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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS

PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE CARMO DO RIO VERDE

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE


CARMO DO RIO VERDE – GOIÁS.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, pelo Promotor


de Justiça abaixo assinado, vem perante Vossa Excelência, com esteio nos
inclusos autos de representação n. 09/2006 e com fundamento nos permissivos
inscritos na Constituição Federal, na Lei 7.347/85 e na Lei 8.625/93 propor a
presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL, com pedido liminar de OBRIGAÇÃO DE


FAZER E COMINATÓRIO

em face de

CRV INDUSTRIAL LTDA., pessoa jurídica de direito privado, inscrita


no CGC/MF sob o n. 03937452/0001-92, sediada na Fazenda Boa Vista, Km 2,5,
Zona Rural, Carmo do Rio Verde (GO), telefone: 3337-6467, representada pelo
sócio-proprietário PAULO FERNANDO CAVALCANTI DE MORAIS, encontradiço
no mesmo endereço, pelos substratos fáticos e jurídicos a seguir indicados:

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I - OS FATOS.

A ré é empresa de produção de álcool e açúcar neste Município de


Carmo do Rio Verde e aqui se instalou há alguns anos.

A produção, em regra, é cíclica, e obedece a uma dinâmica natural


em que durante um período do ano planta-se a cana-de-açúcar em vastas
propriedades rurais deste município e em vizinhos, e no outro promove-se sua
colheita. Normalmente a colheita começa no mês de abril e segue até o mês de
novembro.

Durante esse período a ré utiliza-se de uma grande estrutura de


pessoal e maquinário, incluindo diversos caminhões que transportam a cana-de-
açúcar à sede da empresa para realizar seu beneficiamento.

No intuito de viabilizar um transporte rápido e eficiente entre o local


da colheita e a sede da empresa, a ré construiu um anel viário nesta cidade e o
tem utilizado como caminho para seus veículos.

O transporte tem sido realizado todos os dias da semana no período


de colheita, durante 24 horas por dia.

Esse anel viário não é asfaltado. Quando os veículos da ré transitam


por ele levantam intensa nuvem de poeira que atinge a comunidade de Carmo do
Rio Verde.

Como o trânsito de caminhões é freqüente, há uma natural elevação


dos níveis de poeira e tal fato tem prejudicado a saúde da população desta
cidade. Os finais de tarde em Carmo do Rio Verde têm sido ofuscados pela
quantidade de partículas de poeira dispersas pelo ar. Fenômeno público e notório.

Diante desses fatos esta promotoria de justiça autuou representação


em 28 de abril de 2006 e buscou remediar o problema diretamente com a ré,

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sobremodo no sentido de garantir que fosse providenciada a utilização de um


caminhão pipa para molhar a estrada do anel viário.

A ré informou ao Ministério Público que disponibilizava caminhão


pipa de forma exclusiva para molhar o anel viário. Todavia, as verificações
efetivadas demonstram que no mês de maio de 2006 a ré molhou o anel viário
entre os dias 22 e 25. Posteriormente, a ré cessou a rega do local e no mês de
junho de 2006 foi constatado que do dia 12 a 30 não foi realizada nenhuma
atividade de prevenção à poeira.

É dispensável discorrer sobre os malefícios que o excesso de poeira


provoca à saúde humana, principalmente em crianças. Além disso, essa prática
coincide com um período extremamente seco – com baixíssimos índices de
umidade relativa do ar – que castiga ainda mais nossa região. E nem se fale do
incômodo que a sujeira provoca. Para finalizar, deve-se atentar ainda que a ré
utiliza fogo nos canaviais para preparar suas colheitas; aliando-se a fumaça à
poeira o quadro da saúde pública só tende a piorar.

II.- OS FUNDAMENTOS JURÍDICOS.

Em toda a superfície do globo terrestre encontramos elementos ou


ambientes naturais, cuja composição e concentração variam conforme as
diferentes regiões. Apesar dessas diferenças, são estreitamente relacionados e,
exatamente por isso, constituem ecossistemas.

Tais componentes são: o ar, a água, o solo, a flora e a fauna.

Ligado estreitamente aos processos vitais de respiração e


fotossíntese, à evaporação, à transpiração, à oxidação e a fenômenos climáticos
e meteorológicos, o recurso ar - mais amplamente a atmosfera – tem um
significado econômico, além do biológico ou ecológico, que não pode ser

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devidamente avaliado. Enquanto corpo receptor de impactos, é o recurso que


mais rapidamente se contamina e mais rapidamente se recupera, dependendo,
evidentemente, de condições favoráveis.

A Constituição da República de 1988 dedicou um capítulo específico


para o meio ambiente, prevendo em seu artigo 225, caput:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente


ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-
lo para as presentes e futuras gerações.

Logo, a atual Carta Magna, ao contrário da anterior, conferiu


amplíssima proteção ao ar atmosférico e poder de controle sobre as
atividades capazes de poluí-lo, sendo competência comum da União,
Estados, Distrito Federal e Municípios a proteção do meio ambiente e
combate à poluição.

Em que pese a definição do constituinte do meio ambiente como


bem de uso comum do povo, melhor se caracteriza defini-lo como interesse difuso
da coletividade, sujeito a todas as formas de tutela que a ordem jurídica
estabelece.

Conforme assevera José Afonso da Silva, o que se tem que


reconhecer, sem dúvida, é que “as normas constitucionais assumiram a
consciência de que o direito à vida, como matriz de todos os demais direitos
fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação no
campo da tutela do meio ambiente.”

A Lei n. 8.544, de 17 de outubro de 1978, prevê:

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Art. 2º - Considera-se poluição do meio ambiente a presença, o


lançamento ou a liberação nas águas, no ar ou no solo, de toda
e qualquer forma de matéria ou energia, com intensidade, em
quantidade de concentração ou com características em
desacordo com as que forem estabelecidas em lei, ou que
tornem ou possam tornar as águas, o ar ou o solo:

I - impróprios, nocivos ou ofensivos à saúde;

II - incovenientes ao bem-estar público;

III - danosos aos materiais, à fauna e à flora;

IV - prejudiciais à segurança, ao uso e gozo da propriedade e às


atividades normais da comunidade. (grifei).

Art. 3º - Fica proibido o lançamento ou liberação de poluentes


nas águas, no ar ou no solo.

Parágrafo Único – Considera-se poluente toda e qualquer forma


de matéria ou energia que, direta ou indiretamente, cause
poluição do meio ambiente.

A mesma previsão está estampada no Decreto Estadual n. 1745, de


06 de dezembro de 1979, que regulamentou a Lei n. 8.544.

Ademais, a atividade da ré, com a geração de poeira, tem criado


condição adversa às atividades sociais, o que por si só é causa de poluição, pois
até mesmo uma simples caminhada na beira do lago fica prejudicada. Prevê a Lei
n. 6938, de 31 de agosto de 1981:

Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:

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(...)

III - poluição: a degradação da qualidade ambiental resultante


de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da


população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e


econômicas;

III - A NECESSIDADE DA MEDIDA LIMINAR.

Para que se impeça, eficazmente, todas as formas de poluição


acima descritas e que vem se perpetuando há vários anos, imperioso, para o
sucesso desta ação civil pública ambiental, um provimento jurisdicional liminar
visando estancar, de pronto, as fontes de poluição.

O art. 12 da Lei 7.347/85, que contempla um procedimento especial,


prevê a concessão de mandado initio litis, sem qualquer prejuízo ou concorrência
com os seus artigos 4º ou 5º.

Trata-se de verdadeira medida antecipatória do provimento de


mérito, tal qual nas liminares de procedimento especial, e não de mera
providência cautelar, perfeitamente possível, compatível e autorizada em lei,
podendo ser concedida nos próprios autos da ação civil pública (cf. RJTJESP
113/312).

Nesse sentido a lição de RODOLFO CAMARGO MANCUSO (Ação


Civil Pública, ed. RT, págs. 109 e ss.), em comento a tais dispositivos:

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“Conjugando-se os arts. 4º e 12 da Lei n.º 7.347/85, tem-se


que essa tutela de urgência há de ser obtida através de liminar
que, tanto pode ser pleiteada na ação cautelar (factível antes
ou no curso da ação civil pública) ou no bojo da própria ação
civil pública, normalmente em tópico destacado da petição
inicial. Muitas vezes, mais prática será esta segunda
alternativa, já que se obtém a segurança exigida pela situação
de emergência.”

Portanto, é induvidoso o cabimento da expedição de mandado initio


litis. Cumpre, agora, demonstrar a ocorrência dos seus pressupostos específicos:
a fumaça do bom direito e o perigo na demora.

A fumaça do bom direito reside nos fundamentos legais acima


transcritos e que, de forma inquestionável, prevêem que a atividade da ré constitui
modalidade de dano ambiental. No caso está sendo praticada poluição do ar.

O perigo da demora reside na necessidade de resguardar a saúde


da população de Carmo do Rio Verde. Não resta dúvida de que uma exposição
prolongada à poeira gerada pela atividade da ré gera inúmeros transtornos para a
saúde, principalmente para a atividade respiratória. E quem mais sofre com a
ausência de cuidados com o meio ambiente são crianças que não têm condições
de se defender desses malefícios.

Os danos já consumados só tendem a se agravar, atingindo, se não


concedido o provimento judicial requerido, o nível da irreversibilidade, atentando-
se para o fato de que outros danos poderão surgir, num desdobramento desses
ou como fatos danosos novos e independentes, inclusive, ocasionando nas
pessoas doenças respiratórias de natureza grave.

Além disso, pela própria natureza do bem jurídico tutelado – ar


atmosférico – forçoso é reconhecer a probabilidade de novos danos mediante a
continuidade das atividades da ré sem os cuidados necessários.

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Aqui, então, indispensável o mandado liminar (medida de caráter


protetivo, cautelar ou antecipatória, com comando de obrigação de fazer ou não
fazer executáveis lato sensu), a cominação de multa (medida de pressão
psicológica para o cumprimento daquele, forma de execução indireta ou
imprópria), independentemente de justificação prévia, ante os contundentes
elementos de convicção de plano apresentados, sabendo-se, no mais, que:

“Evidenciados o fumus boni iuris e o periculum in mora deve o juiz


conceder liminar na ação civil pública.” (AI n. 8.221, de Catalão - rel.
Des. Charife Oscar Abrão - 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Estado de Goiás - Agtes.: Centro Educacional Paulo Freire e
outros - Acórdão de 27.10.94)

IV – O PEDIDO.

Diante do exposto, o Ministério Público requer:

a) com fundamento no artigo 12 da Lei 7347/85, SEJA


LIMINARMENTE, inaudita altera pars, DETERMINADA À RÉ QUE
PROVIDENCIE A REGA DO ANEL VIÁRIO DE CARMO DO RIO
VERDE, DURANTE OS DIAS EM QUE UTILIZÁ-LO, POR MEIO DE
CAMINHÃO PIPA, EM INTERVALOS REGULARES E
SUFICIENTES PARA QUE NÃO SEJA PRODUZIDA POEIRA,
GARANTINDO-SE UM MÍNIMO DE 06 (SEIS) REGAS DIÁRIAS,
sob pena do pagamento de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil
reais);
b) a citação da ré na pessoa de seu representante legal para,
querendo, contestar no prazo legal, a presente ação civil pública,
sob pena de revelia e confissão;
c) seja ao final, julgada procedente a presente ação para CONDENAR
a ré na OBRIGAÇÃO DE FAZER consistente em REGAR O ANEL
VIÁRIO DE CARMO DO RIO VERDE, DURANTE OS DIAS EM QUE

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UTILIZÁ-LO, POR MEIO DE CAMINHÃO PIPA, EM INTERVALOS


REGULARES E SUFICIENTES PARA QUE NÃO SEJA
PRODUZIDA POEIRA, GARANTINDO-SE UM MÍNIMO DE 06
(SEIS) REGAS DIÁRIAS;
d) tendo por objeto a presente ação uma obrigação de natureza
infungível, seja na sentença de mérito aplicado as astreintes
previstas no artigo 11 da Lei 7347/85 como forma de obrigar a ré a
cumprir a obrigação.

Protesta provar o alegado por todos os meios probantes em direito


admitidos, em especial, através de perícias, vistorias, inspeções judiciais, juntada
de documentos, depoimento pessoal do representante legal da ré e oitiva de
testemunhas cujo rol será oportunamente ofertado.

Segue, em anexo, a representação n. 09/2006, autuada nesta


Promotoria de Justiça, numerada de folhas 01 a 23.

Dá-se à causa o valor de R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais).

Pede deferimento.

Carmo do Rio Verde (GO), 03 de agosto de 2006.

Márcio Lopes Toledo


PROMOTOR DE JUSTIÇA

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