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MARACATU E GRUPOS PERCUSSIVOS EM RECIFE E OLINDA

(Parte do Relatório Final de Pesquisa de Iniciação Científica, no período agosto de 2009-


julho de 2010.)

Autor: Frederico Lyra de Carvalho


Orientador: Carlos Sandroni

RESUMO:

Análise e discussão da situação, perspectivas e funcionamento de alguns grupos de maracatu


surgidos em Recife a partir dos anos 90. Os grupos estudados são vistos como diferentes dos
maracatus mais antigos ligados a casas religiosas, chamados de “maracatus-nação”. Discussão
de entrevistas com diretores de alguns desses grupos, apresentando vários aspectos relativos
às particularidades de seus grupos no contexto da cena musical recifense. Contextualização
das entrevistas em relação à bibliografia abordada.

Palavras-chave: maracatu, tradição, baque-virado, música pernambucana

O projeto visa reunir e analisar informações sobre certas transformações ocorridas


desde os anos 1990 nos grupos de maracatu de baque-virado e as respectivas polêmicas em
torno do significado desta “dança dramática” (Andrade, 1959). Tais transformações dizem
respeito à inserção dos maracatus em circuitos da música profissional, através da produção de
CDs, participação em espetáculos, turnês e festivais, e participação dos mestres de baque (as
lideranças musicais dos grupos) em oficinas e cursos para ensinar os participantes destas a
tocar ritmos do maracatu. As polêmicas geradas por estas transformações dizem respeito a
idéias de “tradição” e “modernização” do gênero.
O objetivo desde projeto é estudar transformações recentes de certas formas de
música, dança e poesia cantada em Pernambuco, referidas por alguns de seus participantes e
observadores como pertencentes ao domínio do “folclore”, da “cultura popular”, e/ou do
“patrimônio imaterial”.
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3-METODOLOGIA DO TRABALHO

Paralelamente à pesquisa bibliográfica e as discussões destas leituras, iniciou-se a


etapa de pesquisa de campo. Foram realizadas no total sete entrevistas com diretores de
grupos diferentes de maracatu de baque-virado. Nenhum destes grupos é uma nação de
maracatu. Os grupos foram selecionados a partir de indicação de conhecimento prévio destes,
indicação de terceiros e pesquisa na internet. As entrevistas foram realizadas no período
compreendido entre dezembro de 2009 e julho de 2010.
Foram entrevistados diretores dos seguintes grupos:

- Corpos Percussivos
- A Cabra Alada
- Várzea do Capibaribe
- Baque das Ondas
- Quebra-Baque
- Maracatu Batuques de Pernambuco
- Percussionistas do CAP (Colégio de Aplicação)

Todas as entrevistas foram realizadas com base em um roteiro de assuntos à serem


abordados. Foram seis tópicos que de alguma forma necessitavam serem comentados durante
a entrevista:

-Como o grupo começou?


-Como/com quem aprendeu o maracatu?
-Como funciona o seu grupo? É pago? Qual frequência de ensaios? Quem são os
participantes? Sai no carnaval? Realiza outras apresentações?
-Como é seu processo de ensino/transmissão dos toques?
-Qual a sua relação com grupos mais antigos? E os mais novos?
-Além do grupo você realiza outras atividades ligadas a música (percussão)? Outras
atividades de ensino?
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Todas as entrevistas foram gravadas com consentimento dos entrevistados, e


posteriormente transcritas pelo bolsista. Em todas as entrevistas, respostas para essas
indagações foram encontradas. Porém, sendo realizadas sem questões previamente definidas,
as entrevistas permitiram que as conversas ocorressem mais livremente e que cada uma se
tornasse realmente única, refletindo de forma mais concreta a personalidade do entrevistado e
seu pensamento sobre os temas discutidos. Desta forma temos uma boa amostragem de
diferentes grupos, estágios e momentos do desenvolvimento do maracatu nos últimos vinte e
cinco anos na região metropolitana do Recife.

4-RESULTADOS E DISCUSSÃO

Depois de passar todo o século XX em altos o baixos, o maracatu, como manifestação


musical, ganhou, a partir dos anos 90, um espaço anteriormente inédito na sua história. Passou
a fazer parte ativamente da “cena musical” profissional ou semi-profissional da cidade do
Recife e região metropolitana. Os marcos para isso foram o nascimento do movimento
Manguebeat por Chico Science e Nação Zumbi e Fred 04 e Mundo Livre S/A e, anteriormente
mas em menor escala, a criação do grupo Nação Pernambuco. O Manguebeat abriu espaços
para artistas populares antes não conhecidos, e como o público queria conhecer as origens
daquela fusão (que estavam nas periferias) criou-se um “link” antes inexistente entre as
várias regiões da cidade (Galinsky, 1999).
O diretor do Cabra Alada, ex-integrante do Nação Pernambuco, faz uma conexão entre
estes dois marcos: “a gente passou a ter uma força maior a partir do começo dos anos 90, a
partir de Chico Science...”. Por sua vez o diretor do Batuques de Pernambuco relata que suas
duas maiores influências são exatamente Chico Science e o Nação Pernambuco. O diretor do
grupo Várzea do Capibaribe, também ex-integrante do Nação Pernambuco, dá um destaque
maior a este grupo:

“...(Nação Pernambuco) deu destaque ao maracatu de baque-virado...um dos aspectos mais positivos
desta empreitada foi a visibilidade que foi dada ao maracatu de baque virado, eu atribuo ao maracatu
Nação Pernambuco esse crédito”

O diretor do grupos Corpos Percussivos, integrante da nação Estrela Brilhante e ex-


integrante de uma banda importante contemporânea ao movimento mangue, por sua vez,
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enfatiza a mudança radical no comportamento em relação ao maracatu que o movimento


mangue trouxe à cidade:

“No inicio da década de 90...a gente tinha até vergonha, era ridicularizado...sabe a quem a gente deve
isso? Essa não ridicularização da nossa cultura? Ao movimento mangue, isso aí pode tirar o chapéu e
dizer.”

Em seguida ele demonstra bem as oportunidades abertas por esta novos espaços que o
maracatu estava tomando, a integração social que permitia e o novo público a quem estava
chegando. A profissionalização e criação de novos grupos era uma saída real e viável:

“...Por que é o seguinte, a minha proposta aqui, o Corpos Percussivos...era um grupo que atendia as
necessidade do público classe média, que me pagava e eu sobrevivia disso...a primeira experiência foi
no Morro da Conceição...eu cheguei pra [minha amiga] e disse: 'Amiga, tu já me conhece né, eu já
tenho essa prática aqui no conselho de moradores, de educador popular dando aula pra comunidade...
tem pessoas que me procuram pra ter aula e eu não tenho espaço...eu vou fazer o seguinte, vou trazer
todo esse público de classe média aqui pro morro, aí tu me dá uma sala dessas, em contrapartida eu
ensinos aos meninos da escola de graça'...Eu deixava a sala toda limpa pra receber o público de classe
média...eles subiam lá...tinha essa integração social.”

O diretor o Quebra-Baque faz observação semelhante:

“As nações, os grupos tradicionais, desprezam um pouco os grupos de percussão, mas eles esquecem
que a classe média só consegue chegar a conhecer essa manifestação através de um grupo de percussão.
Porque? Onde é que a gente encontra as manifestações? No morro, nas favelas, nas comunidades. A
classe média não vai até lá.”

E em seguida acrescenta:

“O maracatu nação faz um trabalho social. O Quebra-Baque e outros grupos de percussão, em geral,
fazem um trabalho cultural, é diferente.”

A maior parte dos grupos entrevistados exige alguma taxa (de manutenção ou
mensalidade) para poder participar das atividades do grupo. Alguns fornecem os instrumentos
musicais, outros pedem que os participantes levem os seus para os ensaios. Os ensaios
acontecem majoritariamente na rua, porém alguns grupos possuem espaço próprio para isto
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ou mesmo uma sede. A faixa etária dos participantes varia de adolescentes de 15 anos até
adultos de 60. A maior parte é de classe média e profissionais liberais.
O principal meio de transmissão das levadas e toques para os integrantes é oral, por
meio de observação e repetição. Porém, o uso de notação musical (ou adaptações desta) tem
se tornado mais frequente para a facilitação e visualização da linguagem musical. O diretor do
grupo Baque das Ondas, formado em bateria no conservatório pernambucano, faz uso de
alguns métodos usados nesta instituição para facilitar o aprendizado de passagens mais
difíceis e melhorar o controle das baquetas pelos alunos.
O diretor do Quebra-Baque trabalha os ritmos e toques progressivamente, aumentando
aos poucos o grau de complexidade, iniciando com as bases musicais, depois o pulso (dança)
e corporalidade, depois propondo que os alunos cantem junto enquanto tocam para chegar aos
poucos nas viradas. Ele, juntamente com o diretor do Batuques de Pernambuco, enfatiza a
importância da ajuda dos alunos mais adiantados para o progresso dos iniciantes.
Para o diretor do Várzea do Capibaribe disciplina, bom relacionamento, boas
condições e respeito são os fatores mais importantes. O diretor do Corpos Percussivos observa
que o seu processo de ensino vem progredindo e se modificando ao longo de todos esses anos,
ele inclusive frequentou, como ouvinte, aulas no curso de música da UFPE, porém vem
mantendo alguns princípios básicos desde que iniciou este trabalho:

”A coisa começou a tomar uma proporção de indústria, aí eu comecei a sistematizar...os cadernos têm
as aulas...aí eu mostro: essa dinâmica eu fazia assim, e 10 anos depois, olha como eu faço... No geral é
na rua...eu nunca tive essa prática [de dar aula na rua], já comecei a pensar no meu cliente...aí já entra
essa questão de empresa, profissionalização....Quando eu vim pra cá [para o Recife Antigo], vim com
esse pensamento também, comecei a investir nos equipamentos, é o que me vale hoje...Depois o
pessoal foi vendo essa dinâmica e foi vindo [para o Recife Antigo], outros grupos se formando... Pra
mim eu achei interessante, por que era uma forma de você comparar as metodologias...o cara [o aluno]
chega aqui, eu ofereço toda a estrutura”.

Em seguida ele faz uma afirmação de que a profissionalização a partir de


manifestações culturais não é exatamente algo novo no Brasil. Vem sendo desenvolvida em
outros lugares que já estão mais adiantados profissionalmente.

”Pernambucano culturalmente é muito rico, só que é uma pérola que tá sendo descoberta agora,
ninguém teve olhos pra ver...Eu digo para os meus amigos europeus e americanos que o mapa do Brasil
se limitou a Rio e Bahia...Agora já tão estendendo para cá, e aqui culturalmente falando é muito rico,
não tem Rio, não tem Bahia...Os caras que foram descobertos primeiro, da Bahia e tal, já se
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profissionalizaram...Eu aprendi a dar meu preço vivendo com esses caras...eu dei aula por 10 para o
cara, e o cara cobrando 40 na minha cara...”

Ele afirma que em festivais educativos no exterior esses estados possuem uma
participação muito mais efetiva e presença garantida a muito mais tempo. O pouco
profissionalismo, muitas vezes acidental, é bem exemplificado em uma observação que o
diretor do Batuques de Pernambuco faz: “A gente entrou como uma brincadeira e hoje já está
para o lado profissional.” O grupo Baque das Ondas nasceu da mesma forma.
Paralelamente à faceta educacional, os grupos desenvolvem outras atividades como
tocar em eventos privados, congressos científicos ou de classe, casamentos, escolas (públicas
ou privadas), além de combater o stress e outras mazelas contemporâneas. Alguns dos grupos
se apresentam e desfilam uniformizados e com coreografias. Alguns se apresentam em palco
no carnaval ou não, normalmente em formações reduzidas, uma subdivisão do grupo maior,
por eles denominadas de “formação profissional”.
O diretor do Corpos Percussivo viaja várias vezes no ano para ministrar palestras e
workshops em universidades e conservatórios dos EUA e na Europa (Dinamarca, Suécia). O
mesmo caminho tem sido seguido pelo diretor do Quebra Baque tendo viajado para a Áustria
e a França. Este também lançou em co-autoria o Batuque Book, livro em que analisa em
grades de partitura toques de nações de maracatu. Eles são dois dos responsáveis por
disseminar essa cultura internacionalmente e levá-la a ser estudada e praticada nos principais
centros musicais do mundo. Grupos foram por eles fundados (ou por estudantes seus) nessas
localidades para perpetuar o trabalho. Além disto recebem durante todo o ano músicos e
curiosos de várias localidades do Brasil e do mundo para participarem das oficinas e até
mesmo desfilarem no carnaval.
O Baque das Ondas e o Batuques de Pernambuco também afirmaram manter um
intercâmbio nacional e mesmo internacional. Os diretores do Várzea do Capibaribe e do
Cabra Alada foram enfáticos ao afirmar terem participado do primeiro LP integralmente
gravado com músicas de maracatu, que foi o primeiro disco do Maracatu Nação Pernambuco.
O Cabra Alada inclusive dos grupos entrevistados é o único que possui um CD próprio
gravado.
Todos os entrevistados demonstraram um grande respeito pelos grupos de maracatu
nação, grupos por eles denominados de “tradicionais”. O diretor do Cabra Alada é enfático:
“...minha relação com os grupos tradicionais sempre foi de muito respeito, frequentei todos
eles por mais de 10 anos...”. Cita em seguida o maracatu nação Porto Rico, maracatu nação
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Estrela Brilhante e Nação Elefante como referências. O diretor do Corpos Percussivos faz
parte há 17 anos do Nação Estrela Brilhante. O diretor do Quebra-Baque por sua vez enfatiza
ter feito parte por 8 anos do maracatu nação Porto Rico e de ter pesquisado, além desta, outras
três nações (Leão Coroado, Encanto da Alegria e Estrela Brilhante de Igarassu) para escrever
o seu livro (Batuque Book).
O diretor do Baque das Ondas tem uma trajetória particular, foi primeiro integrante do
nação Estrela Brilhante, mas em seguida passou para a nação Porto Rico, onde afirma ter
percebido realmente a importância do maracatu para Recife e Pernambuco. O diretor do
Percussionistas do CAP cita o Leão Coroado como maior referência.
Há uma necessidade muito grande de se distinguir dos maracatus nação, por eles
chamados de tradicionais. Várias razões são apresentadas para isto. O diretor do Várzea do
Capibaribe afirma: “A gente tem a facilidade de não ser maracatu nação”. Como se o seu
grupo tivesse mais liberdades que o outro. Uma dessas liberdades é a possibilidade de realizar
fusões musicais dos toques do maracatu com outros ritmos, pernambucanos ou não. Apesar de
todos estes grupos terem como carro chefe o maracatu, os seus diretores fazem questão de
variar os toques, inserindo elementos do frevo, ciranda, coco, samba e até pastoril. No
entanto, o mesmo entrevistado realça que do ponto de vista musical, o seu grupo teria o
mesmo valor que os maracatus nação: “Eu não vejo nenhuma diferença [musical] para os de
terreiro [maracatus ligados ao candomblé], a gente só não tem o terreiro”.
O diretor do Quebra-Baque é enfático: “(o aluno e o turista) acha até um pouco
monótono o maracatu nação, aí despreza um pouco...o nação segue aquela tradição, aquele
baque sem muito floreio, o outro tem mais liberdade...”. Em seguida ele complementa: “O
grupo de percussão é livre para trabalhar outros ritmos e timbres”. O diretor do Batuques de
Pernambuco segue a mesma direção ao comentar sobre o seu grupo: “O que a gente chama a
atenção é pela diversidade de toques...da questão da tradição...estilo de percussão de
Pernambuco, coco, ciranda, maracatu...”. O diretor do grupo Corpos Percussivo observa que o
seu antigo mestre (Walter) faz na fusões de outros estilos nos toques da nação dirigida por ele,
o Estrela Brilhante do Recife, e que estas ocorrem naturalmente devido a experiências
musicais diversas pelas quais o mestre passou. Ele também observa que essas mudanças não
são sempre vistas com bons olhos por outras nações e pelo que chamou de “xiitas do
movimento negro”.
Outra liberdade importante para estes grupos é não estar associado a religião
(candomblé) e não terem que fazer as obrigações para os orixás. Apesar de estarmos em pleno
século XXI, as religiões afro-descendentes, associadas à periferia, ainda são mal vistas e
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carregam uma carga enorme de preconceitos para o restante da sociedade (Lima, 2005), o que
atrapalharia bastante o mercado desses grupos que é constituído basicamente da classe média.
O diretor do grupo Percussionistas do CAP não aborda o lado religioso por não dominá-lo e
por temer problemas com a direção da escola em que trabalha ou com os pais dos alunos. O
diretor do Baque das Ondas é claro nesta análise da situação, ele chega inclusive a fazer
adaptações em algumas letras das toadas para obter uma flexibilidade religiosa:

“...você monta seu trabalho...o grupo de não-nação hoje é muito importante. É um trabalho que você faz
próprio para apresentar ao público, diferente de uma religiosidade que existe dentro do maracatu. Por
que existem trabalhos dentro de uma nação, obrigações que são feitas que às vezes tem gente que não
gosta. E às vezes você perde muito o público diferenciado por causa da religião.”

O diretor do Várzea do Capibaribe afirma que ter o reconhecimento por parte dos
maracatus nação é uma das partes mais importantes do seu trabalho: “É justamente isso que
eu acho a parte mais gratificante desse nosso trabalho, é ter a simpatia dos maracatus
tradicionais, a exemplo do Porto Rico, Elefante, Estrela Brilhante, Leão Coroado...eles vão lá
nos nossos ensaios”. O diretor do Quebra-Baque coloca as nações de maracatu em um
patamar acima ao do seu grupo: “Eu passo as informações, mas o caminho da venda é ali, ali
tá o maracatu nação, de baque-virado, de verdade”
Durante as entrevistas foram encontradas várias classificações para cada grupo. O
Baque das Ondas se classifica como um “Grupo Cultural”, afirmando ser praticamente um
“cover” do maracatu nação Porto Rico. “O Quebra Baque é um grupo de percussão”, afirma o
seu diretor, e continua: “Tem a nação do maracatu real. Tem o grupo de maracatu, vamos
dizer “maracatu cover”. Que fazem uma representação do maracatu real. E tem o grupo de
percussão” O diretor do Corpos Percussivo rejeita ser classificado como estilizado apenas por
não ser tradicional e classifica o seu grupo como “para-folclórico”, por, apesar de ter como
base, este não se limitar ao maracatu. O maracatu Várzea do Capibaribe desfila na rua como
um maracatu nação com uma corte completa, além dos batuqueiros. O Cabra Alada vai mais
longe na sua descrição:

”A gente se intitula hoje uma 'maracatu fantástico'...a gente usa personagens que outros maracatus não
usam, como o bispo, que faz parte da história da Cabra Alada, tem o próprio papagaio, tem a própria
cabra alada...tudo muito estilizado...por isso que agente chama de 'maracatu fantástico', só por isso, mas
a gente toca maracatu e a gente dança maracatu...e a gente tenta ficar o mais próximo possível do
maracatu mesmo...repetitivo, feito um mantra.”
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5-CONCLUSÕES

A partir da análises das entrevistas podemos entender alguns aspectos sociais e


culturais importantes da cidade do Recife e região metropolitana. O diretor do grupo Corpos
Percussivos resume bem esse pensamento:

“...por exemplo, o cara que nasceu no apartamento lá em Boa Viagem o maracatu não faz parte da
cultura dele? Faz. Da mesma forma que faz o cara que mora na porta do maracatu na favela...um nasceu
na favela, o outro em Boa Viagem, por questão social. Mas é recifense, pernambucano, nordestino e
brasileiro. Então é da sua cultura...por mais que você como classe média negue aquilo ali...”

O maracatu tem um espaço próprio na cidade, que tem crescido ao longo dos anos, e
esses grupos (e outros) têm papel fundamental na popularização e disseminação desta
manifestação em todo o espaço geográfico, todas as camadas sociais da cidade. Fazendo com
que o maracatu seja tocado o ano inteiro. O diretor do Várzea do Capibaribe compara a
importância do maracatu à do frevo, coisa não imaginável há algumas décadas atrás:

“Até então Recife era a terra do frevo. Hoje é a terra do frevo e do maracatu.”

O diretor do Corpos Percussivos resume bem a situação recente e atual além das
perspectivas futuras para o maracatu e seus praticantes, sejam eles nações ou não.
Pernambucanos, brasileiros ou mesmo estrangeiros:

“...o Mangue [estava] em ebulição, aí tavam vindo alguns europeus, alguns americanos...eles dizendo
que o maracatu tinha que estar imaculado, que ele não podia avançar, que essa questão do movimento
Mangue tava levando as batidas do maracatu tradicional do coco, e dando um sentido contemporâneo, e
que isso pra eles não era legal, veja a visão do colonizador...Aí eu disse: “Ah, é isso que você tá
dizendo? Pois eu acho que tem que ter uma evolução. Dizendo o contrário, você tá simplesmente
negando educação pra esse povo, escola, universidade, computadores. O mundo precisa evoluir, a
cultura só sobrevive até hoje por que ela é dinâmica, ela não é estática, então não posso imaginar um
maracatu hoje batendo igual à época de Guerra-Peixe. Tudo isso foi uma vivência, estar conectado com
as bases e também com o mundo. Mais ou menos o que Chico (Science) pregava: se você quer ser
universal, você tem que primeiro cantar sua aldeia. Quando eu pensei em cruzar a fronteira, tive meus
medos...só depois eu tomei consciência do que eu sou, da minha tradição do que faço parte.”

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