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Elaborado por:
Prof. Dr. Sérgio Santos Mühlen
INTRODUÇÃO
A cardioversão e a desfibrilação elétricas são procedimentos terapêuticos que visam
à reversão das arritmias cardíacas pela aplicação de um pulso de corrente elétrica
de grande amplitude num curto período de tempo. Ao atravessar o coração, esta
corrente força uma contração simultânea das fibras cardíacas, possibilitando o
restabelecimento de ritmo normal.
O coração é um órgão contrátil oco, cuja principal função é bombear o sangue,
mantendo-o em circulação permanente por todo o corpo. Suas paredes formam
quatro câmaras contráteis: os átrios (esquerdo e direito) e ventrículos (esquerdo e
direito) . átrios e ventrículos de um mesmo lado se comunicam através de válvulas,
de modo que o sangue é bombeado sempre em um único sentido (entra pelos átrios
e sai pelos ventrículos). As câmaras da direita e da esquerda não têm comunicação
direta, formando duas bombas independentes e com bombeamento síncrono. O
“coração direito” bombeia para os pulmões o sangue que retorna dos diversos
órgãos e o “coração esquerdo” bombeia o sangue que vem dos pulmões para todos
os órgãos do corpo, inclusive o próprio coração.
Assim como outras fibras musculares, as fibras que compõe o miocárdio contraem-
se em decorrência de estímulos externos, em particular estímulos elétricos. Nas
contrações normais, este estímulo inicial aparece na região do átrio direito chamado
nódulo sino-atrial (AS), que é marca-passo natural do coração, propaga-se por um
caminho bem determinado através do miocárdio, resultando em uma contração
ordenada, primeiro dos átrios e em seguida dos ventrículos, que garantem um
bombeamento eficiente do sangue.
Diversas situações podem induzir um funcionamento anormal do coração, levando a
um conjunto de patologias conhecido por arritmias (situações em que o ritmo das
contrações cardíacas é perturbado ou mesmo interrompido). Dentre estas, a mais
grave é a fibrilação, caracterizada por uma perda de sincronismo nas contrações do
miocárdio resultando em contrações desordenadas das fibras, impossibilitando o
sincronismo do sangue. Se a fibrilação se instalar nos átrios, não há um risco
imediato de vida para o paciente (uma vez que não há um comprometimento
obrigatório dos ventrículos), mas a freqüência cardíaca elevada reduz a eficiência do
bombeamento, levando a uma insuficiência cardíaca. A reversão pode ser feita com
drogas que reduzem a excitabilidade das fibras do miocárdio.
Já a fibrilação ventricular é uma condição de emergência, pois a ausência de
bombeamento do sangue resulta em perda de débito cardíaco (fluxo de sangue
circulante) e redução drástica na pressão sanguínea, podendo levar à morte em
poucos minutos. A fibrilação ventricular pode ser causada por distúrbios na
condutividade das fibras cardíacas (hiperexcitabilidade, isquemia resultante de
infarto), ou acidentes (choques elétricos, intoxicação por determinadas drogas, etc.)
a fibrilação é diagnosticada por ausência de pulso arterial e pela substituição do
traçado do ECG (eletrocardiograma) por uma forma de onda flutuante de alta
freqüência, ou onda de fibrilação. Raramente a fibrilação ventricular é revertida
espontaneamente, o que exige ação imediata da equipe médica, com equipamento
adequado e operacional. Quanto mais rápida for a desfibrilação, maiores as chances
de sobrevivência do paciente; para cada minuto que passa depois de inalada a
fibrilação ventricular, a probabilidade de sobrevivência cai em 10%.
A aplicação de um pulso de corrente elétrica que atravessa o coração promove a
despolarização (contração) de uma grande quantidade de fibras ventriculares que
estavam repolarizadas (relaxadas) e prolonga a contração das que já estavam
contraídas. Se uma certa massa crítica (75% a 90%) das fibras responderem
simultaneamente a esta contração de responder ao marca-passo natural e com o
sincronismo, o bombeamento é restabelecido.
Histórico
DESFIBRILADORES E CARDIOVERSORES
Cardioversores: são os modelos mais comuns atualmente nos hospitais. Além das operações realizadas
pelos desfibriladores manuais ou semiautomáticos, permitem a aplicação de pulso desfibrilatório
sincronizado com a onda R do ECG (no caso deste ser detectável). Geralmente estão associados com
um monitor de ECG que apresenta o traçado em uma tela ou display e muitos modelos incorporam
uma pequena impressora para registrar a seqüência de eventos em papel. Alguns modelos incorporam
algoritmos de interpretação do traçado de ECG para auxiliar o operador nas suas
decisões.
ASPECTOS DE MANUTENÇÃO
Desfibriladores e cardioversores são equipamentos predominantemente eletrônicos,
portanto com poucas partes ou peças sujeitas a desgastes mecânicos ou
desalinhamentos. As partes passíveis de avarias mecânicas são os cabos (que
podem ser tracionados acidentalmente a ponto de terem a isolação danificada ou
mesmo se romperem), relés de comutação (no caso de ser esta a tecnologia
empregada) e, finalmente, a própria caixa do equipamento, que pode sofrer quedas
(em função da utilização freqüente fora do ambiente hospitalar e em situações de
emergência).
Mesmo nos circuitos eletrônicos, é importante verificar a limpeza das placas de
circuito impresso, pois a presença de bateria e de grandes capacitores pode
representar risco de corrosão de partes mais delicadas. Os circuitos de alta tensão
também devem ser verificados, pois podem surgir rupturas nos isolantes, acúmulo
de poeira e poluição condutiva, com conseqüente aumento nas correntes de fuga.
A freqüência de manutenções preventivas é geralmente indicada pelo fabricante. Na
ausência de tal informação, recomenda-se proceder a uma inspeção geral a cada
seis meses, observando itens qualitativos, testes quantitativos e procedimentos de
manutenção, conforme será visto abaixo. Um estoque de peças para pequenos
reparos de emergência deve ser obtido junto ao fabricante.
Cuidados especiais
As altas-tensões presentes nas pás dos desfibriladores são extremamente perigosas
e potencialmente letais.
- Nunca realize sozinho testes com estes equipamentos, tenha sempre alguém
ao lado;
- Nunca toque ou segure as partes condutivas das pás a menos que esteja
seguro que o equipamento está desarmado (descarregado)
ou,preferivelmente, desligado.
- Um desfibrilador deve sempre estar disponível para a equipe médica, mesmo
durante os testes e inspeções. Procure então realizar os testes e inspeções
próximo à localização habitual dos equipamentos ou providencie outro
equipamento com o qual a equipe médica esteja familiarizada.
- Os testes podem descarregar as baterias dos equipamentos. Providencie
sempre baterias carregadas para substituir, se necessário.
- Nunca realize os testes e inspeções de todas as unidades ao mesmo tempo,
para não deixar a equipe médica sem equipamentos no caso de uma
emergência.
Inspeções qualitativas
Os itens abaixo devem ser verificados por inspeção visual e os resultados incluídos
em uma planilha com o histórico do equipamento.
- Caixa, estojo, chassi, painel, tampa;
- Carrinho, suporte de montagem, pedestal ou outro mecanismo de fixação;
- Rodízios do carrinho (no caso de ser este o tipo de suporte);
- Cabo de alimentação, tomada, fixação mecânica do cabo, terminal de
aterramento;
- Fusíveis, disjuntores do equipamento (p. ex: térmico), dispositivos de proteção
de sobrecarga;
- Cabos de conexão com as pás, cabos de ECG e de sincronismo com o ECG e
seus conectores;
- Pás e eletrodos (de todos os tamanhos);
- Chaves e controles (mesmo os redundantes, como chave no painel e nas pás);
- Bateria e seu carregador;
- Indicadores, mostradores luminosos, telas gráficas (de funcionamento normal
e alarmes);
- Alarmes e outros sinais audíveis;
- Marcações, avisos, precauções de operação e outras indicações gráficas no
corpo do equipamento;
- Acessórios (cabos, pás, gel, eletrodos);
- Descarga interna da energia armazenada;
- Dispositivos especiais (sincronizador, impressora, etc.).
Testes quantitativos
Estes testes devem ser realizados por pessoal capacitado, de acordo com as
indicações do fabricante e de preferência seguindo as orientações de normas
técnicas aplicáveis ao equipamento ou as recomendações dos fabricantes dos
instrumentos de medidas utilizados nos testes. Os valores abaixo são apenas
indicativos. Verifique os valores adequados para o seu
equipamento.
- Resistência de aterramento ("terceiro pino" da tomada) em relação à caixa ou
chassi do equipamento (< 0,5 W);
- Corrente de fuga (< 100 mA chassi, < 10 mA eletrodos);
- Fuga entre eletrodos (< 10 mA isolados, < 50 mA não isolados);
- Continuidade dos cabos e pás;
- Calibração de frequência cardíaca (5% ou ± 5 bpm, a 60 bpm e 120 bpm);
- Alarmes de frequência cardíaca (5% ou ± 5 bpm, a 40 bpm e 120 bpm);
- Limitação interna da energia com pás (internas ou pediátricas) (< 50 J);
- Indicação de energia armazenada ou entregue (15% ou ± 4 J, a > 250 J);
- Manutenção da energia armazenada depois de 60 segundos (< 15%);
- Tempo de carga máxima (para carga a bateria) [< 15 segundos na 10ª carga].
Normas técnicas aplicáveis
Como os demais equipamentos eletromédicos, os desfibriladores e cardioversores
estão cobertos pelas normas da International Electrotechnical Commission (IEC),
algumas já com versão brasileira pela ABNT. Existem também normas nacionais
estrangeiras, como é o caso da American Association for Medicai Instrumentation
(AAMI). São elas:
- NBR-IEC 60601-1: "Equipamento eletromédico. Parte 1: Prescrições gerais para
segurança", 1997;
- IEC 60601-2-4: "Medical electrical equipment. Part 2: Particular requirements
for the safety of cardiac defibrillators and cardiac defibrillator-monitors",1983;
- ANSI/AAMI DF2: "Cardiac defibrillator devices", 1996;
- ANSI/AAMI DF39: "Automatic external defibrillators and remote-control
defibrillators", 1993.
Manutenção preventiva
Além dos itens listados acima, deve-se ter em mente que em desfibriladores e
cardioversores, os componentes mais críticos são as baterias, o circuito de alta-
tensão (capacitor, comutador, cabos de aplicação e pás) e os conectores.
Por essa razão, inspeções diárias da carga na bateria e ao menos uma descarga
(aplicada em um analisador de desfibriladores) é aconselhável.
Deve também fazer parte da manutenção preventiva a limpeza externa do
equipamento, com especial atenção às pás, que podem acumular resíduos de gel
condutor, colocando em risco a segurança do operador e a efetividade das próximas
descargas.
Instrumentos de teste
Para a realização dos testes quantitativos, testes de aceitação e auxiliar na
manutenção corretiva, alguns instrumentos de teste são necessários. Os critérios
para sua aquisição devem considerar o número de desfibriladores e cardioversores
da instituição, o tipo de contrato de manutenção que a instituição tem com
fornecedores externos, a capacitação técnica de seus
empregados e a disponibilidade de recursos para tais investimentos. Os principais
instrumentos são:
- Analisador de desfibriladores (por exemplo: Bio-Tek QED-6H, ou Dynatech
Impulse 3000). Testam diversos parâmetros funcionais exigidos pelas normas,
como energia entregue, tensão e corrente máximas, sincronismo com ECG,
tempo de carga, forma de onda, etc.;
- Testador de isolação elétrica (por exemplo: Dynatech 235A). Testa,
igualmente, diversos parâmetros exigidos pelas normas, como resistência de
aterramento, corrente de fuga, isolação elétrica, etc.