de segurança,
da água bruta (pesquisa de oocistos de Cryptosporidium),
não produz nenhum
acompanhado da estimativa da remoção necessária (indicada efeito adverso à saúde,
também por padrão rigoroso de turbidez) e alcançável pela conhecido ou previsível.
combinação de técnicas de tratamento, para resguardo de No estabelecimento do
determinado nível de risco considerado tolerável (risco anual de VMD, são levados em
consideração apenas
aproximadamente 10-4, ou seja, um caso de infecção por ano, por
aspectos de saúde,
cada 10.000 consumidores). (USEPA, 2006). desconsiderando-se
outros, tais como limites
A abordagem da OMS é similar, sem incorporar limite de detecção analíticos ou
numérico explícito de turbidez para a água filtrada. Além disso, de técnicas para remoção
a perspectiva de risco é medida pelo indicador “anos de vida de contaminantes. Em
relação aos aspectos
perdidos ajustados por incapacidade” (da sigla inglesa DALYs –
de saúde, são ainda
Disability Adjusted Life Years), o qual permite a transformação de considerados os riscos
uma incapacidade vivenciada (por exemplo, três dias com diarreia a grupos vulneráveis,
ou óbito devido à diarreia) em “anos de vida saudáveis perdidos”. a exemplo de crianças,
idosos e indivíduos
A OMS assume como carga de doença tolerável 1 x 10-6 DALY, imunocomprometidos.
ou seja, 1μ DALY por pessoa por ano, o que corresponde a
níveis de risco tolerável anual de 10-3-10-4 para Cryptosporidium, μ = 10-6 metros
Campylobcter e rotavírus. Portanto, definido o que se queira como

Unidade 2 89
Universidade do Sul de Santa Catarina

DALY tolerável, pode-se estimar requerimentos de remoção de


patógenos por meio do tratamento a partir do conhecimento de
sua concentração na água bruta.

Outro importante coliforme e indicador fecal é a bactéria


Escherichia coli (E. coli.) Esta bactéria é um bacilo Gram-negativo,
anaeróbio facultativo, possui exigências nutricionais simples,
fermenta a glicose e é oxidase negativa. É encontrada no solo e
na água decorrente da presença de fezes e na microbiota de quase
todos os animais de sangue quente, incluindo os seres humanos.
Tem sido isolada de diversos sítios do corpo humano, causando
patologias como pneumonias, meningites, infecções intestinais e
muitas outras.

Como parte da microbiota fecal humana, esse micro-organismo


tem papel importante na contaminação fecal dos alimentos.
Algumas cepas patogênicas de E.coli podem causar diarreias
severas em todos os grupos etários e produzir uma potente
endotoxina. O tratamento com antimicrobianos destes pacientes
infectados é obrigatório, pois, caso contrário, a infecção pode
levar o indivíduo à morte. (PELCZAR et al., 1996).

Seção 2 – Micro-organismos emergentes (protozoários


e cianobactérias)
Nesta seção, veremos os aspectos relacionados a dois importantes
grupos de organismos considerados emergentes em sistemas de
abastecimento de água para consumo humano: os protozoários
(mais especificamente oocistos de Cryptosporidium e cistos de
Giardia) e as cianobactérias.

Micro-organismos emergentes são aqueles para os quais a atenção


e/ou preocupação de médicos, especialistas e/ou epidemiologistas
têm-se voltado a partir de períodos mais ou menos recentes.
Assim, podem constituir espécies recém-descobertas ou
organismos já conhecidos e/ou identificados, porém cuja

90
Processos de Engenharia Biológica

capacidade de infectar seres humanos e lhes ser patogênicos


apenas agora se descobriu.

A emergência dos organismos acima está relacionada não ao


fato de serem espécies recém descobertas, mas ao fato de que,
recentemente, em diferentes países, têm-se registrados surtos ou
epidemias de doenças em que os mesmos foram identificados
como os agentes etiológicos envolvidos e onde o abastecimento de
água, mesmo tratada, foi incriminado como a fonte da exposição.

A transmissão de protozoários patogênicos via água de consumo


é há muito tempo conhecida e consolidada na comunidade
técnica e científica.

Como exemplos, citam-se a associação entre Giardia


sp. e água com qualidade imprópria ao consumo
humano. Mais recentemente, o Cryptosporidium spp.
é o responsável por parasitose de caráter emergente,
tanto pela sua ampla distribuição (cosmopolita)
quanto pela ocorrência de diversos surtos e infecções
esporádicas registradas em várias partes do mundo.
Outros protozoários recentemente identificados
são os helmintos como Ancylostoma duodenale,
Ascaris lumbricoides, Echinococcus granulosis, Necator
americanus, Fasciolopsis buski, Strongyloides stercoralis,
Taenia solium e Trichiuris trichiura. Também se somam
a essa lista Cyclospora cayetanensis e Toxoplasma
gondii, com menor incidência, mas com alguns surtos
registrados em diferentes países (KARANIS; KOURENTI;
SMITH, 2007 apud PÁDUA), inclusive no Brasil.
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002).

Cianobactérias
Entre os fatores que levam as cianobactérias a predominar
sobre os outros grupos fitoplanctônicos (microalgas), destacam-
se suas características fisiológicas: as cianobactérias assimilam
os nutrientes (N e P) do meio aquático. De maneira geral,
as cianobactérias são menos eficientes na assimilação desses
nutrientes do que as microalgas (algas verdes ou diatomáceas, por
exemplo), que, em condições normais, crescem mais e melhor.

Unidade 2 91
Universidade do Sul de Santa Catarina

No entanto, ao produzir uma descarga excessiva de nutrientes


nos reservatórios, o homem propicia uma maior oferta desses
nutrientes, facilitando a assimilação dos mesmos e o crescimento
das cianobactérias.

A principal preocupação com o aumento da ocorrência de


florações de cianobactérias em mananciais de abastecimento
de água é a capacidade desses micro-organismos produzirem
e liberarem líquido toxinas (cianotoxinas) para o meio. Estes
líquidos podem afetar a saúde humana, tanto pela ingestão de
água como por contato em atividades de recreação no ambiente,
ou, ainda, pelo consumo de pescado contaminado. Entretanto a
principal via de intoxicação é pelo consumo oral da água sem um
tratamento adequado para remoção dessas toxinas.

As cianotoxinas formam um grupo bastante diverso de


substâncias químicas, com mecanismos tóxicos específicos em
vertebrados. Algumas cianotoxinas são neurotoxinas bastante
potentes (anatoxina-a, anatoxina-a(s), saxitoxinas), outras são
principalmente tóxicas ao fígado (microcistinas, nodularina e
cilindrospermopsina) e outras ainda podem ser irritantes ao
contato, consideradas como endotoxinas pirogênicas, como as de
bactérias Gram- negativas.

As cianobactérias ou cianofíceas (algas azuis), como


preferem os botânicos, são micro-organismos
aeróbicos fotoautotróficos. Seus processos vitais
requerem somente água, dióxido de carbono,
substâncias inorgânicas e luz. A fotossíntese
é seu principal modo de obtenção de energia
para o metabolismo. Entretanto sua organização
celular demonstra que esses micro-organismos
são procariontes e, portanto, muito semelhantes,
bioquimicamente e estruturalmente, às bactérias.

A capacidade de crescimento nos mais diferentes meios é uma


das características marcantes das cianobactérias. Várias espécies
vivem em solos e rochas, onde desempenham um importante
papel nos processos funcionais do ecossistema e na ciclagem de
nutrientes.

92
Processos de Engenharia Biológica

Entretanto ambientes de água doce são os mais importantes para


o crescimento de cianobactérias, visto que a maioria das espécies
apresenta um melhor crescimento em águas neutro-alcalinas
(pH 6-9), temperatura entre 15 a 30o C e alta concentração de
nutrientes, principalmente nitrogênio e fósforo.

Porque ocorrem florações de cianobactérias?

A crescente eutrofização dos ambientes aquáticos tem sido


produzida por atividades humanas, causando um enriquecimento
artificial desses ecossistemas. As principais fontes desse
enriquecimento têm sido identificadas como as descargas de
esgotos domésticos e industriais, dos centros urbanos e das
regiões agriculturáveis.

Esta eutrofização artificial produz mudanças na qualidade da


água, incluindo a redução de oxigênio dissolvido, perda das
qualidades cênicas, aumento do custo de tratamento, morte
extensiva de peixes e aumento da incidência de florações de
microalgas e cianobactérias.

Estas florações ou blooms se caracterizam pelo


intenso crescimento desses micro-organismos na
superfície da água, formando uma densa camada de
células com vários centímetros de profundidade, com
consequências relacionadas com a Saúde Pública.
(AZEVEDO, 1998).

Tendo em vista a importância das florações para a saúde pública,


a Portaria n° 518/04 (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2004) e a Resolução
357/05 do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA)
estabeleceram os procedimentos e as responsabilidades relativas
ao controle e vigilância da qualidade da água, padrões de
potabilidade, concentrações máximas de algumas cianotoxinas
e número de células de cianobactérias. Entretanto, na prática,
parte dessa normalização ainda não é seguida. Outro importante
ponto da legislação que deveria ser observado é a divulgação,
de forma aberta e sistemática, dos dados de qualidade de água
numa linguagem direta e acessível a toda a população. (CALIJURI
et al., 2006).

Unidade 2 93
Universidade do Sul de Santa Catarina

Como o número de estudos sobre a eficiente remoção dessas


cianotoxinas pelos processos de tratamento da água ainda é
reduzido, e as técnicas de detecção de cianotoxinas ainda não
são muito difundidas na prática do monitoramento de águas de
abastecimento, a avaliação da exposição humana às cianotoxinas
pelo consumo da água ainda é bastante deficiente.

Além disso, em regiões abastecidas por mananciais de superfície


que apresentam florações de cianobactérias tóxicas, a real
exposição a essas toxinas irá depender do método de captação,
da sequência do tratamento da água e do controle operacional do
sistema de abastecimento.

Segundo Di Bernardo (1995), para sanitaristas, é fundamental


o conhecimento dos gêneros de algumas espécies das algas
dominantes, pois algumas afetam a qualidade da água por
produzirem odor e sabor, outras por influírem significativamente
na coagulação química, decantação e filtração, e outras, ainda,
por serem tóxicas ao ser humano ou produzirem subprodutos
metabólicos que, em presença de cloro, formam compostos
cancerígenos.

Toxinas de cianobactérias
Vários gêneros e espécies de cianobactérias que formam florações
produzem toxinas. As toxinas de cianobactérias, as quais são
conhecidas como Cianotoxinas, constituem uma grande fonte de
produtos naturais tóxicos produzidos por esses micro-organismos
e, embora ainda não estejam devidamente esclarecidas as causas
da produção dessas toxinas, tem-se assumido que esses compostos
têm uma função protetora contra herbivoria, como acontece com
alguns metabólitos de plantas vasculares. (AZEVEDO, 1998).

No Brasil, entre os gêneros potencialmente nocivos,


destacam-se: Microcystis, Anabaena, Cylindrospermopsis,
Oscillatoria, Planktothrix e Aphanocapsa. (CALIJURI,
2006).

Algumas dessas toxinas, caracterizadas por sua ação rápida,


causando a morte por parada respiratória após poucos minutos

94
Processos de Engenharia Biológica

de exposição, têm sido identificadas como alcaloides ou


organofosforados neurotóxicos. Outras atuam menos rapidamente
e são identificadas como peptídeos ou alcaloides hepatotóxicos.

Os dois principais grupos de cianotoxinas até agora


caracterizados são: Neurotoxinas e Hepatotoxinas.

A anatoxina-A (uma neurotoxina) foi a primeira toxina de


cianobactéria a ser química e funcionalmente definida e trata-
se de uma amina secundária com peso molecular de 165 datons
(unidade das proteínas).

Os sinais de envenenamento por esta toxina, em animais


selvagens e domésticos, incluem: desequilíbrio, fasciculação
muscular (contração espasmódica muscular), respiração ofegante
e convulsões. A morte é devida à parada respiratória e ocorre
de poucos minutos a poucas horas, dependendo da dosagem e
consumo prévio de alimento. Os sinais clínicos de intoxicação
mostram uma progressão de fasciculação muscular, decréscimo
de movimentos, respiração abdominal exagerada, cianose,
convulsão e morte. (AZEVEDO, 1998).

Hepatotoxinas - O tipo mais comum de intoxicação envolvendo


cianobactérias é causado por hepatotoxinas, que apresentam uma
ação mais lenta, causando a morte entre poucas horas e poucos
dias, em decorrência de hemorragia intra-hepática e choque
hipovolêmico.

Os sinais observados após ingestão dessas hepatotoxinas são


prostração (estado de abatimento extremo, físico e psíquico),
anorexia (disfunção alimentar), vômitos, dor abdominal e
diarreia.

Algumas hepatotoxinas são reconhecidas como potentes


promotoras de tumores hepáticos e, portanto, a ocorrência
de espécies potencialmente produtoras dessas substâncias nos
nossos ambientes aquáticos precisa ser mais bem investigada e
monitorada.

A ocorrência irregular da toxicidade nas cianobactérias ainda


não foi devidamente esclarecida, e uma questão importante que
precisa ser considerada nesta variabilidade é: Existem cepas

Unidade 2 95
Universidade do Sul de Santa Catarina

geneticamente distintas que não produzem toxinas ou fatores


ambientais tais como luz, temperatura, nutrientes que regulam a
síntese dessas toxinas? (CARMICHAEL,1992).

Você se lembra do caso de Caruaru (Pernambuco)?


No início de 1996, 123 pacientes renais crônicos, após terem
sido submetidos a sessões de hemodiálise em uma clínica da
cidade de Caruaru (PE), passaram a apresentar um quadro clínico
compatível com uma grave hepatotoxicose que, no entanto, não
era correlacionada com nenhum dos fatores usualmente tidos
como causadores deste tipo de intoxicação.
Destes, 54 vieram a falecer até cinco meses após o início
dos sintomas e, de acordo com informações fornecidas pela
Secretaria de Saúde de Estado de Pernambuco, a referida clínica
recebia água sem um tratamento completo e, usualmente, era
feita uma cloração no próprio caminhão tanque utilizado para
transportar a água, em períodos de falha no abastecimento pela
rede pública.
Este passou a ser o primeiro caso confirmado de mortes
humanas causadas por uma toxina produzida por cianobactérias.
(AZEVEDO, 1998).

Para se estabelecerem os padrões de segurança da água, são


necessárias demonstrações dos efeitos de toxicidade dose-
dependentes e determinação dos níveis máximos que não causam
efeitos adversos ou Nível Máximo Aceitável (Maximum Acceptable
Level - MAC), pelo uso de muitos tipos de dados biológicos,
toxicológicos e epidemiológicos.

A existência de cianobactérias produtoras de toxinas nas águas


utilizadas para recreio ou para consumo constitui um elevado
risco para a saúde pública. Uma das formas de avaliarmos a
“olho nu” (sem auxílio de microscópio) a presença, ou não,
destes organismos é através da fluorescência. As florescências de
cianobactérias acontecem como consequência de elevadas cargas
de nutrientes, principalmente amônia, nitratos e fosfatos, de
temperaturas elevadas e da forte luminosidade. As fluorescências
ocorrem principalmente em meses quentes (fim da primavera

96
Processos de Engenharia Biológica

até o fim do verão). Desta forma, temos que ficar atentos às


águas que apresentem estas características, para evitarmos a
contaminação com cianobactérias.

Você sabe como podemos nos contaminar com estas


cianobactérias?

Existem quatro importantes vias de contaminação:

1. contato direto com as cianobactérias (em rios, lagos,


arrozais, águas estagnadas, oceanos, etc.);
2. inalação destes agentes;
3. ingestão de águas contaminadas;
4. utilização de água contaminada para hemodiálise.

Em 1997, a OMS (Organização Mundial de Saúde)


define o limite de 1,0 μg/L para a concentração de
toxinas de cianobactérias em águas de abastecimento
público, como o máximo aceitável para consumo oral
humano diário.

Protozoários emergentes
Os protozoários constituem um grupo de organismos que inclui
seres de vida livre e parasitas, que se caracterizam por apresentar
diferentes formas, tipos de metabolismos e locais de ocorrência.

O ser humano e diferentes espécies animais constituem


os hospedeiros obrigatórios ou acidentais dos protozoários
patogênicos, sendo que alguns deles podem apresentar complexos
ciclos biológicos envolvendo, inclusive, diferentes modos e
mecanismos de transmissão.

A transmissão de protozoários patogênicos via água de consumo


é há muito tempo conhecida e consolidada na comunidade
técnica e científica.

Unidade 2 97
Universidade do Sul de Santa Catarina

Como exemplos, citam-se a associação entre Giardia


sp. e água com qualidade imprópria ao consumo
humano. Mais recentemente, Cryptosporidium spp.,
responsável por parasitose de caráter emergente,
tanto pela sua ampla distribuição (cosmopolita)
quanto pela ocorrência de diversos surtos e infecções
esporádicas, registradas em várias partes do mundo.
Também se somam a essa lista Cyclospora cayetanensis
e Toxoplasma gondii, com menor incidência, mas
com alguns surtos registrados em diferentes países
(KARANIS; KOURENTI; SMITH, 2007), inclusive no Brasil.
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002).

Organismos-teste
Os organismos-teste servem como parâmetros de avaliação da
qualidade da água em um determinado ambiente. São utilizados
a fim de verificar algum efeito colateral que possa ser causado por
um ambiente específico, evitando, assim, que os seres humanos
possam vir sofrer algum tipo de injúria. Deste modo, se alguma
injúria ocorrer, que ocorra nestes organismos-teste.

A avaliação da toxicidade de vários compostos pode ser levada


a cabo através dos designados organismos-teste, usados como
modelo da resposta de qualquer ser vivo a esses compostos,
sempre com a saúde humana como objetivo principal.

Estes testes seduzem, sobretudo, pela sua simplicidade e grau


de reprodutibilidade, mas os organismos-teste devem reunir um
conjunto de características importantes:

 devem ser organismos eucariontes;


 a sua biologia deve estar bem documentada através de artigos
ou livros;
 a sua manipulação e cultura em laboratório deve ser fácil; e
 em estudos de efeitos a longo prazo, devem apresentar
preferencialmente tempos de geração (ver unidade 1 - curva de
crescimento) relativamente curtos.

98
Processos de Engenharia Biológica

Parâmetros para medir a qualidade da água


O IAP (Índice de Qualidade de Águas Brutas para Fins de
Abastecimento Público), também utilizado pela CETESB
(Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), considera
o produto da ponderação dos resultados atuais do IQA e dos
resultados de bioensaios de mutagenicidade que avalia a presença
de compostos mutagênicos na água.

Este índice é complementado com a utilização de parâmetros


tais como: metais, protozoários, patogênicos, nutrientes, algas
entre outros. O IAP tem o objetivo de avaliar a qualidade das
águas brutas para fins de abastecimento público. O abastecimento
doméstico está previsto para corpos d’água enquadrados nas
classes Especial, 1, 2, 3 da Resolução Federal CONAMA
357/05, sendo, portanto pertinente sua aplicação somente para
essas fontes.

O IAP deve, em sua próxima etapa de desenvolvimento,


contemplar a avaliação de parâmetros específicos tais como
algas, que podem interferir tanto no sistema de tratamento como
também na qualidade da água distribuída. Outros metais tóxicos
como o arsênio e parasitas (Giardia/Cryptosporidium), que são
protozoários frequentemente encontrados em água bruta.

É importante mencionar que os dados utilizados para


subsidiar a escolha de “patógenos referência” dizem respeito
ao conhecimento disponível sobre os organismos patogênicos.
Muitas informações podem conter imprecisões e, em alguns
casos, não existe informação alguma, dificultando a comparação
entre os organismos selecionados.

Exemplificando o exposto, considerando os impactos à saúde,


o pequeno número de surtos/epidemias registrado envolvendo
outros protozoários patogênicos, diferentes da Giardia e
do Cryptosporidium, pode ser devido a diferenças entre os
procedimentos de notificação existentes nos vários países;
não sendo prática, por exemplo, a adequada identificação
laboratorial de casos de doenças com quadro diarreico e das
ocorrências de protozoários patogênicos nas fontes de água,
dificultando uma avaliação do quadro real de enfermidades
relacionadas com a água.

Unidade 2 99
Universidade do Sul de Santa Catarina

Dados epidemiológicos de surtos/epidemias relacionadas


com protozoários
Conforme caracterização realizada por Karanis, Kourenti e Smith
(2007), dos 325 registros de surtos/epidemias relacionadas com
protozoários, 93% ocorreram na América do Norte e Europa,
enquanto os demais foram distribuídos pelo Japão (1%), Austrália
(2%) e outros países (4%).
Nesse trabalho, os autores não fazem referência aos surtos de
Cyclospora cayetanensis que ocorreram no Brasil em 2000, na
cidade de General Salgado-SP, e no ano 2001, em Antonina-
PR. No primeiro surto, foram identificados 350 casos (taxa de
incidência = 32,3 casos/1.000 hab.); crianças menores de 4
anos foram o grupo de maior risco (taxa de incidência = 49,1
casos/1.000 habitantes); a duração média dos sintomas foi de
13,3 dias; e de 40 amostras fecais testadas, foram identificados
oocistos em 25%. (EDUARDO et al., 2008). No segundo surto,
onde se estima o acometimento de 600 pessoas, de 46 amostras
fecais testadas, 47,8% confirmaram a presença de Cyclospora
cayetanensis. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2002).
Em ambos os surtos, foi evidenciada a água de consumo como
a fonte de exposição para os casos, sendo que no surto ocorrido
em General Salgado, foi identificado o agente em amostra de
água proveniente de um dos poços artesianos que abastecia o
município. (MINISTÉRIO DA SAÚLDE, 2002; EDUARDO et al., 2008).

Outro aspecto que vem adquirindo importância é a capacidade


de sobrevivência dos oocistos em águas estuarinas (são as zonas
onde o rio encontra o mar e a água fica salobra, menos salgada
que a água do mar) e marinhas e a possibilidade de contaminação
de espécies animais desses ambientes, aumentando o significado
de saúde pública desse protozoário, tanto no que diz respeito
à transmissão envolvendo o contato primário/recreação, como
devido ao consumo de produtos marinhos, principalmente crus.

A detecção de oocistos em água do mar ou de estuários


é documentada na literatura (JOHNSON et al., 1995;
FERGUSON et al. 1996; LIPP et al., 2001), entretanto, a
grande maioria dos relatos, em diferentes partes do mundo,
refere-se ao isolamento/identificação de oocistos em moluscos
aquáticos (ostras, mexilhoes e mariscos).

100
Processos de Engenharia Biológica

O comportamento da Giardia em condições de laboratório


e no ambiente é semelhante ao do Cryptosporidium, porém,
normalmente, a sobrevivência de cistos é menor que a dos
oocistos. A temperatura também é um fator que interfere na
manutenção da infectividade dos cistos. No solo, os cistos
apresentam períodos variados de sobrevivência.

A ocorrência de cistos de Giardia em águas tratadas e em


sistemas de abastecimento não determina, necessariamente,
comprometimentos da saúde da população consumidora.
Em princípio, os cistos identificados podem não ser viáveis/
infectantes e/ou as concentrações observadas não são suficientes
para determinar processos de infecção e/ou os processos
infecciosos que ocorrem não implicaram em quadro sintomático.

Adicionalmente, há que se considerar o fato de que podem


ocorrer casos eventuais que, devido a pouca gravidade, não
são identificados e, por conseguinte, não são notificados; ou
ainda, quando as concentrações são suficientes para desencadear
processos de infecção, resultando em casos de giardiose e/ou
criptosporidiose, os sintomas podem ser atribuídos a outros
agentes.

De maneira geral, observa-se que alguns surtos estiveram


associados ao abastecimento de água sem tratamento, entretanto,
outros ocorreram em populações onde a água consumida recebia
algum tipo de tratamento, inclusive filtração.

Alguns aspectos normalmente indicados como as possíveis


causas da presença de (oo)cistos na água distribuída e,
consequentemente, origem do surto/epidemia incluem:

 contaminação dos mananciais de abastecimento


(principalmente superficiais) por esgoto doméstico ou água
residuária provenientes de instalações de produções animais;
 aumento súbito da contaminação dos mananciais
(principalmente superficiais) após intensas chuvas ou degelo;
 existência de assentamentos humanos e/ou explorações
agropecuárias na área da bacia hidrográfica do manancial;

Unidade 2 101
Universidade do Sul de Santa Catarina

 falhas nos processos de tratamento (humanas e/ou


instrumentais);
 tratamento da água por técnicas e processos inadequados aos
níveis de poluição dos mananciais de abastecimento e/ou
 recontaminação da água na rede de distribuição (infiltração de
esgotos/águas residuárias).
Adicionalmente, registra-se que, de modo geral, a qualidade da
água tratada normalmente atendia aos requisitos exigidos nas
legislações específicas.

As microcistinas (veja figura abaixo), hepatotoxinas mais


comumente encontradas em blooms de água doce, são peptídeos
cíclicos formados por sete aminoácidos (heptapeptídeos
cíclicos) de pesos moleculares (PM’s) entre 800 e 1100.
Essas toxinas são caracterizadas de acordo com o arranjo
dos aminoácidos na molécula e podem levar à morte em
algumas horas por hemorragia no fígado (CARMICHAEL
& SCHWARTZ,1984). Cerca de 60 variações estruturais de
microcistinas já foram identificadas.

Figura 2.1 – Nodularinas. Estrutura química das hepatotoxinas mais comumente encontradas em
blooms de água doce.
Fonte: CARNEIRO E LEITE, 2008, p.4.

As hepatotoxinas são classificadas de acordo comas variações


no grau de metilação (CH3), composição e isomerização de
seus aminoácidos. Nodularinas (Figura 2.1) são peptídeos
cíclicos hepatotóxicos formados como você pode observar na
figura, por 5 aminoácidos (pentapeptídeos cíclicos). Assim
como as microcistinas, as noduralinas são solúveis em água e
apresentam alta estabilidade química, o que traz importantes

102
Processos de Engenharia Biológica

implicações sobre sua persistência no meio ambiente e exposição


a humanos nos corpos d’água. Poucas variações de nodularinas
foram identificadas e sua toxicidade, segundo experimentos em
animais, é dada por hemorragia e necrose de hepatócitos, além de
carcinogênese de fígado.

Como identificamos e quantificamos as cianotoxinas?

Existe uma carência de metodologias específicas para análise


microbiológica de líquidos lixiviados e quando existentes, as
dificuldades encontradas não são relatadas claramente e as
adaptações não são bem definidas. Assim, além da divulgação
dos resultados de uma pesquisa, a divulgação destes fatores
limitantes em muito contribuirá para trabalhos futuros.

Métodos para detecção, identificação e quantificação de


cianotoxinas podem variar de acordo com a sofisticação e o tipo
de informações que proporcionam. Em campo, testes rápidos e de
baixo custo podem ser empregados para avaliar o grau de risco de
uma floração e direcionar as medidas a serem tomadas. Por outro
lado, técnicas analíticas mais sofisticadas podem determinar com
maior precisão a identidade e quantidade das cianotoxinas.

Os métodos analíticos hoje disponíveis para essa finalidade se


dividem em físico-químicos (CLAE-Cromatografia Líquida de
Alta Eficiência, acoplado ou não ao espectrômetro de Massas
(MS)); bioquímicos (ensaio de inibição de fosfatase; ensaio de
inibição de acetilcolinesterase; ELISA) ou biológicos (bioensaios;
testes de toxicidade).

Segundo Guia da Organização Mundial da Saúde Toxic


Cyanobacteria in Water, recomenda a técnica de CLAE acoplado
ao espectrofotômetro de massas (CLAE-MS).

Unidade 2 103
Universidade do Sul de Santa Catarina

Métodos de detecção e quantificação de (oo)cisto de


Cryptosporidium spp. e Giardia sp.
Os métodos de detecção e recuperação de protozoários na água
envolvem três passos fundamentais:

1. concentração da amostra de água com a finalidade de


recuperar ou capturar (oo)cistos,

2. purificação dos (oo)cistos;

3. identificação e confirmação.

Basicamente, a primeira etapa é realizada por meio da filtração de


volumes variados, centrífugo-concentração ou eluição dos micro-
organismos.

A etapa de purificação tem sido amplamente estudada e pode


ser obtida por meio de gradientes de sacarose ou pela separação
imunomagnética.

A etapa de identificação e confirmação geralmente é obtida


através de visualização em microscópio com imunofluorescência
direta e prova confirmatória da morfologia por meio de
microscopia de contraste de fase, seguida de enumeração dos (oo)
cistos, como demonstrado na imagem seguir.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.2 - Cryptosporidium parvum. O cisto contendo 4 núcleos.


Fonte: Disponível em: <http://www.safetables.org/fb_illnesses/display.cfm?id=4>.
Acesso em: 20 set. 2010.

104
Processos de Engenharia Biológica

Na imagem destacam-se com as setas, os cistos, especificamente


os oocistos contendo núcleos (corados em preto), observados no
microscópio óptico.

O Cryptosporidium é normalmente encontrado no intestino, mas


pode ocorrer fora do trato digestório, como em certas partes do
trato respiratório. A localização respiratória é comum em aves.

A multiplicação do parasita no interior das células do intestino


causa má absorção e digestão. Como consequência ocorre diarreia
por alterações das células epiteliais, atrofia de vilosidades e perda
de enzimas digestivas.

Este micro-organismo causa uma doença de notificação


compulsória, a Criptosporidiose, ou seja, quando diagnosticada
é obrigatório que se notifiquem imediatamente as agências de
vigilância sanitária, através de formulário específico,.

Outro protozoário de grande importância é a Giadia lamblia


(veja na figura abaixo). Trata-se de um protozoário causador da
giardíase, doença de veiculação hídrica, que será abordada na
Unidade 3.

Relembrando
Protozoários: micro-organismos eucarióticos
unicelulares, desprovidos de parede celular.
Encontrados em diversos habitats de água doce e
marinha. Vários parasitam homens e animais, enquanto
outros crescem no solo ou em habitats aéreos
(superfície de árvores). A maioria dos protozoários
nutre-se pela ingestão de compostos particulados por
fagocitose, que é um processo em que uma porção da
membrana flexível envolve uma partícula alimentar,
englobando-a e conduzindo-a ao interior de célula.
Em consonância com sua capacidade de “capturar”seu
próprio alimento, a maioria dos protozoários exibe
motilidade. De fato, seus mecanismos de locomoção
são empregados na sua classificação: Sarcodina (Ex.
Entamoeba sp. cujos movimentos são ameboides),
Mastigophora (são os protozoários que possuem
flagelados - Figura 2.3); etc.

Unidade 2 105
Universidade do Sul de Santa Catarina

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.3 - Forma parasitária (trofozoíto) e forma cística de Giardia lamblia.


Fonte: Disponível em: <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/giardiase/>.
Acesso em: 20 set. 2010.

Quando nos referimos a oocistos, estamos falando de


protozoários do gênero Cryptosporidium, no entanto,
quando falamos em “cistos”, estamos referindo-nos aos
outros protozoários (Giardia, por exemplo).

Mecanismos de remoção dos micro-organismos e legislação


pertinente
Entre os fatores que levam as cianobactérias a predominar sobre
os outros grupos de fitoplanctônicos (microalgas), destacam-
se as características fisiológicas pelas quais as cianobactérias
assimilam os nutrientes (N e P) do meio aquático. De maneira
geral, as cianobactérias são menos eficientes na assimilação desses
nutrientes do que as microalgas (algas verdes ou diatomáceas, por
exemplo) que, em condições normais, crescem mais e melhor.

No entanto, em ambientes onde ocorre uma descarga excessiva de


nutrientes nos reservatórios (provocados pelo próprio homem, por
diversas razões: lixo urbano, lixo industrial, etc.), esta propicia
uma maior oferta desses nutrientes orgânicos, facilitando a
assimilação deles e o crescimento das cianobactérias.

106
Processos de Engenharia Biológica

O crescimento intenso desses micro-organismos na superfície


da água geralmente se dá com o predomínio de poucas, ou, até
mesmo, de apenas uma espécie de cianobactéria produtora de
toxinas, ou de outros metabólitos, que inibem a sua predação por
microcrustáceos, larvas de peixes, moluscos, etc.

Esses consumidores primários vão preferir consumir as


microalgas não tóxicas e com maior valor nutricional,
contribuindo, assim, para a redução das populações dessas
microalgas, o que, por sua vez, resultará numa diminuição
drástica da comunidade dos consumidores primários, com
consequências em toda a cadeia alimentar do ambiente aquático.

Portanto, como resultado desses processos, muitas vezes restarão,


no meio aquático, apenas as cianobactérias tóxicas como
organismos fitoplanctônicos dominantes. Esse meio aquático,
apresentando uma diversidade de espécies bastante reduzida e
dominância de cianobactérias tóxicas, é, por vezes, o manancial
de abastecimento que temos disponível em muitas regiões
brasileiras. (BRASIL, 2003).

Percebemos, assim, como a presença das


cianobactérias e o equilíbrio natural destas culturas no
meio aquático são importantes para a qualidade da
água que consumimos.

Pudemos verificar os efeitos que os micro-organismos podem


exercer sobre o ecossistema. Além das doenças transmitidas ou
toxinas provocadas por estes micro-organismos, outras ainda
serão discutidas na Unidade 3 (doenças de veiculação hídrica).

Na abordagem referendada pela OMS em sua recente discussão


acerca da revisão dos guias de qualidade da água para consumo
humano (BARTRAM, s.d., WHO, 2003), o controle
laboratorial constitui apenas uma (importante) etapa do processo
de avaliação de riscos.

Entretanto outras ações complementares devem ser agregadas,


enfatizando-se:

 a atenção à qualidade da água no manancial;

Unidade 2 107
Universidade do Sul de Santa Catarina

 a adoção de boas práticas nos sistemas de abastecimento de


água;
 a incorporação de um enfoque epidemiológico;
 o gerenciamento de riscos, promovendo as necessárias medidas
preventivas e corretivas nas situações identificadas como de risco
à saúde;
 adequada informação à população.
A maioria das normas e critérios analisados estabelecem o padrão
de potabilidade em termos qualitativos, utilizando organismos
indicadores – presença/ausência de bactérias do grupo coliforme.
Apenas a legislação argentina inclui outro organismo indicador
– Pseudomonas aeruginosa. De forma correta, em qualquer caso, a
presença de E.coli ou coliformes termotolerantes não é admitida.

Atualmente, encontra-se mais que reconhecida a


limitação dos coliformes, ou melhor, sua ausência,
como indicadores da qualidade virológica e
parasitológica da água tratada. (BASTOS et al., 2000).

Dentre as normas mundiais, apenas a legislação americana inclui,


de forma explícita, regulamentação para organismos patogênicos,
apresentando como VMD (Valor Máximo Desejável) a ausência
de vírus, protozoários e bactérias patogênicas. Adicionalmente,
são estabelecidas eficiências de remoção/inativação, com vistas a
assegurar riscos anuais máximos admissíveis de 10-4 (MACLER,
1993, citado por HAAS et al., 1999; MACLER e REGLI,
1993). O padrão de turbidez é explicitamente entendido como
componente do padrão microbiológico de potabilidade.

Na normalização sobre tratamento da água, são estabelecidos os


seguintes limites de turbidez (USEPA, 2000):

 Filtração rápida: ≤ 1,0 UT e ≤ 0,3 UT em 95% das


amostras mensais, medidas em frequência diária;

 Filtração lenta: ≤ 5,0 UT e ≤ 1,0 UT em 95% das


amostras mensais, medidas em frequência diária.

Tais critérios são empregados como indicadores da remoção


de Cryptosporidium, por meio da filtração (99%) e da remoção/
inativação de Giardia por meio da filtração, complementada

108
Processos de Engenharia Biológica

por desinfecção (99,9%). Cabe ressaltar que estes critérios, mais


recentes, substituem os anteriores voltados à remoção/inativação
de Giardia, para o que se propunha como limite de turbidez ≤
5,0 UT e ≤ 0,5 UT em 95% das amostras mensais, medidas em
frequência diária.

Quando a legislação brasileira foi atualizada em 2004, os


referidos critérios da USEPA (Agência Americana de Proteção
Ambiental – United States Environmental Protection Agency)
foram levados em consideração. Entretanto, em face de
argumentos de ordem prático-econômica e do reconhecimento
de que são escassas no país as informações sobres os riscos
associados à transmissão de protozooses via abastecimento de
água, acabou-se por manter o referido padrão em 1,0 UT.

Por outro lado, reconhecendo as crescentes preocupações com a


transmissão de vírus e protozoários via sistemas de abastecimento
de água tratada e, também, as dificuldades analítico -
laboratoriais na detecção destes organismos de forma rotineira,
optou-se por indicar sua ausência como meta de potabilidade e
adotar, complementarmente, critérios de tratamento da água e
respectivo controle. Vejamos a seguir alguns dos critérios citados
na nossa legislação, conforme Bastos (2000, p 38):

“Recomenda-se a inclusão de pesquisa de organismos


patogênicos, com o objetivo de atingir, como meta, um
padrão de ausência, dentre outros, de enterovírus, cistos
de Giardia spp e oocistos de Cryptosporidium sp.”

“Toda água fornecida coletivamente deve ser submetida a


processo de desinfecção, concebido e operado de forma a
garantir o atendimento ao padrão microbiológico.”

“Toda água para consumo humano suprida por manancial


superficial e distribuída por meio de canalização deve
incluir tratamento por filtração.”

“Com vistas a assegurar a adequada eficiência de


remoção de enterovírus, cistos de Giardia spp e oocistos
de Cryptosporidium sp. recomenda-se, enfaticamente,
que, para a filtração rápida, se estabeleça como meta a
obtenção de efluente filtrado com valores de turbidez
inferiores a 0,5 UT em 95% dos dados mensais e nunca
superiores a 5,0 UT.”

Unidade 2 109
Universidade do Sul de Santa Catarina

“Após a desinfecção, a água deve conter um teor mínimo


de cloro residual livre de 0,5 mg/L, sendo obrigatória
a manutenção de, no mínimo, 0,2 mg/L em qualquer
ponto da rede de distribuição, recomendando-se que a
cloração seja realizada em pH inferior a 8,0 e tempo de
contato mínimo de 30 minutos.”

“Admite-se a utilização de outro agente desinfetante ou


outra condição de operação do processo de desinfecção,
desde que fique demonstrado pelo responsável pelo
sistema de tratamento uma eficiência de inativação
microbiológica equivalente.”

Em 2000, o Ministério da Saúde, em parceria com a


Representação no Brasil da OPAS/OMS, coordenou o processo
de revisão e atualização da legislação brasileira sobre potabilidade
da água, resultando na publicação da Portaria MS nº 1469/2000,
que estabelece os procedimentos e responsabilidades relativos ao
controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano
e seu padrão de potabilidade. (BRASIL, 2001).

Há uma grande diferença entre o padrão de potabilidade de


vários países da América. Segundo Bastos (2000), há que se
perguntar, ainda, o quanto as legislações nacionais encontram-se
baseadas em critérios tais como:

 análise das evidências epidemiológicas e toxicológicas dos riscos de


saúde associados às diversas substâncias ou organismos patogênicos;
 possibilidades analítico-laboratoriais;
 intensidade de comercialização e uso das substâncias químicas;
 ocorrência na água de substâncias químicas e organismos patogênicos.

Veremos a seguir as principais técnicas de rotina e alguns avanços


da biotecnologia nas técnicas utilizadas para avaliar a presença de
micro-organismos indicadores, estudados anteriormente.

110
Processos de Engenharia Biológica

Seção 3 – Princípios teóricos das técnicas de avaliação


de qualidade ambiental
Com o cenário atual de deterioração da qualidade da água, novas
exigências quanto aos padrões de potabilidade são ditadas pelas
legislações, impondo crescente complexidade aos processos de
potabilização da água bruta.

Em muitas situações, novas técnicas são acompanhadas de


custos elevados, onerando cada vez mais a produção de água de
qualidade, compatível com as necessidades da população.

Nesta seção, estudaremos os princípios teóricos dos principais


métodos utilizados na identificação e detecção de micro-
organismos (ou parte deles) utilizados na atualidade, bem como
técnicas que envolvem aplicação biotecnológica para identificação
de indicadores de importância ambiental.

Análises Clássicas para identificação de micro-organismos


ambientais
Existem várias maneiras de realizar a análise biológica:

a) através da coloração de Gram,

b) através da contagem de bactérias heterotróficas,

c) através da contagem de aeróbios por membrana filtrante,

d) pela determinação de coliformes por tubos múltiplos,

e) ou, ainda, por testes bioquímicos (IMVC), e

f) métodos avançados que utilizam técnicas biotecnológicas.

Unidade 2 111
Universidade do Sul de Santa Catarina

a. Coloração de Gram

Como já estudamos, as bactérias podem ser dividas em dois


grandes grupos: as bactérias Gram-negativas e as bactérias
Gram-positivas. O método utilizado para classificá-las nestes
grupos denomina-se coloração de Gram.

A maioria das bactérias cora-se por este método, permitindo


observar sua morfologia e arranjo. Devido a essas vantagens,
essa coloração é também utilizada no estudo taxonômico das
bactérias. É uma técnica rápida, de baixo custo e fácil de ser
realizada.

Como é aplicada esta técnica?

As células bacterianas são fixadas em uma lâmina e passam por


uma série de lavagens e colorações:

1. primeiro, uma solução de um corante chamado cristal


violeta (CV);

2. seguido de uma solução de iodo (lugol) e, então, uma


solução alcoólica (geralmente etanol, etanol-acetona),

3. por último, um corante chamado safranina (fucsina


também pode ser usada). As lâminas contendo o material
corado são levadas ao microscópio para visualização.

O mecanismo da coloração de Gram se refere à composição


da parede celular, sendo que as Gram-positivas possuem uma
espessa camada de peptídeoglicano e ácido teicoico, e as Gram-
negativas, uma fina camada de peptídeoglicano, sobre a qual se
encontra uma camada composta por lipoproteínas, fosfolipídios,
proteínas, e lipopolissacarídeos.

Veja como funciona este processo de coloração e a diferença entre


as células Gram-positivas e Gram-negativas nas figuras a seguir:

112
Processos de Engenharia Biológica

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.4 - Técnica de Gram. Fonte: Disponível em:<http://www.biologycorner.com/APbiology/


pathology/bacteria.html>. Acesso em: 20 set. 2010. Adaptação do autor.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.5 - Diferença entre as células de Bactérias Gram-positivas e Gram-negativas.


Fonte: Disponível em: <www.biologycorner.com/APbiology/pathology/bacteria.html>.
Acesso em: 20 set. 2010.

Durante o processo de coloração, o tratamento com o álcool (ou


álcool-acetona) extrai os lipídeos, resultando em uma porosidade
ou permeabilidade aumentada da parede celular das bactérias
Gram-negativas. Assim, o complexo cristal violeta-iodo (CV-I)
pode ser retirado, e as bactérias Gram-negativas são descoradas.

Unidade 2 113
Universidade do Sul de Santa Catarina

A parede celular das bactérias Gram-positivas, em virtude de sua


composição diferente, torna-se desidratada durante o tratamento
com álcool, diminuindo a porosidade e a permeabilidade, e
o complexo CV-I não pode ser extraído. Assim, as células
Gram-positivas permanecem com a coloração violeta, referente
ao complexo CV-I. Já as células Gram-negativas, devido
ao descoramento (após a lavagem com solução alcoólica),
recebem o novo corante (fucsina ou safranina) e adquirem a cor
característica destes corantes, avermelhado.

No microscópio, é possível diferenciar estas colorações e,


portanto, classificá-las em células Gram-positivas (violeta) ou
Gram-negativas (vermelho). A Tabela abaixo resume a reação
das células bacterianas e seu aspecto após a adição das soluções
usadas no teste.

Tabela 2.6 – Características das bactérias coradas pela técnica do Gram.

Aspecto das bactérias


Soluções
Gram-positivas Gram-negativas

1 - Cristal Violeta Coradas em violeta Coradas em violeta

Formação do complexo CV-I Formação do complexo CV-I


2 - Solução de Lugol no interior da célula, que no interior da célula, que
permanece violeta permanece violeta

Desidratação da parede celular, Degradação da parede,


3 - Álcool-acetona diminuição da porosidade e da aumento da porosidade e da
permeabilidade; o complexo permeabilidade; o complexo
ou etanol CV-I não pode sair da célula, CV-I sai da célula, que fica
que permanece violeta incolor

4 - Fucsina ou A célula não é afetada, A célula é afetada, tornando-


safranina permanecendo violeta se vermelha

Fonte: Elaboração do Autor, 2010.

114
Processos de Engenharia Biológica

b. Contagem de bactérias heteróficas

Em sistemas aquáticos (lagoas, piscinas, etc.), ou mesmo na água


usada em casa, a presença de bactérias heterotróficas em grau
muito elevado pode acarretar problemas e ser prejudicial para
a saúde.

Relembrando
Bactérias heterotróficas são bactérias incapazes de usar
o gás carbônico (CO2) como única fonte de carbono
e, assim, dependem de organismos autotróficos
(que conseguem utilizar o CO2 para obtenção de
energia) para a produção de carboidratos e de outros
compostos utilizados como alimentos. (PELCZAR, 2009).

A determinação da densidade de bactérias heterotróficas constitui


uma importante ferramenta na:
 avaliação das condições higiênicas de sistemas distribuição
de água para consumo humano, poços, fontes e reservatórios,
piscinas, etc.;
 avaliação da eficiência na remoção de bactérias nas diversas
etapas de operação de estações de tratamento de água;
 determinação das possíveis causas de deterioração da qualidade
da água e do solo;
 determinação das condições microbiológicas do ar em diversos
locais, como hospitais, banheiros, cozinhas, restaurantes, etc.
O método se baseia na hipótese de que, definindo as condições de
nutrição, temperatura e tempo de incubação, caso haja bactérias
no meio analisado, haverá formação de colônias que serão
visualizadas após determinado período de incubação (CETESB
– Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental de São
Paulo). (CETESB, 2004).

Para fornecer os nutrientes adequados, um meio de cultura é


utilizado. O meio de cultura é uma solução aquosa de vários
nutrientes, que pode estar constituído por alguns destes
nutrientes ou por todos. Alguns destes nutrientes são fontes de
carbono, nitrogênio, enxofre, fósforo, além de outros elementos
em menor quantidade (traços). Mais adiante estudaremos esta
questão detalhadamente.

Unidade 2 115
Universidade do Sul de Santa Catarina

Dependendo da finalidade, outros componentes podem ser


adicionados para propiciar o crescimento do micro-organismo.
Em meios sólidos, por exemplo, pode-se adiciona ágar (um
polissacarídeo proveniente de algas) para solidificar o meio.

A amostra do meio analisado (água de uma piscina, por exemplo)


sofre diluições e é inoculada nas placas (figura 2.6), que são
incubadas (geralmente a 36 ± 0,5º C por 48 horas), e, então,
as colônias são contadas. O resultado é expresso em Unidades
Formadoras de Colônia (UFC) por mL de amostra.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.6 - Contagem em placas, demonstrando a diluição seriada e a inoculação em meio de cultivo
sólido.
Fonte: Disponível em: <http://vsites.unb.br/ib/cel/microbiologia/crescimento/crescimento.
html#fatores>. Acesso em: 27 set. 2010. Adaptação do autor.

116
Processos de Engenharia Biológica

Duas técnicas são muito empregadas neste método:

1. Pour plate: volumes de amostra são inoculados em


placas de Petri com posterior adição de meio de cultura
fundido. Esta técnica permite a inoculação de até 2 mL
da amostra ou suas diluições e é indicada para a análise
de amostras com contagens acima de 102/mL .

2. Spread plate: volumes de amostra são inoculados na


superfície do meio de cultura já solidificado nas placas
de Petri.

Esta técnica limita o volume inoculado a 0,1 mL da amostra


ou suas diluições, mas permite uma melhor visualização das
características das colônias na superfície, além de facilitar sua
transferência para outros meios de cultura.

c. Contagem de aeróbios por membrana filtrante

Este método é usado principalmente quando o número de UFC/


mL é muito baixo, permitindo análises de volumes maiores
de amostra. Consiste em filtrar sob vácuo a amostra, usando
membranas de filtração especiais, esterilizadas (para evitar
contaminação).

O processo é, então, parecido com a contagem de aeróbios em


meio de cultura: as bactérias retidas são inoculadas em placas de
Petri contendo meio e incubadas. Veja um exemplo na imagem
a seguir.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.7 - Método de contagem microbiana pela técnica de membranas filtrantes.


Fonte: Disponível em: <http://www.e-escola.pt/topico.asp?id=307&ordem=4>.
Acesso em: 27 set. 2010.

Unidade 2 117
Universidade do Sul de Santa Catarina

d. Determinação de coliformes por tubos múltiplos

A técnica de tubos múltiplos possibilita a determinação do


número mais provável (NMP) de coliformes em uma amostra.
São feitos os testes presuntivo (inicial) e confirmativo (final), para
chegar-se ao resultado desejado.

A metodologia de Número Mais Provável (NMP) é amplamente


utilizada em laboratórios de microbiologia de alimentos ou
ambiental (Figura 2. 8), na quantificação de micro-organismos
em água, leite e outros produtos.

Esta metodologia é basicamente utilizada para a pesquisa de


coliformes totais e coliformes fecais, que são micro-organismos
indicadores de poluição fecal, o que pode ter como consequência
a presença de outros organismos, tais como protozoários e vírus.
Esta técnica foi desenvolvida após análises estatísticas complexas.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.8 - Determinação do NMP (Número Mais Provável). Fonte: Disponível em: <http://
helenamazzotti.blogspot.com/2009/11/sobrevivencia-de-coliformes.html>. Acesso em: 27 set. 2010.

A determinação do NMP é realizada inoculando-se 3 séries de 5


tubos, com 10, 1 e 0,1 ml da água ou do produto homogeneizado
em solução salina, em meios seletivos para coliformes totais
contendo tubos de Durham invertidos em seu interior. Estes são
incubados por 48 horas a 37°C, sendo então analisados quanto
ao crescimento e à presença de gás no interior dos tubos de
Durham.

118
Processos de Engenharia Biológica

O resultado é considerado como positivo para a presença de


coliformes totais. Amostras dos tubos positivos são, então,
replicadas para caldos seletivos para coliforme fecais, também
contendo tubos de Durham, os quais são incubados por mais
24 ou 48 horas a 42° C. De todos os tubos positivos faz-se uma
semeadura em placa com meio seletivo e posterior identificação
bioquímica.

De acordo com o número de tubos que apresentam gás,


determina-se o NMP, pela consulta de uma tabela desenvolvida
por Hoskins (1934). Este é um teste apenas presuntivo para a
presença de coliformes. A Tabela 2.7 mostra um exemplo das
características biológicas e os indicadores estudados.
Tabela 2.7 – Parâmetros Biológicos e sua importância na qualidade ambiental.
Para interpretar esta
Nome dos Parâmetros Unidades Uso ou Significados tabela, tenha em
consideração as seguintes
Microbiologia (Coliformes, Pesquisa microbiológica e siglas:
Escherichia coli, Enterococcus NMP/100mL verificação da efetividade dos
faecalis) processos de desinfecção. NMP (Número Mais
Provável);
Outros organismos (Bactérias,
Normalmente são pesquisados nos UT (Unidade de
protozoários, helmintos e NMP/100mL casos de reuso de efluentes.
vírus) Toxicidade);
CENO (Concentração
São utilizados para verificar a Máxima de Efeito Não
toxicidade de uma substância
Observado).
específica ou de efeito sinergético
Toxicidade aguda e crônica
(que age simultaneamente com
(Peixes microcrustáceos e UT, CENO outro composto) de diversos
microalgas)
poluentes identificados, ou não,
na amostra, relacionando-se ao
impacto da biota do corpo receptor.

Fonte: GIORDANI, 2003, p. 14.


Esta tabela pode ser
Técnica de Tubos Múltiplos com Substrato Cromogênico encontrada no “Standard
Methods for the
Examination of Water and
Para a detecção do grupo Enterococcus, pode ser utilizada a
Waste Water”, 1971.
técnica de tubos múltiplos, porém vamos apresentar uma
metodologia mais avançada desta técnica, que utiliza um meio
cromogênico (caldo Chromocult Enterococci®, da MERCK).

A técnica consiste na inoculação de 10mL das diluições decimais


das amostras em tubos contendo caldo Chromocult Enterococci®
em concentração dupla. Os tubos são incubados a 35ºC durante

Unidade 2 119
Universidade do Sul de Santa Catarina

24 horas. São considerados positivos os tubos cujos meios


apresentem coloração esverdeada, conforme mostra a Figura
2.9. O resultado é reportado em NMP/100mL de Enterococcus,
conforme combinação dos tubos positivos.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.9 - Técnica dos Tubos Múltiplos Cromogênios (caldo Chromocult Enterococci®, da MERCK)
demonstrando positividade (mudança de cor de amarelo para verde) na presença de grupo
Enterococcus.
Fonte: Machado, 2004, p. 82.

e. Testes bioquímicos

As provas bioquímicas são amplamente utilizadas para


diferenciar e identificar bactérias por meio de suas atividades
enzimáticas. Algumas das principais provas bioquímicas
normalmente utilizadas para identificação dos micro-organismos
de interesse médico e indicadores ambientais são meio de Rugai
Modificado, indol, degradação da ureia, motilidade, sulfeto de
hidrogênio, citrocromo oxidase, coagulase, prova de oxidação/
Fermentação (OF) e fermentação do manitol. Na imagem a
seguir, veja um exemplo de prova bioquímica Rugai Modificado
da colônia isolada de Pseudomonas aeruginosa.

120
Processos de Engenharia Biológica

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.10 - Prova bioquímica Rugai Modificado (IMVC- indol, vermelho-de-metila, Voges-
Proskauer-citrato), da colônia isolada de Pseudomonas aeruginosa.
Fonte: MACHADO, 2004, p. 79.

Os micro-organismos realizam variadas atividades bioquímicas


utilizando nutrientes do ambiente que os rodeia Essas reações
que ocorrem dentro ou fora das células são catalisadas por
enzimas. Geralmente, o metabolismo origina produtos finais cuja
detecção pode auxiliar na identificação. Como exemplo, citamos:

INDOL – O indol é produzido pela ação da triptofanase sobre


o triptofano existente no meio de cultura, ocorrendo, também, a
produção de ácido pirúvico e amônia. O indol pode ser detectado
pela formação de um anel rosa (pink) na parte superior do tubo,
após a adição de p-dimetilaminobenzaldeído (reativo de Erlich).

VM – Teste que avalia se as bactérias fermentam a glicose pela


via ácida mista, com a produção de vários ácidos (ácido fórmico,
lático, acético), o que prova o abaixamento do pH a menos 4,4,
que é o limite de viragem do indicador de pH. O indicador
de pH é o vermelho de metila que, em pH abaixo de 4,4, é
vermelho, e, acima de 6, é amarelo.

VOGESPROSKAUER – Há bactérias que utilizam a


fermentação butilenoglicólica. Fermentam a glicose produzindo
acetil-metil-carbinol (acetoína), butilenoglicol e pequenas
quantidades de ácidos. Quando KOH é adicionado, e na presença
de O2 atmosférico, a acetoína é oxidada a diacetil. A adição de

Unidade 2 121
Universidade do Sul de Santa Catarina

alfa-naftol nesta reação catalisa a produção de um anel vermelho-


tijolo, após 10-15 minutos.

CITRATO – Este teste determina se a bactéria é capaz de


utilizar o citrato de sódio como única fonte de carbono para o
metabolismo em crescimento. Deve ser utilizado o meio Citrato
de Simmons, contendo citrato de sódio, fosfato de amônia e azul
de bromotimol.

f. Métodos Avançados utilizando técnicas biotecnológicas


(TecBio)

Contrastando com os procedimentos convencionais, dependentes


de crescimento para identificação de bactérias, o uso de
ferramentas da biotecnologia como de provas com substratos
cromogênicos de enzimas permite ao laboratório identificar
numerosas espécies de micro-organismos. São métodos rápidos
de detecção e identificação de bactérias.

A Biotecnologia pode ser aplicada como uma ferramenta de


análises biológicas. Os substratos cromogênicos de enzimas
detectam enzimas pré-formadas nas bactérias e permitem
a identificação rápida de micro-organismos específicos em
comparação com os métodos clássicos de identificação, que
incluem o crescimento em meios seletivos e diferenciais, as
características das colônias e a morfologia celular em esfregaço
corados por Gram (SCHAECHTER et Al., 2002).

As principais técnicas (TecBio) rápidas de detecção e


identificação de bactérias são:

 Técnica de Substrato Cromogênico


Técnica de identificação rápida de espécies bacterianas pela
detecção de características fenotípicas. Baseia-se na síntese de
São as características compostos incolores que originam produtos de hidrólise coloridos
observáveis ou caracteres diretamente ou após adição de um reagente. Os substratos
de um organismo como, enzimáticos comumente utilizados para identificação de bactérias
por exemplo:
são as enzimas glicosidase e aminopeptidase.
morfologia,
desenvolvimento,
propriedades bioquímicas,
etc.

122
Processos de Engenharia Biológica

 Provas com Substratos Fluorogênicos


Outra aplicação relacionada aos testes rápidos é o uso de
substratos fluorogênicos para a detecção de enzimas bacterianas
e a identificação de micro-organismos. Estes substratos são
compostos de moléculas de carboidratos ou de aminoácidos,
unidos por ligações glicosídicas ou peptídicas, que originam
produtos finais fluorescentes quando hidrolisados por enzimas
bacterianas.

Os meios cromogênicos e fluorogênicos (veja imagens abaixo)


foram desenvolvidos buscando ser seletivos e indicadores.
Atualmente, diversos meios de cultura que incorporam
substâncias cromogênicas e fluorogênicas em sua fórmula estão
disponíveis no mercado. Como exemplo podem ser citados os
seguintes kits: Colilert e Enterolert da IDEX e o Chromocult,
Fluorocult e Readycult da MERCK.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 2.11 - Técnica de Substrato Cromogênico e Fluorogênico.


Fonte: Machado, 2004, p. 77.

Um dos problemas técnicos encontrados no dia a dia é


a inexistência de metodologias específicas para análise
microbiológica de líquidos lixiviados de aterro sanitário.
Quando estas metodologias precisarem ser aplicadas,
você deverá buscar fontes oficiais internacionais como,
por exemplo, no Standard Methods for the Examination
of Water and Wastewater (AWWA/APHA/WEF, 1998) e
o Compendium for the Microbiological Methods of Food
(APHA/2001), para análise microbiológica de água e de
alimentos, respectivamente.

Unidade 2 123
Universidade do Sul de Santa Catarina

Até aqui você estudou algumas técnicas de identificação


microbiológica, porém o critério bacteriológico não basta para
a classificação de uma determinada água. As análises físicas e
químicas são também indispensáveis na demonstração de sua
qualidade, especialmente na detecção de substâncias tóxicas ou
mesmo de compostos que prejudiquem esteticamente, podendo
alterar aspectos como o sabor, cor, odor e outras características. A
análise hidrobiológica pode revelar a presença de organismos que,
de muitas e diferentes maneiras, podem afetar as características e
potabilidade da água.

Síntese

Nesta unidade, você aprendeu que a presença da bactéria E.


coli em amostras de água, solo, alimento e demais amostras
ambientais indica poluição fecal, portanto é utilizada como
micro-organismo indicador de contaminação fecal.

Grupos coliformes totais, Grupos coliformes fecais ou


termotolerantes e as bactérias heterotróficas também fazem parte
dos micro-organismos indicadores de qualidade da água.

No entanto, no que diz respeito ao padrão microbiológico de


potabilidade, os indicadores de contaminação clássicos não são
mais aceitos (bactérias do grupo coliforme). Reconhecendo as
limitações dos indicadores tradicionais, novos padrões estão
sendo adotados, principalmente nos países desenvolvidos, como,
por exemplo, a presença das cianotoxinas, mais especificamente
microcistinas, em função do reconhecido problema de saúde
pública decorrente da presença em excesso de cianobactérias em
mananciais eutrofizados. Estes organismos estão sendo chamados
de “micro-organismos emergentes”, conforme estudados na seção
2 desta unidade.

Para caracterizar uma água, são determinados diversos


parâmetros, os quais representam as suas características físicas,
químicas e biológicas. Esses parâmetros são indicadores da
qualidade da água e constituem impurezas quando alcançam
valores superiores aos estabelecidos para determinado uso.

124
Processos de Engenharia Biológica

Os principais indicadores biológicos de qualidade da água são


os coliformes: eles indicam a presença de micro-organismos
patogênicos na água; existem em grande quantidade nas fezes
humanas e, quando encontrados na água, isto significa que a
mesma recebeu esgotos domésticos, podendo conter micro-
organismos causadores de doenças.

As algas desempenham um importante papel no ambiente


aquático, sendo responsáveis pela produção de grande parte do
oxigênio dissolvido do meio; em grandes quantidades, como
resultado do excesso de nutrientes (eutrofização).

Os teores máximos de impurezas permitidos na água são


estabelecidos em função dos seus usos. Esses teores constituem
os padrões de qualidade, os quais são fixados por entidades
públicas, com o objetivo de garantir que a água a ser utilizada
para um determinado fim não contenha impurezas que venham a
prejudicá-lo.

Você também estudou alguns índices, como o VMD -


Indicador não obrigatório e definido como o valor limite de um
contaminante na água. Este indicador determina, com certa
margem de segurança, que nenhum efeito adverso à saúde,
conhecido ou previsível, foi observado. No estabelecimento
do VMD, são levados em consideração apenas aspectos de
saúde, desconsiderando-se outros, tais como limites de detecção
analíticos ou de técnicas para remoção de contaminantes. Em
relação aos aspectos de saúde, são ainda considerados os riscos
a grupos vulneráveis, a exemplo de crianças, idosos e indivíduos
imunocomprometidos.

As principais técnicas de identificação microbiana clássicas ou


avançadas também foram abordadas nesta Unidade. Porém não
são as únicas a serem utilizadas. Tudo irá depender das condições
laboratoriais e do tipo de avaliação ambiental desejada.

Não existem técnicas totalmente seguras, o que existe são


estimativas aproximadas. Técnicas mundiais padronizadas
necessitam ser discutidas e implementadas não só para garantir a
potabilidade das águas mas também para segurança quanto aos
riscos biológicos, físicos e químicos.

Unidade 2 125
Universidade do Sul de Santa Catarina

Atividades de autoavaliação

Ao final de cada unidade, você realizará atividades de autoavaliação. O


gabarito está disponível no final do livro didático. Mas esforce-se para
resolver as atividades sem ajuda do gabarito, pois, assim, você estará
promovendo (estimulando) a sua aprendizagem.
1. As cianobactérias ou cianofíceas (algas azuis) são micro-organismos
aeróbicos fotoautotróficos. Seus processos vitais requerem somente
água, dióxido de carbono, substâncias inorgânicas e luz. A fotossíntese
é seu principal modo de obtenção de energia para o metabolismo.
Entretanto sua organização celular demonstra que esses micro-
organismos são procariontes e, portanto, muito semelhantes
bioquimicamente e estruturalmente às bactérias. Em um texto de
aproximadamente 20 linhas:
a) explique por que este micro-organismo é considerado emergente;
b) indique outros dois organismos considerados emergentes em sistemas
de abastecimento de água para consumo humano;
c) cite pelo menos um acidente ambiental onde estes agentes estiveram
envolvidos;
d) diga qual a relação entre eutrofização e as cianobactérias.

126
Processos de Engenharia Biológica

2. Partindo do que você aprendeu sobre os bioindicadores, associe a


segunda coluna de acordo com a primeira.

( A ) Cianobactérias ( ) Protozoários formadores de cistos

( B ) Criptosporydium sp. ( ) Indicador Biológico

( C ) Giardia lamblia ( ) Algas

( D ) Bactérias heterotróficas ( ) Protozoários formadores de oocistos

( E ) Staphylococcus aureus ( ) Indicador de infecção hospitalar

Unidade 2 127
Universidade do Sul de Santa Catarina

Saiba mais

Se você desejar, aprofunde os conteúdos estudados nesta unidade,


ao consultar as seguintes referências:

BASTOS, R.K.X.; BALILACQUA, P.D.; NASCIMENTO,


L.E.; CARVALHO, G.R.M.;

SILVA, C.V. Coliformes como indicadores da qualidade


da água: alcance e limitações. In: CONGRESSO
INTERAMERIACANO DE ENGENHARIA SANITÁRIA
E AMBIENTAL, 27, 2000. Porto Alegre. Anais... Porto
Alegre: ABES, 2000, p. 1-12. 1 CD-ROM.

CETESB. Norma técnica L5.202: coliformes totais e fecais –


determinação do número mais provável pela técnica de tubos
múltiplos. São Paulo: 1998. 39p.

ITAL/INSTITUTO DE TECNOLOGIA DE
ALIMENTOS. Manual de métodos de análise

microbiológica de água. Campinas: ITAL, Núcleo de


Microbiologia, 2000. 99p.

128
3
UNIDADE 3

Processos naturais e
tecnológicos de remediação

Objetivos de aprendizagem
 Conhecer e analisar os processos aplicados em
tratamentos de líquidos, sólidos e gases.
 Conhecer os tipos de tratamento e aplicação de
biorreatores.

 Através de estudo de casos, conhecer e intervir nos


processos de tratamento industriais, com ênfase no
emprego dos processos biotecnológicos avançados,
relacionando-os com as tecnologias clássicas.

Seções de estudo
Seção 1 Doenças de Veiculação Hídrica

Seção 2 Biotratamentos

Seção 3 Biorreatores

Seção 4 Processos avançados em Biotecnologia


Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


Você estudou, nas unidades anteriores, a importância dos micro-
organismos para a vida humana, o impacto que eles causam
no ambiente e a forma como eles interagem no nosso dia a dia,
tanto trazendo benefícios quanto causando grandes transtornos,
principalmente quando o equilíbrio natural é rompido. Na
grande maioria das vezes, nós somos os verdadeiros causadores
deste desequilíbrio.

Nesta unidade, trataremos de alguns processos biológicos, os


processos de remediação, ou seja, uma vez instalado o problema
ambiental, estudaremos as diversas formas de reverter estes
impactos ambientais. Além disso, estudaremos os mecanismos
(e equipamentos) utilizados para este fim (reatores biológicos) e,
finalmente, através de cases (estudo de casos), veremos alguns dos
processos biotecnológicos utilizados atualmente para tratar os
impactos ambientais ou reduzi-los.

Antes de estudarmos os processos biológicos, estudaremos, na


seção 1, as doenças de veiculação hídrica, para que você possa
entender a necessidade da intervenção humana, cujo objetivo é
minimizar os problemas causados por elas (e outras doenças já
estudadas) no meio ambiente e no nosso cotidiano.

Vamos lá?

Seção 1 – Doenças de Veiculação Hídrica


Segundo a Organização Mundial de Saúde – OMS, 85% das
doenças conhecidas são de veiculação hídrica, ou seja, estão
relacionadas à água.

Neste texto, abordaremos, resumidamente, as doenças e


síndromes veiculadas pelo contato com a água, envolvendo
organismos biológicos. A grande maioria desses agentes é um

130
Processos de Engenharia Biológica

micro-organismo, mas há outros seres que também desencadeiam


doenças, entre eles destacam-se os parasitos.

Os parasitos designam seres vivos associados a outros


(hospedeiro) dos quais extraem alimento e acabam
prejudicando-os, causando doenças. Os parasitos
são todos eucariontes e incluem seres unicelulares
(protozoários), pluricelulares (helmintos) e aqueles
que se localizam externamente aos hospedeiros
(ectoparasitos) e que são artrópodes (insetos e
carrapatos), conforme já foi estudado nas unidades
anteriores.

Simbiose é uma relação


Os seres vivos, ao longo da evolução, adaptaram-se a diversas mutuamente vantajosa
situações adversas e atingiram a atualidade, desenvolvendo entre dois ou mais
mecanismos interativos entre seus semelhantes e entre indivíduos organismos vivos de
de outras espécies. Essas adaptações incluem vários níveis espécies diferentes.

de interdependência, desde a simbiose, até o parasitismo, e


todos estes organismos, sem exceção, dependem da água para Parasitismo se dá em
sobreviver. Ou seja, alguns agentes patogênicos tiveram condições organismos que sofrem
de se desenvolver utilizando a água como mecanismo de ação dos parasitos.
veiculação. Deste modo, alcançam a “vítima” quando ela ingere
água sem tratamento ou entra em contato com coleções de águas
contaminadas (lagoas, charcos, piscinas sem tratamento, etc.)
penetrando nas mucosas (olhos, nariz e boca), pele danificada
(cortes, machucados), ou mesmo, a pele íntegra, comprometendo
a saúde e podendo causar a morte, principalmente de crianças.

A água não tratada é porta de entrada para diversas doenças.


A contaminação funciona como um ciclo, por exemplo, se não
usarmos o banheiro, a fossa ou as redes coletoras, o esgoto ficará
a céu aberto. As fezes e os restos de comida ficarão no quintal,
em volta da casa e nas ruas. Os vermes e os micro-organismos
que vivem no esgoto contaminarão a água e o chão. As pessoas
pisarão no chão descalças ou beberão a água contaminada,
ficando doentes.

Os mesmos insetos que pousam ou andam nas fezes irão para


nossas casas levando as doenças em suas patas e asas. As fezes
dos animais que andam no quintal e nas ruas também ficarão
contaminadas. Assim, se não interviermos, o ciclo continuará
intermitentemente.

Unidade 3 131
Universidade do Sul de Santa Catarina

Você sabia que, hoje em dia, morrem 10 milhões de


pessoas por ano (metade com menos de dezoito anos)
por causa de doenças que não existiriam se a água fosse
tratada?

Então, vamos conhecer algumas das doenças de transmissão


hídrica!

Doenças de transmissão hídrica são aquelas em que a água atua


como veículo de agentes infecciosos. Os micro-organismos
patogênicos atingem a água através de excretas de pessoas
ou animais infectados, causando problemas principalmente
no aparelho intestinal do homem. Essas doenças podem ser
causadas por bactérias, fungos, vírus, protozoários e helmintos.

Doenças de origem hídrica são aquelas causadas por


determinadas substâncias químicas, orgânicas ou
inorgânicas, presentes na água em concentrações
inadequadas, em geral superiores às especificadas
nos padrões para águas de consumo humano. Essas
substâncias podem existir naturalmente no manancial
ou resultar da poluição.

Veremos agora as doenças de veiculação hídrica causadas por


micro-organismos e, também, responsáveis por 16% dos casos de
morte nos primeiros anos de vida no mundo, segundo dados da
UNICEF 2004, conforme o Gráfico 3.1.

132
Processos de Engenharia Biológica

Gráfico 3.1 – Doenças de veiculação hídrica causadas por micro-organismos.


Fonte: Disponível em: <http://7pointplan.org/global-burden-childhood-diarrhoea.html>.
Acesso em: out. 2010.

Conforme o gráfico acima, a diarreia permanece a segunda


causa de morte comum entre crianças, seguindo logo atrás da
pneumonia, o assassino principal de crianças nos primeiros anos
de vida. Juntas, a pneumonia e a diarreia somam quase 40% de
todas as mortes de crianças em torno do mundo, todos os anos.
Quase uma em cinco mortes de crianças ocorre devido à diarreia,
o que representa uma perda de aproximadamente 1.5 milhão de
vidas todos os anos. A soma é maior do que a morte causada pela
AIDS, malária e pelo sarampo juntos.

As principais doenças de veiculação hídrica são a amebíase,


giardíase, gastroenterite, febres tifoide e paratifoide, hepatite
infecciosa e cólera. Indiretamente, a água também está ligada à
transmissão de verminoses, como esquistossomose, ascaridíase,
teníase, oxiuríase e ancilostomíase. (PEGAE, 2007).

Vetores, como o mosquito Aedes aegypti, que se relacionam com


a água, podem ocasionar a dengue, a febre amarela e a malária.
Em todos esses casos, o tratamento da água, higiene pessoal e
condições sanitárias adequadas são formas de evitar as doenças.
(PEGAE, 2007).

Unidade 3 133
Universidade do Sul de Santa Catarina

Na unidade 2, estudamos os agentes dessas doenças, agora


comentaremos a forma de contágio e como prevenirmos estas
doenças de veiculação hídrica.

Doença: Giardíase e criptosporidíase


A giardíase é causada pela Giardia lamblia, e a criptosporidíase,
pelo Cryptosporidium parvum. Ambos vivem nas porções altas do
intestino, sendo mais frequentes em crianças.

Qual a forma de infecção?

A transmissão se faz pela ingestão de cistos. O contágio pode


acontecer pelo convívio direto com o indivíduo infectado, pela
ingestão de alimentos e água contaminados, pelo contato com
moscas, etc.

Como prevenimos esta doença?

A infecção é adquirida com extrema facilidade, sobretudo pelas


crianças. Fazem-se, aqui, as mesmas recomendações firmadas
para a prevenção da amebíase.

Doença: Amebíase
Geralmente, fala-se de ameba (Entamoeba) sempre que há
diarreias persistentes. A Entamoeba coli é um parasita que se
localiza no intestino humano, mas que não o prejudica. Este tipo
de ameba, portanto, não precisa ser eliminado. Já a Entamoeba
hystolitica é prejudicial e precisa ser eliminada.

Qual a forma de infecção?

Estes parasitos são eliminados com as fezes que, se deixadas


próximas a rios, lagoas, fossas, podem contaminar a água.

134
Processos de Engenharia Biológica

Moscas e baratas, ao se alimentarem de fezes de pessoas


infectadas e defecar sobre os alimentos ou utensílios, também
transmitem a parasitose a outras pessoas.

Outra forma de transmissão é pelo contato das patas sujas de


fezes. Pode-se, ainda, contrair a ameba ao se ingerirem frutas e
verduras cruas, as quais foram regadas com água contaminada ou
adubadas com terra misturada a fezes humanas infectadas. Muito
frequente é a contaminação pelas mãos sujas de pessoas que
lidam com os alimentos.

Como prevenimos esta doença?

 Fazer com que todos da casa usem a privada. Se as crianças


menores usarem fraldas, embalar as fraldas sujas em sacos de lixo
fechados. Em caso de uso de penicos infantis, as fezes devem ser
jogadas na privada.
 Proteger todos os alimentos contra moscas e baratas.
 Proteger as águas das minas, cisternas, poços, lagoas, açudes e
valas de irrigação, não permitindo que sejam contaminadas por
fezes humanas.
 Regar as verduras sempre com água limpa, não aproveitando
nunca a água utilizada em casa ou água de banho.
 Lavar bastante as verduras em água corrente.
 Lavar as mãos com sabão e água corrente todas as vezes que
usar a privada.
 Lavar muito bem as mãos antes de iniciar a preparação dos
alimentos.
 Fazer, regularmente, exame de fezes, para detectar o parasito.

Doença: Gastroenterite
A gastroenterite é um termo geral que se refere a um grupo de
distúrbios cujas causas são as infecções e cujos sintomas incluem
a perda de apetite, a náusea, o vômito, a diarreia de leve a intensa,
a dor tipo cólica e o desconforto abdominal. Juntamente com a
água, ocorre a perda de eletrólitos (sobretudo de sódio e potássio)

Unidade 3 135
Universidade do Sul de Santa Catarina

do organismo. Para o adulto saudável, o desequilíbrio eletrolítico


é apenas inconveniente. No entanto ele pode causar uma
desidratação potencialmente letal em indivíduos muito doentes,
muito jovens ou idosos. Esta é uma infecção do estômago e do
intestino produzida, principalmente, por vírus ou bactérias. É
responsável pela maioria dos óbitos em crianças menores de um
ano de idade.

Quais são os principais agentes microbianos?

Geralmente, as gastroenterites são causadas por micro-


organismos presentes na água ou em alimentos contaminados por
fezes infectadas. Podem ser transmitidas de pessoa para pessoa,
sobretudo quando um indivíduo com diarreia não realiza higiene
adequada após evacuar.

Além das bactérias, vários vírus causam gastroenterite. Os


rotavírus (um tipo de vírus) causam a maioria dos casos de
diarreia grave, exigindo a internação de lactentes e crianças
maiores, sendo o maior causador de mortes em crianças menores
de 5 anos com diarreia, no mundo. Essa é uma afirmação
preocupante, tendo em vista que os registros não são completos,
inclusive no Brasil.

Qual a forma de infecção?

A incidência é maior nos locais em que não existe tratamento


de água, rede de esgoto, água encanada e destino adequado para
o lixo.

É necessário comunicar os casos diagnosticados desta


doença aos órgãos de vigilância epidemiológica?

Sim, quando for causado por vírus, especificamente


ROTAVÍRUS. Informações sobre surtos de diarreia devem ser
notificados à Divisão de Doenças de Transmissão Hídrica e
Alimentar – DDTHA, do Centro de Vigilância Epidemiológica
– CVE, Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Inclusive,

136
Processos de Engenharia Biológica

dados de 2006 neste órgão apontam que os surtos por rotavírus


já representam cerca de 20% do total de surtos de diarreia
notificados, ocorrendo principalmente em creches ou em
hospitais.

Como prevenimos esta doença?

 Saneamento, higiene dos alimentos, combate às moscas e uso


de água filtrada ou fervida.
 O uso do leite materno é importante na profilaxia, pois é um
alimento isento de contaminação, além de apresentar fatores
de defesa na sua composição. Estímulo ao aleitamento materno
parece ter fundamental importância pelos altos níveis de
anticorpos contra o rotavírus.
 Surtos de diarreia devem ser notificados imediatamente à
Vigilância Epidemiológica (Município) ou à Regional de Saúde
(DIR).
A gastroenterite pode ter também outras causas, como a ingestão
de substâncias tóxicas, na intolerância à lactose, na ingestão
acidental de metais pesados (arsênico, chumbo, mercúrio
ou cádmio), no uso de alguns medicamentos (antibióticos,
principalmente) e no contato com répteis (tartaruga ou iguana).

Os sintomas dependem do tipo e da quantidade do micro-


organismo ou da toxina ingerida e de acordo com a resistência do
indivíduo à doença. Frequentemente, os sintomas iniciam-se de
forma súbita e, algumas vezes, dramática, com perda do apetite,
náusea ou vômito.

À medida que os sintomas melhoram, o indivíduo pode adicionar


gradualmente alimentos leves (cereais cozidos, bananas, arroz,
compota de maçã e torradas) à sua dieta. Como os antibióticos
podem causar diarreia e estimular o crescimento de micro-
organismos resistentes a eles, raramente eles são adequados,
mesmo quando uma bactéria conhecida é a causadora da
gastroenterite. No entanto os antibióticos podem ser usados
quando a causa do distúrbio envolve determinadas bactérias,
como Campylobacter, Shigella e Vibrio cholerae.

Unidade 3 137
Universidade do Sul de Santa Catarina

Doença: Febres tifoide e paratifoide


É uma doença grave, produzida pela bactéria Salmonella typhi.
Evolui, geralmente, num período de quatro semanas. Do
momento em que a pessoa adquire a infecção até o aparecimento
dos primeiros sintomas, decorrem de 5 a 23 dias (período de
incubação). A fonte de infecção é o doente, desde o instante em
que ingeriu os bacilos até muitos anos depois, já que os bacilos
persistem em suas fezes. A doença pode ser fatal, se não tratada,
e mata cerca de 10% de todas as pessoas infectadas.

Como todas as bactérias Gram-negativas, elas têm LPS


(lipopolissacarídeo), que é um poderoso indutor de resposta
imune, vasodilatação sistêmica e possível morte por choque
séptico. Além disso, a sua disseminação e multiplicação nos
órgãos podem causar danos graves.

A febre paratifoide é mais rara que a tifoide. Produzida


pela Salmonella paratyphi dos tipos “A”, “B” ou “C”, sua
fonte de infecção é a mesma da febre tifoide: doentes e
portadores.

A S. typhi é bastante resistente ao frio e ao congelamento.


Também resiste ao calor de 60°C por 1 hora. Entretanto é pouco
resistente à luz solar. Sobrevive em meio úmido, sombrio e na
água. É bastante sensível ao hipoclorito, motivo pelo qual a
cloração da água é suficiente para sua eliminação. A transmissão
é fecal-oral, na maioria das vezes, através de comida contaminada
por portadores durante o processo de preparo e manipulação
dos alimentos. A água também é um veículo de transmissão,
podendo ser contaminada no próprio manancial (rio, lago ou
poço), ou ainda, por contaminação na rede de distribuição
(quebra de encanamento, pressão negativa na rede, conexão
cruzada).

Qual a forma de infecção?

138
Processos de Engenharia Biológica

A doença se transmite pelas descargas do intestino (fezes), que


contaminam as mãos, as roupas, os alimentos e a água. O bacilo
tifoide é ingerido com os alimentos e a água contaminada.

A possibilidade de transmissão permanece pelo tempo em que


existirem bacilos sendo eliminados nas fezes ou na urina, o que
geralmente acontece desde a primeira semana da doença até a
convalescença. Cerca de 10 % dos doentes eliminam bacilos até
3 meses após o início do quadro clínico e 1 a 5 % até um ano e,
provavelmente, por toda a vida (portadores crônicos).

O período de incubação é de uma a três semanas, em função da


dose infectante e da sensibilidade do paciente. Após o período de
incubação surge, de forma gradual, a febre, dor de cabeça, mal-
estar geral, dor abdominal e falta de apetite. Durante a primeira
e segunda semana, a febre se mantém alta (39 a 40ºC) e cerca
de 10 % dos casos apresentam manchas avermelhadas no tronco
(roséola tífica). Nesta fase da doença, a obstipação intestinal é
mais frequente que a diarreia, porém, à medida que aumenta o
comprometimento intestinal, pode surgir diarreia com sangue.

Como prevenimos esta doença?

 Destinar convenientemente os dejetos humanos em fossas ou


redes de esgotos.
 Tratar a água.
 Combater as moscas.
Efetuar exame e vacinação e promover a educação sanitária dos
manipuladores de alimentos.
 Higienizar os alimentos.

Doença: Cólera
Doença infecciosa intestinal aguda, de transmissão
predominantemente hídrica, que se caracteriza, em sua forma
mais evidente, por diarreia aquosa súbita, profusa e sem dor,
vômitos ocasionais, desidratação rápida, acidose e colapso
circulatório, causada pelo bastonete Vibrio cholerae.

Unidade 3 139
Universidade do Sul de Santa Catarina

Em casos graves não tratados, a pessoa pode morrer em horas e a


taxa de mortalidade exceder 50%. Com tratamento adequado, a
taxa é menor que 1%. O vibrião colérico produz enterotoxina que
parece ser totalmente responsável pela perda maciça de líquidos.

O Vibrio cholerae é uma bactéria Gram-negativa e se apresenta


na forma de bastonete encurvado. É um bacilo móvel e pode ser
classificado em 2 biotipos: o clássico e El Tor.

Qual a forma de infecção?

O Vibrio cholerae eliminado pelas fezes e vômito de pessoas


infectadas, sintomáticas ou não, pode transmitir-se a outras
pessoas de 2 modos:

1. ingestão de água ou de alimentos contaminados –


via mais frequente e responsável pelas epidemias
(transmissão indireta);
2. através das mãos contaminadas (do próprio infectado
ou de alguém responsável por sua higiene pessoal ou de
sanitários), levadas à boca (transmissão direta) – menos
frequente.
O período de incubação varia entre dois a três dias, com
extremos de apenas algumas horas até cinco dias.

Cuidados especiais: Experimentalmente, o vibrião colérico


pode sobreviver de 10 a 13 dias, em temperatura ambiente, e
até 60 dias em água do mar sob refrigeração. Em água mineral
engarrafada, sua sobrevivência atinge até 19 dias. As observações
em ambiente marinho assinalam a maior sobrevivência em águas
costeiras e estuarinas, em contraposição às de alto mar. Esse
fenômeno é importante, embora ainda não de todo explicado.
Em águas doces superficiais, constata-se a existência de relação
entre a presença de esgoto humano e o V. cholerae. Entretanto
o isolamento do vibrião nas águas superficiais e de estuários
somente é possível quando a contaminação fecal é constante.

É necessário comunicar os casos diagnosticados desta


doença aos órgãos de vigilância epidemiológica?

140
Processos de Engenharia Biológica

A conduta epidemiológica depende do nível de


comprometimento, se suspeito ou caso confirmado. A
confirmação só pode ser feita após exames laboratoriais. A
notificação deve ser efetuada o mais rápido possível pelo
serviço que realizou o atendimento do caso suspeito ao órgão
de Vigilância Epidemiológica responsável por sua região ou
à Central de Vigilância Epidemiológica. Além disso, deve
acionar a Vigilância Sanitária e os órgãos de Saneamento e Meio
Ambiente para o desencadeamento de medidas de prevenção do
alastramento da doença no meio ambiente. Existe ainda, em São
Paulo, a Comissão Estadual de Controle e Prevenção da Cólera
que acompanha o programa de controle e prevenção da cólera.

Como é realizada a prevenção desta doença?

A Vigilância Sanitária deverá inspecionar a área onde


ocorreram os casos ou o caso, em conjunto com os órgãos de
saneamento e meio ambiente, para verificação dos sistemas
de água para consumo humano, esgotamento sanitário,
drenagem, coleta e disposição de lixo, com vista a garantir a
proteção dos mananciais, qualidade das águas de abastecimento
público, orientação às populações desprovidas dos sistemas
de abastecimento público, orientações de higiene, limpeza e
desinfecção de reservatórios domiciliares, outras orientações
educativas relativas ao preparo e cocção de alimentos, desinfecção
de verduras e frutas, cuidados pessoais de higiene, etc. Os
cuidados com os alimentos e a água são fundamentais.

Medidas devem ser tomadas para garantir a pureza e tratamento


da água para beber, lavar pratos, recipientes, etc. Em regiões
onde o abastecimento da água é público, verificar se está
sendo devidamente clorada. As medidas de higiene, preparo,
manipulação e cocção dos alimentos, de proteção contra as
moscas e contaminação devem ser divulgadas para a família e
para toda a comunidade, para evitar o alastramento da cólera.

Unidade 3 141
Universidade do Sul de Santa Catarina

Doença: Hepatite A
O agente etiológico é um vírus RNA, possuindo um único
sorotipo, classificado como Hepatovírus. Este vírus está
distribuído largamente em todo o mundo, a ocorrência pode ser
esporádica ou epidêmica, com a tendência a ciclos recorrentes. Em
países em desenvolvimento, os adultos são usualmente imunes,
pois são acometidos na infância, devido às precárias condições de
saneamento e, portanto, as epidemias não são comuns.

Qual a forma de infecção?

Em creches, é comum a transmissão da doença em crianças e,


a partir delas, para seus contatos domiciliares. As epidemias
evoluem, em geral, lentamente, nos países desenvolvidos,
envolvendo grandes áreas geográficas e persistindo por muitos
meses. A hepatite A pode ser transmitida também por via
sexual, no contato com casos na fase aguda. Viajantes de áreas
de baixa circulação do vírus podem se infectar quando vão para
países onde a doença é endêmica. Epidemias por fonte comum
podem evoluir explosivamente, e, atualmente, observam-se
surtos frequentes em comunidades abertas, sendo a água, ou
alimentos contaminados por manipuladores, as principais fontes
de transmissão.

O modo de transmissão é pessoa a pessoa pela via fecal-oral. O


agente da infecção é encontrado nas fezes, alcançando níveis de
pico uma ou duas semanas antes do aparecimento dos sintomas
ou da disfunção hepática, diminuindo rapidamente em seguida,
concomitantemente com o aparecimento na circulação dos
anticorpos para o VHA.

Foram relatadas fontes comuns devido à contaminação da água


e também por contaminação dos alimentos pelos preparadores/
manipuladores de alimentos. Vários tipos de alimentos podem
estar implicados, inclusive, os cozidos, se contaminados por
contato manual após o cozimento. Alimentos crus, como frutas
(especialmente morangos), verduras (alface e outras verduras de
folha) e mariscos podem transmitir a doença, quando cultivados
com água contaminada.

142
Processos de Engenharia Biológica

É necessário comunicar os casos diagnosticados desta


doença aos órgãos de vigilância epidemiológica?

As medidas de controle incluem:


a) notificação compulsória de casos às autoridades de
vigilância epidemiológica, para que se desencadeie a
investigação de fontes e o controle da transmissão através
de medidas preventivas (educativas e imunização passiva
dos contatos);
b) é obrigatória a notificação de surtos (dois ou mais casos)
às autoridades de vigilância epidemiológica municipal,
regional ou central.

Como é realizada a prevenção desta doença?

As medidas preventivas incluem:

a) educação da população quanto às boas práticas de


higiene pessoal, com especial ênfase na lavagem rigorosa
das mãos após contato com lixo, uso do banheiro,
após manipular e trocar fraldas de crianças, antes da
preparação de alimentos, antes de se alimentar, após
contato manual com frutas e verduras não lavados ou
carnes e outros alimentos crus;
b) medidas de saneamento básico, com a rede pública de
esgoto ou construção de instalações sanitárias adequadas,
evitando o despejo de esgoto em córregos ou a céu
aberto, são essenciais para a redução da circulação do
vírus;
c) vigilância da qualidade da água, com monitoramento
do sistema de abastecimento público feito pelos órgãos
competentes (cloro residual deve ser de 0,2 a 0,5 mg/l).
Nos locais sem água tratada, esta deve ser fervida por,
pelo menos, 1 minuto após o levantamento das bolhas
de fervura, ou ser tratada com adição de hipoclorito de
sódio 2,5%, 1 a 2 gotas por litro. É necessário proceder à
limpeza das caixas d’água e higienizar utensílios e filtros
caseiros;
d) cuidados com os alimentos – devem ser bem cozidos,
especialmente, mariscos e frutos do mar e protegidos
contra moscas;

Unidade 3 143
Universidade do Sul de Santa Catarina

e) orientação das creches e pré-escolas e instituições


fechadas quanto à necessidade de medidas rígidas de
higiene e prevenção, com especial ênfase na lavagem
das mãos para minimizar a transmissão fecal-oral,
desinfecção de objetos, bancadas, chão, berços, utensílios
e na disposição sanitária de fraldas, fezes, etc.;
f) proteção de viajantes para áreas endêmicas –
recomenda-se uma dose profilática de vacina para a
hepatite A;
g) imunização com a vacina anti-hepatite A.
Como visto anteriormente, um vasto número de doenças é
veiculado pelas águas; o esgoto está formado por excrementos
(fezes e urina), águas de uso doméstico (banho, lavado de roupas,
etc.) e, eventualmente, alguns rejeitos de origem industrial.
Ao ser liberado diretamente nos cursos de água, desestabiliza
as populações microbianas, que se multiplicam rapidamente,
consumindo o oxigênio e provocando a morte de peixes e
crustáceos. (MALAJOVICH, 2004).

Se você desejar maiores informações sobre as doenças


de veiculação hídrica, acesse os seguintes sites:
Secretaria do meio ambiente do Estado de São
Paulo: <http://www.ambiente.sp.gov.br>
(Acesso em: out. 2010)
Centro de vigilância epidemiológica: <ftp://ftp.cve.
saude.sp.gov.br/doc_tec/imuni/if_rota06.pdf>
(Acesso em: out. 2010)
Informações sobre doenças de transmissão hídrica
e alimentar: <http://www.cve.saude.sp.gov.br/htm/
hidrica/DTA_ROTVAG03.htm> (Acesso em: out. 2010)
Portal da saúde: <http://portal.saude.gov.br/portal/
svs/visualizar_texto.cfm?idtxt=2162>
(Acesso em: out. 2010)

Partindo do princípio de que qualquer ambiente contém a sua


biota “normal” e que o desequilíbrio ocorre, ou por excesso de
nutrientes nestes ambientes (fazendo com que esta população
“normal” aumente desordenadamente), ou por competição
com outras espécies oriundas dos esgotos (micro-organismos
veiculados pela água, micro-organismos veiculados pelos
alimentos, etc.), que estratégias devem ser tomadas para remediar este
impacto biológico no ambiente tornando-o menos perigoso a todos os
habitantes da natureza? A resposta é:
O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.
144
Processos de Engenharia Biológica

Para definirmos o desenvolvimento sustentável, é necessário


refletir sobre dois aspectos importantes. Primeiro: qual o impacto
das atividades humanas sobre o meio ambiente? Segundo: qual o
legado que deixaremos para as próximas gerações?

Assim, podemos dizer que desenvolvimento


sustentável é a “capacidade de atender às
necessidades do presente sem comprometer a
capacidade das gerações futuras em atender suas
próprias necessidades.” (MALAJOVICH, 2004).

Veremos, a partir de agora, formas de remediar, através de


processos de tratamento destes resíduos – também chamados
Biotratamentos –, parte dos problemas ambientais que podem
veicular um vasto número de micro-organismos patogênicos aos
homens e animais.

Seção 2 – Biotratamentos
Antes de iniciarmos esta abordagem, será necessário lembrar
alguns conceitos discutidos em outras disciplinas, entre eles a
biodegradação, biometanização, xenobióticos e biorremediação.

A biodegradação: é a decomposição de um material


em componentes mais simples por organismos vivos.
Este processo biológico envolve dois fatores essenciais:
a nutrição e a respiração. Refere-se à transformação de
moléculas xenobióticas por micro-organismos aeróbicos
(compostagem) e anaeróbicos (biometanização ou
biogás).
Xenobióticos: do grego, xenos = estranho – são
compostos químicos estranhos a um organismo ou
sistema biológico.
Biometanização: processo que causa a decomposição
de matéria orgânica, gerando metano.

A biorremediação se consolidou como líder no rol das


tecnologias inovadoras na remediação de áreas degradadas na
década de 80.

Unidade 3 145
Universidade do Sul de Santa Catarina

Esta tecnologia utiliza agentes biotecnológicos, particularmente


os micro-organismos, para remover poluentes tóxicos do
ambiente, principalmente do solo e da água. Refere-se ao uso
de micro-organismos para detoxificar áreas contaminadas
(Figura 3.1).

Na biorremediação, o contaminante funciona como fonte


de carbono para os micro-organismos, sendo necessário o
fornecimento de nutrientes como nitrogênio e fósforo, bem como
um agente oxidante, que funciona como receptor de elétrons,
além de outros nutrientes específicos para cada contaminante.

Os micro-organismos fazem uso da matéria orgânica constituída


de um resíduo, seja ele sólido ou líquido, servindo-se de uma boa
parte desta para a sua autoconstrução e reprodução. O restante
é oxidado por meio da respiração, aproveitando sua energia e
compensando ao meio elementos na forma de subprodutos do
seu metabolismo. Desta maneira, carbono, nitrogênio e fósforo,
etc., que faziam parte das moléculas orgânicas dos resíduos, são
devolvidas ao meio (ar, água, solo) na forma de compostos mais
simples, como gás carbônico, fosfatos, nitratos, etc. Veja a Figura
3.1, que resume as estratégias de biorremediação.

Um grande volume de biomassa pode ser processado por meio de


vastos processos produtivos e objetivando uma grande diversidade
na produção final de produtos, como alimentos, bioenergia,
bioplásticos, papel, celulose e outros produtos químicos.
(SACHS, 1997).

Figura 3.1 – Estratégias de biorremediação.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, p. 23.

146
Processos de Engenharia Biológica

Os problemas que exigem biorremediação são muito pontuais,


de modo que cada um deles demanda um tratamento particular.
Como não há um produto a patentear, mas um serviço a prestar,
a tecnologia está em mãos de organizações governamentais ou de
pequenas firmas que agem localmente.

Em condições adequadas, todos os compostos naturais podem


ser biodegradados (Tabela 3.1). As populações microbianas
mistas do ambiente degradam as substâncias orgânicas através
de numerosas reações, sem que sejam necessários assépticos
ou culturas puras. Em condições aeróbias, os produtos finais
da mineralização da matéria orgânica são dióxido de carbono
(CO2) e água; em condições anaeróbias, forma-se biogás
(biometanização).

Tabela 3.1 – Principais contaminantes do meio ambiente capazes de sofrer degradação ou


transformação.

CATEGORIA EXEMPLO

 Metais (cádmio, mercúrio, prata, chumbo, cobre,


Inorgânicos nitratos, nitritos, fosfatos, cianetos, asbestos).

 Efluentes e resíduos sólidos de origem


doméstica, agrícola e industrial.
 Resíduos petroquímicos: petróleo, gasóleo,
compostos aromáticos e industrial.
 Produtos sintéticos: pesticidas
organoalogenados como bifeniles policlorados
Orgânicos (PCBs) ou hidrocarbonetos poliaromáticos
(PHAs).
 Gasosos: Dióxido de enxofre (SO2), dióxido de
carbono (CO2), óxidos nitrosos (NOx), metano
(CH4).
 Compostos voláteis: clorofluorocarbonetos
(CFCs), compostos orgânicos voláteis (COCs).

Fonte: MALAJOVICH, 2004, p.22.

Todos os resíduos que são biodegradados (agrícolas e urbanos,


metais procedentes das atividades extrativas e industriais
– cádmio, zinco, chumbo, selênio) permanecem no ambiente,
em concentrações tóxicas. Sua absorção e concentração

Unidade 3 147
Universidade do Sul de Santa Catarina

(bioacumulação) por plantas tolerantes aos metais reduzem a


toxicidade do solo e facilitam sua remoção em faixas de terreno
pouco profundas.

Existem já plantas geneticamente modificadas para


transformar os compostos organomercuriais formados
em diversas atividades (extração de carvão e de ouro,
etc.) em uma forma volátil muito menos tóxica.

Um problema de difícil solução é a detecção e eliminação das 60


a 70 milhões de minas antipessoais espalhadas no mundo. Uma
Minas terrestres possível saída parece ser a utilização de plantas de Arabidopsis
antipessoais transgênicas (Aresa, Dinamarca). Estas plantas, portadoras
são projetadas de genes microbianos, degradam a trinitroglicerina (TNT),
especificamente para
liberando NO2, que é absorvido pela planta, modificando, três
repelir soldados a pé
ou fazê-los tomar
semanas mais tarde, a cor das folhas.
outro caminho. Estas
minas podem matar ou A procura por micro-organismos com características especiais é
incapacitar suas vítimas, e o primeiro passo para resolver problemas ambientais. Alguns já
são detonadas por pressão, conhecidos: Deinococcus radiodurans, resistente à radiação; Bacillus
um arame esticado ou
infernus, resistente a altas temperaturas; Methanococcus jannaschi,
remotamente
resistente a pressões de até 230 atmosferas e a altas temperaturas,
etc.

Como ocorrem os tratamentos?

Existem vários métodos para retirar substâncias recalcitrantes do


meio ambiente. As opções contemplam a construção de barreiras
físicas, a lavagem ou ventilação do solo contaminado, e sua
destruição por incineração ou por biorremediação. Esta última
apela para o uso de agentes biológicos, operando com menos
custo e mais rapidamente.

Como reduzir os resíduos?

A degradação do lixo (resíduos sólidos) e o tratamento de esgoto


(resíduos líquidos) são dois exemplos de prestação de serviços

148
Processos de Engenharia Biológica

da biotecnologia tradicional nem sempre valorizados, apesar do


imenso volume de matéria que transformam e de sua relevância
para o meio ambiente.

Agora que você já sabe o que significa a biodegradação e


biorremediação, vamos estudar estes processos de um modo mais
detalhado. Iniciaremos então com os principais processos de
biodegradação.

A biodegradação do lixo sólido


Em condições adequadas, todos os compostos naturais podem ser
biodegradados. As populações microbianas mistas do ambiente
degradam as substâncias orgânicas através de numerosas reações,
sem que sejam necessários cuidados assépticos ou culturas puras.
Em condições aeróbias, os produtos finais da mineralização da
matéria orgânica são o dióxido de carbono (CO2) e a água; em
condições anaeróbias, forma-se o biogás.

Comentaremos brevemente três destes processos de


biodegradação do lixo sólido, que são a compostagem,
Landfarming e biometanização, pois já foram abordados em
outras disciplinas em semestres anteriores.

Na compostagem, uma etapa intermediária da mineralização, os


próprios micro-organismos do lixo degradam a matéria orgânica
previamente fragmentada e misturada. Ao começar a biodigestão,
a liberação de energia causa um aumento de temperatura
que elimina a maioria dos micro-organismos indesejáveis
(sanitização). À medida que a atividade microbiana decresce, o
sistema se estabiliza e amadurece até perder todo o seu potencial
de biodegradação.

As condições do processo são otimizadas mediante o controle


de alguns parâmetros, tais como a relação carbono/nitrogênio,
o oxigênio, a umidade e a temperatura. O processo pode ser
conduzido em sistemas simples (pilhas ao ar livre), ou complexos

Unidade 3 149
Universidade do Sul de Santa Catarina

(silos, biorreatores), sendo necessário, em ambos os casos,


remover o material manual ou mecanicamente, para assegurar a
aeração durante o processo de biodigestão.

O tratamento dos resíduos sólidos urbanos (RSU) em usinas de


compostagem é um procedimento alternativo à incineração e ao
depósito em lixões e aterros sanitários. Nesses estabelecimentos,
a separação prévia dos componentes permite a reciclagem de
alguns materiais (metais, vidro, etc.). A biodegradação aeróbia
ou mineralização dos restos orgânicos os transforma em um
“composto” utilizado no melhoramento de solos, em atividades
de reflorestamento, para colmatar terrenos, para combater a
erosão, etc.

Por outro lado, a decomposição in natura do lixo nos aterros


sanitários cria uma zona de anaerobiose em que se produz biogás.
Este é liberado na atmosfera, onde contribui para o efeito estufa e
o aumento da temperatura, afetando o clima.

Como exemplo, temos a compostagem (veja a figura abaixo),


que é o processo de transformação de materiais grosseiros, como
a palhada e o estrume, em materiais orgânicos utilizáveis na
agricultura.

Figura 3.2 – A compostagem.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, p. 19.

150
Processos de Engenharia Biológica

Outro processo utilizado é o Landfarming, processo em que


os micro-organismos heterotróficos da camada superficial do
solo são estimulados a degradar os contaminantes ali presentes,
transformando-os em substâncias inertes como o material
orgânico estabilizado, água e CO2.

O processo de landfarming, também conhecido como tratamento


em terra, consiste na aplicação controlada de resíduos sobre o
solo, conseguindo a degradação biológica e química dos mesmos.

O landfarming também deve ser considerado como um processo


de disposição final, já que os produtos da degradação se
incorporam ao solo e à matéria vegetal presente no local.

A diferença entre tratamento em solo e landfarming


se baseia em que o último implica o desenvolvimento
de técnicas de trabalho do solo, através das quais é
incorporado oxigênio do ar, maximizando a remoção
biológica. (DESLER, 2010).

Figura 3.3 – Tratamento da terra por Landfarming.


Fonte: Disponível em: <http://www.desleronline.com/html/portugues/residuos_peligrosos/
landfarming.html>. Acesso em: out.2010.

Unidade 3 151
Universidade do Sul de Santa Catarina

Biometanização
Como definido anteriormente, a biometanização faz parte
do processo de biodegradação, especificamente onde ocorre a
transformação de moléculas xenobióticas por micro-organismos
anaeróbicos (biometanização ou biogás). Para obter energia
renovável a partir de resíduos orgânicos de cozinha e jardim,
estes são submetidos a um pré-tratamento para a eliminação dos
materiais impróprios, sendo posteriormente encaminhados para o
digestor.

No digestor, totalmente fechado e em condições anaeróbias


(sem presença de oxigênio), os micro-organismos transformam a
matéria orgânica em biogás. É um processo de biometanização
que acontece a uma temperatura entre 55ºC e 60ºC durante
15 a 20 dias. Com este processo, são eliminados os germes.
Dependendo da composição dos resíduos orgânicos, obtém-se
entre 105 a 130 m3 de biogás por tonelada de resíduo, o que
equivale, aproximadamente, a 70 litros de gasolina.

Na biodigestão anaeróbia, a digestão microbiana da matéria


orgânica produz água (H2O) e dióxido de carbono (CO2).
Em condições anaeróbias, a ação de vários grupos de micro-
organismos forma como produtos finais o metano (CH4), o
dióxido de carbono (CO2) e a água, conforme a imagem abaixo.

Figura 3. 4 – A biodigestão em condições aeróbias e anaeróbias.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, p.10.

152
Processos de Engenharia Biológica

Nos ambientes confinados de pântanos e sepulcros, o gás


formado gera alguns fenômenos de combustão espontânea
(“luzes dos cemitérios”). Mas, nas condições mais controladas de
um aterro sanitário ou de um biorreator (ou biodigestor), o gás
acumulado poderá ser utilizado como combustível (biogás).

O processo fermentativo (biodigestão) se desenvolve


sobre resíduos rurais (esterco), agroindustriais (vinhaça,
efluentes das indústrias de laticínios e dos matadouros),
domésticos ou comunitários (lama de esgotos) e,
também, sobre plantas (aguapé).

A matéria-prima se coloca no biodigestor, em anaerobiose e a


um pH neutro (6,7-7,7), evitando-se a presença de substâncias
solventes ou de inseticidas, porque prejudicam o desenvolvimento
do processo.

Segundo a temperatura do biodigestor, haverá uma multiplicação


de bactérias mesófilas (350C) ou termófilas (550C) que,
respectivamente, processarão a matéria-prima em 15 a 30 dias ou
em 12 a14 dias. A segunda opção libera mais biogás, mas requer
maior consumo de energia e um monitoramento cuidadoso,
porque as bactérias termófilas não suportam bem as variações de
temperatura.

Como o processo de decomposição anaeróbia envolve a sucessão


biológica de várias populações naturais de micro-organismos,
as melhoras tecnológicas visam exclusivamente a engenharia do
processo. Este pode ser conduzido tanto de maneira descontínua
como contínua, em biodigestores especialmente construídos para
permitir o abastecimento diário de matéria-prima e a retirada de
biogás.

Da biodigestão restam dois resíduos: um deles é um material


sólido fibroso que, uma vez compostado, e prensado se usa como
“solo artificial” para o cultivo de plantas ou para melhorar a
qualidade do solo. O outro é um efluente líquido, que se aproveita
como adubo. Veja como este processo ocorre na figura a seguir:

Unidade 3 153
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 3.5 – Biogás.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, p. 11.

O biogás está formado por 50-65% de metano e 35-50% de


dióxido de carbono, com traços de gás sulfídrico (corrosivo),
nitrogênio, oxigênio e hidrogênio. O poder calorífico é menor
que o do gás natural, um combustível fóssil cuja composição
inclui metano, etano, propano e butano.

Agora, você deve estar perguntando-se, que tipo


de investigação deve ser feita para escolher o tipo de
biorremediação?

Cinco são os fatores principais para a escolha do processo ideal de


biorremediação:

 Dinâmica ambiente-poluente-micro-organismo

 Levantamento do local contamindado

154
Processos de Engenharia Biológica

 Nível de biodegrabilidade do xenobiótico

 Tempo requerido para a biorremediação

 Fatores econômicos

A biodegradação das águas residuais


O esgoto está constituído por excrementos (fezes e urina),
águas de uso doméstico (banho, lavagem de roupas, etc.) e,
eventualmente, alguns dejetos de origem industrial. Ao ser
liberado diretamente nos cursos de água, o esgoto desestabiliza
as populações microbianas, que se multiplicam rapidamente
consumindo o oxigênio dissolvido e ocasionando a morte de
peixes e crustáceos.

Na biodegradação das águas do esgoto participam várias


populações naturais:

 os micro-organismos aeróbios (bactérias e protozoários


ciliados) mineralizam parte da matéria orgânica do
efluente;

 as bactérias anaeróbicas procedem à biodigestão dos


lodos, permitindo a obtenção de biogás e a remoção de
alguns nutrientes (N e P principalmente) que poderiam
criar desequilíbrios ecológicos.

O tratamento do esgoto envolve métodos físicos, químicos


e biológicos. O processo ocorre em, pelo menos, três etapas.
Observe como ocorre cada uma delas na imagem abaixo.

8. Tratamento primário: o esgoto passa por um processo


de filtração que remove objetos grandes, lixo e areia.
No tanque de sedimentação, a gordura sobrenadante é
separada do lodo sedimentado, que pode ser transferido a
um biodigestor.

9. Tratamento secundário: o líquido efluente do tanque de


sedimentação pode ser tratado de vários modos:

Unidade 3 155
Universidade do Sul de Santa Catarina

 em lagoas de baixa profundidade;


 em filtros de gotejamento (Ponto 1 da figura 3.6), coloni-
zados pelos próprios micro-organismos do esgoto, que se
desenvolvem digerindo a matéria orgânica do meio;
 em tanques de lodo ativado (Ponto 2 da figura 3.6), onde o meio
é agitado e oxigenado mediante a injeção de ar comprimido;
 um segundo tanque de sedimentação separa o efluente do lodo.

10. Tratamento terciário: este é realizado para eliminar


substâncias inorgânicas e orgânicas, envolvendo
procedimentos como a filtração, a volatilização da
amônia, a precipitação de fosfato, etc.

Tratamento avançado: a degradação microbiana dos


resíduos orgânicos diminui consideravelmente a carga de
micro-organismos patogênicos liberada no ambiente, mas
não a elimina totalmente. Só alguns métodos adicionais
como a cloração, a irradiação UV e o tratamento
com ozônio eliminam micro-organismos patogênicos
recalcitrantes.

Figura 3.6 – Tratamento de águas residuárias.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, p.22.

156
Processos de Engenharia Biológica

Biodegradação e biotecnologia
A alusão feita com relação à biotecnologia é muito mais do que
vem sendo mostrado nos meios de comunicação social, porque
esta ciência não está somente relacionada com a Engenharia
Genética. Ela vai além disto, pois é “todo um conjunto de
atividades tecnológicas, abrangendo a aplicação de organismos,
sistemas e/ou processos biológicos a indústrias primárias,
secundárias e de serviços.” (MOTA, 2003, p.1).

A aplicação da biotecnologia é tão abrangente que


pode ser feita em áreas como a agricultura, o meio
ambiente, a extração de minérios, as indústrias
alimentares, etc.

Diagnóstico da Contaminação Ambiental


Para efetuar um diagnóstico de contaminação ambiental, deve-se
monitorar a água, o ar, o solo. As biotecnologias envolvem o uso
de indicadores biológicos, de técnicas imunológicas e genéticas,
além de biossensores. Observe como este processo acontece na
imagem a seguir:

Figura 3.7 – Esquema do funcionamento de um biossensor.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, p.26.

Unidade 3 157
Universidade do Sul de Santa Catarina

 Indicadores biológicos

São plantas e/ou animais capazes de acumular metais pesados e


poluentes orgânicos persistentes, determinando de maneira direta
(quantificar os compostos em um micro-organismo específico)
ou de forma indireta (verificar e acompanhar o crescimento ou
diminuição da população de plantas e espécies microbianas).

 Técnicas imunológicas

Estas utilizam anticorpos específicos, marcados ou associados a


enzimas. As técnicas imunoenzimáticas, cujos resultados podem
ser apreciados simplesmente por uma mudança de cor, são a
metodologia apropriada para trabalho em campo. Estas técnicas
estão substituindo os testes tradicionais que, além de serem
lentos, exigem equipamentos caros e complexos. Imunoensaios
de diversos tipos permitem o monitoramento contínuo,
automatizado e barato de pesticidas como o Parathion, PCBs e
Dieldrin.

 Técnicas genéticas

Aplicam-se na identificação de populações microbianas, uma vez


que a maioria dos micro-organismos do ambiente ainda não está
catalogada e técnicas de cultivo in vitro são pouco conhecidas em
função disso. A tecnologia do DNA facilita a identificação dessas
espécies em função do sequenciamento gênico correspondente ao
RNA ribossômico. Estas técnicas também ajudam a monitorar as
modificações populacionais utilizadas na remoção de poluentes,
podendo assim detectar qualquer variação ambiental e restaurar
rapidamente as condições ótimas do sistema.

A degradabilidade (capacidade que alguns compostos têm de


ser biodegradados) é vista como um atributo desejável, pois a
persistência prolongada leva à contaminação de outros ambientes
e também de águas subterrâneas. Três técnicas básicas de
biorremediação são geralmente usadas:

1. estimulação da atividade de micro-organismos indígenas,


pela adição de nutrientes, regulação das condições redox,
entre outros;

158
Processos de Engenharia Biológica

2. inoculação de sítios contaminados com micro-


organismos específicos em transformar determinados
poluentes;

3. aplicação de enzimas imobilizadas (será estudada na


próxima unidade 3).

As pesquisas sobre biodegradação priorizam os pesticidas


mais tóxicos à vida selvagem em agroecossistemas suscetíveis à
contaminação. Os principais aspectos abordados nesta linha de
pesquisa são:

a) biodegradação de herbicidas e fungicidas;

b) enzimas microbianas envolvidas no processo de


biodegradação;

c) tecnologia da rizosfera – uso de rizobactérias promotoras


do crescimento de plantas em biorremediação.

Biorremediação
Numerosas substâncias, hoje presentes no ambiente, têm sido
geradas pelo homem através da síntese química. Embora muitas
possam ser degradadas em poucos meses por algum organismo,
outras persistem na natureza por um longo tempo. Consideradas
recalcitrantes, estas moléculas alheias ao mundo dos seres
vivos (xenobióticas) não são biodegradadas ou, quando o são, o
processo é muito lento.

Para que a biorremediação seja eficiente, é necessário


que o poluente seja transformado metabolicamente
por algum micro-organismo, os produtos finais sejam
seguros e as condições ambientais favoreçam a
atividade microbiana. Além disto, deve-se ter em conta
a relação custo/beneficio.

Unidade 3 159
Universidade do Sul de Santa Catarina

Os contaminantes
Como resultado das atividades humanas, aproximadamente
2,5 milhões de toneladas de substâncias químicas perigosas
são liberadas anualmente no meio ambiente. Em alguns casos,
trata-se de emissões deliberadas e regulamentadas (resíduos
industriais); em outros, de escapamentos acidentais (manchas de
óleo ou de petróleo).

Os tratamentos
Existem vários métodos para retirar substâncias recalcitrantes do
meio ambiente. As opções contemplam a construção de barreiras
físicas, a lavagem ou ventilação do solo contaminado, e, ainda,
sua destruição por incineração ou por biorremediação. Esta
última apela para o uso de agentes biológicos, operando com
menos custo e menor tempo.

Uma forma de biorremediação é a produção de biomassa


específica no local contaminado (in situ). Do ponto de vista
prático, duas estratégias são possíveis:

 colocar micro-organismos especializados no solo;


 acrescentar nutrientes para estimular a ação dos micro-
organismos presentes no lugar contaminado.

Em ambos os casos, as bactérias ou os fungos digerem o lixo


perigoso transformando-o em produtos inofensivos. Uma vez
consumido o material tóxico, os micro-organismos morrem ou
voltam ao seu nível populacional normal no ambiente (ver na
seção 4 o item Processos biotecnológicos utilizados em acidentes
com petróleo).

Outra forma de biorremediação dos solos contaminados


admite o tratamento ex situ, em que o solo escavado é
transferido a um biodigestor. Como a liberação de micro-
organismos geneticamente modificados no ambiente é vista com
desconfiança, sua utilização se restringe a estes sistemas fechados.

A modificação genética dos micro-organismos pode fornecer


linhagens com um potencial de degradação dos contaminantes
maior que o dos organismos naturais. Também permite o design

160
Processos de Engenharia Biológica

de micro-organismos que combinem várias características de


diferentes linhagens como, por exemplo, a degradação de PCBs
(Bifenilas policloradas) e a sobrevivência em uma ampla margem
de temperaturas. Introduzindo os dois genes correspondentes em
uma bactéria inócua e de fácil cultivo, essa contaminação poderia
ser tratada de maneira específica.

Entre as formas de biorremediação, cabe destacar a utilização de


micro-organismos que sobrevivem no ambiente contaminado,
por ter sistemas enzimáticos capazes de digerir os poluentes-
alvo, ligeiramente diferentes de seus substratos normais. Esta
propriedade é denominada metabolismo gratuito.

O metabolismo gratuito possibilitou a descontaminação


do Rio Savannah (Estados Unidos) de tricloroetileno
(TCE), utilizado como desengordurante na fabricação
de componentes de armas. Despejado no solo, o
TCE contaminara as águas subterrâneas, causando
um problema ambiental de grandes proporções.
(MALAJOVICH, 2004).

Exemplos do processo

Os vazamentos de petróleo
Um dos mais sérios problemas de contaminação ambiental é o
derramamento de petróleo nos mares, devido a acidentes notórios
(Prestige, Exxon Valdez, Torrey Canyon, Amoco Cadiz e Braer
and Sea Empress, e, em 2010, nos Estados Unidos e no México)
e a situações bélicas (Guerra do Golfo, por exemplo).

As manchas de óleo despejadas no mar contêm compostos


tóxicos que representam uma ameaça para a ecologia marinha e
costeira, afetando todas as formas de vida aquática e constituindo
um risco para a saúde do consumidor.

A formação de carvão e petróleo nas profundezas da terra é


possível, porque, em condições anaeróbias, tanto a lignina
como os hidrocarbonetos são compostos químicos estáveis.
Porém, em condições aeróbias, ambos são degradados pelos

Unidade 3 161
Universidade do Sul de Santa Catarina

micro-organismos do ambiente. O petróleo derramado no mar


flutua na superfície, onde os componentes voláteis evaporam
rapidamente. O petróleo se dispersa com o movimento das ondas,
permanecendo em alto-mar, ou sendo levado até a costa.
O petróleo derramado será degradado pelos micro-organismos
naturalmente presentes no ambiente marinho, geralmente pobre
em nitratos e fosfatos. Por isso, devem-se acrescentar nutrientes
aos dispersantes químicos (detergentes) ou às espumas de limpeza
das rocas da costa. Estima-se que, até o momento, o solo de
mais de 30.000 sítios contaminados com petróleo proveniente de
vazamentos de tanques de armazenamento tenha sido tratado por
biorremediação.

A recuperação de recursos naturais


Os processos biológicos também são utilizados para a extração
de petróleo e de metais (cobre, ouro, urânio).

O petróleo
Na extração de petróleo, técnicas especiais (EOR, do inglês
enhanced oil recovery) envolvem o uso de polímeros de origem
microbiana (xantana) para aumentar a viscosidade e facilitar o
seu bombeamento. A introdução direta dos micro-organismos no
poço (MEOR, do inglês microrganism enhanced oil recovery) parece
menos interessante do ponto de vista econômico, mas isso pode
mudar, se o petróleo começar a se esgotar.

Os metais
A extração de metais solubilizados nas ácidas e escuras águas
do Rio Tinto (Andaluzia, Espanha) data do domínio romano;
abandonadas durante séculos, as minas foram exploradas a
partir do século XIX. Em 1947, com o isolamento de bactérias
quimiotróficas do gênero Thiobacillus, mostrou-se que a
acidificação das águas e a consequente solubilização dos metais
eram o resultado não só de uma ação química, mas também de
uma ação bacteriana.
As bactérias transformam os sulfetos metálicos insolúveis em
sulfatos solúveis, mediante uma reação de oxidação que libera a
energia necessária para sua reprodução e crescimento.
A biolixiviação se aplica especialmente à extração de cobre,
ouro, zinco, níquel e cobalto. A tecnologia é relativamente
simples e requer pouca inversão, sendo adaptada aos países em
desenvolvimento. Na América Latina, usa-se a biolixiviação para
a extração de cobre (Chile, México e Peru) e de ouro (Brasil, Chile
e Peru).

162
Processos de Engenharia Biológica

Nesta unidade, você estudou os processos de transformação


química e biológica que ocorrem com os mais variados substratos,
sejam de origem sólida ou hídrica; porém você deve estar
curioso(a) para saber:

Como se adicionam micro-organismos no oceano?

Para que isso seja possível, é necessária a utilização de


biorreatores, que começaremos a abordar a partir de agora, na
Seção 3.

Seção 3 – Biorreatores
Segundo Schmidell e colaboradores (2001), os biorreatores,
reatores bioquímicos, ou ainda reatores biológicos, são aqueles
reatores nos quais ocorre uma série de reações químicas
catalizadas por biocatalizadores. Estes biocatalizadores podem
ser enzimas ou células vivas (microbianas, animais ou vegetais).
Assim, pode-se classificar os biorreatores em dois grandes
grupos:

 Grupo 1: Biorreatores (ou fermentadores) nos quais as


reações ocorrem na ausência de células vivas, ou seja, são
tipicamente os reatores enzimáticos;

 Grupo 2: Biorreatores nos quais as reações se processam


na presença de células vivas.

Com relação aos reatores que utilizam células vivas, os mais


amplamente conhecidos e com uso bastante difundido são os
reatores com micro-organismos. Eles vêm sendo empregados
desde a década de 1940 para a produção industrial de uma
diversidade de produtos, tais como: enzimas, antibióticos,
vitaminas, ácidos orgânicos, solventes, tratamento de resíduos
industriais e domésticos. Podem, ainda, utilizar meio sólido
(cultivo sólido) ou meio líquido (cultivo submerso).

Unidade 3 163
Universidade do Sul de Santa Catarina

Por motivos históricos, ainda hoje o termo processos


fermentativos se aplica em biotecnologia a qualquer
processo microbiano operado em grande escala,
independentemente de ser ou não uma fermentação.
E o termo fermentador se usa como sinônimo de
biorreator, designando o recipiente onde ocorre o
processo.

As fermentações ou bioprocessos visam um dos seguintes


objetivos:

 a multiplicação de micro-organismos para obter a biomassa


(leveduras, bactérias, rizóbios, proteína de célula única), ou, como
vimos anteriormente, produzir micro-organismos para a limpeza
de acidentes ambientais (petróleo);
 a obtenção de produtos microbianos (antibióticos, aditivos,
álcool, enzimas, etc.);
 a conversão de um substrato em outro, por ação de micro-
organismos ou de enzimas (transformação de esteroides,
isomerização de glicose em frutose);
 a purificação de um solvente (tratamento de efluentes,
transformação de algum poluente em alguma substância
facilmente degradável, etc.).
Um processo fermentativo começa com a escolha do agente
biológico adequado (micro-organismo ou enzima); segue com a
transformação da matéria-prima, em condições que podem exigir
esterilização, aeração e controle do processo (pH, temperatura,
etc.); e finaliza com a separação e purificação do produto final,
conforme a figura a seguir:

164
Processos de Engenharia Biológica

Figura 3.8 – Processo fermentativo generalizado.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, p. 56.

Os processos tradicionais
Em alguns lugares, os processos fermentativos (produção de
vinhos, queijos, pães, tofu, missô, sakê, etc.) ainda ocorrem
artesanalmente, dentro de folhas de bananeira e cestas de bambu
ou mesmo em montões; também existem hoje equipamentos
sofisticados com bandejas, colunas, frascos e tambores rotativos,
alguns totalmente automatizados (Figura 3.9).

Unidade 3 165
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 3.9 – Exemplo de biorreator de cultivo sólido automatizado.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, p.57.

Classificação de biorreatores
Encontram-se na literatura várias formas possíveis de
classificação dos biorreatores, como por exemplo (SCHMIDELL
et al., 2001):

 quanto ao tipo de biocatalizador (células ou enzimas);


 quanto à configuração do biocatalizador (células livres ou
imobilizadas);
 quanto à forma de agitar o líquido reator (agitação mecânica,
fluxo de ar, etc.).
Dentre as várias classificações encontradas, uma das mais
abrangentes é a classificação de Kleinstreuer (SCHMIDELL
et al., 2001) que apresenta uma classificação mista, com base no
tipo de biocatalizador empregado (enzima, micro-organismo
aeróbio ou anaeróbio) e na configuração deste (livre, imobilizado
ou confinado em membranas).

A figura a seguir resume a classificação mista (ou de Kleinstreuer)


para processos submersos (onde o meio de cultivo é líquido):

166
Processos de Engenharia Biológica

Figura 3.10 – Classificação dos Biorreatores.


Fonte: MALAJOVICH, 2004, modificado pelo autor.

Conforme se pode verificar, a partir da classificação proposta,


há uma grande variedade de configurações possíveis para os
biorreatores, no entanto pode-se afirmar que os mais amplamente
utilizados são os reatores ativados mecanicamente, conhecidos
como reatores STR, ou reatores de mistura, constituindo cerca de
90% dos reatores atualmente utilizados. (SCHMIDELL et al.,
2001).

Atualmente, a maioria dos processos industriais se desenvolve


em cubas de vidro ou de aço de até 20 litros. Os agentes
biológicos se encontram submersos no meio de cultivo que ocupa,
aproximadamente, 75% da cuba. Às vezes é necessário injetar ar,
e, em muitas fermentações, se forma espuma.

O desenho do biorreator deve se adequar ao objetivo do processo,


respondendo eventualmente a diversos imperativos, tais como a
esterilização do sistema, a aeração e homogeneização do meio, o

Unidade 3 167
Universidade do Sul de Santa Catarina

acréscimo de nutrientes e de aditivos antiespuma, a manutenção


do pH, etc.

Como comentado anteriormente, os modelos de fermentadores


mais utilizados com micro-organismos contam com aeração
e agitação mecânica (veja a imagem à abaixo). Esta facilita a
distribuição dos nutrientes na cuba, mas gera calor, que deve
ser eliminado mediante a circulação de água fria. Se o processo
exigir assepsia (ver Unidade 1 – Controle de Micro-organismos),
esta será conseguida mediante:

 a esterilização do meio, dentro ou fora do fermentador;


 a desinfecção ou esterilização do equipamento, por injeção de
vapor ou mediante o calor gerado por serpentinas, sendo esta
medida extensiva a todos os ductos de entrada e saída e as
válvulas correspondentes;
 a esterilização do ar, mediante filtros adequados.

Figura 3.11 – Reator Mecânico (STR) demonstrando as formas de controle (pH, temperatura,
agitação, aeração).
Fonte: MALAJOVICH, 2004, p. 59.

168
Processos de Engenharia Biológica

O processo fermentativo pode ser conduzido de maneira


contínua ou descontínua (batelada), sendo que ambas as formas
apresentam vantagens e inconvenientes.

Em um sistema descontínuo de produção, uma vez que o


fermentador é carregado com a matéria-prima e o inóculo
correspondentes, a fermentação prossegue até o esgotamento
dos nutrientes. Concluído o processo e extraído o produto, o
fermentador é esvaziado, limpo e esterilizado antes de receber
outra carga.

Apesar do tempo improdutivo entre uma batelada e a seguinte,


o sistema é relativamente flexível, já que o mesmo equipamento
pode ser utilizado na fabricação de produtos diferentes. A
produção em bateladas é bastante utilizada na indústria
farmacêutica, porque o risco de contaminação permanece
relativamente baixo.

Já, no sistema contínuo de produção, o acréscimo de nutrientes


e a retirada do produto ocorrem simultaneamente ao longo do
processo, eliminando-se quase totalmente o tempo improdutivo.
Como o risco de contaminação aumenta, o sistema se adapta a
processos que não exijam assepsia, como a produção de proteína
microbiana e de álcool e, obviamente, o tratamento de água.

Entre o sistema em batelada e o sistema contínuo existe


um sistema intermediário de batelada alimentada em que,
periodicamente, parte do conteúdo (meio de cultivo + produto) é
retirada e substituída por conteúdo fresco.

Se deseja aprofundar-se sobre este assunto, indico as


seguintes referências:

MESQUITA, A. C. Uso das técnicas de oxidação


química e biodegradação na remoção de alguns
compostos orgânicos recalcitrantes. [Rio de Janeiro]
2004 XIII, 158 p. COPPE/UFRJ, D.Sc., Engenharia Civil,
2004. Tese - Universidade Federal do Rio de Janeiro,
COPPE.

SCHMIDELL, W. SOARES, H.M.; ETCHEBEHERE,C. et


al. Tratamento biológico de águas residuárias.
Florianópolis: Comissão editorial - Editora Tribo da Ilha,
2007.

Unidade 3 169
Universidade do Sul de Santa Catarina

Instrumentação e controle de bioprocessos

O sucesso de um processo fermentativo depende da existência


de condições adequadas à produção de biomassa e formação do
produto. A temperatura, pH, grau de agitação, concentração de
oxigênio no meio de cultivo e outros fatores devem ser mantidos
constantes durante todo o processo.

A manutenção dessas condições necessita um


monitoramento cuidadoso da fermentação através de
um sistema de controle, para que as condições ótimas
possam ser mantidas.

O monitoramento do processo fornece importantes informações


quanto ao progresso da fermentação. O monitoramento indica
casos de contaminação, morte celular ou fermentações que
ocorrem de forma diferente da esperada. O avanço dos processos
fermentativos totalmente automatizados depende da existência de
sensores que produzam sinais significativos de controle.

Controle do processo
Existem três possíveis objetivos para o controle do processo:

1. manter uma variável constante ao longo de tempo;


2. forçar uma variável a seguir o caminho pré-determinado
ao longo do tempo;
3. otimizar algumas funções das variáveis do sistema.
O primeiro se consegue pela regulação, o segundo por
mecanismos auxiliares, o terceiro por controladores ótimos.
Todos os aparelhos de instrumentação são geralmente conhecidos
como controladores automáticos. Em um sistema de controle,
têm-se quatro classes de variáveis:

1. Variáveis controladas: é a variável de saída que desejamos


controlar;
2. Variável manipulada: é a variável de entrada com a qual
se controla;
170
Processos de Engenharia Biológica

3. Variável de distúrbio: variável de entrada que afeta a


variável controlada;
4. Variáveis de referência: é o valor desejado da variável
controlada.
Vejamos agora os parâmetros que podem ser medidos em
processos fermentativos:
1. Parâmetros físicos: - Temperatura - Pressão - Consumo
de potência - Viscosidade - Fluxo de aeração e de meio -
Turbidez - Peso do fermentador;
2. Parâmetros químicos: - pH - Oxigênio dissolvido -
Oxigênio e gás carbônico nos gases de saída - Potencial
de redox - Concentração de substrato - Concentração de
produto - Força iônica;
3. Parâmetros biológicos: - Produtos biologicamente ativos
- Atividade enzimática - Conteúdo de DNA e RNA -
Conteúdo de NADH2 e ATP - Conteúdo em proteína.

Cinética do processo em batelada


Em um processo em batelada (bath), o volume no sistema é
constante e a composição é a mesma ao longo de todo o reator no
mesmo tempo(t).

Inicialmente, inocula-se o meio de cultura de volume V,


introduzindo uma determinada quantidade X0 de biomassa
(células microbianas, por exemplo). A evolução no tempo das
concentrações de biomassa, substrato e produto, é descrita pelas
equações diferenciais postas a seguir.

Para a biomassa:


(g.L.min-1) equação (1)
ou

(g.min-1) equação (2)


Para o substrato:


(g.L.min-1) equação (3)
ou

Unidade 3 171
Universidade do Sul de Santa Catarina

rs (g. min.-1) equação (4)


Para o produto:

(g.L.min) equação (5)


ou

(g.min-1) equação (6)

As unidades ’, - ’ e representam, respectivamente, as


leis de crescimento, de utilização de substrato (S) (por isso o
sinal negativo – ele é consumido no decorrer do tempo X) e de
formação do produto (P). O substrato (S) pode representar uma
fonte de carbono (C), nitrogênio (N), oxigênio (O2) ou qualquer
outro elemento necessário ao micro-organismo.

Portanto, se criarmos um gráfico para esta equação, teremos a


“curva de crescimento” em fermentador descontínuo, conforme o
gráfico a seguir:

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Gráfico 3.2 – Exemplo de uma cinética de crescimento em batelada simples.


Fonte: Elaboração do autor, 2010

172
Processos de Engenharia Biológica

Mudança de escala
A capacidade da cuba de um biorreator varia entre 1 e 10 litros
(L) para um fermentador de laboratório, chegando a 5.000 L em
uma planta piloto e 100.000 L em uma planta industrial.

Uma operação simples de laboratório pode ser impraticável,


ou pouco econômica, quando realizada em grande escala. No
laboratório, após as primeiras experiências realizadas na bancada,
o processo passa a ser estudado em um biorreator de até 10 litros
de capacidade, onde se analisam as variáveis físico-químicas em
outra escala.

Ao aumentar o tamanho do equipamento, altera-se a relação


superfície/volume, de modo que as condições de operação
do fermentador na planta piloto deverão ser ajustadas até se
aproximarem das correspondentes a um processo comercial.
Se a experiência na planta piloto for bem-sucedida, o processo
poderá ser desenvolvido em um fermentador industrial (veja a
figura a seguir).

A automatização do monitoramento e do controle da fermentação


permite que a informação relativa aos parâmetros físicos e
químicos (pH, temperatura, oxigênio, velocidade de agitação,
o nível do meio, etc.) seja recolhida on-line por sondas e
sensores. Para que o processo se aproxime das condições ideais,
a informação é analisada em relação a um modelo previamente
estabelecido. Como este se elabora a partir da experiência obtida
com cubas menores (laboratório, piloto), os ajustes à mudança de
escala são de grande complexidade.

Unidade 3 173
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 3.12 – Aumento de escala mostrando os tipos de biorreatores e o volume aproximado nos
diferentes processos, bancada, planta-piloto e fermentador industrial.
Fonte: MALAJOVICH, 2004, p. 61,

O principal objetivo para o uso de biorreatores é gerar


um ambiente ótimo para que a atividade biológica
tenha lugar a aumento de escala e, deste modo,
satisfazer as necessidades e os requisitos de qualidade
(em termos de concentração de contaminantes
gerados) e quantidade (volume) de água a ser tratada e
descartada.

Portanto, para o desenho dos biorreatores para tratamento de


águas residuais, por exemplo, deve-se conhecer os parâmetros
cinéticos associados com as principais reações envolvidas no
processo, tais como velocidade de eliminação de contaminantes
por unidade de biomassa, velocidade de crescimento do micro-
organismo, fator de conversão do substrato consumido em
biomassa e suplementos nutricionais dos micro-organismos.

Ademais, para o desenho do biorreator, são necessárias


informações quantitativas da velocidade de transferência de

174
Processos de Engenharia Biológica

massa de nutrientes (especialmente oxigênio) e de micro-


organismos presentes no sistema.

Todos estes dados são obtidos a partir de experimentos


em plantas em escala laboratorial ou escala piloto,
além da experiência acumulada durante a operação
de plantas de tratamento biológico já existentes.
(SCHMIDELL et al.; 2007).

Após obter o produto desejado em biorreator, é preciso recuperar


o produto obtido com uma grande eficiência. Vejamos, então,
como realizar este processo.

Recuperação do produto
A recuperação do produto representa uma fração considerável do
custo de um processo fermentativo. Se o produto for secretado
fora da célula, estará disperso em um volume grande de água
e será necessário separá-lo por decantação ou filtração. Mas,
se o produto permanecer dentro das células, estas terão que ser
desintegradas para proceder à sua extração.

O produto se concentra por sedimentação, precipitação, filtração,


centrifugação, extração por solventes, destilação, evaporação do
solvente e secagem. Se a purificação for necessária, esta envolverá
outros procedimentos, como a cristalização e os métodos
cromatográficos.

Um problema a considerar é o despejo dos resíduos de uma


fermentação, alguns dos quais podem representar um perigo para
o meio ambiente como, por exemplo, o vinhoto resultante da
produção de etanol ou o soro das indústrias de laticínios. Existem
formas de tratamento, como o crescimento de biomassa sobre
resíduos industriais, que eliminam o problema e ainda permitem
a obtenção de mais um produto.

Na próxima seção, veremos alguns exemplos de processos


fermentativos utilizando biorreatores, como, por exemplo, a
produção de biofertilizantes que utilizam biotecnologia clássica.

Unidade 3 175
Universidade do Sul de Santa Catarina

Seção 4 - Processos avançados em Biotecnologia


Antes de abordarmos este tema, se considerar necessário, reveja
o conceito de biotecnologia abordado na Unidade 1, pois ele será
central para o entendimento desta seção.

Vale destacar que a biotecnologia possui diferentes níveis de


sofisticação tecnológica: Biotecnologia Clássica ou Tradicional e
Biotecnologia Moderna.

A Biotecnologia Clássica ou convencional trabalha com seres


vivos encontrados na natureza e otimizados pela mão do homem
para determinada função produtiva mediante isolamento, seleção
e cruzamentos genéticos naturais (ainda que induzidos) entre
espécies e variedades sexualmente compatíveis. As técnicas
para essa otimização são geralmente práticas laboratoriais e
de campo amplamente conhecidas, como também o são as
tecnologias não biológicas necessárias à produção industrial na
Biotecnologia Clássica. Caem nesta classificação vários processos
biotecnológicos comuns, baseados em fermentação por micro-
organismos, tais como a produção de antibióticos, a de álcool
combustível e a de vinho e cerveja.

Já a Biotecnologia Moderna inicia o seu trabalho com seres


vivos naturais para obter outros seres vivos não encontráveis
na natureza, obtidos pela aplicação de técnicas não naturais de
seleção, transformação genética e otimização fisiológica.

A modificaç ão pode ser genética, utilizando-se a chamada


engenharia genética (um conjunto de técnicas de Biologia
Molecular) ou pode ser meramente funcional, caso em que se
aproveitam certas propriedades especiais de células e tecidos para
transformá-las funcionalmente em instrumentos de bioprodução
cujos mecanismos de ação não ocorrem espontaneamente na
natureza.

A Biotecnologia é o conjunto de técnicas que permite


à Indústria Farmacêutica cultivar micro-organismos
para produzir os antibióticos que serão comprados
na Farmácia. Também é Biotecnologia o processo que
permite o tratamento de despejos sanitários pela ação
de micro-organismos em fossas sépticas.

176
Processos de Engenharia Biológica

A Biotecnologia transforma nossa vida cotidiana. O seu impacto


atinge vários setores produtivos, oferecendo novas oportunidades
de emprego e inversões. Hoje contamos com plantas resistentes
a doenças, plásticos biodegradáveis, detergentes mais eficientes,
biocombustíveis, processos industriais e agrícolas menos
poluentes, métodos de biorremediação do meio ambiente e
centenas de testes diagnósticos e novos medicamentos.

E os avanços na área de tratamento de efluentes?

Os processos biológicos empregados no tratamento de resíduos


(efluentes) têm evoluído enormemente nas últimas décadas, tendo
em vista o número crescente de pesquisadores e instituições
preocupadas com a poluição ambiental.

Os princípios que movem os processos biológicos são resumidos


no fluxo de energia dos organismos vivos, ou seja, de que forma
os nutrientes captados no ambiente são convertidos em energia
e utilizados nos processos responsáveis pela manutenção da
vida, tais como reprodução, crescimento, transporte através de
membranas, locomoção, etc.

Em um processo de tratamento de resíduos, é necessário


conhecer profundamente a realidade de um determinado resíduo,
a fim de fornecer informações que retratem a realidade de forma
mais fiel e apurada possível, principalmente se este resíduo ou
efluente for tratado em um sistema fechado (biorreator).

Algumas das informações relevantes são o tipo de


nutrientes que ele possui, as variações que ocorrem
ao longo do tempo, os tipos de micro-organismos
presentes, como foi ou será coletado, etc.

Assim, é imperativo que todas as etapas de um processo biológico


sejam bem planejadas, desde a coleta, os recursos humanos, os
métodos analíticos, os recursos financeiros disponíveis, etc.

Desta forma, na atualidade, busca-se cada vez mais entender


a participação das distintas espécies microbianas em um
determinado sistema biológico, bem como entender a ocorrência
de distintos substratos (carbono, nitrogênio, etc.) presentes nestes

Unidade 3 177
Universidade do Sul de Santa Catarina

efluentes. Com isso, a evolução dos conhecimentos ligados à


biologia dos processos tem propiciado um maior avanço nos
sistemas de tratamento, ou seja, nos arranjos dos biorreatores
mais adequados, ou mais eficientes e de menor custo. Um
exemplo disto é a utilização de cultivo de células in vitro.

Uma vez que você já conhece os processos biológicos que ocorrem


na natureza e os diferentes organismos aqui estudados, aliados
aos diferentes substratos vistos durante as disciplinas deste curso,
imagine, agora, aplicar tudo isso, utilizando um biorreator! Há
um grande avanço tecnológico, concorda? Pois bem, vamos aos
exemplos:

Exemplo 1
Como exemplo, utilizaremos uma parte do trabalho de Mesquita
“Uso das Técnicas de Oxidação Química e Biodegradação na
Remoção de Alguns Compostos Orgânicos Recalcitrantes”
(2004), que envolve um processo de remediação englobando os
temas abordados nesta unidade (biorremediação, biorreatores,
tratamento de efluentes, etc.).
Objetivo do trabalho: Avaliar diferentes técnicas de degradação
de poluentes orgânicos encontrados no ambiente. A primeira
parte da tese enfoca a degradação de HPAs e PCBs por bactérias
isoladas da região da Baía de Guanabara e o uso do Reagente de
Fenton na degradação de PCBs.
Escolha do local: O local (mangue no Rio de Janeiro) era
utilizado como aterro de resíduos das indústrias que operavam
ao seu redor. Segundo relato de antigos funcionários da fábrica,
foram enterrados na área, denominada de “lixão”, cinco tambores
metálicos contendo PCBs, de 200 L de capacidade cada. A área
também recebeu grandes quantidades de subprodutos da
fabricação de polímeros – entre eles hidrocarbonetos aromáticos.
Formas de Biotratamento: Uma das alternativas aplicadas foi a
disposição do solo contaminado em células ou em áreas abertas
para a dispersão de nutrientes e micro-organismos, além da
aeração do sistema. Principais gastos com o sistema: escavação
e remoção do material contaminado, área para disposição do
solo contaminado, análises químicas periódicas para avaliação do
método, eficiência do método de oxigenação do sistema.
Metodologia: As amostras de sedimento da Praia da Ribeira e
área do “lixão” foram coletadas em frasco estéril e preservadas
em geladeira a 4°C. Para o isolamento dos micro-organismos,
foram colocados 10 g de amostra de sedimento em frasco
Erlenmeyer de 500 mL, contendo 100 mL de meio mineral

178
Processos de Engenharia Biológica

de composição (g/L): KH2PO4 0,5; Na2HPO4 1,4; NH4NO3 1,0;


MgSO4.7H2O 0,1; CaCl2.2H2O 0,02; MnSO4.H2O 0,03. O pH do
meio foi ajustado para 7,5. Petróleo cru foi usado como fonte de
carbono, adicionado gota a gota, até a formação de um filme na
superfície do meio. O cultivo foi incubado a 30°C, sob agitação
(72 batidas por minuto), por 48h. Após crescimento dos micro-
organismos, procedeu-se ao enriquecimento através de seis
cultivos sucessivos no mesmo meio para garantir a adaptação
dos micro-organismos à fonte de carbono. As espécies de micro
organismos que cresceram no meio de nafteleno foram isoladas
e identificadas.
Resultados: Foram selecionados os micro-organismos
decompositores de cada área amostrada, com isolamento de
bactérias degradadoras. Interessante que, segundo o autor:
estes micro-organismos relacionam a biodiversidade ao tempo
de exposição do ambiente ao contaminante. Isso significa que,
quando um local recebe uma alta concentração de um ou mais
contaminantes, há uma redução drástica no número de micro-
organismos. A população remanescente passou pelo processo
seletivo, podendo ter capacidade de degradar o composto ou
ser resistente ao mesmo. Com o tempo, esses micro-organismos
podem vir a incorporar genes que aumentem a sua capacidade
de degradação ou de síntese de substâncias que facilitem a
entrada de compostos insolúveis para dentro da célula (i.e.
biossurfactantes). Esse processo de adaptação é lento e contínuo.
Veja a Figura abaixo, a demonstração da degradabilidade de
compostos (PHAs) por micro-organismos isolados do próprio solo
onde se encontravam os contaminantes:

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Gráfico 3. 3 – Ensaio de degradação de HPAs utilizando as cepas isoladas da Praia da Ribeira (RJ).
Fonte: MESQUITA, 2004, p.83.

No gráfico, percebe-se que os micro-organismos consomem


inicialmente o antraceno. À medida que a abundância do
Unidade 3 179
Universidade do Sul de Santa Catarina

antraceno se reduz a 25% da concentração inicial, o fenantreno e


os outros compostos de 4 e 5 anéis começam a ser consumidos.
Embora a concentração final dessas substâncias no meio ainda
esteja muito acima dos valores estabelecidos pelas normas
nacionais, é importante salientar que o ensaio utilizou petróleo
na fase livre, situação semelhante a um derramamento. Nos casos
onde os HPAs estejam em fase residual ou dissolvidos, acredita-se
que o uso desses micro-organismos como técnica de remediação
possa ser bastante eficiente.
Conclusão: Os resultados dos ensaios de biodegradação de
HPAs indicam que as bactérias isoladas da Praia da Ribeira e
da “área do lixão” poderão vir a ser usadas em processos de
biorremediação de hidrocarbonetos de petróleo, tanto in situ
como ex situ. Contudo é necessário manter as condições ótimas
para o desenvolvimento dos micro-organismos.

Como você pode ter notado, os processos biotecnológicos de


remediação são eficazes e há diversas comprovações disto em
teses e artigos científicos.

Continuando o nosso estudo sobre processos biotecnológicos,


vamos diversificar um pouco com outro exemplo interessante na
descoberta de micro-organismos degradadores de petróleo.

Exemplo 2
Processos biotecnológicos envolvidos em acidentes com
petróleo: uma das primeiras patentes obtidas em biotecnologia
corresponde a uma bactéria engenherada (modificada
geneticamente), projetada para degradar alguns componentes
do petróleo. Porém o uso deste tipo de bactérias não teve
sucesso na remoção do petróleo derramado em alguns
acidentes, como o do navio Exxon Valdez, no Alaska (1989).
As pesquisas atuais visam preferentemente os micro-organismos
ambientais, especialmente Alcanivorax borkumensis, uma
bactéria capaz de metabolizar 70% dos compostos do petróleo,
especialmente os de baixo peso molecular. O sequenciamento
de seus 2.755 genes, completado recentemente, dará novas
informações sobre suas rotas metabólicas e seus requerimentos
de fósforo e de nitrogênio.

180
Processos de Engenharia Biológica

Tendências na área de biotecnologia


As novas técnicas de engenharia genética estão promovendo uma
reavaliação de quase todos os processos industriais que empregam
técnicas ou produtos biológicos.

A engenharia genética aplicada à Biotecnologia, além de


substituir processos e produtos tradicionais, apresenta grandes
perspectivas para melhorar o bem-estar da população por meio
de novas soluções para problemas de saúde, alimentação, energia,
materiais e meio ambiente.

A nova Biotecnologia é um instrumento poderoso,


podendo substituir um vasto número de processos
industriais atualmente empregados e criando novas
e melhores soluções para uma grande gama de
problemas.

Problemática
Segundo Francisco Aragão (EMBRAPA, 2010), apesar de a Lei
de Biossegurança, que acaba de ser aprovada pela Câmara dos
Deputados, representar um grande avanço para as pesquisas no
Brasil, o desenvolvimento do setor de biotecnologia como um
todo depende de recursos e de mais agilidade quanto a questões
relacionadas à comercialização. Para o autor, se o país não tratar
a biotecnologia como uma área estratégica, corremos o risco de
nos transformarmos em exportadores de matéria-prima e capital
humano.

O período mais eficiente para as pesquisas na área de


biotecnologia no Brasil deu-se entre 1995 e 2001, quando a
CTNBio era a única responsável pela emissão dos pareceres. Até
1995, não havia nenhuma lei que regulasse este tipo de pesquisa,
e, a partir de 2001, além da CTNBio, o governo definiu que
as pesquisas deveriam ser submetidas a outros órgãos como o
Ministério do Meio Ambiente e da Agricultura, o que acabou
provocando uma paralisação, principalmente de pesquisas de
campo. (EMBRAPA, 2010).

Nos últimos 10 anos, o Brasil multiplicou por cinco a produção


na agricultura, tendo aumentado em apenas 10% a área
plantada. Este ganho deu-se em função do uso de tecnologia.

Unidade 3 181
Universidade do Sul de Santa Catarina

O melhoramento genético é importante para o aumento da


produtividade e a biotecnologia, em muitos casos, é fundamental
(Fonte: EMBRAPA (ARAGÃO, F.).

Síntese

Nesta unidade, você estudou as principais doenças de veiculação


hídrica, giardíase, criptosporidíase, amebíase, febre tifoide e
paratifoide, cólera e hepatite; os agentes causadores, sintomas e a
sua importância na saúde pública. Associada a estas doenças, foi-
lhe possível perceber a importância que um eficaz tratamento de
efluentes pode trazer à saúde humana e meio ambiente.

Você teve oportunidade, também, de conhecer e comparar os


principais tipos de tratamento de resíduos, sejam biológicos,
químicos ou transmitidos pelo ar.

Aprendeu a diferenciar Biorremediação de Biotransformação,


os mecanismos utilizados neste tipo de tratamento, e,
principalmente, a aplicação da biotecnologia clássica ou moderna
como ferramenta fundamental tanto na nossa vida cotidiana
(alimentos) quanto na recuperação de ambientes inadequados à
vida de habitantes da Terra.

A partir dos conhecimentos já citados, você pôde ter noções


claras sobre a tecnologia dos biorretatores, ou equipamentos
biológicos utilizados com uma diversificada aplicação, tanto na
área farmacêutica (produção de vacinas, antibióticos) quanto
na área agrícola (produção de células vegetais), na produção de
biocombustíveis (etanol, biodiesel), na área ambiental (tratamento
de efluentes, produção de fertilizantes biodegradáveis, etc.).

No entanto gostaria de deixar claro que estas linhas de


conhecimento são extremamente amplas e complexas, e que
não caberiam em apenas uma disciplina. A intenção aqui foi
estimular a sua curiosidade e demonstrar, através deste conteúdo,
a infinidade de tecnologias e conhecimentos específicos sobre o
tema “Processos Naturais e Tecnológicos de Remediação”.

182
Processos de Engenharia Biológica

Atividades de autoavaliação
Ao final de cada unidade, você realizará atividades de autoavaliação. O
gabarito está disponível no final do livro didático. Mas esforce-se para
resolver as atividades sem ajuda do gabarito, pois, assim, você estará
promovendo (estimulando) a sua aprendizagem.
1. Para obter energia renovável a partir de resíduos orgânicos de cozinha
e jardim, estes são submetidos a um pré-tratamento para a eliminação
dos materiais impróprios, sendo posteriormente encaminhados para o
digestor. Este é um processo de biometanização que acontece a uma
temperatura entre 55 ºC e 60ºC durante 15 a 20 dias. Com este processo
são eliminados os germes, podendo-se obter entre 105 a 130 m3 de
biogás por tonelada de resíduos, o que equivale aproximadamente a 70
litros de gasolina.
Partindo destas afirmações, explique, em um texto de
aproximadamente 05 linhas, a diferença entre biodigestão anaeróbia e
biodigestão aeróbia, indicando os gases formados em cada processo.

2. Em busca de novas possibilidades terapêuticas, médicos, pesquisadores


e cientistas estão vasculhando as células e suas estruturas. Nesse
cenário em que estão presentes, também, o renascimento da anatomia
e tudo o que se tem descoberto sobre a fisiologia, os mecanismos de
saúde e doença são estudados como complexos problemas biológicos
ao mesmo tempo que ferramentas clínicas são desenvolvidas pela
Biotecnologia. A Biotecnologia tem avançado em diversas áreas

Unidade 3 183
Universidade do Sul de Santa Catarina

do conhecimento, no setor de produção de fármacos, a insulina


é produzida por algumas empresas nacionais com competência
estabelecida em biotecnologia, além de alguns antibióticos, tornando o
Brasil competitivo no mercado biotecnológico mundial.
a) Em um texto de entre 7 e 10 linhas, explique a relação que poderia
ocorrer entre as doenças de veiculação hídrica e a biotecnologia.

b) Indique pelo menos três importantes aplicações biotecnológicas na


área de doenças hídricas.

184
Processos de Engenharia Biológica

3. Com a esperança de uma maior produtividade, menor custo, menor


necessidade de trabalho e maior facilidade no controle das ervas
daninhas através da utilização de herbicida, a soja transgênica
resistente ao glifosato vem sendo cultivada em áreas cada vez maiores.
Como a soja transgênica está patenteada como propriedade intelectual
de uma empresa e sua expansão, em função do risco de contaminação
de lavouras vizinhas, tende a impedir o cultivo da soja convencional,
a dependência dos agricultores em relação às empresas fornecedoras
de insumos passa a ser integral, tendo em vista que seu uso está
programado desde o momento da semeadura. Essa situação parece
confirmar as prognoses marxianas, de que a agricultura tende a ser
completamente dominada pelo capital, constituindo-se num mero
ramo da indústria. Na tentativa de se contrapor a essa tendência em
curso, vários agricultores do Rio Grande do Sul iniciaram, em 1999, o
cultivo de soja orgânica, apoiados por uma cooperativa local, a única
das grandes cooperativas de trigo e soja do Estado a se posicionar
de forma pública, criticamente, à soja transgênica no período do
contrabando de semente da Argentina. (ANDRIOLI, 2006).
O Brasil é o segundo maior produtor mundial de soja, e os derivados
desta planta estão entre os principais itens da pauta de exportação
nacional. Aí reside a importância e, consequentemente, a preocupação
estratégica do Governo de se conseguir cada vez mais produtividade
nas lavouras.
Pesquise quais estratégias foram ou estão sento adotadas
pelo Governo. Cite-as e faça um breve comentário (10 linhas
aproximadamente) sobre tipo de tecnologia utilizada por órgãos
governamentais para contribuir com o aumento da exportação de soja.

Unidade 3 185
Universidade do Sul de Santa Catarina

4. Observe a charge abaixo e responda:

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/images/20030711-mafalda.jpg

O mundo está mesmo doente! As causas são diversas: contaminantes


ambientais resultantes do uso abusivo de agrotóxicos, acidentes
com petróleo, ou ainda contaminação das águas por organismos
patogênicos. Diante deste cenário, pesquise doenças de veiculação
hídrica que não sejam causadas por micro-organismos.

186
Processos de Engenharia Biológica

5. Nesta unidade, vimos que a Biotecnologia se classifica em Clássica


ou Moderna. Partindo do que você aprendeu, elabore um texto de
aproximadamente 10 linhas, incluindo os itens a. e b.:
a) Diferencie os tipos de biotecnologia.
b) Cite pelo menos UM exemplo de processo biotecnológico clássico ou
moderno que tenha trazido (ou traga) benefícios ao meio ambiente.
Não se esqueça de citar a(s) fonte(s) consultada(s).

Unidade 3 187
Universidade do Sul de Santa Catarina

Saiba mais
Se você desejar, aprofunde os conteúdos estudados nesta unidade,
ao consultar as seguintes referências:

MALAJOVICH, M.A. Biotecnologia. 1. Fundamentos. Rio


de Janeiro: Edições da Biblioteca Max Feffer do Instituto de
Tecnologia ORT, 2004.

MAYOR, Federico. As biotecnologias no início dos anos


noventa: êxitos, perspectivas e desafios. Estud. av. [online]. 1992,
vol.6, n.16, pp. 07-28.

SCHMIDELL, W.; LIMA, U. A. AQUARONE, E.;


BORZANI, W. Biotecnologia industrial – engenharia
bioquímica. São Paulo: Editora Blucher, 2001. v.2. 544 páginas.

SCHMIDELL, W. SOARES, H.M.; ETCHEBEHERE,C.


et al. Tratamento biológico de águas residuárias. Florianópolis:
Editora Tribo da Ilha, 2007. 720p.

188
4
UNIDADE 4

Avaliação Tecnológica dos


Contaminantes orgânicos
e Biológicos

Objetivos de aprendizagem
 Conhecer os diferentes contaminantes orgânicos e sua
relação com os organismos vivos.
 Conhecer os principais mecanismos utilizados na
reutilização de efluentes hídricos.

 Avaliar os aspectos econômicos envolvidos nos diferentes


processos de recuperação ambiental.

Seções de estudo
Seção 1 Poluentes (contaminantes) Orgânicos

Seção 2 Reutilização de efluentes – Reúso de águas

Seção 3 Fundamentos Econômicos


Universidade do Sul de Santa Catarina

Para início de estudo


Nesta unidade, estudaremos os principais contaminantes
orgânicos, os COPs (Contaminantes Orgânicos Persistentes),
suas formulações, impactos ambientais, aspectos legais,
tecnologias e processos de remoção e recuperação destes
compostos no ambiente.

Também conheceremos os principais mecanismos aplicados na


reutilização de efluentes, assim como os novos instrumentos de
gestão dos recursos hídricos que estão sendo implantados no
país, o uso de alternativas tecnológicas para reciclagem e reúso de
efluentes industriais e urbanos. Abordaremos aspectos tanto na
área econômica (custos de produção nos setores hidrointensivos)
quanto na área de promoção, recuperação, preservação e
conservação dos recursos hídricos e dos ecossistemas urbanos.
Neste contexto, abordaremos os aspectos legais de reúso de
águas, com ênfase em unidades industriais.

Conhecer e contextualizar os aspectos econômicos e sociais


do uso das tecnologias aplicadas nos processos biológicos
relacionados aos impactos ambientais, biológicos ou químicos
é de fundamental importância na formação de um Gestor
Ambiental.

Vamos aprofundar?

Seção 1 – Poluentes (contaminantes) Orgânicos


O mundo mudou. As inovações tecnológicas fizeram com que
o homem contemporâneo se ache mais importante do que o
planeta. A acelerada industrialização, a crescente urbanização
e a “conquista” das inúmeras técnicas que permitem satisfazer
as necessidades do Homem alteraram decisivamente toda a
ordem natural do planeta. Entretanto estas obras não trouxeram
somente benefícios. As inovações vieram acompanhadas de
alguns fatos danosos, os quais demonstram a necessidade de
darmos mais atenção à intervenção humana na natureza.

190
Processos de Engenharia Biológica

Diante de tais fatos, é natural e aconselhável que uma nova escala


de valores surja e que a proteção ambiental comece a ser colocada
como um imperativo para que as gerações futuras tenham
condições de desfrutar daquilo que hoje possuímos. (GAMA,
2010).

A necessidade de encontrar soluções para os passivos ambientais


gerados nas indústrias e os desafios de utilizar os recursos
naturais disponíveis sem comprometê-los permitiram um avanço
nas pesquisas científicas envolvidas com o tema. E, na atualidade,
a degradação ambiental do planeta tornou-se um dos assuntos
mais polêmicos.

O desenvolvimento sustentável pressupõe a preocupação não


só com o presente, mas com a qualidade de vida das gerações
futuras, protegendo recursos vitais, incrementando fatores de
coesão social e equidade, garantindo, assim, um crescimento
econômico amigo do ambiente e dos seres humanos. Esta visão
integradora do desenvolvimento, que harmoniza a economia, a
sociedade e a natureza e respeita a biodiversidade e os recursos
naturais, deverá constituir o pano de fundo das políticas, sejam
elas nacionais ou internacionais.

Os perigos envolvidos com a presença de alguns compostos


no ambiente derivam não só da sua persistência e toxicidade,
mas também da capacidade de concentração ao longo da cadeia
trófica, podendo constituir grande perigo para o Homem.
(GAMA, 2010). Por forma a ter um conhecimento preciso da
sua distribuição e concentração no ambiente, desenvolveram-se
inúmeros programas de monitorização por todo o mundo, não
sendo o Brasil exceção.

Os problemas ambientais passaram a ter uma


importância fundamental a partir dos anos 60, época
em que se tornou notória a consciência de certos
grupos para as questões globais do planeta.

Esses problemas podem ser observados pelo crescimento


populacional, deterioração da qualidade da água potável,
aumento da produção de rejeitos tóxicos e radioativos, perda de
biodiversidade, esgotamento de recursos energéticos, mudanças

Unidade 4 191
Universidade do Sul de Santa Catarina

climáticas e aquecimento global, erosão dos solos agrícolas,


desastres naturais, aumento progressivo da ocorrência de
muitas doenças degenerativas tais como o câncer e os distúrbios
hormonais. (GAMA, 2010).

Em alguns estados brasileiros, grande parte dos contaminantes


é proveniente das indústrias têxteis, agroindústrias e carvão,
representando, em termos quantitativos e qualitativos, um
problema vasto na contaminação do meio aquático. Sendo os
PBDEs (éteres bifenílicos polibromados) usados em grande
escala nestes tipos de indústrias, é de esperar que sejam uns dos
contaminantes detectados no nosso meio aquático.

Atualmente já não se produzem nem se utilizam alguns dos


compostos halogenados considerados tóxicos e persistentes,
contudo alguns destes compostos ainda estão presentes
em muitos dos materiais utilizados no nosso dia a dia,
nomeadamente os materiais de construção, equipamentos
elétricos e eletrônicos, bem como tintas, e continuam
contaminando o meio ambiente. Exemplos disso são o
PentaBDE (éter difenílico pentabromado) e o OctaBDE (éter
difenílico octabromado) que, embora tenham limitada a sua
colocação e utilização na União Europeia (Directiva 2003/11/
CE de 6 de Fevereiro de 2003, 24ª alteração da Diretiva 76/769/
ECC), ainda fazem parte da composição de muitos materiais em
uso.

A figura abaixo apresenta a Fórmula estrutural de alguns


contaminantes orgânicos.

Veja o que cada uma das


figuras representa:
a) PBDEs
(éteres difenílicos
polibromados)
b) HBCD
(hexabromociclododecano)
c) TBBPA
(tetrabromobisfenol A)
d) PBBs Figura 4.1 – Estrutura química de contaminantes orgânicos.
(bifenilos polibromados) Fonte: GAMA, 2010, p.7.

192
Processos de Engenharia Biológica

Os PBDEs em termos estruturais são formados por dois anéis


benzênicos com ligações bromo (1 a 10 bromos) unidos por
uma ligação éter, conforme se pode observar na Figura acima.
Relatos bibliográficos confirmam que quanto mais átomos de
bromo há, maior é o coeficiente de partição octanol-água, ou
seja, menor é a sua solubilidade em água, fazendo com que
sejam classificados como POPs, ou seja, são tóxicos, persistentes,
bioacumuláveis, serem transportados para longas distâncias, e,
ainda, desreguladores endócrinos.

Os poluentes ou contaminantes podem ser de natureza


orgânica, inorgânica ou sintética. Podem estar presentes em
diversos meios: meio sólido, meio aquático, podem ainda ser
biodegradáveis, recalcitrantes, etc. Antes de estudarmos os
compostos orgânicos, estudaremos os compostos PBDES,
que podem ter origem sintética ou orgânica. Posteriormente,
estudaremos os poluentes (contaminantes) orgânicos.

Contaminação do meio aquático por PBDES


(Éteres difenílicos polibromados)
A contaminação do meio aquático é bastante problemática, já
que os efluentes muitas vezes resultam de uma mistura muito
complexa de compostos persistentes e tóxicos e, por essa razão,
têm características diversificadas, logo necessitam de diferentes
sistemas de controle e tratamento das cargas poluentes que os
constituem.

No que diz respeito aos éteres difenílicos polibromados (PBDEs),


podem ser várias as fontes de contaminação, apesar de que
a indústria talvez seja a que cause maior preocupação. São
diversas as indústrias que utilizam este tipo de compostos como
retardantes de chama, a indústria têxtil, a indústria de plásticos,
a indústria de polímeros e a indústria de automóveis. Os éteres
difenílicos polibromados são usados, também, como retardantes
de chamas em equipamentos eletrônicos, plásticos, tecidos,
materiais de construção, carpetes de veículos, aviões e etc.

O desenvolvimento técnico nos últimos anos fez disparar


a utilização de polímeros sintéticos em equipamentos

Unidade 4 193
Universidade do Sul de Santa Catarina

eletroeletrônicos e outros materiais de fácil ignição, em nossas


casas e em estabelecimentos comerciais.

No presente, o fogo é uma das principais causas de


destruição de bens no nosso planeta. Por forma a
tentar minimizar, quer o risco de incêndios, quer o
seu poder de propagação, recorre-se à utilização de
retardantes de chama. (ALAEE M. et al., 2000).

Atualmente, existem mais de 175 compostos químicos


classificados como retardantes de chama. Estão divididos em
quatro grandes grupos:

1. inorgânicos (óxidos de alumínio, antimônio e estanho);


2. orgânicos halogenados (clorados e bromados);
3. organofosforados;
4. azotados (ácido úrico, amônia).

Existem várias famílias desses aditivos disponíveis no mercado.


Cada uma dessas linhas tem características próprias. Os
retardantes à chama mais antigos são os compostos halogenados
à base de cloro ou bromo, quase sempre enriquecidos com
trióxido de antimônio. Os halogenados apresentam excelente
desempenho contra a propagação de chamas e têm fórmulas
adaptáveis a quase todos os polímeros. Por outro lado, trazem
efeitos colaterais indesejáveis. A escolha do retardante de chama
depende principalmente da disponibilidade do produto, do tipo
de elemento químico (inorgânico, orgânico, alumínio, estanho,
azotados, etc.) e do custo.

Na última década, com a pressão dos ecologistas, e por questões


de segurança, se popularizaram na Europa e Estados Unidos as
famílias de retardantes não halogenados, como os derivados de
fósforo, cargas inorgânicas ou azotados, entre outros, que geram
menos fumaça e não produzem gases tóxicos.

Em termos de mercado mundial, estes retardantes têm


importâncias bem distintas, conforme se pode observar na figura
a seguir. (CEFIC-EFRA, 2008).

194
Processos de Engenharia Biológica

Gráfico 4.1 – Mercado mundial de retardantes de chama (em 2005, foi 1,3 milhão toneladas/ano).
Fonte: GAMA, 2010, p. 6.

Classificação dos poluentes orgânicos


Os poluentes são classificados de acordo com a sua natureza e
com os principais impactos causados pelo lançamento no meio
aquático.

a. Poluentes orgânicos biodegradáveis

A matéria orgânica biodegradável lançada na água será degradada


pelos organismos decompositores presentes no meio aquático.
Existem duas maneiras de esses compostos, constituídos
principalmente por proteínas, carboidratos e gorduras, serem
degradados:

 se houver oxigênio dissolvido no meio, a decomposição


será feita por bactérias aeróbicas, que consomem o
oxigênio dissolvido existente na água. Se o consumo
de oxigênio for mais intenso que a capacidade do meio
para repô-lo, haverá esgotamento e a inviabilidade da
existência de vida para os peixes e outros organismos que
dependem do oxigênio para respirar;

 se não houver oxigênio dissolvido no meio, ocorrerá a


decomposição anaeróbica, com a formação de gases,
como o metano e o gás sulfídrico.

A matéria orgânica biodegradável no meio aquático, portanto,


pode causar destruição da fauna ictiológica e de outras espécies
aeróbicas em razão do consumo do oxigênio dissolvido pelos
organismos decompositores. Assim, o impacto introduzido

Unidade 4 195
Universidade do Sul de Santa Catarina

pelo despejo de esgotos domésticos em corpos de água ocorre


principalmente pela diminuição da concentração de oxigênio
dissolvido disponível na água, e não pela presença de substâncias
tóxicas nesses despejos.

b. Poluentes orgânicos recalcitrantes ou refratários

Muitos compostos orgânicos não são biodegradáveis ou sua


velocidade de biodegradação é muito lenta. Tais compostos
também recebem a denominação de recalcitrantes ou refratários.

A digestão de uma determinada substância depende não somente


da possibilidade dela fornecer energia para os organismos, mas
também da existência de organismos capazes de digeri-la. Esse
é o caso da maioria dos compostos orgânicos recalcitrantes, os
quais têm sido criados por processos tecnológicos e dispostos
há relativamente pouco tempo no ambiente. O impacto
introduzido por compostos orgânicos desse tipo está associado à
sua toxicidade, e não ao consumo de oxigênio utilizado para sua
decomposição.

Alguns destes compostos encontram-se no meio aquático em


concentrações que não são perigosas ou tóxicas, no entanto,
em consequência do efeito de bioacumulação, sua concentração
nos tecidos de organismos vivos pode tornar-se elevada, caso
estes organismos não tenham a capacidade de eliminar estes
compostos após a sua ingestão.

Alguns exemplos de compostos recalcitrantes:


Defensivos agrícolas: parcela considerável do total aplicado para
fins agrícolas atinge os rios, lagos, aquíferos e oceanos através
do transporte por correntes atmosféricas, despejos de restos de
soluções, limpeza de acessórios e recipientes empregados na
aplicação destes produtos e, também, pelo carregamento do
material aplicado no solo pela ação erosiva da chuva.
Detergentes sintéticos: tais produtos têm causado danos
maiores em águas interiores do que em águas oceânicas, sendo,
em geral, mais tóxicos para os peixes do que para o homem.
Muitos micro-organismos que efetuam a biodegradação da
matéria orgânica também podem ser afetados pelos detergentes
sintéticos. Além disso, a presença de uma camada de detergente
sintético na interface ar-água afeta a troca de gases entre os dois

196
Processos de Engenharia Biológica

meios, podendo, também, gerar espuma abundante. Esta espuma


é levada pelo vento e espalha-se por uma região mais ampla,
transportando consigo alguns poluentes que por ventura existam
no meio aquático.
Petróleo: o petróleo é composto por uma mistura de várias
substâncias com diferentes velocidades de degradabilidade. O
petróleo e seus derivados podem acidentalmente atingir corpos de
água nas fases de extração, transporte, aproveitamento industrial
e consumo. Entre os principais efeitos danosos impostos ao
meio ambiente estão: a formação de uma película superficial
que dificulta as trocas gasosas entre o ar e a água; a vedação
dos estômatos (órgão responsável pela respiração) das plantas e
órgãos respiratórios dos animais; a impermeabilização das raízes
das plantas; e, a ação de substâncias tóxicas nele contidas para
numerosos organismos vivos.

c. Metais

Todos os metais podem ser solubilizados pela água, podendo


gerar danos à saúde em função da quantidade ingerida, pela sua
toxicidade, ou de seus potenciais carcinogênicos, mutagênicos
ou teratogênicos. Exemplos de metais tóxicos são o arsênico, o
cádmio, o cromo, o chumbo e o mercúrio.
Como exemplo de problema relacionado com metais, citamos o
mal de Minamata, detectado em 1953, na Baía de Minamata,
Japão. Houve acúmulo de compostos organomercuriais no
sistema nervoso humano, principalmente no cérebro e na medula.
A presença de metilmercúrio, nas águas, pelo lançamento de
efluentes industriais, atingiu os peixes, causando grande número
de mortes e deformações genéticas.
Outro problema relacionado a metais pesados é que, mesmo em
concentrações diminutas, eles podem gerar danos importantes
aos organismos aquáticos ou ao homem. Em muitos casos,
tais concentrações são inferiores à capacidade de detecção
dos aparelhos utilizados nos laboratórios encarregados do
monitoramento da qualidade das águas. Exemplos de metais
de menor toxicidade, dependendo da concentração são o cálcio,
magnésio, alumínio, cobre e zinco. Alguns destes metais podem
produzir certos inconvenientes para o consumo doméstico de
água, pela alteração de cor, odor e sabor que provocam.

Unidade 4 197
Universidade do Sul de Santa Catarina

d. Nutrientes

O excesso de nutrientes nos corpos de água pode levar ao


crescimento excessivo de alguns organismos aquáticos,
acarretando prejuízo a determinados usos de recursos hídricos
superficiais e subterrâneos. Esses nutrientes, notadamente os
sais de nitrogênio e Fósforo, são comumente responsáveis pela
proliferação acentuada de algas, podendo prejudicar a utilização
de mananciais de água potável e causar sérios danos à saúde
humana em função de suas toxinas.

Como os nutrientes chegam aos corpos de água?


Através da erosão dos solos, pela fertilização artificial
dos campos agrícolas ou pela própria decomposição
natural da matéria orgânica biodegradável existente no
solo e na água.

e. Mecanismos Biológicos

Quanto aos mecanismos biológicos, tanto sob o aspecto


qualitativo de suas espécies quanto quantitativo (quantidade de
nutrientes) disponíveis, variam com a transparência da água,
com a variabilidade de seus nutrientes, como já foi comentado
anteriormente sobre o problema das águas; há também o
crescimento do fitoplâncton. No geral, a tendência é que ocorram
mudanças na estrutura populacional do ecossistema, levando
a alterações na qualidade da água, como o teor de oxigênio
disponível, o pH dentre outros fatores.

f. Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs) ou Contaminantes


Orgânicos Persistentes (COPs)

Devemos dar especial atenção a estes poluentes, pois são


compostos extremamente importantes na atualidade e muito
presentes ainda nos dias atuais, apesar de diversos apelos
mundiais.

Os Contaminantes Orgânicos Persistentes (COPs), POPs em


inglês, são substâncias químicas extraordinariamente tóxicas e

198
Processos de Engenharia Biológica

duradouras. Entre os COPs estão: as dioxinas e furanos, o DDT


e inúmeros agrotóxicos e substâncias químicas de uso corrente.

As emissões atuais causarão câncer e alterações


hormonais nos próximos mil anos. É necessário e
possível deixar de produzir este tipo de substância.

Além de serem persistentes (que não se decompõem


rapidamente), orgânicos (com estrutura molecular baseada no
carbono) e contaminantes (no sentido de serem muito tóxicos), os
COP têm outras duas propriedades: são solúveis em graxas e, por
conseguinte, se acumulam nos tecidos vivos; e podem se deslocar
em grandes distâncias. Estas propriedades juntas os tornam
muito perigosos.

Entre os COPs, como citamos anteriormente, estão as dioxinas.


O termo “dioxinas” ou dibenzo-para-dioxinas policloradas
(PCDDs) refere-se a um grupo de 75 composições químicas, e
o termo “furanos” dibenzo-para-furanos policlorados (PCDFs)
de 135 composições, na maioria de elevada toxicidade. Veja na
imagem abaixo como as dioxinas e furanos podem ser formados a
partir do PBDEs.

Acredita-se que a grande maioria das dioxinas e os furanos são


formados por processos de combustão incompletos, regra geral
a temperaturas elevadas, na ordem dos 250-500ºC. E que os
PBDEs em particular, embora em pequena quantidade, podem
dar origem à formação de PBDD/Fs durante o processamento
dos materiais que contenham estes compostos, nomeadamente
extrusão, modelagem ou reciclagem.

Unidade 4 199
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 4.2 – Formação de furanos e dioxinas bromadas a partir de PBDEs.


Fonte: GAMA, 2010, p. 38.

 Origem das Dioxinas e Furanos


A preocupação da sociedade com as dioxinas teve início em 1983,
com o incidente de

“Times Beach”, onde ocorreu contaminação do solo causada pela


disposição de sobras de produção de herbicidas que continham
quantidades de traço de um isômero da dioxina, a 2,3,7,8-TCDD
(tetraclorodibenzo-para-dioxina). Nesta mesma época, traços de
dioxinas eram medidos em um lote de material num incinerador
na cidade de Hempstead, Nova York. A presença de dioxinas e
furanos nas emissões de incineradores precipitou a preocupação
da sociedade quanto à exposição às dioxinas. (NÓBREGA,
2007.

A formação das dioxinas e furanos exige, em geral, a presença


dos compostos orgânicos como fenol, clorobenzenos, PCBs, do
cloro, de um catalisador (por exemplo, cobre) e uma temperatura
de reação entre 200 a 600ºC. Os PCBs, ao contrário das

200
Processos de Engenharia Biológica

dioxinas, foram produzidos intencionalmente, dadas as suas


propriedades físico-químicas que lhes conferem um vasto leque
de aplicações. Por serem praticamente incombustíveis, com baixa
pressão de vapor à temperatura ambiente, baixa volatilidade e
solubilidade, boa estabilidade térmica, estáveis quimicamente
e resistentes às bases e ácidos, têm sido utilizados como fluido
dielétrico em transformadores e condensadores, em adesivos,
óleos de corte, lubrificantes hidráulicos, tintas, etc.

Entre as principais fontes de emissão de micropoluentes,


destacam-se os processos metalúrgicos e siderúrgicos. Há vários
anos, os responsáveis da indústria, os cientistas e as autoridades
procuram meios apropriados para minimizar os impactos
ambientais de dioxinas/furanos.

 Toxicidade das Dioxinas e Furanos


Atualmente, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados
Unidos (USEPA) classifica o composto 2,3,7,8-TCDD como um
carcinógeno “B2”, com uma potência de 1,6 x 105 (mg / kg-d)-
1, que é o mais potente carcinogênico até hoje avaliado por essa
Agência, como destaca Dempsey e Oppelt (1993 apud GAMA,
2010). A categoria B2 é uma das cinco categorias que a USEPA
usa para agrupar, pelo peso da evidência de carcinogenicidade
para humanos, um produto químico, e significa que o peso da
evidência da carcinogenicidade baseada em estudos com animais
é “suficiente”, mas os estudos epidemiológicos mostram uma
“evidência inadequada” ou uma ausência de dados para considerá-
lo um carcinógeno para humanos. A extraordinária potência da
2,3,7,8-TCDD tem sido demonstrada em várias espécies animais,
existindo evidência suficiente acerca de sua carcinogenicidade.

Os Hidrocarbonetos Policíclicos Aromáticos (PAHs)


constituem uma extensa classe de compostos e centenas de
substâncias individuais, liberadas durante combustão incompleta
ou pirólise de material orgânico, resultando numa importante
fonte de exposição humana devido à ação mutagênica e
carcinogênica de vários compostos dessa classe.

Unidade 4 201
Universidade do Sul de Santa Catarina

Os PAHs podem ser encontrados na superfície


terrestre, na água e, principalmente, na atmosfera. São
compostos orgânicos que contêm dois ou mais anéis
aromáticos condensados, formados por átomos de
carbono e hidrogênio.

À temperatura ambiente, os PAHs são sólidos. As características


gerais comuns a esta classe de compostos são altas temperaturas
de fusão e ebulição, baixa pressão de vapor e baixa solubilidade
em água, a qual decresce com o aumento da massa molecular.
São inertes quimicamente e, na atmosfera, reagem com óxidos
de nitrogênio, acido nítrico, óxidos de enxofre, acido sulfúrico e
ozônio.

Os 16 PAHs considerados prioritários pela USEPA são


mostrados na Figura abaixo:

Figura 4.3 – Estrutura dos dezesseis HPAs.


Fonte: NÓBREGA, 2007, p.31.

202
Processos de Engenharia Biológica

 As mais importantes fontes de PAHs


Queima de carvão: as emissões de PAHs resultantes da queima
de carvão têm diminuído significativamente nos últimos anos,
como resultado de melhoria nas plantas existentes, fechamento
de plantas antigas e redução da produção. Esta diminuição tem
ocorrido na Europa e Estados Unidos.

Processos de manufatura: os PAHs são emitidos nos processos de


produção de alumínio, ferro e aço.

Aquecimento residencial: fenantreno, fluoranteno e pireno são


os maiores compostos emitidos em aquecimento residencial. A
liberação de PAHs durante o aquecimento doméstico é uma fonte
importante nos países em desenvolvimento, onde a biomassa é,
frequentemente, queimada com relativa naturalidade.

Cozimento de alimentos: os PAHs são emitidos durante a


combustão incompleta de combustíveis, óleo de fritura e do
alimento que está sendo cozinhado.

Queimadas: em países com extensa área de florestas, a queima da


biomassa pode ser uma importante fonte de contribuição para as
emissões de PAHs.

Motores de veículos automotivos: os principais compostos


liberados de motores a gasolina são fluoranteno e pireno,
enquanto naftaleno e acenafteno são abundantes nos gases de
exaustão de motores a diesel; ciclopenta [cd]-pireno é emitido
em uma alta quantidade nos motores a gasolina, porém sua
concentração nos motores a diesel é pouco acima do limite de
detecção.

O cloro é outro dos COPs: a química do cloro é a causa de


muitos problemas ambientais. Gases que contêm cloro, como
os Clorofluorcarbonos (CFCs) e os HCFs, destroem o Ozônio
estratosférico e são potentes gases de efeito estufa. Agrotóxicos
organoclorados como o DDT (diclorodifenilcloroetano)
prejudicam a capacidade reprodutiva de inúmeras aves, as PCBs
(bifenilas policloradas) afetam todas as espécies de peixes e
mamíferos marinhos, o Pentaclorofenol (PCP) provoca a atrofia
da medula óssea, cirrose hepática e desordens nervosas.

Unidade 4 203
Universidade do Sul de Santa Catarina

As dioxinas causaram, em 1976, a catástrofe de Seveso


(escape de 34 a 120 kg de dioxinas na fábrica de
Hoffman La Roche), e os efeitos tóxicos do agente
laranja, usado na Guerra do Vietnã, persistem e
continuam matando 25 anos após o término da guerra.
Segundo a OMS, a cada ano ocorrem de 30 mil a 40 mil
mortes por intoxicação por agrotóxicos organoclorados
e organofosforados em grande parte, e meio milhão
de pessoas sofre envenenamento por ingestão ou
inalação.

Os organoclorados são substâncias tóxicas, persistentes e


bioacumulativas, elas constituem um grave risco para as pessoas e
para o meio ambiente. Os organoclorados permanecem no meio
ambiente dezenas de anos, alguns durante séculos e, como são
muito estáveis e não se dissolvem em água, acabam por entrar na
cadeia trófica, depositando-se nos tecidos graxos dos seres vivos.

Como estudado, os Poluentes orgânicos persistentes (POPs) são


substâncias geradas por processos naturais e antrópicos que são
encontrados em todos os compartimentos ambientais (solo, água,
ar e biota). Os POPs têm meia-vida prolongada, são lipofílicos
e hidrofóbicos. Essas características fazem com que esses
compostos se acumulem e se magnifiquem na cadeia trófica.

A Legislação Ambiental Brasileira ainda é bastante


incipiente com relação às medidas de monitoramento
da contaminação e gestão de solos. Apenas normas
para disposição de resíduos estão disponíveis. Por isso,
é de dever de todos estar alerta e cobrar da sociedade
medidas que reduzam ou minimizem a presença
destes compostos na natureza.

204
Processos de Engenharia Biológica

Legislação
A poluição provocada por produtos químicos é, frequentemente,
um problema transfronteiriço que exige ações a nível
internacional. Por esta razão, a legislação nacional e internacional
é de suma importância.

Nos últimos anos, governos e organizações internacionais têm


trabalhado em colaboração, com o intuito de desenvolverem
instrumentos legais que permitam eliminar, ou pelo menos
reduzir, a poluição causada por alguns destes compostos.

O primeiro acordo internacional acerca dos poluentes orgânicos


persistentes (POPs) foi aprovado pela Comissão Econômica das
agora Nações Unidas para a Europa (UNECE) e deu origem, em
1998, a um Protocolo dos POPs, que, mais tarde, se denominou
Protocolo UNECE POP, acerca da Poluição atmosférica
transfronteiriça de longo alcance (LRTAP) (PELTONA J.,
YLÄMONONEN L., 2000).

No Brasil, as primeiras medidas restritivas se deram em 1971,


com a Portaria nº 356/71 (Brasil, 1971), a qual proibiu a
fabricação e comercialização de DDT e BHC para combate
de ectoparasitos em animais domésticos no país, obrigando
os fabricantes a recolher os produtos, mas isentou os produtos
comerciais indicados como larvicidas e repelentes de uso tópico.
Com a Portaria nº 357/71(Brasil, 1971), proibiu-se em todo
o território nacional o uso de inseticidas organoclorados em
controle de pragas em pastagens. No entanto o uso do DDT no
controle de doenças endêmicas prolongou-se até os anos 90.

De acordo com relatório publicado pelo Programa de Meio


Ambiente das Nações Unidas em 1998, o Brasil não produziu
industrialmente nenhum dos 10 POPs seguintes: aldrin,
heptacloro, clordano, hexaclorobenzeno, DDT, mirex, dieldrin,
PCBs, endrin e toxafeno. Já as dioxinas e os furanos, por serem
considerados subprodutos, foram produzidos de forma não
intencional e sem controle legal.

Todos os esforços feitos em nível internacional têm como objetivo


principal proteger a saúde humana, assim como o meio ambiente,
eliminando ou restringindo a produção, uso e libertação dos
POPs.

Unidade 4 205
Universidade do Sul de Santa Catarina

Atualmente, a Convenção UNEP POP engloba 21 POPs, nove


dos quais foram adicionados em Fevereiro de 2009 (COP4 –
Conference of Plenipotentiaries). Dos doze PBDEs (PentaBDE
e OctaBDE) que já constavam, oito são pesticidas; dois são
produtos químicos industriais; e dois, subprodutos não desejados
(dioxinas cloradas e furanos).

O Protocolo UNECE POP abrange, ao todo, vinte e cinco


substâncias, as vinte e uma da Convenção mais dois pesticidas,
um produto químico industrial e alguns subprodutos: os
hidrocarbonetos poliaromáticos, PAHs (PELTONA J., YLÄ
MONONEN L., 2000; UNEP, 2009).

A principal diferença entre o Protocolo e a Convenção diz


respeito à maneira como ocorre a propagação dos POPs.
Enquanto o Protocolo só diz respeito ao transporte aéreo de
poluentes, a Convenção é mais abrangente e entra em linha
de conta com outros tipos de propagação, tais como a água, as
espécies migratórias e a concentração nos seres humanos.

Cabe ressaltar que, enquanto normas governamentais


têm sido estabelecidas para controle de poluição da
água por pesticidas, nada existe com relação à poluição
do solo, sendo então importante o desenvolvimento
de métodos adequados, precisos e sensíveis para
determinar a extensão de contaminação do solo.

O comportamento destes compostos poluentes no meio


ambiente é determinado por propriedades físico-químicas
destes compostos e sua relação com o processo como adsorção,
lixiviação, vaporização e degradação. Para estudar o destino
destes compostos em compartimentos ambientais selecionados, os
poluentes devem ser extraídos de diferentes matrizes (sedimento,
solo, ar, água ebiota).

Já que, no decorrer das unidades, você aprendeu os principais


contaminantes orgânicos, biológicos e químicos, vamos agora
verificar se, mesmo com tanta poluição no solo e nas águas, seria
possível reutilizar o efluente. Será possível purificar os recursos
hídricos contaminados?

Veremos isso a partir de agora!

206
Processos de Engenharia Biológica

Seção 2 - Reutilização de efluentes – reúso de


águas

A água é um insumo essencial à vida na Terra e a gestão deste


recurso natural é de suma importância na manutenção de sua
oferta em termos de quantidade e qualidade. Atitudes proativas
são fundamentais nesse sentido, pois, apesar da aparente
abundância de recursos hídricos no Brasil (14% das águas doces
do planeta e 53% do continente sul americano), sua distribuição
natural é irregular nas diferentes regiões do País.

Foi pela carência de instrumentos de gestão que conflitos entre


usuários se instalaram em algumas bacias hidrográficas brasileiras
até o final do século XX, situação que está sendo revertida com
a implementação do Sistema Nacional de Gerenciamento de
Recursos Hídricos (SINGREH). Trata-se de fato importante,
uma vez que o cenário que se apresenta é o de crescimento
urbano-industrial e agrícola o qual certamente será acompanhado
pelo aumento da demanda de água.
A preocupação atual é baseada na urgente necessidade de
se reduzir a poluição dos rios e lagos. Como as exigências
ambientais foram tornando-se cada vez mais restritivas, os
planejadores concluíram que dados os altos investimentos
requeridos para o tratamento dos efluentes, torna-se mais
vantajoso reutilizar estes efluentes ao invés de lançá-los de volta
aos rios. No Brasil, as externalidades ambientais associadas
ao setor industrial e ao rápido crescimento urbano, no contexto Externalidades, também
do desenvolvimento das regiões metropolitanas, apontam para chamadas economias (ou
cenários futuros de escassez hídrica. deseconomias) externas.

De uma maneira geral, os países desenvolvidos vêm unindo


esforços para reverter a situação, remediando os ambientes
contaminados e tratando suas águas residuárias em níveis de
purificação cada vez mais exigentes.

No entanto a geração de bens de consumo para suportar


o crescimento econômico, associado às necessidades
básicas de sobrevivência do ser humano, minimizando os
impactos ambientais, continua sendo um grande desafio,
principalmente para países em desenvolvimento. É preciso
cumprir as determinações das leis, porém, de forma sustentável.
(SCHMIDELL et al., 2007).

Unidade 4 207
Universidade do Sul de Santa Catarina

Um pouco de história

Quando os europeus chegaram ao Brasil ficaram extasiados com


a formosura das terras e a abundância das águas. Observavam
os índios, que já utilizavam a floresta, a água para beber, para
a higiene geral, ou para os rituais e práticas simbólicas. Foram
aprendendo com eles o “melhor jeito” de sobreviver num clima
tropical.

Com o passar do tempo, as necessidades básicas passaram a


ganhar outras proporções. A água tornou-se via de transporte,
força motriz de moinhos e energia. De lá para cá, a água se
transformou em uma grande ferramenta econômica para a
urbanização e a industrialização, mas é nesse caminho de
progresso que também estão as raízes da degradação ambiental
do Brasil.

A transmissão de doenças via hídrica, causadas pelo lançamento


dos resíduos em mananciais já data um pouco mais de um século.
A partir de então, as águas residuárias domésticas, ou esgotos
sanitários, passaram a receber especial atenção com relação ao
seu destino final. Já as águas residuárias industriais, efluentes de
processos de fabricação específicos, somente vieram a ser de
importância após a revolução industrial, ou seja, quando estes
passaram a ser produzidos em grande escala.

No final do século XIX, o conceito de tratamento de efluentes


domésticos por disposição nos solos foi utilizado na Grã-
Bretanha, Alemanha e nos Estados Unidos, com um enfoque
central na redução da poluição dos rios, e não como um método
conservacionista de recarga de aquíferos ou de aumento de
nutrientes para o solo.

Durante o século XX, o desenvolvimento econômico dos


países em desenvolvimento e desenvolvidos foi diretamente
relacionado com o desenvolvimento agrícola e industrial e da
exploração de seus recursos naturais, o que vem mudando um
pouco as perspectivas no século XXI. Este desenvolvimento
deu-se sem uma maior preocupação com as consequências ao
meio ambiente, gerando um passivo ambiental considerável.
(SCHMIDELL et al., 2007).

208
Processos de Engenharia Biológica

Com o surgimento de problemas relacionados à escassez e


poluição de água nos grandes centros urbanos, começa a haver
um maior interesse por parte de vários setores econômicos pelas
atividades nas quais a água é utilizada, o que também é motivado
pelas recentes políticas federais e estaduais sobre o gerenciamento
dos recursos hídricos.

A nova estrutura legal tem o objetivo de garantir água na


quantidade e qualidade necessárias para a atual e futura gerações,
introduzindo como um de seus principais instrumentos, a
cobrança e o controle rigoroso pelo uso adequado da água.

Veja a seguir algumas definições importantes no estudo de reúso


de águas:

água de reúso: é a água residuária que se encontra dentro dos


padrões exigidos para sua utilização.
água residuária: é o esgoto, água descartada, efluentes líquidos
de edificações, indústrias, agroindústrias e agropecuária, tratados,
ou não.
esgoto ou efluente doméstico: despejo líquido resultante do uso
da água para preparação de alimentos, operações de lavagem e
para satisfação de necessidades higiênicas e fisiológicas.
esgoto ou efluente industrial: despejo líquido resultante da
atividade industrial.
reúso: uso de água residuária ou água de qualidade inferior,
tratada, ou não.
reúso indireto de água: uso de água residuária ou água de
qualidade inferior, em sua forma diluída, após lançamento em
corpos hídricos superficiais ou subterrâneos.
reúso direto de água: é o uso planejado de água de reúso,
conduzido ao local de utilização, sem lançamento ou diluição
prévia em corpos hídricos superficiais ou subterrâneos.
reúso em cascata: uso de efluente industrial originado em
um determinado processo que é diretamente utilizado em um
processo subsequente.
reúso de efluentes não tratados: utilização de efluentes não
submetidos a tratamento, mas enquadrados qualitativamente para
a finalidade ou processo a que se destina.

Unidade 4 209
Universidade do Sul de Santa Catarina

Tipos de reúso
A reutilização de água pode ser direta ou indireta, decorrente de
ações planejadas, ou não:

 reúso indireto não planejado da água: ocorre quando a água,


utilizada em alguma atividade humana, é descarregada no meio
ambiente e novamente utilizada a jusante, em sua forma diluída,
de maneira não intencional e não controlada. Correndo até o
ponto de captação para o novo usuário, a mesma está sujeita às
ações naturais do ciclo hidrológico (diluição, autodepuração).
 reúso indireto planejado da água: ocorre quando os efluentes,
depois de tratados, são descarregados de forma planejada
nos corpos de águas superficiais ou subterrâneas, para serem
utilizados a jusante, de maneira controlada, no atendimento
de algum uso benéfico. O reúso indireto planejado da água
pressupõe que exista também um controle sobre as eventuais
novas descargas de efluentes no caminho, garantindo assim que
o efluente tratado estará sujeito apenas a misturas com outros
efluentes que também atendam ao requisito de qualidade do
reúso objetivado.
 reúso direto planejado das águas: ocorre quando os efluentes,
depois de tratados, são encaminhados diretamente de seu ponto
de descarga até o local do reúso, não sendo descarregados no
meio ambiente. É o caso com maior ocorrência, destinando-se a
uso em indústria ou irrigação.

De onde vem e para onde vai a água que usamos?


A água que chega até nós, ou que é utilizada de alguma forma,
também retorna para a natureza. Captada de um córrego,
rio, lago ou reservatório e levada até uma ETA– Estação de
Tratamento de Água para se tornar potável, fica armazenada
em reservatórios, de onde será distribuída por meio das redes
adutoras para as nossas torneiras.

Toda água utilizada em casa transforma-se em esgoto ou efluente,


devendo ser direcionada, por meio de uma rede oficial coletora,
para uma ETE – Estação de Tratamento de Esgoto.

210
Processos de Engenharia Biológica

Na estação, o esgoto tratado transforma-se em água, sendo


devolvida aos rios em condições de não prejudicá-los, incluindo
peixes e outros organismos aquáticos. Nem sempre o acesso à
água tratada, à coleta e ao tratamento de esgotos é realidade de
todos.

A Crise da Água, apontada pelos técnicos e cientistas, será


enfrentada por todos, mas serão as populações mais pobres
as mais sujeitas a contaminações diretas, pois continuarão a
usar os córregos e rios, muitas vezes poluídos, para higiene e
abastecimento de água.

Por que reutilizar a água?


Olhar a imensidão do Planeta Azul dá uma sensação de
grandeza, de que a água é algo que nunca vai faltar. Pensando
bem, a quantidade de água no planeta, de fato, não se altera,
porque seu ciclo natural se responsabiliza pela sua manutenção.

Não podemos dizer o mesmo dos seres humanos, que se


multiplicam rapidamente e se agrupam em espaços cada vez
mais urbanizados. Cada um dos mais de 6 bilhões que vivem
atualmente, precisa de milhares de gotas d´água para satisfazer as
suas necessidades básicas.

Somos hoje 6 bilhões de habitantes com um consumo


médio diário de 40 litros de água por pessoa, bebendo,
tomando banho, escovando os dentes, lavando as
mãos. Para se ter uma ideia, a cada minuto de chuveiro,
utilizamos 3 a 6 litros de água. Um europeu gasta de
140 a 200 litros por dia, um norte-americano, de 200 a
250 litros e, em algumas regiões da África, 15 litros por
dia. Segundo cálculos realizados pela SABESP, gastando
200 litros por dia, em São Paulo (www.sabesp.com.br),
estamos desperdiçando.

O grande consumo de água: somando as atitudes e


comportamentos do desperdício e a poluição, resulta numa
relação desigual entre natureza e seres humanos.

Unidade 4 211
Universidade do Sul de Santa Catarina

Características das águas residuárias


 Sólidos em suspensão: se os sólidos forem majoritariamente
inorgânicos, estes devem ser removidos antes de ser alimentados
para o sistema de tratamento propriamente dito, pois poderão
provocar o assoreamento e abrasão dos equipamentos
subsequentes. O uso da força de gravidade (câmara de
sedimentação, por exemplo) seria uma opção adequada de
remoção. (SCHMIDELL et al., 2007).
 Óleos e Graxas: as gorduras são contaminantes presentes
em vários efluentes, principalmente oriundos de indústrias
alimentícias. Primeiramente, deve-se avaliar a potencialidade de
seu reúso como matéria-prima de uma série de produtos, como na
fabricação de sabão e na indústria de cosmético (principalmente
o glicerol). A sua presença nos processos subsequentes traz uma
série de problemas operacionais, devido às suas características de
aderência nas superfícies, próprias deste material, aumentando
a manutenção dos equipamentos e diminuindo a eficiência da
degradação dos compostos solúveis em água. A sua remoção
é também facilitada pela diferença de densidade entre estes
e a água, sendo a flotação a alternativa comumente utilizada.
(SCHMIDELL et al., 2007).
 Matéria orgânica: o tipo de material orgânico e sua
concentração devem ser analisados para auxiliar na escolha do
sistema a ser utilizado. Uma série de fatores irá influenciar a
escolha, tais como: se o processo será aeróbico, anaeróbico ou os
dois processos alternados. (SCHMIDELL et al., 2007).
 Nutrientes: os nutrientes de importância são aqueles
necessários em grandes quantidades para o crescimento dos
micro-organismos (macronutrientes), como o nitrogênio, o
fósforo e o enxofre. Existem métodos físico-químicos para
remoção destes compostos, como a precipitação e a volatilização,
no entanto, recentemente, estão sendo desenvolvidos processos
biológicos de remoção destes compostos por combinação de
processos aeróbicos seguidos de anaeróbicos, ou vice-versa.
 Compostos tóxicos recalcitrantes: a presença de compostos
tóxicos para os micro-organismos e de compostos de difícil
degradação deve ser analisada com cautela. Dependendo da
natureza do composto tóxico e de sua concentração, seu efeito
deve ser neutralizado antes de entrar no reator biológico. Após

212
Processos de Engenharia Biológica

o tratamento biológico, estes compostos devem ser removidos


por processos físico-químicos específicos (adsorção, troca iônica,
oxidação, etc.). (SCHMIDELL et al., 2007).
 Micro-organismos patogênicos: os esgotos domésticos, por
sua origem, possuem, como já visto anteriormente, micro-
organismos patogênicos, indicados pelos coliformes fecais. No
entanto, mesmo após o tratamento e processamento das águas
residuárias, os níveis exigidos pela legislação vigente no país
ainda é insuficiente. Assim, um tratamento por oxidação química
normalmente é empregado para atingir os níveis exigidos.

Falando em águas, você sabe a diferença química entre água doce e


água salgada?

Considera-se água doce aquela cuja concentração de sais


minerais está por volta de 0,5 g.L-1, principalmente cloretos e
sulfatos. Água salgada é aquela cuja concentração de sais está
acima de 3 g.L-1, principalmente cloretos e sulfatos. A salinidade
é um importante condicionador das espécies aquáticas, uma
vez que são raras as espécies que sobrevivem em água doce
e salgada, em decorrência, principalmente, das diferentes
condições de equilíbrio osmótico existentes entre duas situações.

Emprego das águas de reúso


O homem tem usado a água não só para suprir suas necessidades
metabólicas, mas também para outros fins, como listado a seguir
Existem regiões no planeta com intensa demanda de água, tais
como os grandes centros urbanos, os polos industriais e suas
zonas de irrigação.

Essa demanda pode superar a oferta, seja em termos


quantitativos, seja porque a qualidade local está prejudicada
em virtude da poluição. Tal degradação de sua qualidade pode
afetar a oferta de água e também gerar graves problemas de
desequilíbrio ambiental.

Unidade 4 213
Universidade do Sul de Santa Catarina

a. Abastecimento Humano

Dentre os vários usos da água, esse é considerado o mais nobre


e prioritário, uma vez que o homem depende de uma oferta
adequada de água para sua sobrevivência. A qualidade de vida
dos seres humanos depende diretamente da água, pois ela é
utilizada para o funcionamento adequado de seu organismo, o
preparo de alimentos, a higiene pessoal e de utensílios. Usamos
a água também para irrigação de jardins, lavagem de veículos e
pisos, usos esses com exigências menores em relação à qualidade.

Para prevenir danos à saúde e ao bem-estar do homem, a


água usada para abastecimento doméstico deve apresentar
características sanitárias e toxicológicas adequadas, tais como
isenta de organismos patogênicos (bactérias, vírus, parasitas,
protozoários) que podem causar doenças (hepatite, cólera, febre
tifoide, etc.) e substâncias tóxicas.

b. Abastecimento Industrial

A água é usada na indústria em seu processo produtivo,


por exemplo, como solvente em lavagens e em processos de
resfriamento. Não existe um requisito de qualidade da água
genérico para todas as indústrias, pois cada uso específico
apresenta requisitos particulares.

Indústrias que utilizam produtos farmacêuticos, alimentícios


e de bebidas estão entre aquelas que precisam de qualidade
elevada. Indústrias que utilizam a água para resfriamento devem
usar água isenta de substâncias que causem o aparecimento de
incrustações e corrosão nos condutos. Indústrias envolvidas
com processos de tingimento de tecidos e louças devem ter à
disposição água isenta de produtos que propiciem o aparecimento
de manchas no produto final.

As metodologias de recuperação incluem reúso direto, reúso


indireto ou em cascata. Os fatores que irão definir estes critérios
são, dentre outros, o custo/benefício, o tipo de efluente e a
aplicação da água tratada.

214
Processos de Engenharia Biológica

c. Irrigação

A qualidade da água utilizada na irrigação depende do tipo de


cultura a ser irrigada. Por exemplo, para o cultivo de vegetais
que são consumidos crus, a água deve estar isenta de organismos
patogênicos os quais poderão atingir o consumidor desse produto.
Essa água também deve estar isenta de substâncias que sejam
tóxicas aos vegetais ou aos seus consumidores.

Outro aspecto de importância fundamental diz respeito ao teor


de sais dissolvidos na água empregada para a irrigação. O excesso
de sais dissolvidos pode afetar a atividade osmótica das plantas,
bem como prejudicar o aproveitamento de nutrientes do solo,
influir diretamente no metabolismo das plantas e, ainda, reduzir
a permeabilidade do solo, dificultando a drenagem e a aeração.

Esquemas de irrigação mal operados arruinariam


grandes áreas de solo originalmente férteis
em consequência do efeito da salinização e do
encharcamento dos solos.

É importante ressaltar que a irrigação é responsável por


aproximadamente 70% do consumo de água doce do mundo.
Além disso, ela pode carrear para os corpos de água superficiais
e subterrâneos as substâncias empregadas para o aumento de
produtividade da agricultura. Entre tais substâncias empregadas
para o aumento da produtividade da agricultura, destacam-se os
fertilizantes sintéticos e os defensivos agrícolas.

d. Geração de Energia Elétrica

A água é utilizada para fins energéticos por meio da geração de


vapor de água nas usinas termoelétricas ou pelo aproveitamento
de energia potencial ou cinética da água nas usinas hidrelétricas.
Em ambos os casos, os requisitos de qualidade da água são
pouco restritivos, a não ser pelo controle de substâncias que
possam afetar a durabilidade e a manutenção dos equipamentos
utilizados.

Unidade 4 215
Universidade do Sul de Santa Catarina

O reaproveitamento dos recursos hídricos para fins energéticos


pode introduzir uma série de impactos ambientais no meio
aquático. As usinas hidrelétricas podem despejar calor nos corpos
de água, afetando o ecossistema de várias maneiras. Estas usinas
dependem, em geral, da existência de uma barragem que crie um
desnível entre as superfícies livres de água localizadas nos lados
a montante e a jusante. Como consequência, o rio a montante da
barragem transforma-se em um lago, o que altera o ecossistema
aquático, pois ele passa de um ambiente de altas velocidades e
alta turbulência (rio) para um ambiente de baixas velocidades e
baixa turbulência (lago).

e. Assimilação e transporte de poluentes

Os corpos de água podem ser utilizados com a finalidade de


assimilar e transportar os despejos neles lançados. A jusante do
lançamento, as concentrações do poluente dependerão em parte
da razão de diluição, isto é, da relação entre vazão do rio e a
vazão do despejo. Se a razão de diluição for alta, as concentrações
podem ser baixas o suficiente para não causar impactos sobre
outros usos de água.

A diluição, no entanto, não deve ser recomendada em


substituição ao tratamento dos despejos, devendo somente ser
utilizada para a carga residual das estações de tratamento. O
comportamento dos corpos de água como receptores de despejos
varia em função de suas características físicas, químicas e
biológicas e de natureza das substâncias lançadas.

f. Preservação da flora e fauna

O equilíbrio ecológico do meio aquático deve ser mantido,


independentemente dos usos que se façam dos corpos de água.
Para isso, deve-se garantir a existência de concentrações mínimas
de oxigênio dissolvido e de sais nutrientes na água. Ela não deve
conter substâncias tóxicas acima de concentrações críticas para os
organismos aquáticos.

216
Processos de Engenharia Biológica

g. Aquicultura

A criação de organismos de interesse para o homem requer


padrões de qualidade da água praticamente idênticos aos
necessários à preservação da flora e da fauna, havendo
possivelmente algumas considerações para o favorecimento da
proliferação de certas espécies.

Você percebeu o uso diversificado de reúso de águas, porém,


atualmente, apenas metade dos habitantes das grandes cidades de
países em desenvolvimento possui ligações de água em suas casas
e apenas um quarto tem acesso à água potável.

Em muitas cidades em desenvolvimento no mundo,


mais de 50 % da água bombeada pelo sistema se
perde antes de chegar ao consumidor. Muitas cidades
de países desenvolvidos, também, possuem perdas
de água de mais de 20 %, não utilizam tecnologias
potentes de economia de água, e alguns consumidores
desperdiçam água regularmente.

Está claro que cidades, tanto em países desenvolvidos quanto


em desenvolvimento, desperdiçam energia, água e recursos
financeiros, devido à ineficiência das companhias de água
públicas e privadas.

Como complemento, as companhias de água podem melhorar


continuamente suas contribuições para o bem público, através da
educação dos consumidores. O fornecimento de uma companhia
de água com custo otimizado e com a eficientização de recursos
tem um grande impacto no padrão de vida das pessoas.

Baseado neste contexto, a seguir se resumem os principais


problemas a se considerar sobre os recursos e aproveitamentos
hídricos no Brasil.

 Desconsideração das características de cada região para a


implementação dos processos de gestão das águas.

 Participação ainda muito pequena da sociedade na


gestão dos recursos hídricos e no cumprimento das leis
ambientais.

Unidade 4 217
Universidade do Sul de Santa Catarina

 Necessidade de melhor estruturação dos órgãos


ambientais para cooperação e cumprimento de suas
funções, como a fiscalização.

 Poucos investimentos voltados à prevenção da poluição


da água, como sistemas de tratamento e esgotamento
sanitários e programas de educação ambiental.

 Ausência de monitoramento da qualidade das águas


subterrâneas, como os aqü íferos, e de seus processos de
exploração, fundamentais para o abastecimento de água,
principalmente no semiárido.

 Degradação dos ecossistemas aquáticos e obras que


alteraram os ciclos hidrológicos.

 Disposição inadequada dos resíduos sólidos, provocando


a contaminação do solo e da água.

 Enchentes periódicas nos grandes centros urbanos,


agravadas pelo crescimento desordenado das cidades,
ocupação de áreas de alto risco ambiental, como encostas
de morros, várzeas de rios e áreas de mananciais.

 Agricultura mal planejada, com o uso abusivo de


agrotóxicos, resultando no desmatamento das bacias
hidrográficas, em processos erosivos e de contaminação
do solo e das águas, no empobrecimento das vegetações
nativas e redução das reservas de água do solo.

 Inexistência de práticas efetivas de gestão integrada dos


múltiplos usos dos recursos hídricos.

218
Processos de Engenharia Biológica

Você sabia:

Tabela 4.1 – Exemplos do consumo médio de água para fabricação de diversos compostos.

Fonte: VIEIRA, 2006. Disponível em: <http://www.wwf.org.br/informacoes/bliblioteca/publicacoes_


educacao_ambiental/?2986>. Acesso em: out.2010.

Antes de tomarmos qualquer decisão sobre a tecnologia que


melhor se adéqua àquela situação problema deve-se primeiro
analisar as características da água residuária, para então verificar
qual o nível de tratamento que deve ser aplicado para se chegar
aos parâmetros exigidos pela legislação local vigente.

Benefícios do reúso de águas industriais ou domésticas


Benefícios ambientais

 Redução do lançamento de efluentes industriais em


cursos d´água, possibilitando melhorar a qualidade das
águas interiores das regiões mais industrializadas dos
Estados.

 Redução da captação de águas superficiais e subterrâneas,


possibilitando uma situação ecológica mais equilibrada.

 Aumento da disponibilidade de água para usos mais


exigentes, como abastecimento público, hospitalar, etc.

Unidade 4 219
etores

Universidade do Sul de Santa Catarina

Benefícios econômicos

 Conformidade ambiental em relação a padrões e normas


ambientais estabelecidos, possibilitando melhor inserção
dos produtos brasileiros nos mercados internacionais.

 Mudanças nos padrões de produção e consumo.

 Redução dos custos de produção.

 Aumento da competitividade do setor.

 Habilitação para receber incentivos e coeficientes


redutores dos fatores da cobrança pelo uso da água.

Benefícios sociais

 Ampliação da oportunidade de negócios para as


empresas fornecedoras de serviços e equipamentos, e em
toda a cadeia produtiva.

 Ampliação na geração de empregos diretos e indiretos.

 Melhoria da imagem do setor produtivo junto à


sociedade, com reconhecimento de

empresas socialmente responsáveis.

Depois de ler todos estes benefícios, você deve estar


perguntando-se: existe alguma Legislação que garanta a
qualidade do reúso de águas?

No nosso país, SIM! Com o crescente interesse pelo tema, o


Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH) publicou a
Resolução 54, em 2005, que estabelece os critérios gerais para a
prática de reúso direto não potável de água. Nessa resolução, são
definidas as cinco modalidades de reúso de água:

 reúso para fins urbanos;

 reúso para fins agrícolas e florestais;

220
Processos de Engenharia Biológica

 reúso para fins ambientais;

 reúso para fins industriais;

 reúso na aquicultura.

Veja, na Tabela abaixo, as classes, aplicações e padrões de


qualidade garantidos pela legislação Brasileira.

Tabela 4.2 – Classes de água de reúso pela NBR-13.969 e padrões de qualidade.

Água de reuso Aplicações Padrões de qualidade

Turbidez < 5uT


Coliformes Termotolerantes <
Lavagem de carros e 200NMP/100ml
Classe 1 outros usos com contato
direto com o usuário Sólidos Dissolvidos Totais <200mg/L pH
entre 6 e8
Cloro residual entre 0,5mg/L a 1,5mh/L

Lavagem de pisos, Turbidez < 5uT


calçadas e irrigação de
Coliformes Termotolerantes <
Classe 2 jardins, manutenção de
500NMP/100ml
lagos e canais, exceto
chafarizes Cloro residual entre 0,5mg/L

Turbidez < 10uT


Descargas de vasos
Classe 3 sanitários Coliformes Termotolerantes <
500NMP/100ml

Irrigação de pomares,
cereais, forragens,
pastagem para gados e Coliformes Termotolerantes <
Classe 4 outros cultivos, através de 500NMP/100ml
escoamento superficial ou Oxigênio dissolvido >2,0mg/L
por sistema de irrigação
pontual

Fonte: FIRJAN, 2006, p. 7.

Como você deve ter observado na tabela, conforme o volume


estimando para cada um dos usos, pode-se prever graus
progressivos de tratamento (por exemplo, se o volume destinado
para uso com menor exigência for expressivo, não haveria
necessidade de se submeter ao máximo grau de tratamento todo
o volume de esgoto a ser reutilizado, mas apenas uma parte,
reduzindo-se o custo de implantação e operação, desde que haja
sistemas distintos para a reserva e a distribuição.

Unidade 4 221
Universidade do Sul de Santa Catarina

O tipo de reúso pode abranger desde a simples recirculação de


água de enxágue da máquina de lavagem, com ou sem tratamento
aos vasos sanitários, até uma remoção em alto nível de poluentes
para lavagens de carros. Frequentemente, o reúso é apenas uma
extensão do tratamento de esgotos, sem investimentos adicionais
elevados, assim como nem todo o volume de esgoto gerado deve
ser tratado para ser reutilizado.

Admite-se também que o esgoto tratado em condições de reúso


pode ser exportado para além do limite do sistema local para
atender, por exemplo, à demanda industrial ou outra demanda
de uma área próxima. No caso de utilização como fonte de
água para canais e lagos para fins paisagísticos, dependendo
das condições locais, pode ocorrer um crescimento intenso das
plantas aquáticas devido à abundância de nutrientes no esgoto
tratado. Neste caso, deve-se dar preferência à alternativa de
tratamentos que removam eficientemente o fósforo do esgoto.

Nós utilizamos a água tratada conscientemente?


Preocupamo-nos com um simples vazamento nas
torneiras de nossa casa? Observe a figura abaixo e
imagine o quanto você desperdiça diariamente!

Figura 4.4 – Desperdício de água doméstica.


Fonte: VIEIRA, 2006. Disponível em: <http://www.wwf.org.br/informacoes/bliblioteca/index.
cfm?uNewsID=2986>. Acesso em: out. 2010.

222
Processos de Engenharia Biológica

Fazer o melhor uso dos recursos naturais disponíveis,


principalmente da água, é condição essencial para se atingirem os
níveis de desenvolvimento almejados. As pessoas não podem ser
saudáveis, se o seu ambiente também não o for.
Nosso sentido visual aguçado traz um grau de exigência que
vai além da questão sanitária, tão fundamental para a nossa
saúde. Queremos viver num ambiente belo e limpo, o que
compreende manter as funções dos ecossistemas em equilíbrio,
remover a sujeira ou resíduos nocivos à saúde. O atendimento
a estas condições tem um alto custo. No caso da água, a parte
mais dispendiosa no seu cuidado é a construção, operação e
manutenção de estações de tratamento para a remoção da cor e
turbidez, sabor, odor e eliminação de seres que causam doenças,
deixando a água com bom aspecto.
Além disso, é importante ressaltar que a maior parte da água
doce encontra-se em locais de difícil extração, calota polar e
subsolo, como mostra a figura a seguir – Ciclo Hidrológico.

Para melhor compreensão,


visualize esta figura
colorida ao final do livro
didático no anexo.

Figura 4.5 – Ciclo hidrológico.


Fonte: Vieira, 2006, p. 11.

Apesar da água na atmosfera mostrar-se em percentagem


ínfima, devemos ter em mente que, ao longo de um ano, muita
água circula na região da ecosfera, no entanto o mau uso ainda
continua sendo preocupante.

Unidade 4 223
Universidade do Sul de Santa Catarina

A Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997, em seu Capítulo II,


Artigo 20, Inciso 1, estabelece, entre os objetivos da Política
Nacional de Recursos Hídricos, a necessidade de “assegurar
à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de
água, em padrões de qualidade adequados aos respectivos usos.”
Verificou-se, por intermédio dos Planos Diretores de Recursos
Hídricos de bacias hidrográficas – em levantamento realizado a
fim de se conhecer mais profundamente a realidade nas diversas
bacias hidrográficas brasileiras – que há a identificação de
problemas relativos à implementação de planos de saneamento e
coleta e tratamento. Entretanto não se identificam atividades de
reúso de água utilizando efluentes pós-tratados per sei. Isso pode
dever-se ao relativo desconhecimento dessa tecnologia e a razões
de ordem sociocultural. (ABNT, NBR-13.969/97).

Considerando que já existe atividade de reúso de água com fins


agrícolas em certas regiões do Brasil, a qual é exercida de maneira
informal e sem as salvaguardas ambientais e de saúde pública
adequadas, torna-se necessário institucionalizar, regulamentar
e promover o setor através da criação de estruturas de gestão,
preparação de legislação, disseminação de informação, e do
desenvolvimento de tecnologias compatíveis com as nossas
condições técnicas, culturais e socioeconômicas. (ABNT, NBR-
13.969/97).

O item 5.6.1 da NBR 13.969/97 determina que, para se obtenha


êxito na aplicação consciente do reaproveitamento hídrico, alguns
aspectos merecem atenção, entre eles:

a) os usos previstos para esgoto tratado;


b) volume de esgoto a ser reutilizado;
c) grau de tratamento necessário;
d) sistema de reservação e de distribuição;
e) manual de operação e treinamento dos responsáveis.

Finalizando este tema, é importante salientar que, para que


ocorra o reúso racional de águas, é necessário que exista um
planejamento do sistema de reúso, de modo a permitir seu uso
seguro e racional, assim será possível minimizar o custo de
implantação e de operação, tema que discutiremos na próxima
seção.

224
Processos de Engenharia Biológica

Seção 3 – Fundamentos Econômicos


A raiz de uma das principais causas de dificuldades na gestão do
ambiente certamente está na ausência de uma resposta objetiva
para algumas perguntas que, frequentemente, se apresentam. Ao
disciplinar o acesso e a apropriação do ambiente pelos indivíduos,
a sociedade define e impõe padrões ambientais que afetam
interesses conflitantes.

Há vantagens, ou seja, benefícios, na obediência a


esses padrões? Quem aufere esses benefícios, quem
assume esses benefícios e quem assume os custos
dessa obediência? A alocação de custos e os benefícios
resultantes da obediência desses padrões trazem para a
sociedade um excedente de benefícios sobre os custos?
Esse excedente é o maior que se consegue obter?

A teoria econômica ensina que o acesso aos bens e serviços


existentes em uma sociedade fica adequadamente disciplinado
quando todos eles efetivamente se subordinam às leis econômicas.
Em outras palavras: nesse caso, e somente neste caso, todos
os conflitos são resolvidos de modo a atender aos objetivos da
economia a que se subordinam. Infelizmente nem a prática
nem mesmo a teoria econômica têm condições de abranger
e disciplinar todos os bens e serviços existentes. Cabe aqui a
pergunta: a que objetivos atendem as leis econômicas?

A resposta à questão é imediata. Em todos os modelos


socioeconômicos aceitáveis, o objetivo é o mesmo.
Resumidamente, esse objetivo é atender a maior quantidade
das demandas mais valorizadas pelo conjunto da sociedade,
utilizando a menor quantidade possível dos bens que são escassos.
De outro modo, pode-se dizer que o objetivo da economia é
obter uma alocação ótima de bens escassos.

Embora as economias reais nunca sejam exatamente iguais


aos modelos econômicos formulados, todas as economias
atuais subordinam-se mais ou menos a um dos dois modelos
fundamentais existentes: o modelo denominado Economia
Clássica é o que está hoje presente em praticamente todos os

Unidade 4 225
Universidade do Sul de Santa Catarina

países. O da Economia Centralmente Planejada é hoje uma


exceção, sendo o modelo chinês o que mais se aproxima dele.

Para entendermos como funciona o Mercado econômico,


analisaremos o gráfico de oferta e demanda da Figura 4.6.

Figura 4.6 – Curva de oferta e demanda – Mercado livre.


Fonte: BRAGA, 2005. p. 223.

A curva de demanda traduz a disposição a consumir um


determinado bem ou serviço. O ponto de encontro entre as duas
curvas, de oferta e de demanda, traduz o resultado do confronto
entre as duas disposições e identifica o preço e a quantidade
ofertada (e consumida) em condições de equilíbrio.

Níveis de preços maiores que o de equilíbrio levam a uma


produção de quantidades em excesso. Níveis mais baixos do que
o de equilíbrio levam a demandas maiores do que a produção
ofertada e, portanto, à escassez. O preço de equilíbrio (ou de
mercado) é a variável que fundamentalmente estabelece quanto
desse bem vai ser consumido/produzido nesse mercado.

Para completar a resposta à primeira pergunta, deve-se destacar


ainda que, segundo os ensinamentos da economia, esse preço de
equilíbrio leva à alocação de bens escassos de maior eficiência

226
Processos de Engenharia Biológica

econômica. Ou seja, nesta alocação, o total dos benefícios


associados ao desfrute desses bens menos o total dos custos
associados à sua obtenção é a maior dentre as demais alternativas
possíveis de alocação.

Você deve estar perguntando-se, qual a relação entre a


economia clássica e a economia ambiental ou ecológica?

A economia ecológica constitui uma reação àquilo que se


considera como insuficiência dos princípios-base da economia
tradicional, em face da natureza dos processos ecológicos nos
ecossistemas e na biosfera, que são determinantes do equilíbrio
e da qualidade do ambiente. Na sua visão, a economia deve ser
entendida como um subsistema originado da atividade humana,
mas subordinado às leis fundamentais que regem os ecossistemas
da biosfera.

De acordo com este ponto de vista, a economia não pode ignorar


que o fluxo do material e da energia é finito e limitado, conforme
estabelecem os dois princípios da termodinâmica. Não pode
também ignorar que os fluxos de material e energia no subsistema
econômico não são infinitos, nem ilimitados, e que não pode
haver limites livremente arbitrados pela humanidade, uma vez
que eles estão restritos à capacidade dos demais seres vivos.

Ao contestar os princípios e os mecanismos de Mercado para


valorização dos bens e serviços econômicos, a Economia
ecológica propõe um método alternativo de base termodinâmica.
Segundo Marques e Comune (apud BRAGA, 2005, p.226):

Esse método, segundo seus defensores, avalia os


objetos de acordo com o seu custo, que, por sua vez, é
determinado em função do seu grau de organização em
relação ao ambiente. O conteúdo do conceito organizado
está intimamente ligado aos requerimentos de energia
necessária, na forma direta de combustível e, na indireta,
por meio de outras organizações que também utilizam
energia na sua produção. Por exemplo, a quantidade de
energia solar necessária para o crescimento de florestas
pode, portanto, servir como medida do seu custo de
energia, de sua organização e de seu valor. Em suma, esse
método pressupõe que todo o ecossistema seja avaliável

Unidade 4 227
Universidade do Sul de Santa Catarina

direta ou indiretamente. O método proposto por esta


corrente superestima algum serviço do ecossistema que
ainda não tenha valor reconhecido pelos seres humanos.

Atualmente, as imposições de mercado para o setor industrial


tornam impraticável a tomada de qualquer decisão sem uma
avaliação dos aspectos econômicos associados. Para a escolha
da alternativa que apresente a melhor viabilidade econômica, é
necessário que sejam identificadas as tecnologias disponíveis para
tratamento de efluentes e seus respectivos custos.

O estudo econômico para implantação de um projeto de


otimização e reúso de água e de aproveitamento de águas pluviais
pode ser baseado no período de retorno do investimento (pay
back), que permite avaliar o tempo necessário para a recuperação
do capital investido.

A título de ilustração, o tempo de retorno simples do


investimento de um determinado projeto pode ser calculado da
seguinte forma:

Onde:

T : é o tempo de retorno (anos)


O : é o custo operacional (anual)
V : é o valor total de investimento (global)
E : é a economia apresentada mediante implantação do projeto (anual)

Para avaliações mais completas e melhor elaboradas, podem ser


utilizados outros modelos econômicos disponíveis, os quais levam
em consideração os custos de capital, de operação e manutenção,
da taxa e o período de retorno de investimento.

A definição da viabilidade econômica do programa de


conservação e reúso de água é atribuição da área financeira. No
entanto, além dos aspectos monetários, deve ser considerada a
disponibilidade futura de água para a manutenção das atividades
no local.

228
Processos de Engenharia Biológica

Numa avaliação econômica convencional, a tomada de decisão


sobre a implantação, ou não, de qualquer atividade ou projeto
depende, basicamente, do montante de recursos, em geral
financeiros, a ser investidos e do retorno que se espera obter após
a implantação desta mesma atividade ou projeto. Nesta situação,
a decisão depende de uma análise comparativa entre os custos e
benefícios diretamente relacionados à implantação da atividade
ou projeto. Por outro lado, quando as questões ambientais estão
envolvidas no processo de tomada de decisão, os conceitos de
custo e benefício adquirem uma dimensão maior.

Isto se justifica, pois, em uma clássica avaliação econômica,


são considerados apenas os custos e benefícios diretamente
associados às atividades em estudo, podendo, em alguns casos,
ser considerados os custos e benefícios indiretos. Já, em uma
avaliação onde as questões ambientais estão envolvidas, além dos
custos mencionados, também devem ser considerados os custos e
benefícios intangíveis, os quais são difíceis de avaliar em termos
financeiros, muito embora sejam facilmente verificados que
existem.

Com a crescente disseminação de conceitos sobre


a prevenção da poluição, a gestão ambiental e a
ecoeficiência, foram desenvolvidas novas ferramentas
que visam incorporar os custos e benefícios
prontamente quantificáveis para avaliação econômica
tradicional.

A figura abaixo mostra a relação entre essas novas ferramentas


de avaliação e aquelas tradicionalmente utilizadas em avaliações
econômicas.

Unidade 4 229
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 4.7 – Relação entre as ferramentas de avaliação econômica.


Fonte: BRAGA, 2005, p.223.

Na análise econômica, os fatores menos prontamente


identificáveis ou de difícil mensuração produzem custos e/ou
benefícios que poderiam ser omitidos da análise convencional.
Alguns custos dão-se durante a realização de uma avaliação
econômica, perdidos ou incluídos nas contas de despesas gerais,
enquanto outros são completamente ignorados, devido às
incertezas envolvidas. Assim sendo, para a obtenção de resultados
mais precisos na avaliação econômica de alternativas relacionadas
à otimização do uso da água e minimização da geração de
efluentes, devem-se considerar os seguintes custos:

 Custos diretos: custos identificados em uma análise


financeira convencional como, por exemplo, capital
investido, matéria-prima, mão de obra e custos de
operação, entre outros;

 Custos indiretos: custos que não podem ser diretamente


associados aos produtos, processos, ou instalações
como um todo, alocados como despesas gerais, tais
como os custos de projeto, custos de monitoração e de
descomissionamento;

 Custos duvidosos: custos que podem, ou não,


tornarem-se reais no futuro. Esses podem ser descritos
qualitativamente ou quantificados em termos da

230
Processos de Engenharia Biológica

expectativa de sua magnitude, frequência e duração.


Como exemplo, podem incluir-se os custos originados
em função do pagamento de indenizações e/ou multas
resultantes de atividades que possam comprometer o
meio ambiente e a saúde da população;

 Custos intangíveis: são os custos que requerem


alguma interpretação subjetiva para a sua avaliação
e quantificação. Esses incluem uma ampla gama de
considerações estratégicas e são imaginados como
alterações na rentabilidade. Os exemplos mais comuns
referem-se aos custos originados em função da mudança
da imagem corporativa da empresa, relação com os
consumidores, moral dos empregados e relação com os
órgãos de controle ambiental.

Outros aspectos que devem ser analisados, a fim de se obter um


crescimento sustentável e lucrativo:

 Redução de prêmios de seguros pagos – Diminuição


de interrupções do funcionamento devido a problemas
ambientais;

 Redução das reservas para pagamento de multas


ambientais;

 Redução de custos, que vão desde os ocultos, aqueles que


não estão diretamente visíveis e associados ao produto,
processo ou serviço; de custos menos tangíveis, aqueles
cuja quantificação é bastante difícil de ser realizada,
porém sendo fácil perceber a sua existência, como o
desgaste de uma marca em decorrência de problemas
ambientais, má vontade da comunidade e órgãos do
governo, até custos financeiros;

 Diminuição dos conflitos pelo uso da água entre os


usuários da bacia hidrográfica. Recentemente, com
a implantação dos Sistemas Nacional e Estadual de
Gerenciamento de Recursos Hídricos, outro fator a ser
considerado na avaliação financeira dos programas de
conservação e reúso de água refere-se à cobrança pelo uso
dos recursos hídricos.

Unidade 4 231
Universidade do Sul de Santa Catarina

Pelo exposto, do ponto de vista financeiro, a opção pela


implantação de iniciativas de conservação e reúso de água deve
levar em consideração os vários custos e benefícios envolvidos, os
quais deverão ser comparados com aqueles resultantes da opção
pela não implantação de qualquer medida de conservação e reúso.

A água é um insumo vital para as atividades e operações de


qualquer setor industrial. No entanto o panorama de escassez
hídrica, principalmente nos grandes centros urbanos, somado à
rigidez das legislações, que deve ser cada vez maior tendo em
vista o cenário ambiental insustentável bem como os custos
relativos à outorga pelo uso e cobrança da água, vem incentivando
a busca por soluções que viabilizem as atividades industriais, seja
Figura 4.8 – Problemas sociais,
no aspecto econômico, como no ambiental e social.
a falta e o desperdício de água!
Fonte: VIEIRA, 2006, p. 32.
Dentro deste objetivo, a implantação de Programas
de Conservação e Reúso de Água deve ser entendida
como uma ferramenta de gestão a ser utilizada pela
indústria como diferencial de competitividade e
produtividade.

Atualmente, as indústrias têm voltado seus esforços para


programas ambientais que envolvam o reaproveitamento dos
resíduos gerados no processo industrial como fonte de geração
de produtos e o controle da eficiência no tratamento de efluentes.
Porém, para indústrias que utilizam volumes consideráveis de
água, como as indústrias de polpa e papel, de alimentos, de
metais e químicas, faz-se necessário o enfoque em programas
de redução de consumo e fechamento de circuitos de água no
processo industrial.

Os processos de tratamento a serem adotados, as suas formas


construtivas e os materiais a serem empregados são considerados
a partir dos seguintes fatores: a legislação ambiental regional;
o clima; a cultura local; os custos de investimento; os custos
operacionais; a quantidade e a qualidade do lodo gerado na
estação de tratamento de efluentes industriais; a qualidade do
efluente tratado; a segurança operacional relativa aos vazamentos
de produtos químicos utilizados ou dos efluentes; explosões;
geração de odor; a interação com a vizinhança; confiabilidade
para atendimento à legislação ambiental; possibilidade de reúso
dos efluentes tratados. (GIORDANO,1999).

232
Processos de Engenharia Biológica

Um fator importante que determina o grau de controle


da poluição por efluentes líquidos é a localização da
indústria. Podemos citar como exemplo o caso de
uma indústria localizada em uma bacia hidrográfica
de classe especial, que não poderá lançar nesta
nem mesmo os efluentes tratados. Nestes casos é
necessário, além do tratamento, que seja feita uma
transposição dos efluentes tratados para outra bacia,
logicamente com maiores custos. Além de atender aos
requisitos específicos para o lançamento de efluentes,
as características dos efluentes tratados devem ser
compatíveis com a qualidade do corpo receptor.

Tecnologia
As indústrias têm a necessidade de buscar e desenvolver novas
tecnologias visando à reutilização de água com baixo custo e de
maneira segura, para a manutenção da confiabilidade da planta e
da qualidade do produto.

O governo pode auxiliar os programas de minimização de custos,


com estudos e planejamentos relacionados ao reúso de águas,
através da criação de convênios entre universidades, centros de
pesquisa e empresas. A tecnologia advinda desta parceria pode
ser utilizada em outras indústrias com características e problemas
semelhantes.

Pesquisadores que atuam na área ambiental


argumentam que a única opção para modificarmos o
ciclo de exploração dos recursos naturais é reinventar a
nossa tecnologia, utilizando-a para diminuir o impacto
sobre o Terrão planeta.

A implementação de programas de minimização de resíduos e


reúso de água é uma necessidade iminente para as indústrias
consumidoras de grandes volumes de água, devido, não
apenas aos custos de tratamento de água e de efluentes, mas,
principalmente, a taxas crescentes pagas pelo uso da água
e lançamento de efluentes. Além destes fatores, deve ser
considerada a tendência contínua do aumento das restrições
ambientais.

Unidade 4 233
Universidade do Sul de Santa Catarina

O reúso de água é um investimento de curto prazo para a


empresa, considerando seus ganhos com a abertura de mercado,
a diminuição com custos de tratamento de água, a possibilidade
de exploração de marketing, o maior poder de negociação com
o governo e órgãos ambientais e o aumento da capacidade
de expansão da planta. Para a sociedade, é uma forma de
internalizar as externalidades e diminuir a degradação dos
recursos hídricos, permitindo a diminuição de recursos gastos
com o tratamento de água para o consumo doméstico.

As empresas devem estar preparadas para absorver a


cobrança pelo uso de água através da mudança da análise de
investimentos, inserindo os custos ambientais para determinado
empreendimento ou atividade. A maximização dos benefícios
está intrinsecamente ligada ao grau de desenvolvimento de
tecnologias limpas e viáveis, este desenvolvimento passa a ser a
grande barreira a ser ultrapassada pelas organizações atuais.

Mas, como é a realidade brasileira no que diz respeito aos


investimentos na área de melhoria de abastecimento e
reúso de água?

A desigualdade social e a cultura do desperdício estimulam


cada um a jogar água fora da maneira como lhe convém. Este
retrato está presente nas ações individuais e coletivas de descaso
com a água desperdiçada nas redes públicas de distribuição, que
chega a ser reduzida em até 40% em alguns casos, por causa de
vazamentos.

A falta de planejamento do governo, aliada ao mau uso do


potencial econômico da água no Brasil e ao desconhecimento
da população sobre a real dimensão da crise de água são fatores
preocupantes. Falta investimento para o uso e a proteção mais
eficiente da água e a garantia de uma distribuição equilibrada.

Grandes investimentos na área ambiental, maior conscientização


e gestão ambiental em parceria com equipes multidisciplinares
é o caminho para se minimizar ou controlar a poluição e a
degradação do ambiente até que sejam compatíveis com o
nível de desenvolvimento pretendido pela sociedade. Devemos
lembrar que esse controle precisa, preferencialmente, ser atingido

234
Processos de Engenharia Biológica

por meio de medidas preventivas, isto é, com o planejamento


do uso do solo pelos humanos, em contraposição às medidas
corretivas; essas, às vezes necessárias, em geral requerem vultosos
investimentos.

A água potável e o saneamento são direitos humanos básicos e


fundamentais para todos!

Síntese

Nesta unidade, estudamos os impactos ambientais causados por


diversos compostos orgânicos potencialmente poluentes (BTEX,
PHAs, Dioxinas, Furano, etc.). Aprendemos a sua classificação
e entendemos como estes compostos orgânicos ou inorgânicos
(metais) se comportam e se propagam no meio ambiente.
Outra preocupação com alguns poluentes é que o despejo de
esgotos domésticos ocorre principalmente pela diminuição da
concentração de oxigênio dissolvido disponível na água, e não
pela presença de substâncias tóxicas nesses despejos.

Percebemos que os problemas ambientais que estamos


enfrentando na atualidade são reflexo de um avanço tecnológico
negativo de diversos setores não só industriais, mas de práticas
domésticas inadequadas, abuso na utilização de reservas naturais,
principalmente as hídricas, urbanização, etc. Neste contexto,
aproximadamente 30 anos se passaram sem que investíssemos na
prevenção da poluição, muito menos que houvesse preocupação
com as nossas reservas hídricas e florestais.

O panorama de escassez hídrica, principalmente nos grandes


centros urbanos, somado à rigidez das legislações, que deve ser
cada vez maior tendo em vista o cenário ambiental insustentável,
bem como os custos relativos à outorga pelo uso e cobrança da
água, vem incentivando a busca por soluções que viabilizem
as atividades industriais, seja no aspecto econômico, como no
ambiental e social.

Verificou-se ainda que, aliado ao crescimento populacional


explosivo, associado ao fenômeno de urbanização, consumismo,

Unidade 4 235
Universidade do Sul de Santa Catarina

novas tecnologias, desconhecimento dos impactos ambientais


desse tipo de desenvolvimento, os problemas ambientais se
agravaram e os investimentos de empresas e governo se resumem
basicamente ao controle dos acidentes ambientais, e não na
prevenção e/ou medidas que minimizem estes graves problemas.
No entanto, temos de ter como meta, um futuro digno e de
qualidade, que devemos deixar para os nossos filhos e netos.

Atividades de autoavaliação

Ao final de cada unidade, você realizará atividades de autoavaliação. O


gabarito está disponível no final do livro didático. Mas esforce-se para
resolver as atividades sem ajuda do gabarito, pois, assim, você estará
promovendo (estimulando) a sua aprendizagem.
1. Em maio de 2001, o Brasil e mais de 100 países assinaram a Convenção
de Estocolmo, que trata da eliminação de uma lista inicial de 12
Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs). O documento obriga
governos a proteger o meio ambiente e a saúde das pessoas contra
as substâncias químicas tóxicas. Além das indústrias, a incineração de
resíduos é identificada como uma das principais fontes de emissões de
POPs, como os PCBs, furanos e as cancerígenas dioxinas, os produtos
tóxicos mais perigosos conhecidos pela ciência.
Partindo destas informações, cite os principais agravantes destes
compostos à saúde humana.

236
Processos de Engenharia Biológica

2. Nesta unidade, estudamos os diversos agentes que poluem a água. Em


um texto de, no mínimo, 5 linhas, cite os principais.

3. De acordo com a última avaliação do Programa das Nações Unidas para


o Meio Ambiente (PNUMA), 80 países estão com sérias dificuldades para
manter a disponibilidade de água. Esses 80 países representam 40%
da população mundial. Pesquise através de consultas bibliográficas
oito dos principais problemas ambientais que comprometem o futuro
hídrico mundial:

Unidade 4 237
Universidade do Sul de Santa Catarina

4. O acesso à água tratada e de qualidade é um direito de todo cidadão


que o Estado deve garantir. Além de ser uma questão de saúde e
qualidade de vida, ter acesso à boa água para viver é uma questão de
cidadania.
Portanto vamos solicitar que nossos representantes políticos apoiem
os projetos e iniciativas que façam chegar água de qualidade às zonas
periurbanas e rurais, especialmente para populações de baixa renda.
Para isso, você teria que sugerir pelo menos cinco medidas gerenciais
para reúso ou recuperação da água de seu município.

238
Processos de Engenharia Biológica

Saiba mais
Se você desejar, aprofunde os conteúdos estudados nesta unidade,
ao consultar as seguintes referências:

ABNT - NBR-13.969/97 - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE


NORMAS TÉCNICAS. Disponível em: <http://www.enge.
com.br/reuso_agua.htm>. Acesso em: out.2010.

BRASIL. - RESOLUÇÃO Nº. 54, DE 28 DE NOVEMBRO


DE 2005. Disponível em: <www.aesa.pb.gov.br/.../54_2005_
criterios_gerais_uso_agua.pdf>. Acesso em: nov. 2010.

HESPANHOL, I.; MIERZWA, J.C.; RODRIGUES, L.D.B.;


DA SILVA, M.C.C. Manual de conservação e reúso de água
na indústria. Centro Internacional de Referência em Reúso
de Água – CIRRA/IRCWR. Rio de Janeiro: DIM, 2006.
Disponível em: <www.siamfesp.org.br/novo/downloads/cartilha_
reuso.pdf>. Acesso em: out. 2010.

NUNES, J.A. Tratamento físico-químico de águas residuárias


industriais. 2. ed. Aracaju: Gráfica Editora J. Andrade, 1996.

PAIVA, Horacio Lafer. Manual de conservação e reúso de água


para a indústria para o setor industrial. Disponível em: <www.
fiesp.com.br/publicacoes/pdf/ambiente/reuso.pdf>. Acesso em:
nov. 2010.

Agência Nacional de Águas (ANA). Manual de Conservação


e reúso de água na agroindústria. Disponível em: <http://
www.ambienteenergia.com.br/index.php/2009/12/manual-de-
conservacao-e-reuso-de-agua-na-agroindustria/945>. Acesso em:
nov. 2010.

Unidade 4 239
Para concluir o estudo

Esta disciplina abordou um conteúdo vasto de


informações. Iniciamos o estudo, conhecendo as
características dos seres vivos, em particular os micro-
organismos, onde eles vivem, como se classificam e como
interagem com os seres humanos e com o ambiente.
Compreendemos a atuação destes organismos sob
vários aspectos, seja causando doenças ou remediando
ambientes “doentes”.

Contextualizamos os fatores econômicos relacionados


à recuperação ambiental, estudamos os contaminantes
orgânicos, inorgânicos e os biorreatores (onde podemos
recriar in vitro as características dos micro-organismos,
ou parte deles, para poder atuar de forma mais eficaz e
pontual em algum problema específico de recuperação ou
remediação ambiental).

Ainda, demonstramos, através de processos na área


da engenharia e da biotecnologia, formas de aplicação
deste conhecimento com objetivo único de melhorar a
qualidade de vida no planeta em que vivemos.

Concluindo sobre a contribuição que esta disciplina


pode deixar a você - profissional da área ambiental
-, chamo a atenção para a necessidade urgente da
conscientização humana no que diz respeito ao meio
ambiente. Não construiremos um “ambiente de
qualidade” sem auxílio de equipes multidisciplinares,
sem o conhecimento, a contextualização dos problemas
presentes e, principalmente, sem a atualização constante
do conhecimento adquirido.

Faça a sua parte, semeie um presente digno e saudável,


para que desfrutemos no futuro as boas colheitas deste
esforço conjunto.

Agradeço a oportunidade de estar construindo com você um


mundo mais consciente, sustentável e saudável para nós,
nossos filhos e netos.
Referências

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dos produtos agrotóxicos organoclorados. D.O.U., 03 set. 1985.
BRASIL. Lei nº 7.804 de 18 de julho de 1989. Altera a Lei nº 6.938,
de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional
do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e
aplicação, a Lei nº 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, a Lei nº 6.803,
de 2 de julho de 1980, e dá outras providências.
Universidade do Sul de Santa Catarina

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www.wwf.org.br/informacoes/bliblioteca/publicacoes_educacao_
ambiental/?2986>. Acesso em: out. 2010.

245
Sobre a professora conteudista

Denise Esteves Moritz

Doutora em Engenharia Química pela Universidade


Federal de Santa Catarina (2005). É professora da
Universidade do Sul de Santa Catarina desde 1999
em disciplinas oferecidas nos cursos de graduação em
Farmácia, Nutrição e Gestão Ambiental.

Dedica-se à pesquisa, ao ensino e atividades de


extensão nos cursos de Farmácia, Nutrição e Gestão
Ambiental, com ênfase em desenvolvimento de produtos
e processos com reaproveitamento de resíduos, produção
biotecnológica de produtos de alto valor agregado.

Possui conhecimento avançado na área de bioquímica de


micro-organismos, química dos alimentos, entre outras.
Atua na área de pesquisa no Laboratório de Engenharia
Química e Engenharia de Alimentos (UFSC), com
os seguintes temas: Processos fermentativos, Química
e bioquímica dos alimentos, biopigmentos, métodos
analíticos (CG e CG-MS), tratamento de biomassa e
microbiologia aplicada a processos tecnológicos.

Endereço para acessar o CV:


http://lattes.cnpq.br/6418180165259363
Respostas e comentários das
atividades de autoavaliação

Unidade 1 - Respostas:
1. Cuidados diários, como o de purificação da água, a
pasteurização do leite e a preservação dos alimentos
são muito importantes para o controle das populações
microbianas, trazendo grandes benefícios para a população.
Os principais motivos para se desenvolver o controle de
micro-organismos são basicamente:
1 - prevenir a transmissão de doenças e infecções;
2 - prevenir a contaminação ou crescimento de micro-
organismos nocivos;
3 - prevenir a deterioração e dano de materiais por micro-
organismos.
2. Os principais grupos de micro-organismos são os
protozoários, fungos, algas e bactérias. Os vírus, apesar de
não serem considerados vivos, têm algumas características
de células vivas e, por isso, são estudados como micro-
organismos.
Bactérias: (do grego bakteria, bastão) são organismos
unicelulares, procariontes (não possuem envoltório nuclear,
nem organelas membranosas). Seu domínio filogenético
é Bactéria. Podem ser encontrados na forma isolada ou
em colônias. Podem viver na presença de ar (aeróbias),
na ausência de ar (anaeróbias), ou ainda ser anaeróbias
facultativas. Sua morfologia é baseada na forma e no arranjo
celular.
Fungos: são micro-organismos eucarióticos
quimiorganotróficos. Reproduzem-se, naturalmente, por meio
de esporos, com poucas exceções. Além disso, a maioria das
partes de um fungo é potencialmente capaz de crescimento.
Um minúsculo fragmento é suficiente para originar um novo
indivíduo. São geralmente aeróbios, podendo, em alguns
casos, como as leveduras, ser aeróbios facultativos.
Protozoários: são organismos eucariotos, na maioria das vezes,
unicelulares. Ingerem partículas alimentares, não apresentam parede
celular rígida e não contêm clorofila.
Protozoários são organismos quimiorganotróficos (heterotróficos).
A maioria dos protozoários é de vida livre e aquática. Podem ser
encontrados na água doce, salobra ou água salgada, levam vida livre
também em lugares úmidos, rastejando pelo solo ou sobre matéria
orgânica em decomposição. No entanto algumas espécies levam
vida parasitária nos organismos de diversos hospedeiros e, assim,
passam a maior parte da vida parasitando diversas espécies de seres
vivos, causando-lhes muitas doenças. São aeróbios obrigatórios. Os
protozoários parasitas são de particular interesse nas ciências da saúde.
Muitos vivem em ambientes aquáticos e formam cistos (estrutura
de resistência e latência dos protozoários), quando as condições
ambientais não são favoráveis.
Algas: compreendem vários grupos de seres vivos aquáticos e
autotróficos, ou seja, que produzem a energia necessária ao seu
metabolismo através da fotossíntese. São consideradas semelhantes
às plantas, porque contêm o pigmento verde clorofila que participa
do processo de fotossíntese e apresentam uma parede celular
rígida. Algas Procariontes (do Reino Monera ou Bactéria). As mais
importantes são as “algas azuis” ou cianofíceas, modernamente
classificadas como Cianobactéria como uma divisão dentro do
domínio Eubactéria ou “verdadeiras” bactérias (ou reino Monera).
Foram dos primeiros seres vivos a aparecer na Terra, com o mais antigo
fóssil datado em 3.800 milhões de anos (Pré-Câmbrico). Acredita-se
que tiveram um papel preponderante na formação do oxigênio da
atmosfera.
Vírus: os vírus são estruturas que representam o limite entre as formas
vivas e as inanimadas. Apresentam as estruturas mais simples, são
muito menores que as bactérias. Trata-se de “parasitas intracelulares
obrigatórios”. Diferentemente das células, os vírus contêm somente
um tipo de ácido nucleico, RNA ou DNA, que é circundado por um
envelope proteico ou capa. Devido à ausência de componentes
celulares necessários ao metabolismo ou reprodução independente, os
vírus podem multiplicar-se somente dentro de células vivas.

250
Unidade 2 - Respostas:
1.
a. Micro-organismos emergentes são aqueles para os quais a atenção e/
ou preocupação de médicos, especialistas e/ou epidemiologistas têm-
se voltado a partir de períodos mais ou menos recentes. Assim, podem
constituir espécies recém-descobertas ou organismos já conhecidos/
identificados, porém cuja capacidade de infectar seres humanos e lhes
ser patogênicos apenas agora se descobriu.
b. Alguns exemplos podem ser os gêneros Cryptosporidium e Giardia.
c. Durante a disciplina abordamos o caso do Caruaru, Pernambuco - Água
utilizada em hemodiálise contaminada com cianobactérias. Mas o aluno
pode citar outro.
d. A eutrofização artificial produz mudanças nas qualidades da água,
incluindo a redução de oxigênio dissolvido, perda das qualidades
cênicas, aumento do custo de tratamento, morte extensiva de peixes e
aumento das incidências de florações de microalgas e cianobactérias.
Estas florações ou bloom se caracterizam pelo intenso crescimento
desses micro-organismos na superfície da água, formando uma densa
camada de células com vários centímetros de profundidade, com
consequências relacionadas com a Saúde Pública.
2. C; D; A; B; E

251
Unidade 3 - Respostas:
1. Biodigestão aeróbia - Em condições aeróbias, a digestão microbiana da
matéria orgânica produz água (H2O) e dióxido de carbono (CO2).
Biodigestão anaeróbia - Em condições anaeróbias, a ação de vários
grupos de micro-organismos forma como produtos finais o metano
(CH4), dióxido de carbono (CO2) e água.
2.
a. A biotecnologia em um primeiro momento serviria para remediar
(BIORREMEDIAÇÃO - refere-se ao uso de micro-organismos para
detoxificar áreas contaminadas) o problema de transmissão de
doenças, através do tratamento adequado de efluentes. Num
segundo momento, caso o primeiro não fosse bem-sucedido, seria o
biotratamento através de técnicas que retirem os micro-organismos do
efluente (BIODEGRADAÇÃO - refere-se à transformação de moléculas
xenobióticas por micro-organismos aeróbicos – compostagem – e
anaeróbicos – biogás).

b. - Produção de antibióticos contra estas doenças.


- Produção de vacinas contra estas doenças.
- Tratamento adequado dos efluentes por técnicas avançadas em
biotecnologia (em condições sanitárias adequadas).
3. Os sojicultores brasileiros terão uma nova opção no manejo de plantas
daninhas. “É uma soja que tolera um grupo diferente de herbicidas.
O objetivo é fazer o controle de plantas daninhas, facilitando a vida
do agricultor”, explica Carlos Alberto Arrabal Aires, pesquisador da
Embrapa Soja. Segundo o cientista, essa nova variedade facilitará o
manejo do produtor, pois ele terá mais uma alternativa de uso de
herbicida. “O sojicultor vai poder usar outra molécula para controlar as
plantas daninhas, o que é muito importante, pois é sabido que o uso
da mesma molécula ano após ano acaba selecionando algumas plantas
daninhas resistentes, o que traz problemas para a lavoura.”. Disponível
em: <http://www.revistarural.com.br/Edicoes/2007/Artigos/rev117_
biotecnologia.htm>.

4. Exemplo de doenças não causadas por micro-organismos: saturnismo e


metemoglobinemia. O saturnismo é provocado por excesso de chumbo
na água; já a metemoglobinemia em crianças é decorrente da ingestão
de concentrações excessivas de nitrato.

252
5.
a. Biotecnologia clássica utiliza células biológicas ou parte delas (enzimas,
por exemplo) livres ou imobilizadas. Na biotecnologia moderna são
utilizados gens ou modificações genéticas.
b. Nas últimas décadas, os desenvolvimentos científicos na área da
biologia e da bioengenharia, especialmente aqueles focados na
indústria farmacêutica e na medicina, promoveram uma verdadeira
revolução na forma como a sociedade percebe as biotecnologias
(EFB, 1999a; SCULLY, 2003). Os OGMs (organismos geneticamente
modificados) já são uma parte integral e essencial de muitas
atividades industriais, como a produção de biocombustíveis, que
busca tornar sua produção competitiva através da incorporação
de micro-organismos mais eficazes em seus processos produtivos.
(BOSTON GLOBE, 2006). Importantes iniciativas existem para estimular
o desenvolvimento da biotecnologia ambiental, como o projeto
Biomac, patrocinado pela Administração Federal Suíça, que busca
alavancar técnicas de construção e operação de um biorreator para
a cultura em massa de micro-organismos selecionados. (ARAMIS,
2006). Na área da biotecnologia médica, o polo de competitividade
Bioméditerranée (Le Biocluster de Provence Alpes Côte d’Azur) foi
criado pelo governo regional francês para estimular o desenvolvimento
na área da biotecnologia aplicada, cujo modelo de aproximação
multissetorial é igualmente aplicável à área ambiental. (ASSOCIATION
BIOMÉDITERRANÉE, 2007).

253
Unidade 4 - Respostas:
1. As substâncias químicas emitidas de um incinerador causam uma
variedade de problemas na saúde humana, incluindo impactos no
sistema reprodutivo e imunológico, abortos expontâneosespontâneos,
doenças respiratórias, diabetes, disfunção hormonal e câncer.
2. Os agentes poluidores são inúmeros, podendo ir desde o mercúrio
empregado no garimpo e os agrotóxicos agrícolas, passando pelos
esgotos residenciais e industriais, até as chuvas ácidas e os materiais
sintéticos não -biodegradáveis, como o plástico e o óleo despejado
pelos navios petroleiros. Dioxinas, Furanos, PHAs, etc. O monóxido
de carbono é produzido, sobretudo, pelos automóveis, pela
indústria siderúrgica e pelas refinarias de petróleo. Outros poluentes
atmosféricos são os: hidrocarbonetos, aldeídos, óxidos de azoto, óxidos
de ferro, chumbo e derivados, silicatos, flúor e derivados, entre outros.
3. Oito principais problemas ambientais ou oito temas centrais para o
futuro hídrico do planeta:
1) mudanças globais;
2) perda de diversidade biológica;
3) depleção estratosférica de ozônio;
4) degradação de recursos hídricos;
5) desertificação e degradação do solo;
6) desmatamento e uso não sustentável de florestas;
7) degradação de recursos do mar e do ambiente marinho;
8) poluentes orgânicos persistentes (POPs).
4.
- Proteção dos mananciais e das bacias hidrográficas.
- Tratamento de esgotos e de águas rejeitadas por indústrias.
- Tratamento e disposição do lixo doméstico, industrial e de construção
civil.
- Controle da poluição difusa.
- Treinamento de gerentes, técnicos ambientais e de recursos hídricos.
- Educação sanitária da população.
- Programas de mobilização comunitária e institucional.

254
Biblioteca Virtual

Veja a seguir os serviços oferecidos pela Biblioteca Virtual aos


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* Se você optar por escaneamento de parte do livro, será lhe enviado o


sumário da obra para que você possa escolher quais capítulos deseja solicitar
a reprodução. Lembrando que para não ferir a Lei dos direitos autorais (Lei
9610/98) pode-se reproduzir até 10% do total de páginas do livro.
Anexo - Imagens Coloridas

Unidade 1

Figura 1.9 - Árvore filogenética de organismos: Bacteria, Archaea e Eukaria.


Fonte: Disponível em: <http://www.portaleducacao.com.br/forum/forum_posts.
asp?TID=637>. Acesso em: ago. 2010.
––

Figura 1.10 - Invasão de uma bactéria em um tecido epitelial.


Fonte: Disponível em: <http://forums.tibiabr.com/showthread.php?t=271278>.
Acesso em: 22 ago 2010.

Figura 1.12 - Classificação bacteriana de acordo com a forma.


Fonte: Disponível em: <http://www.infoescola.com/biologia/reino-monera-bacterias-
cianobacterias/>. Acesso em: 15 jun. 2010.

Figura 1.13 - Classificação bacteriana de acordo com o grau de agregação.


Fonte: Disponível em: <http://www.infoescola.com/biologia/reino-monera-bacterias-
cianobacterias/>. Acesso em: 15 jun. 2010.

258
Processos de Engenharia Biológica

Figura 1.15 - Forma de infecção e multiplicação do vírus Influenza em uma célula humana.
Fonte: Disponível em: <http://www.qmc.ufsc.br/qmcweb/artigos/virus_container/virus.html>.
Acesso em: 20 ago. 2010.

Figura 1.17 - Bolor contaminando a laranja (a). Macromorfologia do fungo causador (Penicillium sp.) e
(c) estrutura do fungo ao microscópio ótico.
Fonte: Elaboração do autor, 2010.

ANEXOS 259
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 1.18 - Representação esquemática de uma célula leveduriforme.


Fonte: Elaboração do autor, 2010.

Figura 1.19 - Principais estruturas morfológicas de um fungo filamentoso.


Fonte: Disponível em: <http://www.cientic.com/tema_fungo_img2.html>. Acesso em: 20 jul. 2010.

260
Processos de Engenharia Biológica

Figura 1.20 - Alguns tipos de Protozoários encontrados em água salgada e água doce.
Fonte: Disponível em: <http://www.tratamentodeagua.com.br/r10/Biblioteca_Detalhe.
aspx?codigo=96&topico=654>. Acesso em: 28 ago. 2010.

Figura 1.21 - Células unicelulares de cianobactérias (ou algas azuis).


Fonte: Disponível em: <http://preservemais.spaces.live.com/?_c11_BlogPart_pagedir=Next&_
c11_BlogPart_handle=cns!CBEAD7CFB4866C0F!560&_c11_BlogPart_BlogPart=blogview&_
c=BlogPart>. Acesso em: ago. 2010.

ANEXOS 261
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 1.22 - Intensa poluição do Tejo, vinda de Espanha.


Fonte: Disponível em: <http://gentedelisboa.blogspot.com/2009/05/alerta-de-poluicao-
eutrofizacao-no-tejo.html>. Acesso em: ago. 2010.

Figura 1.24 - O fenômeno causado pela proliferação de algas dinoflageladas.


Fonte: Disponível em: <http://www.mundoeducacao.com.br/biologia/mare-vermelha.htm>.
Acesso em: 22 ago. 2010.

262
Processos de Engenharia Biológica

Unidade 2

Figura 2.2 - Cryptosporidium parvum. O cisto contendo 4 núcleos.


Fonte: Disponível em: <http://www.safetables.org/fb_illnesses/display.cfm?id=4>.
Acesso em: 20 set. 2010.

Figura 2.3 - Forma parasitária (trofozoíto) e forma cística de Giardia lamblia.


Fonte: Disponível em: <http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/giardiase/>.
Acesso em: 20 set. 2010.

ANEXOS 263
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 2.4 - Técnica de Gram.


Fonte: Disponível em:<http://www.biologycorner.com/APbiology/pathology/bacteria.html>.
Acesso em: 20 set. 2010. Adaptação do autor.

Figura 2.5 - Diferença entre as células de Bactérias Gram-positivas e Gram-negativas.


Fonte: Disponível em: <www.biologycorner.com/APbiology/pathology/bacteria.html>.
Acesso em: 20 set. 2010.

264
Processos de Engenharia Biológica

Figura 2.6 - Contagem em placas, demonstrando a diluição seriada e a inoculação em meio de cultivo
sólido. Fonte: Disponível em: <http://vsites.unb.br/ib/cel/microbiologia/crescimento/crescimento.
html#fatores>. Acesso em: 27 set. 2010. Adaptação do autor.

Figura 2.7 - Método de contagem microbiana pela técnica de membranas filtrantes.


Fonte: Disponível em: <http://www.e-escola.pt/topico.asp?id=307&ordem=4>.
Acesso em: 27 set. 2010.

ANEXOS 265
Universidade do Sul de Santa Catarina

Figura 2.8 - Determinação do NMP (Número Mais Provável)


Fonte: Disponível em: <http://helenamazzotti.blogspot.com/2009/11/sobrevivencia-de-coliformes.
html>. Acesso em: 27 set. 2010.

Figura 2.9 - Técnica dos Tubos Múltiplos Cromogênios (caldo Chromocult Enterococci®, da MERCK)
demonstrando positividade (mudança de cor de amarelo para verde) na presença de grupo
Enterococcus. Fonte: Machado, 2004, p. 82.

266
Processos de Engenharia Biológica

Figura 2.10 - Prova bioquímica Rugai Modificado (IMVC- indol, vermelho-de-metila, Voges-
Proskauer-citrato), da colônia isolada de Pseudomonas aeruginosa. Fonte: MACHADO, 2004, p. 79.

Figura 2.11 - Técnica de Substrato Cromogênico e Fluorogênico.


Fonte: Machado, 2004, p. 77.

ANEXOS 267
Universidade do Sul de Santa Catarina

Unidade 3

Gráfico 3.2 - Exemplo de uma cinética de crescimento em batelada simples.


Fonte: Elaboração do autor, 2010

Gráfico 3. 3 - Ensaio de degradação de HPAs utilizando as cepas isoladas da Praia da Ribeira (RJ).
Fonte: MESQUITA, 2004, p.83.

268
Processos de Engenharia Biológica

Unidade 4

Figura 4.5 - Ciclo hidrológico.


Fonte: Vieira, 2006, p. 11.

ANEXOS 269

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