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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB

INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS – ICS


DEPARTAMENTO DE ESTUDOS LATINO-AMERICANOS - ELA

RELATÓRIO FINAL DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA


A Produção Científica sobre a América Latina na ANPOCS

Évelyn Silva Bernardo


Orientadora: Dra. Lília Gonçalves M. Tavolaro

Brasília-DF
2017
Resumo: O presente relatório final de iniciação científica tem como objetivo
apresentar um perfil dos trabalhos sobre América Latina apresentados nos
Encontros Anuais da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais
(ANPOCS), entre 1977 até 2016. A partir de uma análise da quantidade de
trabalhos, suas principais áreas de concentração, temas predominantes, e vínculos
institucionais, busca-se identificar a frequência e importância do tema “América
Latina” nos encontros da ANPOCS.

Abstract: This final report aims to present the analysis and systematization of the
papers on Latin America presented at the Scientific Meetings of the National
Association of Graduate Studies in Social Sciences (ANPOCS) between 1977 and
2016, based on data regarding the number, importance, main themes and
institutional affiliation of the works on “Latin America” presented at ANPOCS scientific
meetings.

Palavras-chave: América Latina, Brasil, produção científica, ANPOCS

APRESENTAÇÃO

Embora sejam várias e importantes as contribuições de cientistas sociais


brasileiros para a produção do conhecimento sobre a América Latina, os estudos
sobre a região de perspectiva interdisciplinar e sob uma abordagem propriamente
regionalista permanecem relativamente invisibilizados na produção intelectual na
área de ciências sociais no Brasil. O presente trabalho objetiva identificar a produção
científica de perspectiva regionalista voltada para a América Latina no Brasil a partir
de um levantamento dos trabalhos apresentados em reuniões, mesas redondas,
conferências, fóruns, colóquios, painéis, simpósios, simpósios de pesquisas pós-
graduadas, seminários temáticos, grupos de trabalho, e seminários temáticos que
ocorreram nos encontros anuais da ANPOCS, desde seu primeiro encontro em 1977
até 2016.
Fundada em 1977, a ANPOCS é uma entidade de direito privado sem fins
lucrativos, que reúne diversos centros de pós-graduação e de pesquisa em
antropologia, ciência política, relações internacionais e sociologia, de todo o Brasil.
De acordo com dados institucionais do site, esta é responsável por diversos meios
de divulgação que visam incentivar os cientistas sociais a contribuírem para a
análise dos problemas do desenvolvimento nacional e mundial, tais como revistas,
livros e coletâneas. Além disso, os encontros anuais realizados pela ANPOCS
destinam um espaço para atuação de grupos de trabalho e atividades diversas que
possuem temáticas diferenciadas e de indiscutível relevância científica.
A opção por esse viés investigativo se deve, portanto, ao fato de ser a
ANPOCS uma associação de notório prestígio e relevância na área de Ciências
Sociais no Brasil e pelo fato de seus encontros reunirem pesquisa de nível de pós-
graduação altamente qualificada, de grande circulação e impacto sobre a produção
acadêmica nacional.
Com base em um levantamento dos trabalhos apresentados em todas as
atividades dos encontros anuais da ANPOCS desde 1977, traçamos um perfil da
produção brasileira sobre América Latina na área de ciências sociais quanto à sua
2
relevância numérica (quantidade de trabalhos), suas principais áreas de
concentração, temas predominantes, vínculos institucionais por tipo de instituição e
região.

METODOLOGIA

A pesquisa teve como fonte o site da ANPOCS, o qual concentra diversos


trabalhos apresentados nos encontros anuais, do 1º ao 40º, de 1977 a 2016,
respectivamente. A coleta de dados foi realizada primeiramente durante os meses
de agosto e setembro de 2016. Nos meses de novembro de 2016 a abril de 2017
foram realizadas outras coletas a fim de confirmar dados pendentes. Percebeu-se
que a maioria dos trabalhos disponíveis concentravam-se nos grupos de trabalhos
(GTs), seminários temáticos (STs) e simpósios de pesquisas pós-graduadas (SPGs),
uma vez que são estas as atividades que abrigam maior quantidade de trabalhos no
encontro. De acordo com a programação do 40º encontro anual, em 2016, houve 35
STs e 30 SPGs, um número, portanto, bastante superior às outras atividades do
Encontro: 5 conferências, 3 conversas com autores, 3 sessões especiais, 26 mesas
redondas, 11 colóquios, 4 fóruns, 2 simpósios e 16 reuniões.
Não obstante, vários empecilhos e problemas técnicos que se interpuseram à
busca por trabalhos no site nos impediram de avaliar o conteúdo de trabalhos
apresentados em alguns anos e de nos certificarmos se não se tratavam de
trabalhos que, embora não apresentassem América Latina ou termos relacionados
(latino-americano, Caribe, caribeanista, ou nomes de países da América Latina) no
título, não elaboravam em seus conteúdos uma abordagem sobre a região. Na
primeira busca foram encontrados diversos trabalhos que, ao serem acessados,
constavam como “arquivo vazio” ou “arquivo inexistente” ou ainda “erro ao carregar”.
Os anos de 2004, 2009 e 2010 foram os que apresentaram tais dificuldades com
maior frequência. Notou-se que nos anos de 1977 e 1978 não havia nenhum
trabalho anexado ao site, somente a partir de 1979 foi possível encontrar os
materiais referentes aos encontros. Além disso, não foi possível acessar os
trabalhos de 1987.
Outra dificuldade encontrada ainda na primeira busca foi com relação à
programação dos encontros. Em alguns anos foi possível acessar no site a
programação com todos os eventos dos encontros e os resumos dos trabalhos, o
que facilitou a procura por temas sobre a América Latina.
Durante a segunda busca para confirmar dados pendentes foram encontradas
outras dificuldades para acessar novamente os trabalhos. Após o 40º encontro, em
outubro de 2016, os trabalhos a partir do ano de 2001 foram retirados do site, bem
como outros materiais (programação e dados estatísticos dos encontros). Tal
ocorrido dificultou uma nova busca de trabalhos com temática latino-americana, o
que pode explicar a discrepância no número de trabalhos entre alguns anos.

PRODUÇÃO CIENTÍFICA SOBRE A AMÉRICA LATINA NA ANPOCS

Ao longo dos encontros anuais da ANPOCS, desde 1977 até o ano de 2016
foi possível identificar 405 trabalhos e 35 painéis apresentados entre GTs e STs que
abordavam a temática sobre a América Latina. Além disso, América Latina figurou
como tema central de 21 mesas redondas; 3 conferências; 2 fóruns; 3 colóquios; 3
simpósios; 24 simpósios de pesquisas pós-graduadas; 2 sessões especiais; 1

3
prêmio do concurso ANPOCS para dissertação de mestrado em ciências sociais; 1
conversando com o autor latino-americano (Alejandro Grimson); e 1 reunião especial
no ano de 2016: a I Reunião de Pesquisadores Latino-Americanistas e
Caribeanistas, coordenada pelas professoras Lília Tavolaro e Flávia Lessa,
professoras vinculadas ao recém-criado Departamento de Estudos Latino-
Americanos (antigo centro de Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas), da
Universidade de Brasília (UnB), e outros pesquisadores de outras universidades
além da UnB.
Conforme ilustra o gráfico 2 em anexo é notável o crescimento na quantidade
de trabalhos sobre a América Latina a partir de meados dos anos 2000, sendo 2016
o ano com maior número, totalizando 102 trabalhos em todas as atividades dos
encontros, 63 deles somente em GTs/STs. No entanto, nota-se que é ainda tímida a
presença desta temática em relação às demais temáticas abordadas nos encontros
anuais (gráfico 3).
De acordo com os dados levantados, a maior parte da produção acadêmica
em nível de pós-graduação apresentada na ANPOCS se concentra nas áreas de
Sociologia e de Ciência Política e aparece de forma bem menos significativa nas
demais disciplina: foram 160 trabalhos em sociologia, 152 em ciência política, 53 em
antropologia, 38 em economia, 34 em relações internacionais, 12 em história, 6 em
direito e 5 em administração1.
São também as universidades públicas (federais e estaduais) concentradas
na região sudeste as principais responsáveis por essa produção. No gráfico 5 USP,
UNICAMP e UFRJ, destacam-se com 54, 36 e 31 trabalhos, respectivamente. Com
menor participação, a FLACSO e a Universidade de Buenos Aires (UBA), com 9 e 7
trabalhos, respectivamente. Nos gráficos 6 e 7 pode-se assim constatar maior
concentração de trabalhos das regiões sudeste, com 322 trabalhos ao todo,
especificamente provenientes de instituições localizadas no estados do RJ e SP,
com 103 e 101 trabalhos, respectivamente.
A esse repeito, Gentili e Saforcada (2010) apontam que ao mesmo tempo em
que existe uma expansão do ensino superior em ciências sociais na América Latina,
este se dá de forma desigual por região. Além disso, as instituições de ensino
superior na América Latina tem sido, segundo esses autores, fortemente marcadas
pela competição e mercantilização, ou seja, competição e disputa nas comunidades
acadêmicas e fonte de recursos extras em cursos e em faculdades (privatização do
ensino), sendo no Brasil a região sudeste a maior do país e, portanto, detentora do
maior desenvolvimento social e econômico, abrigando universidades que
concentram mais recursos e investimentos.
Com relação à relativa escassez de trabalhos voltados para a América Latina
comparativamente a outras temáticas e abordagens na ANPOCS, esta reverbera
uma tendência identificada por Pablo Gentili e Fernanda Saforcada (2010) na
produção acadêmica em nível de pós-graduação na América Latina, em decorrência
das ditaduras que atingiram a região, qual seja: o problema da “emigração
acadêmica” (p. 11) que levou a que muitos cientistas sociais não regressassem mais
ao seu país de origem e o consequente esvaziamento das universidades e das
ciências sociais mais críticas, voltadas para os problemas pertinentes à região e a
partir da região.

1
A delimitação por área de concentração dos trabalhos se deu mediante a identificação da filiação institucional
dos autores dos trabalhos.
4
Em contrapartida, o aumento expressivo de trabalhos sobre a América Latina
na ANPOCS em especial a partir de meados dos anos 2000, acompanha uma
mudança no enfoque da política externa brasileira durante os governos Lula,
quando, conforme lembra Bethell (2009:313) o Brasil esteve muito mais resistente à
agenda estadunidense para a integração das Américas e, pela primeira vez, passou
a privilegiar as relações com seus países latino-americanos vizinhos, em especial os
do Cone Sul.
A maior concentração de trabalhos sobre a região na área de Sociologia
também explica-se, conforme Tavares-dos-Santos e Baumgarten (2005), pelo fato
de que esta disciplina soube participar de forma expressiva de diversas
transformações das sociedades latino-americanas desde o século XIX, onde
“acompanhou o processo de construção do Estado e da Nação, problematizou as
questões sociais, analisou os efeitos da mundialização, das conflitualidades, sempre
se mantendo em um diálogo internacional múltiplo” (p. 178). Tavares-dos-Santos e
Baumgarten (2005) relatam que os processos de redemocratização ocorridos nas
duas últimas décadas do século XX em países da América Latina, como Brasil e
Chile, culminaram em novos processos sociais de extrema importância para o
debate na sociologia. Para os autores, as transformações das sociedades latino-
americanas foram marcadas por conflitos sociais e pela globalização da economia
durante essas décadas, o que pode ser notado nas temáticas dos trabalhos
apresentados.
A esse respeito, nota-se que, nas décadas de 1980 e 1990, prevaleceram os
trabalhos que giravam em torno da política social, democracia e desenvolvimento da
América Latina, integração regional, blocos econômicos e contexto internacional,
programas sociais, megablocos, conflitos sociais.
Nos anos 2000 e 2010 foi notável a diversidade nas temáticas dos trabalhos
apresentados. Os assuntos centralizavam-se em sua maioria em questões como:
pensamento latino-americano e correlações com autores importantes da região;
desigualdades sociais; políticas públicas; relações internacionais e políticas
externas; gênero e o empoderamento feminino; relações raciais; dilemas da
modernização e avanço tecnológico; migração de latino-americanos para o Brasil;
família e sociedade; gastos públicos; alguns trabalhos abordaram os avanços do
ensino em ciências sociais, outros mencionaram a necessidade de emancipação das
ciências sociais como conhecimento acadêmico e científico; principalmente durante
o século XX, quando houve um grande avanço na educação superior nos países da
região.

CONCLUSÃO

Ao longo dos encontros anuais foi perceptível um aumento de trabalhos com


enfoque no contexto da América Latina de acordo com os dados encontrados no site
da ANPOCS, principalmente após os anos 2000. Os autores Gentili e Saforcada
(2010) afirmam que durante os últimos trinta anos houve um aumento da produção
científica na área de ciências sociais na América Latina, algo que correspondeu ao
grande avanço na educação superior nos países da região, ainda que de forma
desigual e fragmentada.
Apesar dos obstáculos políticos e institucionais enfrentados pelos países
latino-americanos no que tange à promoção da pesquisa científica – o que conforme
foi apurado, dificultou o pleno desenvolvimento da produção do conhecimento
produzido sobre e a partir da região – os estudos sobre a América Latina na área de
5
ciências sociais no Brasil conquistaram um importante espaço acadêmico que
contribui para o desenvolvimento cultural e científico na região e, principalmente,
para os avanços dos estudos em ciências sociais.
Como apontam Gentili e Saforcada (2010), é de extrema importância que as
ciências sociais na América Latina tenham “espaços de encontro, intercâmbio e
colaboração” (p. 19); diálogos que “permitam uma reflexão crítica” (p. 19); discussão
e articulação em relação às políticas de educação superior e uma “cultura solidária e
colaboradora no âmbito da formação de pós-graduação e da pesquisa acadêmica”
(p. 19), afim de que o ensino superior em ciências sociais esteja dentro de uma
temática importante nas pautas das políticas públicas latino-americanas. Tais
propostas descritas pelos autores podem ser encontradas na ANPOCS durante
encontros anuais, onde diversas áreas e temáticas das ciências sociais ganham
espaço e interagem seus conhecimentos de forma multidisciplinar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais


(ANPOCS). Institucional: Sobre a ANPOCS. Disponível em:
<http://www.anpocs.com/index.php/universo/institucional/sobre-a-anpocs>. Acesso
em: 05 fev. 2017.
BETHELL, Leslie. O Brasil e a ideia de “América Latina” em perspectiva histórica.
Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Vol. 22, n. 44, pp. 289-321, 2009. Disponível
em: <http://www.scielo.br/pdf/eh/v22n44/v22n44a01.pdf>. Acesso em: 05 jan. 2017.
GENTILI, Pablo; SAFORCADA, Fernanda. A expansão da pós-graduação em
ciências sociais. Desigualdade regional, competência e mercantilização na América
Latina. Série Cadernos FLACSO, São Paulo, n. 2, pp. 1-23, 2010. Disponível em:
<http://flacso.redelivre.org.br/files/2015/03/N2-GentilieSaforcada-Portugues.pdf>.
Acesso em: 05 jan. 2017.
GOHN, Maria da Glória. Desafios para a pesquisa em ciências sociais na América
Latina na temática da participação social. Polis, Santiago, n. 41, pp. 1-10, 2015.
Disponível em: <https://polis.revues.org/11186>. Acesso em: 26 mar. 2017.
IANNI, Octávio. Enigmas do Pensamento Latino-Americano. São Paulo: Instituto
de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, 2000. 42 p. Disponível em:
<http://www.iea.usp.br/artigos>. Acesso em: 05 jan. 2017.
MOTTA, Renata Campos. Ciências sociais na América Latina: privilégio
epistemológico, estilo original. Revista Debates, Porto Alegre, v. 3, n. 1, pp. 9-26,
2009. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/index.php/debates/article/view/3135/5447>.
Acesso em: 26 mar. 2017.
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45222005000200009&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 05 jan. 2017.

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ANEXO – Gráficos

GRÁFICO 1: Distribuição total das atividades/trabalhos por tipo


GRÁFICO 2: Total de trabalhos/atividades por ano/reunião

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GRÁFICO 3: Total de trabalhos dos GTs/STs do 1º ao 40º encontro (1977-2016)
* 1º, 2º e 11º encontros (1977, 1978 e 1987, respectivamente): as partes encontram-se vazias no gráfico pela indisponibilidade de trabalhos
anexados no site da ANPOCS, assim como exposto na seção de metodologia.

10
GRÁFICO 4: Distribuição total por subáreas/disciplinas

11
GRÁFICO 5: Distribuição total por natureza da vinculação institucional

12
GRÁFICO 6: Distribuição total por região

13
GRÁFICO 7: Distribuição total por estados

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