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Resumo
Durante a década de 90, a cadeia agroindustrial do trigo passou por profundas
transformações devido à desregulamentação do setor, abertura de mercado e início do plano
real. Tais transformações apresentaram grandes reflexos no importante segmento de
produção de biscoitos, fazendo com que novos produtos sejam constantemente lançados. Com
o objetivo de caracterizar o processo de desenvolvimento de produtos neste setor, foram
realizados estudos de caso em duas empresas, fabricantes de biscoitos de médio porte. O
principal resultado obtido foi à caracterização destas empresas como enfocadas em custo
total de acordo com a classificação de Porter (1986), atendendo principalmente um mercado
de classes sociais mais baixas, onde a diferenciação e a qualidade apresentam uma
importância muito menor que o custo. Conclui-se que estas empresas buscam a diferenciação
de seus produtos para agregar maior valor a suas atividades e a expansão de mercado,
porém, investimentos em desenvolvimento são cautelosos, para evitar aumento de preço dos
produtos ao consumidor.
Palavras-chave: Processo de desenvolvimento de produtos, Indústria de biscoitos,
Agroindústria.
1. Introdução
Na primeira metade da década de 90, o setor moageiro e dos produtos derivados da farinha de
trigo no Brasil passaram por grandes transformações. Nunca, na história do setor,
transformações tão importantes ocorreram em espaço de tempo extremamente curto
(JACOBSEN 2001a).
Em 1990, o país abria o mercado para produtos importados, com taxa de importação muito
abaixo das quais o mercado nacional praticava até então. Produtos de diversas nacionalidades
invadiram o país. No setor de biscoitos, os produtos vinham principalmente da Argentina,
uma vez que este país tinha tradição na produção dos mesmos.
De acordo com Jacobsen (2001b), mesmo antes de a indústria ter algum tipo de reação à
entrada dos produtos importados, ainda em 1990, o governo desregulamentou o mercado
nacional do trigo. Até aquele momento este grão só podia ser comercializado por intermédio
do Banco do Brasil, o qual controlava desta forma, o preço do produto retardando o processo
de melhoria de qualidade dos grãos. Tanto que, durante o monopólio, o Brasil produzia 75%
do trigo consumido, poucos anos após a queda do monopólio o país produzia apenas 25% do
total que consumia. Isto devido, principalmente, a várias décadas de um mercado fechado,
controlado por uma empresa estatal, que priorizava o volume de produção nacional e deixava
de lado a produtividade agrícola e a qualidade do produto. Segundo o IBGE (2002),
atualmente, a produção nacional está próxima a um terço do consumo.
Com estas mudanças, as empresas aqui instaladas puderam conhecer melhor a principal
matéria-prima da fabricação dos biscoitos, e, aos poucos, exigir dos moinhos produtos
adequados aos seus processos de fabricação.
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Portanto, a caracterização do PDP das empresas de médio porte poderá servir para um melhor
entendimento do setor e também para compreender o desenvolvimento de produto de um setor
onde se tem pouco estudo a respeito do assunto.
O objetivo deste trabalho é apresentar dois casos estudados sobre o processo de
desenvolvimento de produtos (PDP) dos fabricantes de biscoitos de médio porte,
comparando-os com um modelo de desenvolvimento de produto proposto pela literatura.
A estrutura do trabalho foi estabelecida para, em um primeiro momento, caracterizar a
indústria de biscoito no Brasil. Em seguida um modelo de gestão de desenvolvimento de
produto para indústria de alimentos é apresentado. Posteriormente, são apresentados a
metodologia utilizada para o desenvolvimento do trabalho e os resultados dos casos
estudados. Finalmente são tecidas as conclusões do trabalho.
2. Caracterização da indústria de biscoitos
O biscoito é um produto composto principalmente por farinha de trigo, gordura e açúcar, com
teor de umidade bastante baixo o que lhe proporciona uma longa vida de prateleira, se
acondicionado em embalagem com eficiente proteção à entrada de umidade (MONTEIRO,
1996). A tabela 1 mostra o comportamento do mercado nacional de biscoitos no final da
década de 90.
De acordo com a SIMABESP (2002), o Brasil conta atualmente com 876 fábricas de
biscoitos, mais de 200 estão instaladas no Estado de São Paulo. A concentração no setor de
biscoitos está cada vez mais acentuada. Três grandes marcas detêm mais de 25% da produção
nacional em um mercado que consome mais de um milhão de toneladas por ano do produto.
A suíça Nestlé, com as marcas São Luís, Tostines e Ailiran, é a líder no setor, com quase 13%
da produção nacional, seguida pela francesa Danone, com as marcas Aymoré, Danone e
Triunfo que representam pouco mais de 12% da produção.
Seguindo as grandes Multinacionais, quatro empresas nacionais detêm uma produção
equivalente: M. Dias Branco, Marilan, Mabel e Bauducco. Segundo a revista Food
Ingredients (2002), o grupo argentino Macri, que recentemente adquiriu as marcas Zabet,
Isabela e Adria, pretende consolidar-se a partir de 2002 entre os cinco principais fabricantes
do país.
Segundo a SIMABESP (2002), atualmente, o Brasil é o maior produtor mundial de biscoitos,
com mais de um milhão de toneladas ao ano, que representa mais de um bilhão de dólares. Os
valores de importação e exportação do produto são pouco significantes, portanto, a produção e
consumo nacional se equilibram.
Apesar desse grande consumo, existe um potencial de aumento de produção. Ao se comparar
o consumo brasileiro per capita com outros países como Holanda, Inglaterra, Irlanda, Bélgica
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e Suíça, percebe-se que estes consomem mais de 10 kg do produto por habitante por ano,
enquanto, este número chega a quase seis no Brasil, tendo sido pouco superior a
6kg/habitante/ano no final da década de 90.
Segundo El-Dash, Camargo & Diaz (1980), existem basicamente seis categorias para os
produtos desta indústria, esta divisão dá-se em função de diferentes processos de fabricação,
inerentes a cada produto. Não é possível produzir outro tipo de biscoitos numa mesma linha
de produção, sem que esta passe por modificações, em alguns casos é até mesmo impossível.
Para estes autores, os biscoitos são divididos em recheados, semidoces (Maria / Maizena),
doces (moldados / estampados), crakers (cream craker / água e sal), wafers (alguns autores
não consideram wafers como biscoitos) e outros (snaks e extrusados). Atualmente, está é a
divisão mais empregada para caracterização de fabricantes de biscoitos.
De acordo com a SIMABESP (2002) e ACNielsen (2002), os dois grupos que vêm
aumentando sua participação no mercado nos últimos anos são recheados e wafers, produtos
de valor agregado maior que a média dos demais, como é possível verificar na tabela 2, a
porcentagem de valor (R$) destes setores é maior que a porcentagem em volume de vendas
(kg).
3. Processo de desenvolvimento de produtos
As empresas estão constantemente desenvolvendo novos produtos para manter sua
competitividade, uma vez que, os produtos apresentam ciclos de vida. Estes podem ser
extremamente curtos ou durarem muitos anos, no entanto, a tendência é em um dado
momento do produto, as vendas entrarem em declive até não ser mais viável economicamente
sua produção.
Para a permanência da empresa no mercado, quando um produto entra em declínio, é
necessário existir produtos em outras etapas do ciclo de vida, inclusive produtos sendo
desenvolvidos, para o processo manter-se ao logo do tempo.
Para as empresas da indústria de biscoito, investir no processo de desenvolvimento de
produtos, ganhou importância para a sobrevivência no mercado Por um lado, este apresenta
melhores condições tecnológicas para a produção, com possibilidade de especificações de
matérias-primas, aquisições de equipamentos importados de produção com taxas
alfandegárias menores e grande avanço no setor de produção de embalagens, permitindo a
flexibilização de produção a custo baixo.
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Por outro lado, com o mercado competitivo, os consumidores estão mais acostumados com
novos produtos, em todos os setores da economia, e não aceitam consumir tanto tempo o
mesmo produto, encurtando muito o ciclo de vida dos produtos desta indústria.
De acordo com a ABIMA (2002) as empresas fabricantes de massas e biscoitos podem ser
divididas em grupos, com os quais se pode criar uma relação entre as estratégias competitivas
de Porter (1986) e os ciclos de vida dos produtos:
– Empresas inovadoras: lançam produtos constantemente para atender clientes específicos
cada vez mais. Podem ser relacionadas à estratégia de enfoque, e seus produtos têm ciclos
de vida curtos.
– Empresas tradicionais: os lançamentos de produtos ocorrem, porém, com uma
freqüência menor. Apresentam características semelhantes às descritas na estratégia de
diferenciação, e o ciclo de vida do produto é maior.
– Empresas de produção de baixo custo: as características são as mesmas das empresas
que utilizam a estratégia de liderança no custo total. Neste caso, o ciclo de vida dos
produtos tende a ser longo.
Dentre as diversas metodologias que podem ser utilizadas como referência para gerenciar o
processo de desenvolvimento de produtos, entre elas pode-se destacar os modelos de Fuller,
Pugh (1996) e Wheelwrigth & Clark (1992). A de Fuller será utilizada como referência neste
trabalho por atender ao setor alimentício.
Fuller (1994) estabelece seis etapas para o desenvolvimento de produtos alimentícios:
concepção de idéias, conceituação, desenvolvimento, produção, avaliação por consumidores e
teste de mercado. Esta metodologia é bastante difundida na indústria de alimentos pela
especificidade de sua elaboração para este setor.
– Concepção de idéias. Nesta etapa trabalha-se com idéias surgidas das mais diversas
fontes, desde opiniões e sugestões obtidas nos serviços de atendimento ao consumidor ou
diretamente nos pontos de venda e, até mesmo, opiniões pessoais de gerentes e
proprietários da empresa. Porém, as necessidades do consumidor sempre deverão ser
conciliadas com os objetivos e estratégias da empresa.
– Conceituação. As idéias que se mostrarem interessantes passam por um processo de
conceituação, no qual boa parte dos processos de desenvolvimento de novos produtos são
finalizados, devido a alguma inviabilidade do projeto, seja ela mercadológica ou
técnica.São realizadas, nesta etapa, pesquisas de mercado, estudos de viabilidade
financeira e de manufatura do produto.
– Desenvolvimento. A fase de desenvolvimento requer a maior quantidade de recursos e
tempo, em todo processo, pois nela projeta-se o processo e criam-se as especificações do
produto. Uma fase de desenvolvimento mal conduzida pode gerar custos acima do
previsto nas fases subseqüentes, e, até mesmo, o fracasso do produto antes ou após o
lançamento. Segundo Maffin & Braiden (2001), mais da metade dos processos de
desenvolvimento implicam mudanças nos processos de fabricação, ou aquisição de novos
equipamentos ou tecnologias, e mais de 80% dos casos envolvem o desenvolvimento de
novos fornecedores ou ampliação do mix de produtos fornecidos pelos atuais.
– Produção. Inicia-se a produção em escala piloto, porém, com as mesmas especificações
de uma futura produção industrial, para não ocorrer alterações organolépticas no produto
planejado. Nesta etapa, podem surgir necessidades de adaptação do processo produtivo,
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